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4434 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 182

Aqui, porém, estamos a legislar - e a lei, mais que uma tese abstracta, é um ordenamento da vida
For isso, sem perdermos de vista as teorias que expressam as fortes correntes do pensamento, temos que auscultar as realidades da vida, para deduzirmos a medida em que elas confirmam as teorias, ou as repelem, ou as modificam
Será da interpretação e reacção mútuas destas duas forças - a do pensamento e a das realidades, a da teoria e a da vida - que poderemos e deveremos extrair a resultante verdadeiramente útil para o problema.
Não o entendeu assim a lei anterior, que, entrincheirando-se no castelo encantado da indivisibilidade, dela deduziu, sem atendei às realidades humanas, pressupostos e ilações ilegítimos.
E é precisamente contra estes pressupostos e ilações ilegítimos - e só contra eles - que tenazmente se insurge, há mais de 30 anos, o bom senso nacional.
Com a agravante de que tais ilações e pressupostos não constituem consequência necessária, nem condição ame qua non, da vivência do princípio da indivisibilidade, e são até contraproducentes, na medida em que tornam tal princípio odioso e fazem perigar os objectivos práticos que a indivisibilidade pretende atingir.
Vejamos se assim é.
Vivemos há mais de 30 anos no regime legal da indivisibilidade, e, por isso, a nossa própria e longa experiência nacional dispensa-nos a invocação de paralelismos estrangeiros.
Não se pode, porém, dizer que sejam animadoras as lições desta experiência, nem que tenham sido brilhantes os resultados alcançados, a própria apresentação desta proposta disso constitui confissão explícita.
E até, segundo as informações do nosso ilustre colega Dr. Folhadela de Oliveira, mais de 70 por cento das farmácias espalhadas por todos os cantos de Portugal estão em transgressão à letra e ao espírito do Decreto-Lei n º 28 422, cuja redacção é, aliás, modelar.
Sendo assim, há que apurar o que está mal, porque quando a esmagadora maioria da Nação infringe teimosamente uma lei é caso para averiguar o que nela estará errado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Se com este propósito auscultarmos bem a reacção pública, veremos que ela se dirige, não contra o princípio da- indivisibilidade em si mesmo, mas contra a forma por que a aplicação mal entendida de tal princípio ofendeu, inútil e contraproducentemente, o direito de propriedade e a estabilidade da família, que axiològicamente são os valores primários e supremos da nossa vivência nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Inútil e contraproducentemente - dissemos já e repetimos-, porque a proposta da lei, defendida através do pengosíssimo slogan «A farmácia para os farmacêuticos», não concede ao fim e ao cabo ao farmacêutico senão a detenção precária e temporária do estabelecimento farmacêutico, por não lhe assegurar devidamente o pagamento do seu justo valor no caso de futura alienação forçada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Admitindo mesmo, por hipótese, que um jovem farmacêutico tenha disponibilidades económicas para investir numa farmácia, é muito duvidoso, em face do actual articulado da proposta de lei, que ele a queira adquirir, ou que, adquirindo-a, ele se sinta impelido a devotar-lhe toda a sua actividade e entusiasmo profissional.

O Sr. Brilhante de Paiva: - V Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Brilhante de Paiva: - Como todos nós, tenho seguido a apreciação da proposta de lei relativa a propriedade da farmácia quase diria com emoção, mas direi certamente com o interesse ditado pelo alcance nacional que ela tem
V. Exa. tem estado efectivamente a fazer considerações todas elas perfeitamente correspondentes e que são perfeito espelho da ponderação que põe em todos os seus actos e que eu tenho muito interesse e muito prazer em o manifestar, apresentando desde já a homenagem e o apreço devidos a V. Exa.

O Orador: - Muito obrigado.

O Sr. Brilhante de Paiva: - A propósito da aquisição da propriedade da farmácia, que V. Exa. acaba de mencionar, digamos por um jovem farmacêutico, se ele estiver inteiramente desprovido de meios financeiros, parece-me de perguntar de que maneira conseguirá ele montar a sua farmácia sem dispor de dinheiro e sem subordinar de forma nenhuma a honorabilidade com que há-de exercer o seu múnus.

O Orador: - Tem V. Exa. razão. Aliás, vou abordar esse ponto mais adiante.
Eu estou a pôr o aspecto tão exacto quanto possível, sem tomar qualquer posição que não seja, digamos, diagnosticar a extensão do mal. É esse problema que nos preocupa a todos nós, porque é fácil dizer que a farmácia é do farmacêutico e que o farmacêutico compra a farmácia.
Um dos propósitos desta proposta de lei é livrar o farmacêutico, no exercício do seu múnus, da pressão directa ou indirecta do grande capital.
Parece-me - mas isso não cabe na interpretação desta proposta de lei e seria talvez até de sugerir uma nova base que seria conveniente criar um fundo nacional de saúde ou como lhe queiram chamar talvez fundo nacional de farmácia -que se destinasse a amparar financeiramente o farmacêutico que principia, livrá-lo da pressão do capital estranho (é esse o propósito fundamental da proposta) e ao mesmo tempo assegurar amanhã aos herdeiros desse farmacêutico o valor que ele com o seu trabalho de muitos anos porventura tenha criado e investido na farmácia.
Esses problemas vou abordá-los mais adiante, porque estão na ordem deste trabalho
V. Exa. pôs um problema que existe Ë muito fácil dizer que a farmácia é piara o farmacêutico. Mas quem é que o faz dono da farmácia De maneira que talvez o problema se resolvesse com a introdução de uma nova base, a não ser que numa futura regulamentação - esta lei não é mais do que uma pedra num edifício que é necessário construir em defesa da saúde pública - lá venha a organização desse fundo