O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

258 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 179

mós e em condições, portanto, de ficarem sujeitos à supervisão daquele organismo.
A delegação portuguesa, a quem deste lugar desejo prestar as minhas calorosas homenagens pela lógica e pelo desassombro com que defendeu os mais altos e transcendentes interesses do País, bem vincou o carácter discriminatório dessa moção, que estabelecia um regime para os países que entraram em 1956 para a O. N. U. diferente do que se mantinha para os países que haviam entrado anteriormente para uma organização que se baseia na igualdade jurídica, isto é, na igualdade de direitos e obrigações para todos os Estados que dela fazem parte.
Numa assembleia que reúne dezenas de Estados, de diferente estrutura política, de mentalidades tão diversas e onde têm sempre eco as ansiedades e as paixões que dominam a nossa época, dura foi a batalha travada pela delegação de Portugal, que tinha atrás de si as verdades da História, os imperativos da Justiça e, ao mesmo tempo, o apoio dos Portugueses, de todos os credos e de todas as raças espalhados pelo Mundo, mas unidos em volta da grandeza, dos destinos e dos mais altos interesses da Pátria, conforme o acaba de acentuar, no seu magistral discurso, o Sr. Dr. Águedo de Oliveira.
Pôde a nossa delegação provar com argumentos irrefutáveis que não há em Portugal territórios não auto-administrados e que, pelo contrário, a administração do País pertence indistintamente a todos os portugueses, sem distinção do local ou da província onde nasceram.
Nesta Assembleia é fiscalizada a acção da Administração, propõem-se e votam-se leis e todos os Deputados da Nação têm as mesmas prerrogativas, sem ter em conta a circunscrição por onde foram eleitos.
Portugueses da metrópole, da África ou do Oriente, são iguais perante a lei e se nalgumas províncias do ultramar há núcleos de portugueses que, pela sua cultura e educação, ainda não puderam ascender a plenitude dos seus direitos, é tarefa honrosa a da Nação que tão devotadamente prossegue a missão de os elevar, espiritual e materialmente, e que não precisa de directrizes, porque, neste aspecto, toda a sua história é um livro aberto e em que se contam, pelas páginas, as lições sem par de dedicação e de sacrifício.
Informando as Nações Unidas que não possui territórios daqueles que se convencionou chamar não autónomos, Portugal deu uma resposta de acordo com a sua Constituição Política, e, como a O. N. U. pretendia poder apreciar e discutir essa resposta, isso equivalia, como recentemente afirmou o Prof. Marcelo Caetano, nunca discurso a todos os títulos notável, a querer ter o direito a interpretar e a discutir essa Constituição, e que constituía ingerência nos negócios internos do Estado e violação expressa da própria letra da Carta das Nações Unidas.
Apesar das razões aduzidas pela delegação portuguesa e pelos representantes de outros países, não nos foi favorável a votação na Comissão das Curadorias. Por dois votos perdemos numericamente a batalha. Mas ganhámo-la moralmente. Com excepção da Grécia, a quem nos prendem tão fortes vínculos espirituais e a mais sincera admiração pela sua velha cultura, votaram connosco todas as nações europeias que vivem fora da órbita comunista, os Estados Unidos da América e o Brasil, países cuja história está mais directamente ligada à nossa ou que nunca ocultaram uma sincera e profunda admiração pelo esforço português no Mundo.
Nações das mais poderosas e com os maiores serviços à causa do progresso humano e da elevação moral e material dos povos puseram-se abertamente ao nosso lado na O. N. U.
Mas entre tantas provas de solidariedade dispensadas ao nosso país seja-me permitido, Sr. Presidente, destacar nesta Assembleia a atitude do delegado da nação brasileira, Donatello Grieco, que tratou, como se fosse do Brasil, a causa de Portugal.
No seu memorável discurso não há que admirar apenas a força dos argumentos, o rigor dos conceitos jurídicos, o realismo da exposição, o seu brilho literário e a forma como os factos serviram para documentar o fulgor inexcedível da palavra. Há que admirar também a sinceridade desse discurso, a emotividade com que foi proferido e a íntima e profunda solidariedade que exprime entre os dois povos de língua portuguesa.
Numa assembleia de representantes de povos, uns jovens, outros de existência multissecular, em que se entrechocam ideias e conceitos opostos, nada podia ser mais útil ao ponto de vista português do que o depoimento do Brasil.
Quando no fundo se tratava de averiguar se Portugal possuía territórios que devessem ser submetidos à supervisão das Nações Unidas, um grande país se eleva para contestar esse direito.
Não está fora das realidades, não desconhece a acção do país visado, não o move qualquer interesse oculto, pretende apenas ser fiel a si próprio e a verdade.
Se alguma dúvida houvesse em certos meios internacionais sobre a capacidade civilizadora e construtiva dos portugueses as declarações do delegado do Brasil deveriam ser, por si, esclarecedoras e definitivas.
Em momento particularmente delicado a nação brasileira não enjeitou a sua maternidade e, antes, teve orgulho em proclamá-la em reunião autorizada de representantes de povos.
O Brasil não é só, na verdade, uma grande descoberta de Portugal. E também uma das mais belas afirmações da sua capacidade realizadora. Para ali levámos, com o sangue, a língua e a fé, costumes e instituições, e toda a obra do povoamento é um esforço ingente e continuado de séculos para o progresso simultâneo da terra e da gente.
O continente era vasto, com profundas diferenças entre muitas das suas regiões, ali acorreram ondas sucessivas e maciças de emigrantes das mais diversas partes do Mundo, mas deste conjunto de raças e de interesses fez o génio português uma grande nação, que desconhece as questões raciais e dominada por um sentimento de forte unidade política. Separou-se da Mãe-Pátria sem ressentimento ou ódios, conservou-se-lhe amorosamente grata e fiel e, longe de adoptar os preconceitos anticoloniais, tão em voga na nossa época, recorda sempre alguns séculos de vida comum como trecho honroso e dignificante da sua história, à qual, mercê do passado, o futuro abre tão grandiosas esperanças e perspectivas.
A acção civilizadora que há mais de cinco séculos empreendemos e de que o Brasil é a mais esplendorosa floração continua hoje em diversos continentes, desbravando a terra, propagando a fé e os altos ideais da vida, mobilizando a riqueza, procurando atrair os povos pela persuasão e dando-lhes a consciência do seu valor, da sua dignidade e do seu verdadeiro destino.
Sr. Presidente: no dia em que a rainha da Inglaterra, que nos trouxe uma mensagem de fidelidade a uma aliança tantas vezes secular, deixa Portugal, depois de ter conquistado o afecto e o coração do nosso povo, conforme exprimiu em nome de nós todos o Sr. Presidente da Assembleia Nacional, terminando uma visita que corresponde a um dos mais relevantes e significativos actos da política externa portuguesa, traz-nos o telégrafo a notícia de que a Assembleia Geral das Nações Unidas não ratificou a moção discriminatória aprovada na Comissão das Curadorias.