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29 DE ABRIL DE 1959 621

confesso que prefiro, sempre que posso, actuar com segurança, à maneira empírica.
Meus Senhores: quando vejo, em vários sectores da imprensa estrangeira - que tanto empenho mostram em resolver os nossos problemas, como se os não tivessem na própria casa -, apodar de ditador o Chefe do Governo Português, vem-me à lembrança um ror de situações que presenciei e nas quais aquilo que eu verdadeiramente poderia estranhar era, bem ao contrário, a falta da sua categórica orientação, como parecia lógico e, quanto a mim, necessário. Quantas vezes, em reuniões ministeriais e outras, lamentei que o Presidente do Conselho não fizesse decididamente encaminhar com o prestigio da sua experiência, com a autoridade da sua isenção e do seu lugar, para aquilo que eu julgava ser o melhor lado, a solução de um problema!
Mas não.
Não queria, de maneira alguma, impor o seu juízo em matéria oferecida ao livre exame e votação. Um respeito absoluto pelas deliberações dos conselhos. E de tal maneira que quem o tivesse ouvido opinar sobre certos casos pasmava de ver como era possível deixar livremente correr discussões que rumavam para desfechos contrários ao seu próprio parecer.
Era este um ditador?
Respeito impressionante pelas leis. Pode, é certo, fazer a lei; mas para depois lhe prestar estrita obediência, como qualquer outro.
Respeito ainda pela dignidade alheia, como se fosse a sua.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu poderia testemunhar como, mesmo em questões de alta importância, e nas quais o Presidente do Conselho tinha posição tomada, admitia convicções diferentes e tudo fazia para evitar que alguém tivesse que agir contra a própria consciência.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Nem o seu alto nível moral consentia que em seu espirito ficasse mesquinho ressentimento para com atitudes honestas e leais, ainda que em oposição aos seus propósitos.
Será este um ditador?
Intransigente, sim, mas na observância dos princípios que tinha como fundamentais para a administração publica - de resto muito poucos e muito simples. A autoridade, com os seus corolários de hierarquia, disciplina, harmonia social, defesa da ordem; a independência do Estado e a sua missão orientadora: nem sujeição a interesses, nem intromissão absorvente nas actividades privadas; o equilíbrio orçamental, que fora um alvo difícil e que, uma vez atingido, nunca mais se poderia perder.
Princípios filosóficos na base de tudo? Certamente; mas em lugar das abstracções com que às vezes se depara, perigosas pelo seu poder aliciante, inteiramente em desacordo com as realidades da vida actual, o que da sua actuação se desprende é um destacado cunho de aplicação imediata e prática, fundamentalmente humano e caracterizadamente adaptado ao povo português.
É ele mesmo o primeiro a sofrer o rigor salutar dos princípios. Nos planos de acção que a sua inteligência, friamente, patriòticamente, tem preparado nestes longos trinta e um anos de um esforço ingente - em que a coragem, a paciência, a capacidade de resistência aos trabalhos físicos e às agruras morais entraram no campo do verdadeiro estoicismo -, nesses planos, aquecidos ao color de uma fé inabalável e que outra finalidade não têm do que o engrandecimento da nossa Pátria, não há lugar para paixões, nem simpatias; tudo o que poderia ser humana vaidade ou orgulho, mágoa ou desgosto, tinha de ser esquecido, amarfanhado no próprio peito. Só interessa o bem comum. Mas generoso e tolerante, sempre que o pode ser. E assim lhe restam apenas as esperanças nos empreendimentos, a alegria serena e muda de ver dia a ia realizar-se uma obra, que também dia a dia tem de se multiplicar, indefinidamente, inexoravelmente.
Qual de nós, dos que têm sacrificado ao serviço público alguns anos inteiros, sem tirar um dia, de esforço, de canseiras, de entusiasmo e de agravos sofridos, qual de nós não sentiu por vezes o desespero e o desânimo, o desejo ardente de se libertar?
Só assim se pode compreender a incomparável coragem moral daquele espirito forte, daquele homem verdadeiramente abnegado, que, sem um desfalecimento, vem arrostando com o mais pesado e mais honroso fardo da administração pública portuguesa, durante a vida inteira!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Sr. Presidente, Srs. Deputados: continuo o meu modesto depoimento, pessoal, pobre, talvez irreverente, mas sincero, vivido.
Vejo este homem eminente, que atingiu a plenitude do seu saber e adquiriu a maravilhosa experiência de uma larga e intensa vida, durante a qual o nosso pais e o mundo sofreram convulsões e atravessaram e vivem períodos históricos decisivos para o futuro da humanidade ; que soube vencer tentações de glória e dominar impulsos de mando; que preferiu refugiar-se na própria consciência para nada esperar em troca dos seus serviços - vejo-o de há longo tempo como o mais precioso orientador e conselheiro da administração pública portuguesa.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Da sua discreta cadeira de S. Bento, examinando atenta e serenamente os problemas que em sucessão ininterrupta lhe são trazidos, na mais variada gama que a vida humana apresenta, o mestre venerando, que tanto se orgulha do seu «culto pela justiça, pela verdade e pela exactidão», desdobra, através do mais claro e mais frio raciocínio, todas as premissas, todas as razões, para chegar às mais justas, às mais verdadeiras, às mais exactas conclusões; e para depois, modesta, simples e sinceramente afirmar que é tudo o que sabe dizer.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-Pela sua mão passam, diária e continuamente, grandes e também pequenos problemas, cuja análise nunca recusa. E quanto tempo, valioso tempo, assim desbaratado em coisas mínimos! Mas os homens nem sempre terão sabido utilizar as altas prerrogativas que ele lhes outorga, a independência, a enorme força que lhes foi confiada.
No entanto, também quantos, felizmente, souberam aproveitar as condições privilegiadas da sua época para realizar essas obras grandiosas que em todos os sectores da vida portuguesa ficam a assinalar um período de resgate e de renovação! Colaboradores dignos desse nome que puderam elevar-se a altura do grande Chefe e compreendê-lo e secundá-lo e multiplicá-lo.
Porque este homem superior despreza tudo o que seja tacanho: as pequenas soluções, as pequenas obras, os pequenos projectos, quando destacados dos planos orientadores. Merecia e merece quem possa corresponder a tão levantados propósitos; quem possa aproveitar o