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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

SUPLEMENTO AO N.º 145

ANO DE 1968 8 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IX LEGISLATURA

Projecto de lei sobre a alteração do artigo 667.º do Código de Processo Penal

Fundamentação na generalidade

1. O assento do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1950 1, estabelecendo que "em recurso penal, embora só interposto pelo réu, pode o tribunal agravar a pena", acolheu no processo penal comum português o instituto da reformatio m pejus. Em abono do regime legal assim imperativamente definido aduz o Supremo Tribunal de Justiça que "nenhum preceito ... do Código de Processo Penal e legislação complementar refere expressamente qual deve ser a extensão da apreciação jurisdicional, pelo tribunal superior, da decisão recorrida" e que, por isso, "essa extensão há-de determinar-se em função dos princípios gerais que dominam e orientam o processo penal".

Concretizando tais princípios, o Supremo Tribunal de Justiça refere, em primeiro lugar, "o carácter público do direito que através do processo penal se realiza - o direito de punir o Estado", acentuando que a natureza pública do jus puniendi impõe a possibilidade de os tribunais superiores aplicarem livremente as sanções que julguem adequadas nos casos sujeitos à sua apreciação, "pois só assim aquele direito do Estado alcançará plena realização". Para além disso, entende o Supremo Tribunal de Justiça que a faculdade de os réus recorrentes limitarem o objecto dos recursos - uma das formas pelas quais viria a ficar praticamente limitado o poder de apreciação dos tribunais superiores - contraria ... o fim que se pretende atingir através do processo penal, ou seja, a aplicação da sanção justa ao que delinquiu". Por último, invoca-se "o princípio da unidade ou iucindibilidade das decisões penais", que se reflecte no artigo 663.° do Código de Processo Penal.

É esta, essencialmente, a fundamentação do mencionado assento. As outras considerações do aresto ocupam-se da interpretação de vários preceitos de direito positivo, com o fim de demonstrar que esses preceitos não depõem contra informatio in pejua no processo penal.

O assento foi tirado por onze votos contra quatro, figurando entre os quatro vencidos o conselheiro Cruz Alvura - depois presidente do Supremo Tribunal de Justiça -, que expôs largamente as razões do seu voto discordante.

2. O simples facto de a reformatio in pejus ter tradicionalmente um carácter odioso, remontando a sua proibição na Europa ao início do último quartel do século XVIII, pelo menos, bastaria já para justificar que o legislador português vá agora - volvidos quase dezoito anos sobre o referido assento - ponderar a manutenção ou substituição do regime assim consagrado entre nós por via não legislativa.

Mas não é só uma tradição jurídica vigorosa que se opõe à reformatio in pejua no processo penal. Podem assinalar-se nas legislações europeias continentais tomadas de posição recentes contra tal instituto. Elas não se explicam só pelo respeito perante a tradição, antes constituem valorações conscientes de legisladores dos nossos dias, que reconhecem os mesmos pressupostos culturais a que adere o legislador português.

Assim é que em 12 de Setembro de 1950, poucos meses depois de acolhida entre nós pelo assento mencionado, a reformatio in pejus era abolida na Alemanha. Fora, aliás,