O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2478 I SÉRIE-NÚMERO 74

A réplica de um Projecto Erasmus que, para nós, se poderia chamar «Damião de Gois», está ao alcance do Governo e das universidades portuguesas. Anda pelos diários da Câmara um projecto nesse sentido, que aqui foi recordado pelo Sr. Deputado Manuel Alegre, a quem agradeço a referência, mas não há inconveniente em que a origem seja esquecida e, por isso, aproveitado, assim como convinha que não lhe acontecesse como aconteceu ao Instituto Internacional de Língua Portuguesa, que foi por nós aqui advogado e que, pelo destino reservado pelo sistema às propostas das minorias, foi posto em vigor por iniciativa do Brasil.
Contudo, sendo a África o nosso maior empenho, não podemos todavia deixar de dizer uma palavra sobre Timor.
Há largo tempo que andamos sobretudo ocupados com uma carta dirigida pelo Governo da Indonésia ao Presidente desta Assembleia. Vemos pelos jornais que o processo da carta ainda vai demorar. Entretanto, o Conselho de Segurança da ONU abriu uma nova jurisprudência sobre o genocídio e sobre a intervenção internacional e entendemos que é dever de Portugal obrigar o Conselho de Segurança a debruçar-se sobre o genocídio dos Timorenses. A proposta foi apresentada. Talvez a cooperação pudesse ocupar-se do genocídio, enquanto somos solicitados para que a carta continue a ocupar a cena toda. O genocídio parece-nos mais urgente.
Finalmente, desejaria sublinhar, mais uma vez, que a África se tornou no continente mais ajudado e mais perdido. O principal investimento de que necessita é a paz, porque sem ela não haverá ajuda, nem cooperação, nem direitos do homem, nem Estado de direito. O passo dado, que se inscreve construtivamente na busca mundial da paz, no projecto da Euro-África, na tarefa da recuperação da África, também representa, se a evolução ajudar e o sentido geral da responsabilidade portuguesa corresponder, o primeiro significativo acto dado no sentido do reencontro da nossa comunidade nacional com uma das traves mestras da sua história secular.

Aplausos do PS, do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cooperação é, para nós, um imperativo ético, político e cultural. Resulta do reconhecimento da unidade fundamental da humanidade e da interdependência cada dia mais acentuada entre os povos. Para Portugal é, além disso, um imperativo histórico e axiológico. É-nos exigida pela riquíssima vivência passada do nosso povo e pelo sistema de valores que soube construir, de entre os quais se destaca o valor da solidariedade, de que a cooperação é a mais lídima expressão no mundo actual.
O patriotismo universalista, que, na feliz expressão de José Augusto Seabra, nos distingue dos outros povos, mantém-nos abertos a eles e dispostos a desenvolvê-la. No entanto, a cooperação tem de começar pela ajuda à concretização da aspiração fundamental de todos os homens: viver em paz. É que da paz tudo depende. Sem ela, tudo o resto será ilusório. Ela é uma condição sine qua non de estabelecimento de qualquer sistema de valores e sem ela é impossível uma cooperação minimamente eficaz.
Por isso, tem o Governo considerado ser tarefa prioritária, fundamento da cooperação, a disponibilidade para a ajuda, quando solicitada, na resolução de conflitos que tem destroçado povos irmãos.
Aprovou esta Assembleia, por larga maioria, um voto de congratulação pelos acordos de paz para Angola, concluídos há dias em Portugal. Eles representam uma grande vitória para o povo angolano, que todos cordialmente saudámos. Esta Câmara reconheceu expressamente que o papel relevante da mediação portuguesa, conduzida pelo Primeiro-Ministro Cavaco Silva e pelo Secretário de Estado Durão Barroso, a quem (apesar de ele me ter dito para não o fazer) quero felicitar calorosamente pelo seu trabalho e pelo resultado alcançado, «representa um ponto alto da diplomacia portuguesa e é um grato motivo de satisfação e orgulho para todos os portugueses».

Aplausos do PSD.

Como aqui disseram alguns Srs. Deputados da oposição, é um sucesso de Portugal sobre o qual, como foi dito pela minha bancada, não nos move qualquer aproveitamento partidário.
Com confiança no futuro, e no entendimento alargado que lenho da cooperação, gostaria de deixar aqui algumas reflexões sobre o objectivo essencial e o significado daqueles acordos. Considero-os simultaneamente inovadores, exemplares e integrados na tradição histórica e cultural portuguesa. Começo por felicitar as partes angolanas que fizeram o esforço para chegar à decisão final de assinar os acordos, que só a elas competia.
Quero colocar-me no campo da axiologia, para caracterizar a paz como um valor fundamental e universal. É fundamental porque é pressuposto do respeito de outros valores - a dignidade da pessoa, a liberdade, os direitos do homem, a solidariedade, o desenvolvimento, o bem-estar - nenhum deles tem fundamento real sem a paz. É, pois, um valor universal a que todos os povos aspiram.
Penso que a unidade essencial da humanidade, verificada pela antropologia, coloca alguns limites à variação dos valores. Cada sistema de valores contém-se numa matriz universal da qual é expressão particular. Progressivamente unificada e cada vez mais consciente da própria unidade, a humanidade, venha ou não a ser a «cidade ou aldeia global» de que alguns falam, não pode avançar se todos não se orientarem para a paz porque só assim todos se orientarão para o desenvolvimento.
Como os direitos do homem não conhecem fronteiras, a paz, que é seu pressuposto, é também uma responsabilidade colectiva. Francisco Sá Carneiro chamou-lhe um problema universal e acrescentou: «Entre os nossos objectivos prioritários Figura o que constitui a filosofia da nossa política externa: a preservação da paz, a construção da segurança pela via da cooperação.» Devo referir ainda que, como Helmut Schmidt, penso que o Estado não cria, nem pode criar, valores. Constata-os na comunidade e, em toda a sua acção, deve partir dessa realidade.
Em Portugal, também a consciência da responsabilidade pela paz universal teve nascimento no seio da comunidade e depois foi consagrada no artigo 7.º da nossa Constituição. A meu ver, os Portugueses, ao longo da sua história, foram os que melhor puseram em prática o essencial do cristianismo: a fraternidade de todos os homens e o elogio dos construtores da paz. Anteciparam mesmo, de algum modo, alguns dos princípios que os defensores dos direitos do homem muito mais tarde propuseram.
Entendo, portanto, que estes acordos se enquadram na concepção da paz como bem universal e na vivência universalista dos Portugueses. A poucas horas da chegada de João Paulo II ao nosso país, recordo que ele próprio,