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18 DE NOVEMBRO DE 1964 3801

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pires, a quem peço para vir falar da tribuna.

O Sr. José Manuel Pires: - Sr. Presidente o Srs. Deputados: Nunca, como hoje, ao pedir a palavra nesta Casa da verdade senti todo o peso da responsabilidade ao tentar erguer a minha voz. E que eu gostaria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, de transmitir à Câmara uma visão de conjunto, ao menos aproximada, do que foi a empolgante romagem patriótica do venerando Chefe do Estado, almirante Américo Tomás, a terras de Moçambique.
Mas receio que a pequenez das minhas forças atraiçoe a afoiteza da minha boa intenção. Todos VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, acompanharam, certamente, através dos vários órgãos de informação, o brilho e grandiosidade desse extraordinário acontecimento nacional, que teve retumbante repercussão na imprensa estrangeira, até na de alguns povos que nos têm combatido desapiedadamente em África.
A mensagem de clara fraternidade lusíada que o Sr. Presidente Américo Tomás levou a Moçambique será mais um elo forte de coesão moral, social, política e sentimental que ligará, indissoluvelmente, ao «solar da raça» todas as comunidades portuguesas dispersas por esse mundo além. Nós, Portugueses, temos, como nenhum outro povo do Mundo, o estranho «dom das lágrimas», na frase lapidar do crítico Moniz Barreto, para sentir, como ninguém sente, em assomos de romantismo impenitente, todo o peso das glórias passadas e toda a força acalentadora da sua lição indeclinável para retemperar as dúvidas cruciantes da hora presente. Por isso, Srs. Deputados, podemos enfrentar a fúria procelosa dos tais «ventos da história» e fazê-los virar de direcção, quando a cobiça traiçoeira dos tais «grandes do Mundo» tenta afrontar o património sagrado da «pequena casa lusitana».
Ah!, meus senhores, que espectáculo empolgante -que jamais se poderá esquecer na vida- o daquele mar imenso de portugueses das mais variadas etnias, todos unidos num perfeito abraço de patriotismo sadio, vitoriando, espontaneamente, sem atitudes estudadas nem disfarces calculistas, o chefe prestigioso de uma pátria que detém, nesta hora sangrenta de cobardia moral, o verdadeiro ceptro da honra, da dignidade e do dever cumprido.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Belo espectáculo este de perfeita fusão multirracial, em que o amor entranhado a Portugal, semeador de cristandades florescentes pelas cinco partes do Mundo, por nós descobertas, era o sentimento forte, de - perfeita solidariedade lusíada, que estreitava todos aqueles corações agradecidos à volta do venerando Chefe do Estado. Ante aquela visão grandiosa de uma realidade insofismável, eu pergunto, Srs. Deputados, como há-de alguém. com dois dedos de seriedade e de pudor moral e mental levar a sério aqueles pretensos reformadores da O. N.º U., que tudo deformam, tudo conspurcam, tudo malsinam, ao sabor dos seus nefastos preconceitos de racismo negro e da prepotência asfixiante de uma plutocracia arrogante que ameaça transformar o Mundo numa pura coutada sob a sua esfera de influência?
Muito bem!

O Orador: - Quem, de boa fé, poderá hoje .negar que Portugal, neste ambiente mundial de deserção, saturado de ódios e de traições que não desarmam, continua a mostrar-se ao Mundo sem norte perfeito cavaleiro medieval, único defensor do humanismo cristão ocidental, brandindo, com toda a destreza do seu braço hercúleo,
A sua espada de fogo em defesa da honra e do dever, quando nações mais fortes do que nós, mergulhadas no jogo fácil das materializados aliciantes da vida corrente, viraram simplesmente as costas à, responsabilidade indeclinável ido imperativo da história?
É que nós, bem vistas as coisas, fomos sempre um povo de missão, incapazes de trair e, sobretudo, incapazes de enjeitar a quota-parte de responsabilidade que porventura nos possa caber no desenrolar dos acontecimentos trágicos que enlutam a pobre humanidade dos nossos dias. Somos, na verdade, um povo de ponto de honra, que aprendeu em Ourique em Aljubarrota, em Montes Claros, em Marracueue, em Magul, em Chaimite, em Macontene, a confiar o futuro da Pátria ao valor indefectível das suas espadas e à dignidade inconcussa do seu carácter de povo de missão.
Ninguém como nós, Srs. Deputados, soube, até hoje, descer à alma sonhadora destes povos das mais variadas raças e origens para lhes infundir a marca indelével da verdadeira fraternidade cristã, inteiramente alheia a preconceitos racistas, que transformam o homem num perfeito «lobo do homem», segundo a clássica definição do Leviatã, de Hobbes. Não nos debruçamos sobre o passado em atitude de mero contemplativismo estático à maneira dos românticos celticistas de Novecentos. Mas sabemos bem que é do fundo das raízes do passado que chega ao homem a seiva que o faz crescer para o futuro. Só o que foi herdado se renova. E sem tradição não passaríamos de simples peregrinos caídos, aqui e além, na poeira de qualquer caminho.
O nosso passado de glória justifica plenamente o nosso presente de vitória perante as forças do mal, tão duramente congregadas contra nós. Por isso, ousamos apontar ao mundo ensandecido os caminhos da honra, da verdade e do dever cumprido. Não se podem erguer no ar as torres de uma catedral. E nós falamos a linguagem da verdade e da razão, sem disfarces que amesquinhem, nem meias-
tintas de colorido dúbio. Ela é clara sem redundâncias, os nossos processos de combate pelo que é nosso trazem o cunho indelével da lealdade e o nosso programa de acção mergulha as raízes bem fundo no húmus revitalizante de oito séculos de história, heroicamente vivida. Fomos nós, Portugueses, senhores potentados da O. N. U., quem primeiro mandou ao interior da África, da América e da Ásia «os primeiros portadores da ciência e da civilização mundial». Os seus nomes? Sabe-os bem o mundo inteiro medianamente culto: Albuquerque, Gama e Cabral, Bar-tolomeu Dias e Diogo Cão, Magalhães, Pêro da Covilhã, S. Francisco Xavier, Mendes Pinto, Anchieta, Manuel da Nóbrega e tantos outros que «da lei da morte se foram libertando».
Não fomos à África, à América ou à Ásia sómente à procura do enriquecimento fácil, voltando-lhes as costas com o cofre a abarrotar de ouro sonante, quando os tais «ventos da história» começaram a soprar, rijamente, em sentido desfavorável. Velho de oito séculos, o nosso génio aventuroso encheu de glória o Mundo durante quatro séculos. «Durante esse glorioso período» - comenta a Ramalhal Figura - «combatentes, vencemos, navegámos, conquistámos, civilizámos, aprendemos, ensinámos».
Ora, foram estes, Srs. Deputados, os nobres pergaminhos de dignidade e de firmeza de princípios que o venerando Chefe do Estado deste Portugal civilizador de povos pôde ostentar, galhardamente, entre as portuguesíssimas populações de Moçambique. O raro aprumo, a dignidade impressionante, o acrisolado fervor patriótico, o carácter franco, lhano, afável, com que S. Ex.ª percorreu, um a