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2048 - I SÉRIE - NÚMERO 99

Cortámos decididamente com a amálgama de leis dispersas que até agora regiam o Tribunal e que lhe davam uma conotação arcaizante, centralizadora e burocrática, amarrando-o métodos antiquados e ultrapassados. A proposta representa mais um passo, a que outros se seguirão, no sentido de, com gradualismo e segurança, introduzir novos procedimentos que contribuam para um cada vez mais reforçado controlo dos dinheiros públicos.
Podemos dizer que a mais importante inovação da presente proposta é o novo estatuto que ela confere ao Tribunal, a reforçada independência que ela lhe traz.
O Tribunal de Contas viveu, durante longos anos, numa posição de subalternidade face ao Governo, subalternidade que tinha o seu ponto culminante na possibilidade que a lei conferia ao Conselho de Ministros de se sobrepor às suas decisões em matéria de visto. Hoje, por força da disposição da lei, quando não do próprio texto constitucional, essa possibilidade não existe. Mas, mesmo assim, é o ministro das Finanças quem nomeia os seus juizes, à excepção do presidente, e é o ministro das Finanças quem superintende na Direcção-Geral do Tribunal de Contas.
Com certeza, tal relacionamento estreito entre o Ministério das Finanças e o Tribunal de Contas nunca pôs em causa, ao menos nos tempos mais recentes, a probidade dos juizes, mas julgamos que é tempo de lhe pôr fim, e a presente proposta fá-lo inequivocamente. O estatuto básico é, assim, profundamente alterado no sentido de lhe criar condições de maior independência, dignidade e prestígio.
É bem certo, Srs. Deputados, que independência, dignidade e prestígio não resultam exclusivamente das leis nem podem ser objecto de oferta de quem quer que seja. Independência, dignidade e prestígio conquistam-se e reconhecem-se e terá de ser o Tribunal, na sua acção quotidiana, a grangeá-los. É a isso que vimos precisamente assistindo da parte do nesse Tribunal de Contas. É com honra que o reconhecemos aqui, perante V. Ex.ª Digo-o assim porque o Governo, de algum modo, tem contribuído precisamente para essa atitude e para esse estado de coisas.
Mas a lei pode criar ainda condições que favoreçam o bom desempenho e a boa imagem das instituições e o Governo deseja-o.
A presente proposta avança nesse sentido. O Tribunal liberta-se de tutelas exteriores passando a reger-se por uma concepção muito ampla de autogoverno.
Os juizes passarão a ser escolhidos por um concurso público presidido pelo próprio presidente do Tribunal, sendo a respectiva área de recrutamento particularmente exigente.
A Direcção-Geral do Tribunal de Contas é integrada no Tribunal, atribuindo-se ao seu presidente competências ministeriais em matéria de gestão do pessoal.
Sublinho, Srs. Deputados, que, neste momento, a Direcção-Geral do Tribunal de Contas é apenas e simplesmente mais uma Direcção-Geral do Ministério das Finanças. Passará, com esta reforma, a ser uma Direcção-Geral do Tribunal de Contas.
O número de juizes passa de dez para dezanove, incluindo o presidente e os juizes das secções regionais.
O próprio funcionamento interno do Tribunal é alterado com a criação de duas secções especializadas e com a desconcentração de poderes que, até aqui, tinham de ser exercidas pelo plenário.
Esta proposta de lei entrega o Tribunal a si próprio, dá agilidade ao seu funcionamento interno e permite-lhe funcionar sem hesitações, como órgão de soberania em pleno.
Só este passo justificaria a apresentação de uma proposta de lei. Mas as importantes inovações por ela trazidas não se ficam por aí. Também ao nível das competências do Tribunal a proposta de lei, respeitando escrupulosamente a Constituição da República, traz significativas alterações.
No que respeita ao parecer sobre a Conta Geral do Estado e as Contas das Regiões Autónomas esta proposta de lei introduz-lhe um novo mecanismo de aprovação. O texto que vos é presente cria, para este efeito, um colectivo constituído pelo presidente e pelos juizes das duas secções regionais, a quem competirá a aprovação dos referidos pareceres. Trata-se, julgamos, de uma inovação harmoniosa pois, por um lado, dar-se-á uma nova relevância institucional à autonomia político-administrativa integrando as duas experiências regionais e, por outro lado, proteger-se-á o interesse da unidade da jurisprudência do Tribunal, a qual é cabalmente garantida pela presença do Sr. Presidente do colectivo em causa.
No que toca ao conrolo prévio que o Tribunal exercia até aqui através do visto, com um larga extensão, há três grandes inovações:
Redução do seu âmbito (na linha da doutrina mais moderna) aos actos de admissão à função pública e aos contratos; introdução do visto tácito como figura de alcance geral sem porém, haver lugar a exoneração de responsabilidades; criação da declaração de conformidade, da competência da Direcção-Geral do Tribunal de Contas, com os mesmos efeitos do visto para os casos em que não haja dúvidas.
Trata-se de medidas muito significativas, que reduzem uma actividade de sentido burocrático, em muitos casos de escassa relevância financeira, e que, até aqui, pesava em demasia na actividade do Tribunal e na sua imagem externa e retirando-lhe a atenção das funções mais nobres.
A experiência revelou que o controlo prévio compromete excessivamente o próprio Tribunal de Contas, o qual, concedendo o visto a certa despesa, limitava, naturalmente, a sua liberdade de apreciação no momento do julgamento da conta em que a despesa se inserisse.
Ora a doutrina mais moderna ensina que a intervenção dos tribunais de contas deve fazer-se, fundamentalmente, ao nível do controlo a posteriori do julgamento das contas dos serviços e não ao nível da apreciação casuística e desintegrada das despesas no momento prévio da sua realização.
Por outro lado, o visto tem constituído, muitas vezes, um exagerado entrave à acção administrativa, burocratizando e alongando o processo de decisão, desresponsabilizando a própria entidade que decide, diminuindo a capacidade de resposta e prejudicando interesses da administração e dos particulares.
A redução do controlo prévio é, assim, uma medida imposta tanto pelo melhor funcionamento do Tribunal como pela política de desburocratização que o Governo, insistentemente, tem prosseguido.
O visto mantém-se apenas como válvula de segurança para os actos do Estado de maiores implicações financeiras.