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21 DE FEVEREIRO DE 1969 3233

Podemos defini-lo de vários modos.
Ontològicamente, ele é «pessoa humana», sui juris; é matéria e espírito; é razão e sensoriedade. Aqui não pode haver confrontações donde se infiram diversidades adjectivais. Pelo contrário, teremos de reconhecer nesta definição uma rígida e inflexível identidade que reduz todos os homens à sua unidade ontológica.
Mas o homem é também história e sociedade; susceptível de evolução, sujeito de direitos e obrigações entre os seus semelhantes.
É nestas coordenadas que se terão de situar os trinta artigos da Declaração Universal dos Direitos do Homem das Nações Unidas, que, no artigo 25.º, quiseram, de forma expressa, acautelar a defesa da velhice.
Na sua evolução, porém, o homem-história ou o homem-sociedade não pode desprender-se da sua definição ontológica nem poderá impunemente distorcê-la, prejudicá-la em proveito de uma definição meramente económica ou social.
É inexorável, na sua lógica e na sua dinâmica, esta exigência de unidade e de hierarquia de valores. Ela condena e pune implacàvelmente todos os desvirtuamentos de uma sã definição histórico-social do homem, os economistas que pretendam aferi-lo tão-sòmente pela relação «produção-consumo».
Todos esses desvirtuamentos se revelam ainda mais aberrantes se os analisarmos à luz da definição teológica do homem.
Teològicamente, meus senhores, o homem é objecto de uma definição progressiva: ele é a imagem viva da Divindade; filho de Deus, temporalidade agónica, eternidade beatífica.
Entroncado nesta linhagem divina e sublimado a esta dignidade indefinível, cada fragmento da existência do homem permanece impregnado de sentido divino.
É por isso, Srs. Deputados, que se pronunciam criminosos todos os atentados obstrusivos da vida nascitura. É por isso que a debilidade de uma criança é defendida pela maior força que existe: o amor dos seus progenitores. É por isso também, Srs. Deputados, que nós nos aproximamos agora da veneranda senectude, como que a passo de santuário, para lhe oferecermos o nosso apoio, a nossa palavra de conforto.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Seja na vida que apenas brotou ou se expandiu já em pleno vigor, seja na vida que envelheceu no trabalho e no sofrimento e se irá, a pouco e pouco, extinguindo, a plenitude ontológica do homem é sempre a mesma e a sua indivisibilidade teológica terá de ser respeitada e honrada em todo o seu itinerário vivencial.
É desta concepção do homem, simultaneamente ontológica e teológica, é dela que há-de vir toda a solução humana e adequada ao problema que se está a apreciar.
Na lei mosaica, a sorte dos velhos estava pelo decálogo relegada à piedade filial, que viria a ser depois facilmente ludibriada pelas tradições judaicas.
A era cristã surgiu com uma solução mais ampla, numa fórmula universalista, configurada, por assim dizer, numa geometria piramidal, com uma única paternidade divina no vértice e uma amplíssima filiação adoptiva na base.
Nesta concepção, todo o esforço sociológico procura soluções que intrinsecamente tendem a verticalizar-se, numa constante dinâmica de convergência para o vértice comum.
Característica essencial da fórmula da caridade é o seu voluntariado, contraposto a qualquer esquema imperativo. A partir deste facto todas as soluções propostas pela caridade genuína acusarão necessariamente uma clara democratização de iniciativas e auxílios em prol da gente necessitada ou incapacitada pelos anos.
A esta sociologia, inspirada na caridade, e que poderíamos classificar de «sociologia vertical», veio modernamente justapor-se uma outra, que poderia chamar-se «sociologia horizontal», mais ampla no seu campo de acção e esfera de influência, mais esquadriada nos seus esquemas, mais automatizada no seu funcionamento, mas reduzida a um ideário filosófico, onde em vão se procurariam verticidades extraterrenas, mas, pelo contrário, se pretende rasoirar o homem até ao mais perfeito nivelamento democrático.
Na sociologia vertical imperava a caridade. E as soluções de justiça eram procuradas preponderantemente na caridade. Na sociologia horizontal predomina o sentido de uma fria justiça; e as soluções de justiça buscam-se apenas na justiça distributiva cientificamente esquematizada.
Ali a iniciativa era caracterizadamente privada. Aqui, porém, é nitidamente da autoridade pública, numa forma directa ou indirecta.
Entre nós, Srs. Deputados, procurou-se, num eclectismo instintivo, enriquecer e completar esquemas sociológicos mais actualizados com o espírito e a acção da Igreja e o calor da multissecular tradição caritativa do nosso povo.
Assim, ao lado de asilos e lares e obras congéneres, nascidos da caridade o alguns por ela mantidos, aparecem várias formas de previdência social do próprio Estado e de agrupamentos de carácter corporativista.
Em 1967, o Estado despendeu, em 46 178 pensões de aposentação por limite de idade ou invalidez, a verba de 741 062 contos. Por seu lado, a previdência social gastou, no mesmo ano, a importante verba de 789 207 contos, atribuída a 125 452 pensões de reforma a favor de indivíduos atingidos por limite de idade ou declarados inválidos. Para uma apreciação mais aproximada da realidade, deve ter-se presente que grande número de indivíduos declarados inválidos praticamente se encontra já no grupo etário dos velhos.
Quanto a estabelecimentos para- internamento de pessoas idosas, contam-se 258, uns do Estado, outros particulares.
Mas entre nós nunca se chegou a praticar uma específica política da velhice. E para o muito que se deseja continuará a parecer pouco o muito que se terá podido fazer.
Quer-se mais. Pretende-se um verdadeiro estatuto da velhice. É o que imediatamente se infere da exaustiva intervenção do ilustre Deputado avisante, que. termina o seu valiosíssimo trabalho com um generoso fascículo de sugestões relativas à cobertura económica da gente idosa, seu alojamento, cobertura sanitária, ocupação e ambiente a criar-lhe.
Ressalvada a indiscutível nobreza das intenções e da causa que defendem, merecedora não só de atenção mas também de carinho, seja-me permitido exprimir sobre o assunto alguns receios, que espero venham a ser construtivos:

Atenta a nossa conhecida escassez de meios, será oportuno arquitectarmos um sistema de previdência muito requintado e completo para a terceira idade, quando, mercê dessas mesmas limitações, continuam ainda a aguardar solução plena ou adequada alguns problemas importantes da infância e da juventude e dos grupos etários activos?
Por outro lado, o requinte de sistemas muito perfeitos de previdência para velhos será um remédio