1014 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 99
pode resultar o perigo de julgarem que não mais serão necessárias novas inscrições nos futuros orçamentos.
Do que acabo de expor, e nada tem de exagero, é fatal que, consequentemente, se dão sérias e intensas reacções na administração das finanças públicas durante o período final da gerência.
Por um lado os serviços a defenderem ou julgando que defendem a sua eficiência e prestígio e por outro lado a Fazenda, a informar da legalidade e cabimento das dotações e, ao mesmo tempo, opondo a sua barreira como defesa do indispensável equilíbrio financeiro.
No último período da gerência choram-se, e às vezes com desnecessária agressividade, estas duas reacções em matéria de administração financeira.
Quem tem sobre si a responsabilidade de velar pelo equilíbrio financeiro durante todo o ano económico terá de pautar o ordenamento das despesas de maneira a atender as justas pretensões dos serviços, mas somente na medida em que a situação das finanças o permita e sem nunca comprometer o resultado da conta de exercício.
E como estas despesas ordenadas no final da gerência só virão a ser pagas no período complementar do exercício, eis a razão, Sr. Presidente, pela qual escolhi o período complementar para tirar conclusões sobre a possibilidade de ter havido compressão de despesas em Macau no ano económico de 1953.
Não se julgue que no ultramar se possam ordenar despesas durante o período complementar. As despesas no ultramar são contraídas somente no período da gerência.
No tempo complementar apenas se efectuam os pagamentos que por qualquer motivo não se puderam efectivar na gerência.
Se a administração reconhecer a necessidade do comprimir despesas, será durante a gerência que naturalmente terá de seguir esta orientação administrativa.
Mas se a situação financeira se apresentar precária e ameaçar fechar-se a conta do exercício com saldo negativo, não se deverá hesitar em recorrer à suspensão das despesas já ordenadas.
Há sempre à mão os conhecidíssimos meios clássicos de reduzir despesas: não ordenar despesas variáveis nem preencher lugares vagos.
E, além destes meios, há ainda aquele cuja originalidade pertence ao Estado Novo: não autorizar os 10 por cento cativos em todas as verbas nas despesas variáveis.
Sr. Presidente: vou agora procurar esclarecer esta situação precária de Macau motivada pela quebra das suas receitas que, como já tive ocasião de informar, deu o angustioso resultado de fechar a conta de exercício com saldo negativo.
Este desfecho financeiro do ano económico de 1953 é o reflexo inevitável da má posição da economia da província, traduzida pelo reduzido e decrescente movimento do comércio externo de Macau.
Para se conhecerem as características do comércio externo desta província ultramarina bastará relembrar que Macau foi sempre o entreposto do Ocidente com o Oriente.
A sua economia assentou essencialmente no que importava da metrópole, das províncias ultramarinas e principalmente, dos países do Ocidente para depois efectuar a sua reexportação para o Oriente, para o território da China.
Normalmente Macau abastecia o mercado do vizinho distrito chinês de Chong San de tudo que importava; e por sua vez, Chong San fornecia Macau de géneros frescos (gado, aves, hortaliças, etc.).
Porém, Sr. Presidente, o receio da guerra obriga os Ocidentais a tomarem medidos de precaução contra as exportações, para países comunistas, de matérias-primas ou quaisquer produtos susceptíveis de aplicação militar.
E assim é que, pelo Diploma Legislativo n.º 1207, de 23 de Janeiro de 1952, foi criada a Comissão Coordenadora do Comércio, com poderes de coordenação, fiscalização e licenciamento :de importações, exportações e trânsito de mercadorias.
Seguidamente foi publicada a Portaria Provincial n.° 5233 de 20 de Setembro de 1952, que regulamentou o citado Diploma Legislativo n.º 1207, estabelecendo normas relativas à importação de determinadas mercadorias, designadamente matérias-primas, materiais de construção e outros produtos de que a província de Macau necessita, o adoptou medidas destinadas a evitar que as mercadorias sejam reexportadas ou tenham aplicarão diferente da que crusta das licenças de importação.
As firmas industriais ou construtoras, quando carecem de matérias-primas, produtos ou materiais paru laboração das suas indústrias, ou para execução de obras aprovadas, têm de requerer à Comissão Coordenadora do Comércio a necessária autorização para importarem esses produtos, matérias-primas ou materiais de construção, com indicação do nome e endereço da firma interessada, designação da mercadoria e país de origem, nome e endereço da firma fornecedora, aplicação a dar aos produtos e período em que estes serão consumidos.
A guerra, Sr. Presidente, que parece ter acabado, ainda se prolonga com desastrosas consequências pelas restrições impostas ao comércio de importação e exportação da nossa província de Macau.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Se, pelas disposições da legislação citada, impostas pela defesa contra guerra futura, a importação daquela nossa província ultramarina se limita ao que é absolutamente indispensável ao consumo interno e lhe fica proibida a reexportação como medida cautelar dos países ocidentais; e se por sua vez os comunistas chineses tomam idênticas precauções, não nos pode restar qualquer dúvida de que o comércio de Macau terá de atravessar uma crise tremenda de sérias repercussões na economia e nas finanças da província.
E ,só vemos como remédio para esta grave crise intensificar o comércio com a metrópole, donde Macau se tem limitado a importar vinhos, azeite e conservas em escala reduzida, e proceder de igual modo com Timor, Moçambique e as restantes províncias ultramarinas.
Timor recebe de Macau artigos chineses, sedas e artefactos e tem-lhe enviado café e pouco mais.
Moçambique é grande mercado importador de artefactos de malha de Macau, que é produto da sua indústria. A província terá também de recorrer ao desenvolvimento das suas indústrias.
A mais importante é a da pesca, que ocupa numerosa população marítima e terrestre, com milhares de barcos de pesca em Macau, Taipa e Coloane.
A seguir está a indústria de panchões. com as suas grandes fábricas instaladas na ilha da Taipa.
A indústria do fabrico e embalagem de fósforos, por serem considerados os melhores do Extremo Oriente, tem aumentado a sua exportação para a China, Indochina, Malásia, Filipinas, Indonésia, Estado da índia e Moçambique, apesar de que esta indústria está prejudicada com as restrições impostas à exportação para a China.
E além destas, há outras indústrias em Macau susceptíveis de desenvolvimento, como artefactos de malha, conservas, óleo de amendoim, tralhas, tabaco solto e preparado.
Bem sei que uma coisa é dizer a outra é realizar.