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7 DE ABRIL DE 1919 - 2053

A verdade, porém, é que, por falta de vontade política dos governos e de maiorias parlamentares conjunturais, o Tribunal de Contas mantém, no essencial, a orgânica apertada, a estreiteza de atribuições, a limitação de competências, a escassez de juizes e a carência de meios herdados de há mais de 50 anos.
Conhecem-se as razões essenciais das resistências dos Governos à reestruturação e modernização do Tribunal de Contas, das resistências governamentais à democraticidade e transparência da vida financeira do Estado, designadamente as ilegítimas e injustificáveis «vantagens» dos governos no não controlo efectivo e atempado da gestão dos dinheiros públicos, nas «margens de manobra» na execução orçamental, nos «sacos azuis» não fiscalizados, nas incontroladas «operações de tesouraria», na inquantifícável gestão do património público.
Foi para combater esta situação inaceitável que o PCP propôs e viu aprovada no Orçamento do Estado para 1986 uma norma tendente a fixar um prazo de 180 dias para a reestruturação do Tribunal de Contas e que, antes de expirado aquele prazo, apresentou (em Maio de 1986) um projecto de lei destinado a aprovar as opções fundamentais da reestruturação do Tribunal de Contas. No entanto, este projecto não chegou a ser apreciado pela Assembleia da República.
Foi ainda com o mesmo objectivo da adequação da orgânica do Tribunal de Contas ao regime democrático e de controlo democrático da vida financeira do Estado que, tendo em conta o conteúdo dos trabalhos preparatórios conhecidos e, nomeadamente as posições e propostas do próprio Tribunal de Contas, o PCP apresentou um novo projecto de lei sobre a reestruturacão do referido tribunal, projecto de lei que, por ausência de vontade política da maioria parlamentar, dormia há exactamente um ano nas gavetas da Comissão de Economia, Finanças e Plano e que hoje, por efeito de agendamento de uma proposta governamental sobre a mesma matéria pode, finalmente, ser objecto de apreciação, na generalidade, pelo Plenário da Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque ao PCP importa, fundamentalmente, uma reestruturacão orgânica do Tribunal de Contas que consagre um verdadeiro controlo democrático da acção financeira do Estado, a apresentação pelo Governo, há cerca de um mês, de uma proposta de lei sobre a reforma do Tribunal, deveria «regozijar-nos», utilizando uma expressão da carta que ontem mesmo os nove juizes do Tribunal de Contas dirigiram ao Sr. Presidente da Assembleia da República. A, há muito esperada, reorganização do tribunal encontrar-se-ia finalmente em movimento, embora tardiamente, já que entre a apresentação da proposta do Governo e a elaboração do projecto pelo Tribunal de Contas medearam três longos anos.
Porém, após a análise do conteúdo e alcance da proposta de lei, não podemos deixar de concordar inteiramente com a opinião unânime dos juizes do Tribunal quando afirmam que esse sentimento de regozijo é perturbado pelo facto de o texto enviado à Assembleia da República conceber um Tribunal de Contas que, em alguns aspectos fundamentais, ficaria não só desajustado das realidades actuais mas aquém da actual legislação que data de 1933».
De facto, se esta proposta do Governo vier a ser consagrada legalmente sem alterações significativas - e continuo a citar os juizes do Tribunal de Contas -, «em vez de caminharmos no sentido da modernização do controlo da actividade financeira do Estado, de molde a poder existir uma maior transparência dos gastos públicos, no duplo aspecto da sua legalidade e da sua eficácia, tal como vem acontecendo nos países mais avançados e, nomeadamente nos membros da CEE, irá cair-se numa situação em que, na realidade, o Tribunal não poderá exercer convenientemente a sua acção fiscalizadora, com prejuízo da democraticidade do sistema».
A apreciação, na generalidade, dos dois projectos de diploma, hoje em discussão, impõe que se proceda à análise das suas orientações fundamentais à luz das realidades e necessidades nacionais e do Direito Comparado. As realidades nacionais nesta matéria são públicas e evidentes, desde o desconhecimento do efectivo património do Estado até à abusiva utilização de Operações de Tesouraria camuflando efectivas Operações Orçamentais, passando pelos múltiplos «sacos azuis», pela incontrolada actividade dos Fundos Autónomos, pelas operações do Serviço de Utilização Comum dos Hospitais e de muitos outros «SUCH» que por aí existirão. É destas realidades que decorre a necessidade inegável de uma mais cabal e sistemática disciplina e controlo das Finanças Públicas.
No que concerne ao Direito Comparado, a análise das instituições de controlo noutros países e, nomeadamente, as orientações essenciais que há anos vêm sendo reafirmadas em congressos da INTOSAI (Organização Internacional das Instituições Superiores de Controlo) não deixam lugar a grandes dúvidas. As linhas essenciais de reestruturacão do Tribunal de Contas deverão pautar-se por: em primeiro lugar, reforço da independência e autorização do Tribunal; em segundo lugar, pelo princípio da funcionalidade, o que significa completar o princípio da mera legalidade financeira com o princípio da avaliação da eficácia, eficiência e economicidade da gestão financeira; em terceiro lugar, pelo alargamento do âmbito de jurisdição e controlo a todas as entidades públicas e a todos os gastos de dinheiros públicos; em quarto lugar, pelo desenvolvimento de técnicas avançadas de auditoria e a integração do controlo interno dos serviços com o controlo externo do Tribunal; em quinto lugar, pelo controlo sucessivo sobre o controlo preventivo, visando a democratização, a eficácia e a pertinência do controlo das Finanças Públicas; e, em sexto lugar, pelo relacionamento directo entre o órgão de soberania responsável pelo controlo técnico da gestão dos recursos públicos e o órgão de soberania a quem compete a fiscalização política da actividade do Governo.
Estes são, Srs. Deputados, princípios essenciais internacionalmente aceites e recomendados para a estruturação dos Tribunais de Contas nas sociedades democráticas.