440 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 92
çao serena, sem coacções exteriores à verdade dos factos e das intenções e aos próprios imperativos da nossa consciência - só a essa luz as criticas poderão surgir despidas de intuitos malévolos, embora nessas criticas se ponham os desejos de ligeira ou profunda, modificação de conceitos, normas, processos ou métodos.
À situação política que nos conduz neste mundo conturbado devemos o poder nesta Assembleia apreciar com serenidade e sem ideias preconcebidas contra seja quem for ou contra o quer que seja a gestão do Pais através das suas mais salientes linhas de exame: as das contas públicas. E é com essa serenidade e essa isenção que podemos aqui falar - e falar aqui, no clima sério e propício aos grandes exemplos (o clima que nos outorgam os Chefes do Estado e do Governo), falar aqui, Sr. Presidente, é «construir», ou, pelo menos, «tentar construir», mas nunca «destruir».
E começo desde já - porque em minha consciência o sinto como dever imprescritível de «construir» -, começo desde já, Sr. Presidente, por dar o meu voto de aprovação plena às contas públicas de 1957, ora em apreciação, cujo teor já apreendera no sempre magnifico relario do Sr. Ministro das Finanças e cuja analise nos é proporcionada agora principalmente através do não menos magnífico parecer que as acompanha.
Sr. Presidente: devemos congratular-nos com o facto de o nosso sistema financeiro ser um sólido baluarte da marcha do Pais na via do progresso a que aspira - e que vai conquistando, palmo a palmo, sim, mas com a, segurança de que precisa tudo o que deve não confinar-se à efémera condição do momento, mas assentar a sua base fundamental no tempo.
Temos boas finanças, temos mãos seguras para as governar - teremos as condições de garantia necessárias para o fomento de uma boa economia, a par de as termos para a estruturação do bem-estar de todos os portugueses, qualquer que seja a sua camada social, qualquer que seja o território nacional em que vivam.
Não nos encontraremos, certamente, dentro desse bem-estar a breve prazo, seja-o, então, a longo prazo, mas com a segurança exactamente proporcionada pelas obras que se executam de acordo com o tempo, não com a improvisação.
Que um bom sistema financeiro não basta, eis uma verdade incontroversa e palpável. Já o falecido e glorioso Papa Pio XII, em certa mensagem que dirigiu há cerca de uma dúzia de anos aos membros de um Congresso Internacional das Finanças Públicas, asseverou que o sistema financeiro do Estado deve procurar organizar a situação económica de modo a assegurar ao povo as condições materiais de vida indispensáveis ao desenvolvimento da sua própria vida intelectual, espiritual e religiosa, ficando, pois, as finanças públicas apontadas como um dos instrumentos de intervenção do Estado na economia propriamente ditada Nação.
Mas, se um bom sistema financeiro não basta, parece-me que o pensamento de Pio XII anda bem perto de o considerar como condição necessária à instituição do bem-estar geral.
Ora, se já nos devemos considerar gratos à Providência por nos ter dado, com Salazar, finanças públicas sólidas e sérias, claramente postas à vista de quem quer que seja - aqui e em todo o Mundo -, a verdade é que por não menos gratos nos devemos ter ao vermos que o nosso sistema financeiro nem por isso deixa de procurar, na ânsia do mais e do melhor para o Pais, na ânsia da melhor justiça social, os instrumentos que, no rodar dos tempos, mais profícuos se forem mostrando, venham donde venham os bons e legítimos figurinos, porque bem sabemos que o progresso dos instrumentos de pesquisa, materiais ou intelectuais, não podem ser apanágio exclusivo deste ou daquele pais - e não raro as notícias do Mundo nos falam de que o nosso próprio figurino é adoptado no estrangeiro nas suas próprias estruturas de base.
Não se pode conceber, Sr. Presidente, que, se o País não estivesse sob a égide de finanças públicas sólidas, houvesse a possibilidade de pensar-se na promoção do bem-estar geral dos Portugueses, na metrópole e no ultramar, através da execução de planos de fomento, de que o actualmente em marcha representa o instrumento mais ambicioso - de legítima ambição, entenda-se - de progresso para o Pais, no sector material e, em cadeia, nos restantes, já que uns sectores repercutem nos outros, provocando-se incrementações recíprocas de alta projecção nas fundadas esperanças que suscitou e suscita.
Mas também não se podia conceber que o País. estivesse apenas sob a égide das finanças públicas sólidas, e que se contentasse em ficar por aí. E na realidade, não ficou.
Aí temos o II Plano de Fomento; aí temos toda a couraça de que nos queremos revestir perante a crueza de certos blocos de integração económica, um dos quais, o do Mercado Comum dos Seis, do Tratado de Roma, é o que mais nos ameaça já, podendo acontecer que mais nos ameace ainda outro qualquer, como alargamento daquele.
A rude franqueza com que o Governo da Nação, a começar pelo Sr. Ministro das Finanças - exactamente o primeiro grande grito sobre as implicações da integração económica europeia (com o seu cortejo de apreensões para o nosso quadro industrial) surgiu do relatório que antecedeu a proposta da Lei de Meios para 1957, o mesmo ano cujos resultados de execução orçamentaria estão agora entregues ao exame da Assembleia -, essa rude franqueza com que o Governo pôs à Nação os problemas que iríamos enfrentar, numa luta de sustentação ou de sobrevivência das nossas indústrias, não deixa de constituir mais um dos relevantes serviços que a todos tem prestado, até porque, fazendo-o, não deixou de nos ir dizendo que, de acordo com a letra e com o espírito da nossa Constituição Política, a índole da nossa actividade económica é de iniciativa privada, ao Governo competindo, nos termos da mais elevada moral, intervenções normativas (orientadoras e, quando preciso pré-executivas ou mesmo já executivas) apenas na medida em que o bem-comum o aconselha ou impõe.
Sr. Presidente: é verdade que as publicações do Instituto Nacional de Estatística dão oportunamente ao País conhecimento dos números mais expressivos respeitantes ao comportamento dos nossos distritos em matéria vária, a permitir-nos já os contactos com certas diferenças entre uns e outros.
Meramente estatísticos esses indicadores, nós os vemos nos pareceres sobre as contas públicas revestidos explicitamente das reais características do nível de vida de que cada distrito goza, isso a marcar as várias manchas regionais claras ou escuras da sua posição no todo do País.
Os comentários dos pareceres, com serem sóbrios e serenos, nem por isso deixara de ter aquele calor de elucidação que se impõe nas peças que terão de ser apreciadas no seio da representação nacional. E incitam-nos, até, a procurar outros indicadores correlativos que nos ajudem a considerar os vários Ângulos de que nos podemos e devemos servir para a observação de problemas mais ou menos vitais que Portugal, como qualquer outra nação, tem de enfrentar, e enfrentará, porque os quer resolver.
Ora, diz-nos o parecer que temos em apreciação agora ser preciso tomar-se uma boa série de medidas no sentido da descentralização das actividades económicas, para serem evitados graves prejuízos para o equilíbrio