O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

22 DE SETEMBRO DE 1994 3065

minoritários, monopartidários, de coligação, socialistas, sociais-democratas, de esquerda e de direita. Rever sem motivo, Srs. Deputados, conduziria a enfraquecer a autoridade da Constituição que temos.
Discordâncias, sempre as haverá. Mas é próprio das ordens jurídicas serem globais e sintéticas. Não podendo existir mais do que uma, não pode a única dar plena satisfação a todas as visões. Uma Constituição é sempre um ponto de convergência de aspirações diversas.
Para além dos limites, fica todo um campo aberto a actualizações e melhorias. Uma Constituição não tem de ser nem é um cadáver mumificado. É um ser vivo, na medida em que reflecte o essencial comunitário. Revê-la de tempos a tempos traduz a atitude elementar de «estar atento às exigências da vida». Daí que se fale num «poder constituinte difuso... discreto e inominado» ou num «exercício quotidiano do poder constituinte...» operando pela via de uma alteração dos costumes, das convicções e dos valores. E até num «plebiscito jornalístico». Tudo agentes de mudança do statu quo da comunidade política de que se trate. Daí que, ao rever, devamos ser, como já se disse, «não os pais da reforma constitucional, mas apenas os padrinhos!...»
Uma boa revisão há-de ser assim a que resulta «da natureza das coisas» que não da vontade dos seus proclamados agentes. De outro modo corre o risco de se transformar numa «paródia do verdadeiro poder constituinte».
Tudo isto para concluir que se o poder de revisão é de sua essência limitado, não deixa de ser necessário e legítimo no entanto, respeitadas que sejam as fronteiras dentro das quais se move.
Do que se escreveu e disse, e dos projectos de revisão já apresentados, deve concluir-se que estamos perante três diferentes atitudes em face da revisão: a visão uma vez mais minimalista, se não imobilista, do PCP; a visão arrogante, globalista e todo-o-terreno do PSD e do CDS-PP; a visão de síntese, equilibrada e respeitadora dos limites, do Partido Socialista.
Os projectos do CDS-PP e do PSD apropriam a conhecida imagem da «epilepsia dentro da sorveteira». Vão-se à Constituição - à sua dimensão formal ou material, sem distinção - e fazem dela um passador de ressentimentos. Absoluto desprezo pelos limites materiais de revisão, o que naturalmente os inconstitucionaliza. Total indiferença perante valores e sentimentos nela plasmados por exigência do sentir colectivo à data da ruptura constitucional de Abril. A mesma atitude de quando se tratou de normalizar a democracia política ou de reforçar a democracia económica: a atitude de quem entra pelo texto constitucional adentro, pilotando um bulldozer. A mesma preocupação de despejar dela os últimos resquícios de socialismo democrático, para em seu lugar erguer estátua ao liberalismo personalista. Não se limitam a mudar a água às azeitonas. Mudam as azeitonas à água. A pessoa, sempre, no lugar do cidadão. Uma aparente rejeição do qualificativo de «democrático». Onde o qualificativo permanece, nomeadamente a qualificar a legalidade, decepam-no. O pretexto é o de que, legalidade só, é «a expressão própria da tradição do Estado Constitucional Europeu»! E nós lembrados do meio século em que sofremos as inclemências de uma legalidade que tinha o defeito de não ser nem democrática em si, nem democraticamente legitimada. A palavra «povo» - horribile dictu - é também decepada. Expressões que assegurem algum relevo à constituição social são, elas também, substituídas por chá de malvas.
Vem-nos irresistivelmente à memória a carta do velho Eça ao Director da Companhia das Águas:« V. Ex.ª acaba de me cortar a água. Eu tenho de cortar qualquer coisa a V. Ex.ª!»

Risos do PS.

Alguns dos mais importantes direitos dos trabalhadores - na prática, incluindo o da greve - vão-se à viola! E o CDS, refinando nisso, substitui o enunciado de direitos - alguns fundamentais! - que a Constituição assegura a «todos» por simples incumbências do Estado.
Por sobretudo isto, que não esgota o essencial, grossa maquia nos poderes do Presidente da República; as habilidades eleitorais do costume; a tentativa, mal disfarçada - esta, sobretudo, do PSD - de mitigar a independência dos tribunais e de reconduzir o Ministério Público, amputado de competências, à tutela do Ministro da Justiça; enfim, para não sair do essencial, o cair da máscara do PSD em matéria de regionalização do País.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - O PCP não conseguiu levar até para lá do penúltimo dia do prazo a sua resistência ao processo de revisão. Já sobre o apito de partida, tomou o comboio.
E, para quem tanto evidenciou a desnecessidade de uma revisão - não revemos, de facto, em estado de necessidade -, o projecto surge encorpado de propostas e alterações. Acabaram, afinal, os Deputados do PCP por fazer a demonstração de que melhorias são sempre possíveis.
São, de um modo geral, sedutoras as propostas apresentadas pelo PCP. Extremamente sedutoras! Têm, no entanto, o pequeno senão - note-se que não digo defeito - de relevarem de alguma utopia (talvez até mais do que alguma!). Não fossem os arreliadores constrangimentos orçamentais, só receáveis por quem é ou se arrisca a ser Governo, e eu estaria aqui a aplaudir a quase generalidade das reclamadas benfeitorias. Acontece é que são, pelo menos, precisos sete orçamentos para poder cumprir esta proposta de revisão constitucional!
Mas repito o que noutro lugar afirmei: utópicas ou não, são metas, directivas, estrelas polares que podem vir a revelar-se úteis.
Verifiquei, com natural satisfação, que o PCP fez suas muitas das nossas principais propostas, nomeadamente no plano do reforço da participação democrática dos cidadãos e de alguns fundamentalíssimos direitos.
Razão seria essa para que o PCP, ao menos desta vez, se tivesse eximido de ataques ao PS em matéria de revisão constitucional. Mas não! Volta a acusar-nos de «colocar a revisão constitucional como primeira prioridade» - e eu a julgar que tinha sido o CDS a dar o pontapé de saída para a revisão constitucional; acusam-nos de «estendermos a mão ao PSD para entendimentos sobre a descaracterização da lei fundamental»; de «novos entendimentos entre o PS e o PSD para pôr em causa aspectos essenciais da Constituição»; de apresentarmos «propostas das quais resulta também a adulteração do princípio da representação proporcional».

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E, enfim, de termos como «objectivo principal conseguir alterações ao sistema eleitoral para, através de operações de engenharia eleitoral e da mutilação do sistema proporcional, podermos obter Deputados que, democraticamente..., deveriam caber aos outros partidos».
As nossas propostas, sem excepção das que ele próprio perfilha, seriam «gravemente lesivas do regime democrático».
Que fazer a esta prenda? Só posso concluir uma de três coisas: ou que o PCP não leu o nosso projecto - hipótese, apesar de tudo, menos grave!

Páginas Relacionadas