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24 DE JULHO DE 1997 3707

Em segundo lugar, queria chamar a vossa atenção para a realidade: quando abordamos a questão do voto dos portugueses que vivem no estrangeiro, normalmente, fazêmo-lo partindo de um universo eleitoral possível de 4,5 milhões de portugueses; ora, não é assim, nem mesmo através dessa lei de nacionalidade, que já aqui hoje foi considerada permissiva mas que é considerada uma das mais importantes e honrosas conquistas do Portugal de Abril, que é a Lei da Nacionalidade Portuguesa. Pois, Minhas Senhoras e Meus Senhores, vejamos qual é a realidade: o único recenseamento de inscrições consulares, não de cidadãos eleitores, o único que se realizou ao longo destes anos, aconteceu recentemente a propósito das eleições para o Conselho das Comunidades Portuguesas; e, na base das inscrições consulares consideradas válidas, isto é, em vigor (e, mesmo assim, com alguma margem de erro sempre dependente dos que morrem e dos que regressam), apurou-se que estão inscritos nos consulados de Portugal em todo o mundo 2,2 milhões de portugueses - é este o número. Portanto, o universo real, não hipotético, não a tal comunidade linguística ou cultural de que aqui se falava há pouco e que é uma metáfora, mas sim a realidade concreta da comunidade portuguesa no estrangeiro, é de 2,2 milhões de portugueses!
Em terceiro lugar, queria dizer-lhes que, de acordo com o número de recenseados até hoje registado nos cadernos eleitorais referentes às várias eleições legislativas que entretanto se realizaram, o número mais elevado de portugueses recenseados no estrangeiro foi de 190 000. E já não vou ao ponto de lhes dizer que, destes 190 000, até à data, nunca chegaram a votar 50%! Portanto, temos de ter bem presente qual é o universo real com que estamos confrontados. E, a este respeito, tenho pena que não esteja presente neste momento a Sr.ª Deputada Isabel Castro, que disse que estávamos aqui a discutir as condições do exercício do direito de voto aos não residentes. Ora, Srs. Deputados, aquilo que estamos aqui a discutir é a atribuição ou não do direito de voto aos portugueses que vivem no estrangeiro. E a pior coisa que se pode fazer em democracia é negar a atribuição do direito de voto com fundamento na inexistência ou deficiência das condições para o seu exercício.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi este o argumento que, durante 50 anos, privou os portugueses do exercício da democracia. Não tivemos democracia antes do 25 de Abril porque as autoridades do passado sempre questionavam a capacidade dos portugueses para exercer livremente os seus direitos cívicos e políticos e, por isso, era sempre demasiado cedo para nos concederem a liberdade e a democracia. Portanto, Minhas Senhoras e Meus Senhores, Srs. Deputados, o que temos de decidir aqui hoje é se queremos ou não conceder o direito de voto na eleição presidencial aos portugueses que vivem no estrangeiro. Esta é a questão. Mas, conexa com esta, está uma questão fundamental sobre a qual temos de tomar uma posição clara, que é saber se queremos ou não que os portugueses que vivem no estrangeiro participem na vida política nacional.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Bem lembrado!

O Orador: - A este respeito, permito-me recordar aquilo que tem sido a política dos outros países que têm comunidades no estrangeiro. Pois esses países tudo fazem para atrair as suas comunidades à comunidade nacional, para as ligar à pátria, para potenciar essa riqueza imensa em benefício do poder estratégico dos respectivos Estados. E constrange-me que nós, portugueses, tendo no estrangeiro comunidades tão fortes e tão prestigiadas, não aproveitemos esta oportunidade histórica para ligar mais profundamente esses portugueses à Pátria portuguesa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - Esta é que é a questão fundamental. Portanto, todos os argumentos que aqui se esgrimiram, colocam-se no plano do exercício do direito - não se colocam no plano da titularidade do direito. É esse o plano em que devemos situar-nos.
Srs. Deputados, é altura de pormos termos às contradições que ainda sobrevivem na nossa ordem jurídica: os filhos dos estrangeiros residentes em Portugal podem adquirir a nacionalidade portuguesa e podem, depois, votar nas eleições portuguesas; os filhos dos portugueses residentes no estrangeiro têm nacionalidade portuguesa mas não podem votar na eleição presidencial; os estrangeiros que vivem em Portugal, podem votar para as autarquias, mas os portugueses que vivem no estrangeiro, não têm esse direito. E mais: o português que vive no estrangeiro, a quem nós negamos o direito de votar na eleição do Presidente da República há 20 anos, pode ser candidato à eleição presidencial! Pode ser! Um português residente no estrangeiro, pode candidatar-se, desde que satisfaça os requisitos constitucionais, a Presidente da República, mas - contradição das contradições! - ele não pode votar no Presidente da República!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a vergonha socialista!

O Orador: - Suponho que era altura de termos a coragem de pôr termo a estas contradições e concedermos o direito de voto como vem proposto e sem qualquer tipo de restrições - é aquilo que entendo.
Queria também acrescentar duas breves coisas sobre o recenseamento oficioso e o voto presencial. O Sr. Deputado João Amaral, que, infelizmente, não tenho o prazer de ter agora como meu interlocutor mas a quem gostaria de fazer um claro elogio, foi o único Deputado que, tendo usado da palavra neste debate, não empregou a palavra emigrante. De facto, considero injurioso que os portugueses que vivem no estrangeiro, nomeadamente nos países da Comunidade, onde são tratados como cidadãos comunitários, em Portugal continuem a ser tratados por emigrantes e como emigrantes. Acho que era tempo de, na evolução lexical nossa, termos enterrado definitivamente um termo que está ultrapassado no plano do direito e no plano dos factos, para nos referirmos a esses nossos concidadãos como portugueses de pleno direito e, como tal, portugueses e não emigrantes. Porque a palavra emigrante não é inócua nesta questão: chamar ao português que vive no estrangeiro emigrante é, desde logo, colocá-lo num grupo à parte; é, desde logo, cometer a injúria de o considerar diferente dos portugueses que residem em Portugal - e isso, a meu ver, é negativo.
Mas o Sr. Deputado João Amaral impertigou-se por causa do recenseamento oficioso. Bem, mas afinal quem é que fez o primeiro recenseamento oficioso da história