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1640 I SÉRIE -NÚMERO 49

próprio «tempo» dos acontecimentos ou da actividade política, mas, sobretudo, à expressão das comunidades locais.
Em muitos concelhos, a rádio local tem um papel relevante como pólo de difusão cultural, uma vez que não há cinema, o teatro não chega, os clubes de vídeo, as livrarias e as bibliotecas não existem, a liberdade de imprensa está limitada à opção entre um jornal desportivo de Lisboa e a folha local sem expressão nem leitores, a televisão que se vê com mais nitidez e frequência ainda é muitas vezes o primeiro canal da TVE, a televisão privada só chegará talvez no próximo ano e a televisão por cabo no próximo século.
Em muitos outros concelhos, nomeadamente no litoral, as rádios locais não estão tão isoladas. A concorrência acesa com os outros media torna a sua existência simultaneamente menos relevante, mas, por vezes, mais difícil.
É possível, no entanto, traçar um quadro geral da situação das rádios locais em Portugal: progressiva concentração; diminuição do pluralismo; diminuição da produção própria; diminuição da programação virada para temas regionais e locais; diminuição do número de rádios com noticiários próprios; desaparecimento de rádios locais; crescentes dificuldades de natureza financeira e muitas outras sujeitas à inesperada concorrência de novas cadeias nacionais e regionais.
Aumentou, de facto, drasticamente a concentração da propriedade. Alguns grupos detêm hoje várias rádios, nomeadamente de âmbito local. Mesmo uma seita religiosa de origem brasileira viu na compra de algumas estações um óptimo investimento.
Pior do que isso, algumas estações locais não difundem hoje qualquer espaço de programação própria. Onde há dois ou três anos havia programas e noticiários virados para as questões locais e regionais e um óbvio esforço de acompanhamento da vida das comunidades, restam muitas vezes algumas salas com material abandonado. Essas estações, que ganharam os alvarás graças a muito entusiasmo e a algumas promessas, já não têm programas próprios, nem jornalistas, nem outros empregados. Apenas uma antena para retransmitir na íntegra a progrmaação de outra rádio.
De pouco valeram, de facto, os concursos públicos que seleccionaram as rádios regionais e locais. Repare-se como estão, hoje, por exemplo, as duas estações regionais vencedoras do concurso público de Junho de .1990. Menos de três anos depois, ambas tinham desaparecido: a Radiopress foi absorvida pela TSF e a Correio da Manhã Rádio pela Rádio Comercial.
Entretanto, em cerca de metade dos concelhos do conjunto dos distritos do interior do País, não há rádios locais, porque nenhuma entidade se candidatou.
No distrito de Portalegre, por exemplo, apenas dois dos 15 concelhos dispõem, hoje, de uma rádio local.
Estes dados demonstram que há uma íntima relação entre grau de desenvolvimento e dinamismo económico e social e a capacidade para fundar uma estação de rádio.
Mas há outro aspecto demonstrável: as rádios locais desempenham um papel relevante, sobretudo nos concelhos mais isolados e menos desenvolvidos, precisamente naqueles onde as carências das populações são muitas, mas as receitas publicitárias das rádios inevitavelmente poucas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo não tem qualquer política para a radiodifusão. É-lhe rigorosamente indiferente que as rádios locais existam ou desapareçam.
Há três anos, publicou um despacho, que impunha a distribuição pelas rádios locais e pela imprensa regional de uma percentagem equivalente a 10 % das receitas da publicidade estatal. O despacho continua por cumprir!
Nos últimos meses, ameaçou intervir contra as estações propriedade de uma seita de origem brasileira. Nunca o fez!
Em 1991, proibiu, estupidamente, a associação de rádios para a produção e difusão conjunta de programas. O PSD aplaudiu.
Em Março de 1992, mudou radicalmente de posição. Passou a permitir «a difusão simultânea de programas culturais, formativos ou informativos». O PSD continuou a aplaudir.
Hoje, muitas rádios retransmitem já toda a programação, violando o artigo 6.° da Lei da Radiodifusão. Ninguém sabe o que o Governo pensa sobre esta matéria.
A lei proíbe que uma pessoa colectiva tenha participação em mais do que duas empresas de radiodifusão. Toda a gente sabe que este preceito não é cumprido!
A lei faz depender a transmissão de alvarás de uma autorização do Governo. Nunca ninguém a solicitou, mas todos os meses os jornais noticiam a mudança de propriedade de rádios.
Se tudo continuar como até aqui, não haverá, dentro de alguns anos, muitas rádios locais. As opções de política de comunicação social, que levaram à criação de mais de 300 rádios locais, ficarão sem qualquer sentido.
O País e a liberdade de informação não beneficiariam com esta situação.
A radiodifusão sonora é ainda, apesar dos vertiginosos progressos tecnológicos, um bem limitado. Isso implica não só uma selecção dos concorrentes à utilização das frequências, com natural eliminação dos menos apetrechados, como um conjunto de obrigações para os vencedores dos concursos: pluralismo, qualidade, promoção educacional e cultural. No caso das rádios locais, acrescente-se uma outra: a ligação às realidades dos concelhos onde se inserem.
Há muitas coisas incompatíveis com esta conclusão: o desrespeito absoluto pêlos concursos públicos; a utilização de um bem do domínio público para fins particulares de mais do que duvidosa seriedade (vide as rádios ligadas a seitas ditas religiosas); o desaparecimento de diversas rádios, cujas antenas são agora meros retransmissores de programação alheia; a recusa obstinada do Governo em estender às rádios locais o quadro de apoios em vigor, há mais de dez anos, para a imprensa regional.
O projecto de lei que o PS hoje coloca à discussão pretende contribuir para combater esta realidade.
As propostas apresentadas não são inovadoras. Muitos países, entre os quais os próprios Estados Unidos da América, impõem mínimos de programação própria. Outros prevêem formas de apoio às estações locais, de forma a que elas possam eficazmente desempenhar a sua função.
O Orçamento do Estado para 1994 prevê uma verba superior a 1 milhão de contos para apoio à imprensa. Ninguém compreende que o que generosamente se dá à imprensa-e também ao cinema, ao teatro, ao audiovisual e a outras formas de expressão da cultura - se recuse à rádio.
Conheço de cor a argumentação do Governo e do PSD: as rádios locais tiveram de provar a sua viabilidade económica quando venceram os concursos públicos.
Este argumento esquece não só a realidade da situação da radiodifusão como as profundas mudanças nas regras da concorrência do sector, graças à acção ou à inacção do Governo: os aumentos de potências, a permissão das cadeias ou da transmissão simultânea de programas,, a nova situação das rádios regionais.
O governo da Região Autónoma dos Açores estabeleceu, há cerca de quatro anos, um quadro geral de apoios às rádios idêntico àquele que o PS vem defendendo. Propõe-se mesmo, agora, renová-lo. Entendeu o papel insubstituível das rádios locais.

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