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31 DE JANEIRO DE 1990 1287

Ora o Primeiro-Ministro, que promete reforçar o diálogo com todos, começa por excluir do diálogo, como se vê (e não só por este exemplo), os partidos da oposição e, mais ainda, exclui o órgão de soberania perante o qual é politicamente responsável.
Em qualquer país de regime democrático semelhante ao nosso os esclarecimentos sobre a remodelação e o debate parlamentar subsequente seriam normais acontecimentos institucionais, que acabariam por dar credibilidade a um novo fôlego do Governo. Os receios do Primeiro-Ministro em enfrentar a Assembleia da República nesta matéria são mais uma demonstração de que o Governo está sem fôlego e que a remodelação não tem credibilidade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo julga, talvez, que fugindo a discutir a derrota eleitoral de 17 de Dezembro, a fragilização e o isolamento que ela indica e acentua, poderá, a^ golpes de propaganda (do género «PSD acelera!») e com umas operações de cosmética na imagem do, Primeiro-Ministro e do Governo, transformar as fraquezas num fenómeno passageiro, rapidamente ultrapassável.
Sabe-se, no entanto, que não é assim.
A derrota nas eleições autárquicas foi antecedida pela derrota nas eleições para o Parlamento Europeu e ambas, as segundas mais do que as primeiras, revelaram a grande redução da base social e política de apoio do Governo, operada pela luta dos trabalhadores e de praticamente todos os sectores profissionais mais representativos da sociedade portuguesa.
O descontentamento continua e alastra. A conflitualidade social recrudesce em torno de problemas específicos e de importantes processos reivindicativos, com particular destaque na área da contratação colectiva, a qual envolve mais de um milhão de trabalhadores. Continuam em aberto os processos reivindicativos dos professores, dos médicos, dos enfermeiros e de outros destacados sectores profissionais. Os processos dos militares não parecem encerrados. O Governo não se entende com os parceiros sociais.

O Sr. João Amaral (PCP): - É isso mesmo!

O Orador: - Com a redução da base de apoio governamental vêm as contradições internas de interesses, as divisões, as rivalidades, as oposições insanáveis. Os ventos que sopram das bandas governamentais não são as brisas da estabilidade que o Primeiro-Ministro apregoa, mas os prenúncios de noitadas de turbulência tão comuns no passado do partido do Governo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Exacto!

O Orador: - Não admira, por isso, que até mesmo dentro da maioria parlamentar já apareça quem admita, com amargura, que «com a quebra eleitoral do PSD abriu-se de novo o palco para o mundo pré-1987».
Toma-se, assim, oportuna a contestação da legitimidade da pretensão do Governo de conduzir a política do Pais invocando a maioria conjuntural de 1987.
É altura de recusar, com toda a firmeza, o delírio governamentalizador com que o executivo Cavaco Silva invadiu todas as áreas da vida nacional, incluindo a Assembleia da República, e que continua a manifestar-se em recentes propostas governamentais como a da Alta
Autoridade para a Comunicação Social, a do Conselho da Bioética e a do Conselho Económico e Social.
Mostrando ao Governo o cartão da sua desconfiança, o povo português espera, naturalmente, dos partidos de oposição que redobrem de rigor, de firmeza e de vigilância no acompanhamento, na fiscalização e na contestação da política do Governo e numa confrontação com soluções alternativas para uma viragem democrática na vida nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É com este espirito que abordaremos, embora sucintamente, duas questões da maior actualidade: a primeira é a questão da televisão, que já se tornou no maior escândalo do País. A entrevista ao Primeiro-Ministro, pelo horário escolhido, pela doçura do trato e pela mansidão das perguntas, representa uma tão flagrante discriminação positiva que não houve sector da vida nacional, incluindo na área do Governo, que não se mostrasse indignado.
Cm contrapartida, as forças da oposição são tratadas com rudeza, remetidas ao silêncio ou em coberturas o, as suas mensagens distorcidas e adulteradas.
O debate entre representantes partidários sobre os resultados das eleições para as autarquias foi anulado, pela primeira vez, porque o PSD perdeu as eleições.
No extremo das discriminações negativas encontra-se o tratamento que a RTP reserva ao PCP, que está a constituir uma permanente operação de desinformação, manipulação e agressão política e ideológica. Misturando informação deturpada com comentários caluniosos de sua própria autoria, a RTP procura tutelar e condicionar, de forma totalitária, o direito dos telespectadores a ajuizar soberanamente sobre o que o PCP faz, diz ou propõe, o que é ilegal, inadmissível e intolerável num órgão público de comunicação social.

Aplausos do PCP.

Hoje percebem-se perfeitamente as razões por que o Governo mantém e quer manter indefinidamente - este estado de coisas em relação à televisão: é que a RTP constitui dos poucos sectores do País de que continua a receber um apoio total e incondicional.
A segunda questão refere-se à política externa, relativamente à qual o Governo ignora, completamente, a Assembleia da República, a não ser quando carece de aprovação de tratados e convenções e, mesmo assim, sempre em cima da hora, sem informação, sem pareceres, sem debate esclarecedor!...
A Assembleia quis conhecer a posição do Governo sobre a viagem da líder da UNHA, Jonas Savimbi, a Portugal. O Governo não prestou qualquer esclarecimento. Constou, no entanto, por intermédio de deputados do PSD, que era considerada uma viagem particular.
Ora aí está a «viagem particular» que envolve, embora com esse título, contactos com todos os órgãos do poder político, ruas engalanadas com o retraio do visitante, carros de som propagandeando a visita. Nem o passado remoto, nem o passado recente, nem o presente do líder da UNITA - onde, desde o envolvimento com forças do colonialismo, à colaboração com o apartheid, até ao rapto de compatriotas nossos, abundam motivos de ofensa ao povo português -, nada nesse passado e neste presente, dizíamos, justifica um tão pomposo acolhimento. Estamos,