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26 DE ABRIL DE 1955 927

4. Por uma evidente razão de ordem, não deve deixar de assinalar-se, desde já, uma relativa disparidade entre o articulado no projecto e a fórmula usada no artigo 27.° do Decreto-Lei n.° 26 115.
Enquanto por este último diploma entram na esfera da limitação apenas as «sociedades, companhias ou empresas concessionárias ou arrendatárias em que o Estado tem direito a participação nos lucros ou é accionista . . .», o projecto parece, à primeira vista, Ter um alcance muito mais amplo, por compreender todas as «empresas em cujo lucro o Estado tenha comparticipação ou em que possua acções . . .».
Sem embargo de certa diferença de amplitude, há-de reconhecer-se, no entanto, o seu carácter mais aparente do que real, por isso que não será corrente ter o Estado participação nos lucros duma empresa, ou ser seu accionista por força do diploma legal da constituição, sem que ela tenha a natureza de concessionária ou arrendatária.
Adoptar-se, pois e simplesmente, a designação de «empresa» ou acrescentar-se-lhe o atributo de «concessionária ou arrendatária», são coisas que no fundo se equivalem, para os efeitos práticos da incidência da limitação, desde que se figure a hipótese de o Estado ser accionista ou participante nos lucros.
Sendo assim, supõe-se não ter havido no projecto o propósito de ampliar o campo de aplicação do preceito consignado no Decreto-Lei n.° 26 115, mas apenas, e talvez, o mero intuito de reduzir o articulado à sua expressão mais simples. Realmente, nada autorizaria a partir de um pressuposto contrário, nem nos considerandos do projecto se descortina qualquer indício a tal respeito.
Em última análise, pois, há todas as razões para acreditar que o projecto de lei em estudo se situa precisamente no campo definido pela reforma de 1935, quanto às empresas vinculadas ao Estado, e tem como objectivo essencial - para não dizer único - o alargamento em proporções consideráveis do limite de remuneração ali arbitrado.
E desta premissa se parte para o exame subsequente.

5. É este aumento substancial um dos dois pontos fundamentais em que se concretiza o presente projecto de lei e que se impõe examinar.
Nos considerandos declara-se fundamento da inovação, como já anteriormente se apontou, o facto de o Decreto-Lei n.° 26115 «ter fixado um limite demasiadamente baixo de retribuição, muito aquém da usada para os corpos gerentes de empresas privadas».
Ora o legislador da reforma de 1935 não ignorava que, em muitos casos, as remunerações percebidas pêlos administradores das grandes empresas particulares, sem ligações directas com o Estado, se situavam muito acima do estalão ministerial. E, ao arbitrar o limite do artigo 27.°, fê-lo, portanto, intencionalmente.
Os motivos determinantes do critério seguido não aparecem desenvolvidos no relatório tio Decreto-Lei n.° 26 115, que os filia resumidamente num «princípio de hierarquia social». (Vide suplemento ao Diário do Governo de 23 de Novembro de 1935, 1.ª série, p. 1764). Mas pode conjecturar-se um pouco mais sobre eles.
Uma consideração acorre logo ao pensamento. As empresas compreendidas no artigo 27.º - «concessionárias ou arrendatárias, em que o Estado tem direito a participação nos lucros ou é accionista ...» - têm posição especial perante a coisa pública, estão de algum modo vinculadas ao Estado, não constituem rigorosamente empresas privadas, no sentido estrito da expressão.
E, porque assim é, o Estado não pode desprender-se das bases em que essas empresas assentam e deixar de subordiná-las a certas normas que, embora não tolhendo a iniciativa económica ou a necessária elasticidade de acção, se conformem com a sua ética. Ali se encontram representantes seus, administradores ou delegados do Governo; e se, quanto a eles, não pode pôr-se em dúvida a legitimidade do Estado para impor fórmulas de remuneração, logicamente relacionadas c harmónicas com os níveis do serviço público,- também, quanto aos outros, nem seria justa uma desigualdade, num esses -só por serem representantes do capital privado - deixam de participar em organismos de índole peculiar e, se não com carácter tipicamente público, pelo menos em relação directa com o Estado.
Objectar-se-á que, assim, pode suscitar-se uma flagrante disparidade de remunerações entre estas empresas, que o Estado subordina aos seus princípios éticos, e quaisquer outras desfrutando de maior independência para com ele, em regime de inteira liberdade no tocante aos réditos dos seus corpos gerentes. E essa é, exactamente, a objecção sublinhada no relatório do projecto em causa.
Contudo, esta razão de possível injustiça, se quer significar que alguma coisa está mal, não implica necessariamente a culpa por parte do Estado, quando este actua - em sector que lhe está afecto -, limitando e moralizando, em ordem a cercear a tendência natural para exageros ou abusos, na sua alta função de supremo fiscal e garante do bem comum.
Mas, tratando-se do campo puramente privado - cuja autonomia o Estado respeita e deve promover, na sequência de uma ideologia política nitidamente! marcada -, já os governantes responsáveis, não podendo desinteressar-se do problema pêlos seus evidentes reflexos de ordem pública, estão todavia inibidos, em regra, de disciplinar por meios directos aqueles casos excepcionais em que se verifiquem anomalias mais salientes.
Restam-lhes, no entanto, os meios indirectos - e esses, entre os quais figura primacialmente o imposto, devem utilizá-los pelo modo mais inteligente c profícuo, sempre que a oportunidade se apresente paru tanto.

6. Mas o autor do projecto de lei não se contenta com afirmar ser baixo o limite estipulado para as remunerações dos corpos gerentes das empresas submetidas ao Decreto-Lei n.° 26 115, nem se queda em preconizar a sua elevação em termos proporcionados - o que ainda poderia admitir-se. Ao contrário, no artigo 1.° do projecto fixa-se implicitamente, para tais remunerações, um novo limite, que as pode fazer subir vertiginosamente para nada mais, nada menos, do que o triplo.
Com um salto brusco, galga-se do «escalão-Ministro» para o « escalão-Chefe do Estado», em matéria de vencimentos, ou seja um aumento aproximado de um para três. E, com maior exactidão, deveremos dizer, mesmo, que cessa qualquer limitação nessas remunerações, visto prever-se a hipótese de serem excedidos os honorários do Chefe do Estado e só para o excedente se criar uma pesada tributação.
Tem de concordar-se em que se não cuida já de um vulgar aumento, mas de uma completa mutação de situações, envolvendo até a subversão do princípio em que se apoia o aludido artigo 27.°, harmònicamente integrado na economia do Decreto-Lei n.° 26 115.
E o mais estranho ainda é que o espírito informador do projecto em apreciação, segundo se depreende dos considerandos preliminares, contende com esta elevação maciça de remunerações.
Assim, começa logo por se escrever ali que «a opinião pública vê com legítimo desagrado receberem por um só lugar, como directores ou administradores de companhias concessionárias, mais do que na sua totalidade