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2652 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 132

usadas, pois que a liberdade de imprensa a conceder exige uma responsabilidade que se não compadece com o relato fácil, o sensacionalismo, as antipatias pelas ideias ou pelas pessoas, todos tanto mais livres quanto mais respeitarmos a liberdade dos outros.
Se assim vier a acontecer, teremos dado um grande passo e mostraremos haver merecido esta lei sobre a, desejada liberdade de imprensa.
Ao exprimir-me por este modo, espero não me ter constituído em surpresa para ninguém, até porque, precisamente desta matéria, numa antecipação distante, o jornal O Século de 2 de Fevereiro do corrente ano me honrou com a publicidade da minha opinião na aberta tribuna dos Deputados, onde, embora numa referência directa à actividade dos jornalistas nesta Assembleia, me identifiquei em termos definitivos quanto ao essencial. Aí, ao referir-me ao seu trabalho, salientei que, prezada embora a sua independência e a sua formação política dificilmente lhes poderia reconhecer um consequente direito de apreciação no relato das matérias expostas ou quanto às atitudes tomadas, no que não poderiam deixar de ser francamente objectivos, por aquelas não consentirem insinuações críticas em que o julgamento público sobre o animus não resultasse acessível, logo, claro e preciso.
Não vou transcrever aqui o que o referido jornal publicou na citada data, salvo uma parte a que atribuo grande interesse e que textualmente reproduzirei:

Assim se torna evidente que à desejada maior liberdade terá de corresponder uma maior responsabilidade, e aqui se põe, desde logo, o problema da preparação do jornalista, que deixa de o poder ser por intuição; precisa de saber mais do que escrever, pois se há-de concluir como necessária uma reestruturação da nossa legislação penal, em que a averiguação do animus injuriandi terá de deixar de ser de natureza subjectiva para o ser de natureza objectiva, logo, cada um a constituir-se na obrigação de se ater ao rigor terminológico das expressões usadas, sem que na opinião do público ledor fiquem dúvidas quanto à formulação de conceitos tantas vezes prejudiciais. E a ter de procurar apreender o exacto alcance das palavras, de forma a bem poder traduzir a essência do que ouve c do que vê, «mas apenas do que realmente ouve e vê».
Sr. Presidente: Creio ter dito o bastante, entre o muitíssimo que poderia dizer, para justificar o sentido das minhas opções na matéria e justificar também o meu voto que, na generalidade, decisivamente dou à proposta de lei, opinando que a discussão se faça sobre o texto da comissão eventual, que tão exaustivamente o trabalhou, e tanto se dignificou e a esta Assembleia, na manifestação inequívoca e já demonstrada das suas possibilidades de produzir trabalho sério e desapaixonado. Bem hajam. Antes de terminar, devo dizer que tudo o que dito ficou em nada afecta o muito respeito e consideração que me merecem os profissionais da imprensa, a quem presto o tributo da minha muita admiração.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Joaquim Macedo: - Uma excursão pela história dos homens e das instituições, o que constitua sempre exercício intelectual útil e conveniente para a correcta compreensão dos fenómeno sociais mostra perfeitamente um facto que, nem por sobejamente conhecido, nos espanta menos quando com ele nos enfrentamos - a força das ideias. São elas, inegavelmente, a grande alavanca impulsionadora do progresso, seja ele científico, tecnológico, artístico, económico ou político.
Atendo-nos a este último aspecto, pelo natural relevo que assume nesta Casa, podemos sem receio afirmar que das ideias que estiveram na base do que constitui hoje o património indiscutível das sociedades civilizadas - igualdade dos cidadãos perante a lei, direito de voto, liberdades fundamentais, emancipação da mulher, etc. - bem poucas alcançaram vencimento pacífico; surgindo ao arrepio da ortodoxia então dominante, viram contra si o poder do Estado, que não as logrou, todavia, vencer, apesar da saia aparente fragilidade inicial. E que as ideias não se combatem senão com ideias.
As sociedades progressivas e dinâmicas são-no, pois, sobretudo, por uma grande força criadora no domínio intelectual. A concorrência das ideias, do mesmo modo que a concorrência na, economia, é factor da vitalidade e do progresso. O monopólio ideológico, de direita ou de esquerda, não produz, neste tempo caracterizado por tão rápida evolução, sou ao sociedades fechadas e monolíticas, autênticos dinossauros culturais, que, como os seus homólogos biológicos, não conseguem, por falta de condições de adaptação, sobreviver nos novos condicionalismos sociais.
E não são apenas as sociedades, globalmente encaradas, que têm de ser objecto dessa acção de adaptação, mas também os indivíduos que as constituem. Já passou o tempo em que o quadro cultural se mantinha praticamente constante durante o período de uma geração. Os ensinamentos recebidos na família e na escola perduravam durante toda uma vida. Hoje, a evolução é estonteante, e deste modo o quadro de valores que conhecemos na infância é o objecto de mudanças sucessivas e nalguns pontos profundas e a ritmo, pelo menos até agora, cada vez mais veloz. Daí que resulte um sentimento de inadaptação psicológica das pessoas, mais generalizado sobretudo nos grupos menos permeáveis à informação, constituindo um fenómeno que alguns sociólogos já apelidam de «choque do futuro». A expressão de ideias diversas e até em muitos casos opostas, relativizam certos conceitos tidos algumas vezes, indevidamente, por absolutos e vão assim preparando os indivíduos para as mudanças culturais.
A imprensa constitui ainda o meio mais generalizado e com maior impacte para II expressão e divulgação de ideias e de informação e daí a sua extraordinária importância. É pois factor de relevo no progresso das sociedades e temos de vê a não apenas como direito de expressão individual, mas acentuar sobretudo a sua importância de dinamizador social. Mas isso exige antes de tudo liberdade, pelo que incumbe ao Estado a missão de assegurar as condições necessárias para que a imprensa possa, sem restrições, a não ser as que resultam da natural salvaguarda dos valores morais da comunidade, desempenhar a importante tarefa de formação, de informação, de crítica, que lhe é cometida.