17 DE DEZEMBRO DE 1962 1625
deixa a impressão de ser ténue a margem que entre a renda fundiária e o lucro da exploração ficará para sofrer o novo imposto.
Na prática, porém, não será realmente assim, porque os elementos da renda fundiária, ou rendimento colectável segundo a matriz predial, serão estabelecidos de cada vez para muitos anos, enquanto os elementos correspondentes do lucro de exploração serão determinados anualmente.
E destarte aparece-nos o imposto em exame como um meio de correcção permanente das matrizes em favor do Estado, que, pela via do lucro da exploração, não deixará de perceber o que qualquer desactualizarão dessas matrizes no regime actual lhe faria perder. Só os contribuintes é que ficam sem defesa contra as desactualizações em seu detrimento!
Mas como se determinam os lucros das explorações? Partindo do princípio de que são difíceis e raras as contabilidades Agrícolas, estes lucros determinam-se, ano a ano, perante declarações complexas dos contribuintes e pelas presunções de comissões de fixação de rendimentos, e de reclamação, em que a Fazenda Nacional terá sempre a maioria deliberativa.
E aqui temos larguíssimo campo aberto a discussões, se não a transacções, que justificam as mais sérias dúvidas ao cabimento e oportunidade do imposto.
Notarei até que a própria complexidade das declarações e da sua verificação pode conduzir a que as disponibilidades de tempo e de pessoal deixem a maioria delas por examinar convenientemente, levando, porventura, a fortes discriminações entre contribuintes, conforme sejam ou não escalpelizados os seus casos, e a sérios prejuízos para o Estado, quando passem despercebidas declarações insuficientes. E darei como exemplo disto a asseveração que há anos me fez certo funcionário das finanças lisboetas, segundo o qual, e pelas conclusões de uma rápida amostragem, só no seu bairro a Fazenda Pública perderia anualmente centenas de contos por insuficiente verificação das declarações para o imposto complementar, que, aliás, poderia bem fazer-se, caso fosse atendido o pedido, em vão feito e repetido, de um só mero amanuense para reforçar o quadro do pessoal...
Fonte certa de trabalhos, de canseiras, quiçá de vexames e de agastamentos, aplicando-se a actividades cuja debilidade económica está bem reconhecida e só tende a acentuar-se, sem discordar de que o novo imposto seja teoricamente justificável, pergunto-me muito a sério, Sr. Presidente, e pergunto a VV. Exas. Srs. Deputados, se não valerá mais procurar vazar a clássica contribuição predial em moldes de maior ajustabilidade às evoluções da economia e tentar apenas através dela a melhor adequação dos tributos aos rendimentos reais, que é escopo inatacável da reforma fiscal em curso.
A tese oficial para o recurso à presunção dos lucros como base do imposto sobre a indústria agrícola é a de que mesmo as médias e grandes explorações dispõem de imperfeitos elementos de contabilidade, embora esteja manifestada a esperança de que o sistema agora introduzido sirva de estímulo ao aperfeiçoamento da escrita das empresas.
Não pode haver dúvidas de que uma rigorosa contabilidade agrícola, visando o fim último das modernas escritas, que é o de estabelecer custos de produção, identificar lucros e descobrir prejuízos, é extremamente difícil de organizar e conduzir em qualquer exploração já medianamente complexa.
Mas uma contabilidade honesta de resultados gerais, que se me afigura poder ser a bastante para satisfazer ao fisco, já é outra coisa bem mais fácil, e tenho por isto real pena de que a facilidade reconhecida às empresas agrícolas, na primeira versão do código, de serem tributadas com base nos saldos de contas de resultados, devidamente organizadas, não tenha sido mantida na redacção actual.
Isto porque seria mais um incentivo ao aperfeiçoamento das escritas, em que até o legislador crê, e porque permitiria ir fazendo beneficiar as empresas progressivas de sólidas e benéficas vantagens, asseguradas, por outro lado, às empresas industriais e comerciais. Estas, com efeito, com base nas suas escritas, podem ser creditadas como verbas isentas de imposição:
a) Pelos prejuízos sofridos em qualquer ano, a serem abatidos aos lucros dos três anos seguintes, compensação cuja importância e interesse é certamente desnecessário acentuar;
b) Em determinadas condições, pelos lucros levados a reservas e reinvestidos na empresa em aplicações de interesse para o fomento da economia nacional, do que na agricultura os alargamentos de regadios, como as defesas contra erosões e tantas mais benfeitorias, poderiam ser exemplos;
c) Pelos gastos de utilidade social;
d) Por certos donativos que, uns e outros, os agricultores são tão frequentemente movidos a fazer.
Creio que ainda vale a pena pedir daqui ao Governo que abra também aos empresários da indústria agrícola as portas para estas compensações e incentivos.
Ao mesmo Governo quero ainda deixar uma lembrança, que é outro pedido, para o caso de efectivamente lançar o imposto de que me venho ocupando.
Há nas explorações agrícolas receitas ocasionais ou periódicas que podem tomar grande vulto no acervo dos rendimentos do ano em que ocorram, e são desses exemplos mais flagrantes os cortes de matas e as tiradas de cortiça. Embora surjam de uma vez, reportam-se de facto a períodos de criação de alguns ou de muitos anos, e não podem com justiça ser considerados rendimentos só do ano em que se cobram.
Aumentando as receitas, que passarão a ter de ser declaradas, porém, irão também ao cômputo do imposto complementar, mas aí, pelo efeito do escalonamento dos rendimentos e da progressividade das taxas, podem produzir, produzirão decerto muitíssimas vezes, se não for devidamente acautelado o seu caso, inflações gritantemente ofensivas da equidade devida aos contribuintes.
Rendimentos agrícolas deste tipo devem ser Acautelados, para não se repercutirem indevidamente no imposto complementar, parecendo que o mais correcto será, ou dividi-los pelos períodos de geração, como para o cálculo da renda fundiária, ou taxá-los de uma vez, mas em separado dos demais e pelo escalão correspondente ao rendimento médio respectivo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Há ainda dois pontos que quero aproveitar o ensejo para tratar.
O primeiro diz respeito às tarifas cadastrais da contribuição predial.
Está para ficar na nova legislação um preceito já vigente, mas nem por isso menos discutível, acho eu: o de que as tarifas, que são os rendimentos colectáveis das parcelas ou árvores-tipo, se hão-de manter inalteráveis durante cinco anos, pelo menos, a contar daquele a que se refira o primeiro lançamento da contribuição predial com base nos rendimentos da nova matriz. E porque a experiência mostra nunca mediarem menos de dois a