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29 DE OUTUBRO DE 1993 III

Tal dispositivo permitia, como se sabe, excluir da base tributável a diferença entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de imobilizações corpóreas ou financeiras desde que tais transacções fossem reinvestidas na aquisição, fabricação ou construção de elementos do activo corpóreo, na aquisição de quotas ou acções das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial ou em títulos do Estado português. Era isto o que se dizia e neste momento vem-se revogar, pura e simplesmente, esta faculdade, que estava atribuída ao contribuinte. A retroactividade existe, não é legitíma, e vem o Governo argumentar com uma perversão, ou suposta perversão, do mecanismo legal, já que estaria a ocorrer «uma mera drenagem de lucros». E neste ponto, há um julgamento político que tem de ser feito aqui, que tem a ver, no fundo, com o facto de o Executivo não ter ponderado devidamente as consequências da medida adoptada. Esta é a questão fundamental e não pode, naturalmente, ser esquecida.
No caso dos benefícios fiscais, nem pode, aliás, invocar-se o n.º 7 do artigo 7.º do Código do IRC, uma vez que o acto tem uma autonomia própria, as mais-valias correspondem, de facto, a actos tributários autónomos, e só haverá respeito pela Constituição se se estipular para o futuro uma data razoável, que evite movimentos especulativos: por exemplo, o dia 15 de Outubro, justamente a data de entrada neste Parlamento da proposta de lei, a partir da qual o contribuinte zeloso poderia, naturalmente, prever a possibilidade de perder este benefício. E note-se o seguinte: neste caso, a retroactividade é particularmente grave, porque, em termos da técnica de aplicação deste benefício fiscal, já que o efeito não ocorre apenas no período de um ano mas, sim, ao longo de dois anos.
O Estado de Direito está em causa e é por isso que, no plano político, temos de fazer um julgamento negativo relativamente a esta iniciativa. Juízo político que tem naturalmente consequências constitucionais.

O Sr. Presidente: - Peco-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: - Concluo de imediato, Sr. Presidente.

O Estado para ser considerado como pessoa de bem tem, naturalmente, de cumprir os seus compromissos. Quem sai fortemente penalizado, neste caso, é o contribuinte cumpridor e de boa fé. Mais uma vez, «paga o justo pelo pecador», quando o Governo não assume as suas responsabilidades quanto ao mau funcionamento da administração fiscal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo aquilo que acabei de dizer e por estarem em causa os legítimos direitos dos contribuintes, votaremos favoravelmente o recurso apresentado pelo CDS.

(O Orador reviu.) Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que agora está colocado à consideração da Assembleia da República não é a bondade, maior ou menor, das propostas de alteração ao quadro fiscal em vigor mas apenas a questão da admissibilidade da proposta do Governo, suscitada pelo requerimento de impugnação apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS.
Do ponto de vista do Grupo Parlamentar do PCP, é importante que esta pública chamada de atenção seja feita e que o objecto estrito deste debate fique esclarecido.
Temos uma opinião muito clara, repetidamente expressa nesta Assembleia, sobre o excesso e a imoralidade dos benefícios fiscais que o Governo tem vindo a conceder às actividades e operações financeiras, às mais-valias especulativas e aos grupos económicos e temos sido igualmente claros e coerentes no combate à arbitrariedade e à prepotência tributária, na defesa da segurança jurídica dos cidadãos.
O que agora está posto em causa é o arbitrário recurso pelo Governo à aplicação retroactiva de alterações fiscais. Bem podem, o Governo e o relator do parecer da 3." Comissão, tentar socorrer-se do n.º 7 do artigo 7.º do Código do IRC para defender a tese da não retroactividade.
É verdade que esse dispositivo legal, por razões essencialmente práticas de cálculo da matéria colectável e da liquidação do imposto respectivo, define que «o facto gerador do imposto considera-se verificado no último dia do período de tributação». Mas não é menos verdade, é mesmo irrecusável, que os lucros e resultados de uma empresa vão sendo gerados ao longo dos 365 dias do ano e não apenas no dia 31 de Dezembro. As operações, designadamente as que estão em causa na proposta de lei, que a empresa realiza ao longo do ano assentam em opções em que o quadro fiscal tem, muitas vezes, peso preponderante e determinante.
Por isso, não tenhamos e não restem quaisquer dúvidas sobre os efeitos retroactivos das propostas do Governo.
Ora, sendo certo que não há disposição constitucional de que resulte directamente a impossibilidade de leis retroactivas, também não há quem sustente ser constitucionalmente possível aprovar leis fiscais retroactivas sem limite nem condições.

Bem pelo contrário!

Por todos, o próprio Acordão n.º 11/83 do Tribunal Constitucional, ao mesmo tempo que conclui que «o princípio da protecção da confiança ínsito na ideia do Estado de Direito democrático não exclui em absoluto a possibilidade de leis fiscais retroactivas», é peremptório ao afirmar a exclusão segura de uma retroactividade que afecte de forma «arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundadas dos cidadãos contribuintes». E esses direitos e expectativas dos contribuintes são arbitrariamente afectados pela proposta do Governo.
Porque é incontroverso, nada faria supor ao contribuinte a hipótese destas alterações do quadro fiscal, em especial durante o corrente ano. Não o faria supor, desde logo, o próprio Programa do Governo, que, quer o Governo, quer o PSD, não se cansam de repetir que «é para cumprir». Não o faria supor o optimismo governamental sobre a situação da economia portuguesa e a sua persistente recusa na admissão da existência de uma recessão económica em Portugal. E, nomeadamente, não o faria supor - antes, pelo contrário, só poderia reforçar as expectativas dos contribuintes - o facto de o Governo e o PSD, durante o debate do próprio Orçamento do Estado para 1993, terem rejeitado as propostas, apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PCP, de revogação de chorudas e imorais benesses fiscais, algumas das quais estão precisamente agora em questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Srs. Deputados, se a questão da admissibilidade da proposta de lei n.º 78/VI decorre fundamentalmente da aplicação retroactiva de alterações fiscais, ela coloca-se também em relação ao seu artigo 11º, dito de «reestruturação da Lisnave».