29 DE ABRIL DE 1971 1971
O Orador: - A miséria da taxa de acréscimo de rega nas últimas três décadas, que realmente não ultrapassa 800 ha por ano, e a circunstância de, praticamente, se não ter iniciado o pagamento das amortizações desde início previstas dos grandes obras executadas, apesar do tempo já decorrido - e presumo que só poderá encarar-se quando a desvalorização se tenha encarregado de reduzir o custo a reembolsar às proporções que nunca devia ter ultrapassado-, constituem comprovação suficiente de que o caminho trilhado não está certo, a política seguida se não ajusta às realidades e necessidades do País, a tarefa da irrigação ainda não encontrou a devida solução.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Não é aqui lugar para entrar em pormenores, nem este o momento para enfrentar o problema de fazer reverter a política hidráulica, dita de rega, a uma política de defesa e conservação do solo, como acontece em outros países. A seu tempo me ocuparei do problema, em termos de lhe dar solução, já que se entende que uma parte da tarefa poderá continuar, dentro do actual esquema português, a competir ao Ministério das Obras Públicas - as grandes obras hidráulicas, a partir dos grandes cursos de água, especialmente quando destinadas a fins múltiplos, desde que a iniciativa dos estudos esteja no sector da agricultura e não se completem projectos antes de este departamento ter aprovado um plano de ordenamento cultural; não tenho qualquer dúvida de que, em geral, apenas aos serviços de agricultura, como únicos responsáveis pela defesa, conservação e utilização racional do solo, pode e deve competir a tarefa do regadio.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E que a realização das grandes obras de rega, tendo sido erigida em bandeira de resolução do problema agrário, tornou-se exclusiva, primeiro, de facto, para depois de assegurar essa exclusividade por via legislativa e regulamentar do Ministério das Obras Públicas, em termos de, quando aplicada com rigorismo, impedir a execução de qualquer obra singela de defesa do solo, uma simples vala, embora ao arrepio da orientação governativa bem patente na recente legislação do Ministério do Interior sobre licenciamento da construção urbana. E em países como a França e a Itália é inteiramente livre de qualquer formalismo a execução de barragens até determinada amplitude de altura ou volume
Pois é este monopolismo que é necessário fazer cessar, porque o País carece de executar em tempo, economicamente e por forma agricolamente válida uma política de defesa e conservação do solo, que é como quem diz uma política de rega, se quiser vencer a actual crise de desadaptação da nossa agricultura.
Mas não só o problema da água para regar, também o da água para beber carece de profunda revisão, pois, por toda a parte se assiste a arremedos de soluções, dispendiosas e demoradas, mas rápidas no esgotar da duração, que, contrariamente à legislação ou interpretando-a com manifesta falta de sentido das proporções, retardam a resolução do problema, implicam o dispêndio, sem resultado, de pesadas verbas orçamentais e frustram as expectativas das populações.
Quem não recordará as esperanças em abastecimentos inexauríveis no momento da inauguração solene, soleníssima, que rapidamente deixam de satisfazer as necessidades, forçando a novos investimentos, para em seguida se repetir o fracasso e reiniciar o processo, que tende, assim, a tornar-se contínuo?
Creio poder acentuar que não tem o Estado sido avaro em meios materiais para assegurar a água necessária ao consumo doméstico, mas, para lá das novas soluções exigidas pêlos rápidos aumentos demográficos imprevisíveis ou impostas pelo crescimento ao longo de muitos anos, ninguém poderá ignorar que a aplicação desses meios não tem sido, com especial naturalidade na última década, aquela que a técnica recomendava, a prudência aconselhava, a economia exigia e a geologia impunha. Muito pelo contrário, desperdiçara-se -e desperdiçam-se ainda- verbas vultosas com total ineficácia, esperada frustração e evidente primarismo do tempo do pêndulo ou da varinha mágica.
E isto tem de ser corrigido com decisão e coragem, mas também pela. autonomia regional de serviços que responsabilize quanto o centralismo anónimo e irresponsável consente e até premeia.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Então muita coisa duvidosa na sua origem deixará de passar-se ...
Sr. Presidente: Organizar o território «m termos de tirar o mais amplo partido da integralidade das suas potencialidades, de harmonizar desenvolvimentos, de compatibilizar produções, de integrar os recursos, afigura-se-me constituir um imperativo da maximação dos resultados económico-sociais.
Organizar o território supõe naturalmente planos de desenvolvimento à escala regional, integrados no programa nacional, exige a definição de pólos de desenvolvimento industrial e urbano, implica, sob o domínio agrícola, uma zonagem sócio-económica de culturas.
Restringindo a minha análise ao problema agrário, deverei acentuar que a evolução da técnica moderna encaminha a agricultura para soluções, sejam intensivas, sejam extensivas, de tipo industrial, dependendo a preferência por umas ou por outras da mais favorável combinação dos factores sob o aspecto da rentabilidade. Será a escolha da técnica de exploração, perante a natureza a fazer produzir, tendo em couta os mercados, as exigências dos consumidores e o nível de preços, que decidirá sobre a solução a adoptar.
Em qualquer caso a técnica apronómica evolui cada vez mais no sentido de, por recurso a formas cultivadas mais produtivas, mais resistentes e entrando em produção em menor período de tempo, proporcionar melhores resultados. Essa evolução exige, porém, uma técnica mais delicada, mais especializada e obriga a um maior domínio dos factores que condicionam a produção. Entre estes tem papel relevante a água, defendendo dos excessos e compensando a escassez. Aqueles depauperando o solo e afectando as culturas, imas também limitando o seu escalonamento no tempo, impõem uma terapêutica de defesa, que no nosso condicionalismo, terá ainda o mérito de a entesourar para benefício do longo período de secura. Esta constitui a mais forte limitação da produção.
E por isso que a agricultura moderna, menos contingente do que a tradicional, se funda no domínio da água, que até pode corrigir desequilíbrios térmicos ou acidentes meteorológicos. A política de nega está assim na base de uma nova política agrícola, mas também de uma programação económica, de uma zonagem de culturas, de uma reestruturação agrária, de uma reconversão de culturas.
Longe estamos da fruticultura extensiva ou quase florestal, de que a amendoeira, o castanheiro, a cerejeira, etc., constituem ainda hoje característica do nosso país. Estas culturas tenderão, como a própria oliveira, mesmo paca azeite, a ser exploradas em pomares' intensivos de