500 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 96
Foi lido. É o seguinte:
«Lisboa, 17 de Abril de 1959. - Sr. Presidente da Assembleia Nacional. - Lisboa. - Excelência - Tenho a honra de transmitir a V. Ex.ª a seguinte deliberação do conselho geral da Ordem dos Advogados, rogando-lhe que se digne dar conhecimento dela a Assembleia Nacional:
O conselho, ao tomar conhecimento de ter sido aprovado por unanimidade pela Assembleia Nacional o projecto de lei da autoria do colega Homem Ferreira, modificando alguns, artigos do Código de Processo Penal e que, assim, põe termo, satisfazendo-a, à reivindicação considerada vital por quantos se honram de vestir uma toga, congratula-se com aqueles que, de qualquer modo, para isso contribuíram, permitindo-se salientar a acção do autor do projecto; do colega Cancella de Abreu, que promoveu o apressamento das formalidades essenciais para a sua aprovação, e do antigo presidente da Ordem, professor Palma Carlos, que elaborou, como relator, o primoroso parecer da Câmara Corporativa.
Apresento a V. Exa. os meus respeitosos cumprimentos.
A bem da Nação. - O Presidente da Ordem, Pedro Pitta».
O Sr. Urgel Horta:- Sr. Presidente: cumprindo a promessa, volto a esta, tribuna para dar inteira satisfação àqueles que confiadamente aguardam com certa ansiedade as minhas singelas palavras, proferidas perante os membros da Assembleia Nacional, como se elas encerrassem o poder ou condão miraculoso de solucionar problema de tanta magnitude e importância como é o problema dos reformados e pensionistas do Estado, em que tenho posto o meu melhor interesse.
Na intervenção parlamentar de 13 de Fevereiro passado ocupei-me, com notável desenvolvimento, das providências legais tomadas acerca da revisão e do reajustamento dos vencimentos do funcionalismo do Estado em serviço activo, regozijando-me com. essas medidas, inteiramente merecedoras do aplauso geral, dignificadoras de uma política assente em princípios de seriedade e sanidade financeira, há muito estabelecidos, dando satisfação e remédio aos constantes agravamentos do custo da vida, dentro das possibilidades existentes, dentro da verdade, sem recurso a qualquer artificio.
Resolvido o problema de vencimentos do funcionalismo em harmonia com o equilíbrio das nossas contas, de que resultou uma soma de notáveis benefícios e recursos para poder fazer frente às acumuladas dificuldades de vida com que se luta, outro problema de não menor importância ficou em suspenso: o problema dos reformados e dos pensionistas do Estado. Sempre através dos tempos os vencimentos de uns e de outros andaram num plano de paralelismo, obedecendo às mesmas flutuações, visto as necessidades para sustento e manutenção da vida ser em quase as mesmas, pois o encarecimento dos produtos, dependente dos mesmos factores, faz-se igualmente sentir tanto para aqueles que se encontram no pleno exercício da sua função, como para os que a doença ou limite de idade atirou para a reforma, podendo até dizer-se que com reconhecido agravo para os segundos, porque a senilidade exige cuidados especiais, dispendiosos, que os mais novos dispensam.
Perante problema de tanta projecção e gravidade, que toca em profundeza a nossa sensibilidade e desperta nas consciências bem formadas um sentimento de enternecido interesse e desvelo em defesa de uma causa inteiramente justa, não hesitei, e da minha tribuna de Deputado, quo sempre ocupei com toda a independência e com toda a liberdade, levantei a voz, exteriorizando o meu pensamento acerca da razão que assiste aos velhos servidores do Estado, que, no exercício dos seus cargos, cumprindo o seu dever, pedem agora atenção às suas necessidades dentro do direito que comprovadamente lhes assiste.
E aqui estou, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a defender mais uma vez e com o mesmo calor e entusiasmo a sua causa, muito especialmente a causa dos humildes, os mais batidos pela adversidade e pela desgraça, procurando recursos na luta contra a fome e a miséria que desesperadamente os persegue.
Sr. Presidente: há anos dizia o Sr. Presidente do Conselho, naquela forma lapidar e eloquente em que apresenta os seus tão magníficos como inigualáveis conceitos, plenos de verdade e de razão: «A justiça exige que onde há mais necessidade aí seja maior a solicitude; não se é justo quando se não é humano».
Que magnífica lição encerra o período que acabamos de ler e que alto significado têm as palavras proferidas pelo insigne estadista, de inteira aplicação no caso presente. Na verdade, justiça e humanidade são apanágio dos corações fortes, das almas boas, iluminados pela crença e pela fé, e é dentro desse espirito que o problema tem de ser encarado e resolvido. O Sr. Presidente do Conselho, sempre atento às manifestações do sentimento humano, mais uma vez, através da esclarecida articulação, oportunidade e sentido das suas palavras, marcou e definiu posição em face do problema agora em litígio. Honra lhe seja.
Sr. Presidente: o mundo de hoje, nos seus constantes movimentos oscilatórios da crise em que se debate, vive, presentemente, uma hora bem diferente da vivida no século passado.
E os problemas da incapacidade e da velhice, onde me seja permitido colocar os reformados -problemas ligados à longevidade, acusam natural tendência para um agravamento, produto generoso e benéfico da aplicação dos meios instituídos pela medicina e pela higiene, e~ ainda por outras providências de ordem social-, esses têm de ser encarados com humanidade e com justiça. Há que dar aos aposentados, incapacitados por doença inibitória do exercício da sua actividade, os recursos suficientes com que possam combater as enfermidades que os atacam, vivendo uma vida compatível com a situação que adquiriram no exercício da sua actividade profissional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador:-Aos que, forçados pela tirania da lei a abandonar o desempenho de cargos que ocupavam, quantas vezes a inacção, fonte perturbadora do seu psiquismo, lhes acarreta manifestações nervosas e mentais e lhes desperta lesões adormecidas, transformando-os em farrapos humanos, que é necessário amparar e proteger.
O que acabo de expor quer dizer que os reformados ou aposentados têm necessidade do amparo e do carinho do Estado, que às leis devidamente lhe conferem.
Sr. Presidente: os escalões de classificação dos diferentes funcionários estão ordenadamente estabelecidos. E são sempre os mais modestos, os mais humildes, aqueles que exigem maior soma de protecção, visto serem os mais sacrificados.
As pensões são em tantos casos tão exíguas, tão pouco remuneradoras, que não podem fazer face à própria alimentação, reduzida ao mínimo, quanto mais à da família de que são chefes.
O quadro que apresentei na intervenção de 13 de Fevereiro é expressivo na fidelidade da sua clareza.