O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

18 DE JUNHO DE 1959 1013

sal por o voto ser conferido a uma enorme massa de cidadãos.
Eu, na proposta, mantenho o princípio do sufrágio universal, mas condiciono-o a ser exercido pelos chefes de família.
Esta solução integra-se no longo ramo dos sufrágios universais mais ou menos limitados.
Se V. Ex.ª quiser fazer dialética de palavras, poderá ver contradição. Mas se quiser usar as palavras pesando-lhe o seu verdadeiro sentido, reconhecerá que não é indiferente dizer que a minha proposta é a do sentido de sufrágio universal ou que é no sentido de sufrágio de chefes de família. Esta é modalidade de um sufrágio universal condicionado; mas nessa tribuna há vantagem em se empregarem as expressões com a precisão possível; por isso entendo que se exprime mal o sentido da minha proposta dizendo apenas que é a do sufrágio universal.

O Orador: - Sr. Presidente: deixei que de novo os apartes se tornassem discursos intercalados no meu próprio discurso, com risco de este me ficar desfigurado, por difícil reconhecimento do fio lógico por onde procurei conduzi-lo. De novo também, em nada foi prestado qualquer esclarecimento útil ou resposta pertinente à crítica que vinha fazendo.
Estava eu a acentuar que se ignora ainda, na Câmara qual o novo sistema preconizado pelo ilustre Deputado Sr. Dr. José Saraiva, visto não ter sido apresentada logo qualquer proposta, que se vê estar agora na Mesa.
Até agora, sabe-se apenas vagamente - porque, depois de talvez mais de duas horas dedicadas ao minucioso exame do sistema que se entendia não poder ser, só cerca de dez minutos terão sido consagrados à exposição da linha geral do novo sistema que se entendia dever ser, tendo-se relegado para o debate ma especialidade os desenvolvimentos naturalmente indispensáveis. Haverá, anunciou-se, um certo amplo colégio eleitoral, designado por um certo sufrágio dito universal directo, e não poderão ser dispensados nem a apresentação pública de candidaturas nem o debate eleitoral - aquele célebre debate que nos fora dito ser «um problema grave, que tem de ser corajosamente posto e definitivamente resolvido».
Este simples desvendar da solução basta, quanto a mim, para a recusar. Sabemos, por alheia experiência vivida, que a eleição indirecta pelos chamados eleitores ide segundo grau se converte, na prática, em eleição de sufrágio directo. Não está provado e não há raciocínios capazes de convencer que iria suceder agora de outro modo, para mais em país considerado de muita exaltação de temperamento e insuficiente «dignidade cívica».
Sr. Presidente: não terminarei este capítulo das minhas mal ataviadas considerações sem uma referência merecida à nobre coragem moral com que alguns Deputados aproveitaram o ensejo do presente debate para reafirmar, coram populi, a fé das suas convicções monárquicas.
Como o Regime não obriga ao sacrifício das preferências políticas de ninguém, respeitado que seja o denominador comum do interesse nacional no quadro de meia dúzia de princípios essenciais (e, no dizer do Sr. Presidente do Conselho, embora não cabendo nele Deputados monárquicos, do mesmo modo que não cabem Deputados republicanos, isto é, Deputados de partido, é desejável que existam monárquicos Deputados), parece perfeitamente explicável que os aludidos Srs. Deputados tenham proclamado, a propósito do artigo 72.º da Constituição, as excelências da hereditariedade na chefia do Estado.
Por o terem feito, admiro a fortaleza dos seus temperamentos e a solidez das suas convições. Não pertencem, Deus louvado, àquela raça moderna de apolíticos (uns inconscientes e outros mal disfarçados), a quem, se lhes perguntarmos se sào situacionistas ou anti-situacionistas, respondem que são médicos ou advogados ou engenheiros ou industriais ou comerciantes. Esses Deputados sabem e proclamam que há um ideário temático para todo o homem verdadeiramente digno, onde não cabe nem o exclusivismo nem o primado dos valores materiais - cientes, de resto, de que a própria vida profissional anda na estreita dependência das boas ou más estruturas do País.
Todavia, consinta-se-me a lealdade e a franqueza de, afirmar que, para além do talvez excessivo acento posto na defesa da ideia, que pôde parecer a alguns Deputados mais do que serena afirmação de princípios, suponho de mau aviso, por certo mais emotivo do que raciocinado, concluírem pela rejeição da preconizada substituição do artigo 72.º

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não estando em causa o princípio da hereditariedade na chefia do Estado, votar contra a proposta não pode validamente significar votação a favor de um sistema que se situa por completo fora do elenco dos problemas em debate. O verdadeiro valor jurídico-político de tal voto seria de outra força - a de que deveria continuar com força de preceito constitucional o actual processo de eleição do Presidente da República.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ora, como nobremente reconheceu o ilustre Deputado Sr. Cortês Pinto, o sistema da proposta atenua os inconvenientes do até aqui consignado na Constituição e é, portanto, preferível a este; mas votar, apesar de tudo, contra ele, ou seja pela manutenção do actual, significa, salvo o devido respeito e a muita consideração, optar pelo pior.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nem me parece que, se por absurdo quisermos admitir que votar o artigo 72.º é votar antimonárquico, seria menos antimonárquico votar, mercê da sua recusa, pela manutenção do mesmo artigo na sua redacção actual, resultado à que se chegaria se, também por absurdo, admitíssemos a decisão da maioria da Câmara neste sentido, ao lado daqueles Srs. Deputados.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Isso quer dizer que esses Deputados não se decidem por absurdos. Guiam-se pela consciência, e suponho que V. Ex.ª não admite que sobre esta prevalecem os absurdos.

O Orador: - Estou a falar de questão de inteligência, e não de questão de consciência - o que é diferente. Quero acreditar, Sr. Presidente, que se desfará
o equívoco deste errado estado de espírito e que uma serena reflexão, bem própria das pessoas inteligentes que são os mesmos Srs. Deputados, varrerá o mito criado certamente numa hora de explicável intensidade emocional. Para mais, sabe-se que eles próprios entendem, antes de ninguém, que, conforme as autorizadas palavras do ilustre Deputado Sr. Dr. Cortês Pinto, hoje. talvez mais do que nunca, continua a ser necessário «colaborar com a situação vigente para defender a Nação».