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16 DE DEZEMBRO DE 1964 4199

gerações laboriosas, daqueles homens de que a Nação necessita para as tarefas difíceis e para o exemplo do seu povo. Ora, não deverá permitir-se que estas zonas rurais se transformem aos poucos num deserto. Impõe-se impedir que tais populações se deteriorem. Urge, em suma, valorizá-las não só para a manutenção de um salutar equilíbrio do país como ainda para ajustado sustentáculo das próprias aglomerações urbanas.

Quando o Sr. D. Eurico Dias Nogueira quis, em romagem significativa, recordar os seus ancestrais, poderia talvez fazer suas aquelas palavras de Frederico Ozanan:

Dou graças a Deus por ter nascido numa dessas classes médias que se situam entre a pobreza e a riqueza, o que me habituou às privações sem ignorar as comodidades lícitas, situação onde o homem não se escraviza com a saciedade de todos os desejos, nem está submetido à pressão das contínuas solicitações da necessidade.

Mas já quem no passado domingo percorresse os principais núcleos da serra poderia perguntar com justificada inquietação: que fizeram das nossas classes médias agrárias? Porquê as deixaram perder como elites locais, no seu papel moderador, docente e assistencial?

E de novo o espectro da triste sorte da nossa agricultura poderia ajudar a encontrar uma resposta. E de novo junto a minha voz aos clamores que nesta Assembleia se têm erguido. Advogando uma política de revigoramento das classes médias agrárias, chamo uma vez mais as atenções do Governo para a urgência em atender à situação marginal da agricultura do Portugal das montanhas do interior, recordo a oportunidade da valorização dos produtos agrícolas, do apoio a soluções cooperativas e a esquemas de comercialização, da generalização de assistência técnica e do crédito agrário, da consagração dos instrumentos jurídicos ou dos meios institucionais que correspondam a estas exigências de revitalização.

O concelho de Pampilhosa da Serra pertence à última lista dos concelhos deserdados do País.

A sua população, que em 1940 se aproximava dos 16 000 habitantes, não ultrapassa hoje os 13 000. O êxodo rural fez com que as colónias de muitas das povoações da serra em Lisboa sejam mais numerosas do que o que resta de velhos e de crianças nas terras de origem.

Assim, à destruição das elites seguiu-se a debandada das populações válidas.

Mas será pecado que esta gente abandone as suas terras? Ter-lhe-á o Governo prodigalizado um mínimo de condições propícias à vida?

Dos 13 000 habitantes do concelho de Pampilhosa da Serra, 2000 vivem isolados, sem a comodidade de um caminho rural praticável por qualquer sorte de veículos, 4000 não dispõem de abastecimento público de água 11 000 não têm electricidade, mais de 12 000 não sabem o que é abastecimento domiciliário de água e todos eles são apenas servidos por um médico, a cuja dedicação me apraz, de resto, prestar homenagem. E até o hospital sub-regional, construído há anos, continua, para tristeza das populações e vergonha da administração pública, fechado.

Quando, em 1950, se fez o inquérito às condições de habitação do concelho, apurou-se existirem aí 3455 famílias com habitação ocupando um fogo sem electricidade e água e só 28 com casa de banho, 40 com electricidade e 54 com água.

Penso ter chegado a hora de o Governo se devotar inteiramente aos concelhos mais atrasados do País, promovendo a realização de um esforço que quebre o círculo vicioso de pobreza e atraso dessas regiões e proporcione aos respectivos habitantes um mínimo de condições de vida compatíveis com a dignidade da pessoa humana. Penso ter chegado a hora de acudir ao concelho de Pampilhosa da Serra.

Esta ajuda não pode restringir-se aos processos normais de trabalho e de financiamento. Em 1960, por exemplo, as receitas ordinárias propriamente ditas do Município de Pampilhosa totalizaram 392 contos. Mas deste montante, 14 contos destinaram-se à amortização de empréstimos, 199 a despesas com pessoal e 56 a despesas com tratamento de doentes pobres. Isto é, depois de deduzidas estas três rubricas de despesas obrigatórias, restavam à Câmara 123 contos.

Com estes 123 contos foram ainda pagas as despesas de instalação, mobiliário, água e luz da Secção de Finanças, da tesouraria da Fazenda Pública, da Conservatória do Registo Civil, os encargos com serviços de justiça, as amortizações da construção das escolas primárias o mobiliário e material didáctico, expediente, higiene, saúde e conforto das mesmas escolas, os recenseamentos eleitorais, militar e escolar e as dotações obrigatórias destinadas às freguesias, nos termos do artigo 754.º do Código Administrativo.

Pergunto a mim mesmo se finalmente terá restado alguma coisa para eliminar uma das muitas fontes de chafurdo ainda existentes no concelho ou para restaurar qualquer pontão que ameace ruína.

Mas a problemática das carências do concelho de Pampilhosa da Serra não se restringe às obras públicas.

A política do bem-estar rural, como salientei há dias, a propósito da discussão da Lei de Meios para 1965, estende-se ainda à valorização da habitação rural, à extensão do ensino, à cobertura da região nos sectores da saúde, assistência e previdência, à localização dos serviços públicos no rural, à valorização das potencialidades produtivas (agricultura, florestas, pecuária e indústrias), ao abastecimento público, à existência de esquemas de comercialização e sistemática eliminação dos que especulam com a pobreza das populações ou abusam da sua boa fé.

Vai para um ano defendi nesta tribuna a realização de uma grande cruzada para promoção económica e humana de regiões como a do concelho de Pampilhosa da Serra. Como a triste condição do Portugal das montanhas do interior se mantém, renovo tal apelo.

Seria um mundo novo que- se abriria à nossa alegria e à nossa esperança.

Nessa sociedade nova haveria naturalmente lugar ainda à dor, ao luto, às lágrimas.

Mas, como recordava o Sr. Presidente do Conselho, no seu memorável discurso do 1.º de Maio de 1935, "na paz que cobre a terra trabalhada e as almas conformadas e simples, na alegria do esforço criador, na garantia do trabalho e na suficiente satisfação das necessidades, na segurança do lar e no doce convívio familiar", o homem das nossas serras encontraria providencialmente o bálsamo para o que ainda restasse da dureza da vida.

Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sales Loureiro:-Sr. Presidente: Passa no próximo dia 18 o terceiro aniversário de um dos mais hediondos crimes da história: sobre Goa arremeteu então uma das mais clamorosas violações das elementares normas sobre que se alicerçam os direitos d aã gentes e o trato nas relações internacionais!