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996 I SÉRIE - NÚMÉRO 29

Deputados: O Governo submete à Assembleia da República a aprovação, para ratificação, da Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena, em 17 de Junho de 1994, no âmbito da Agência Internacional da Energia Atómica. Esta Convenção, aberta à assinatura em 20 de Setembro de 1994 na 38.ª sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, foi assinada por Portugal em 3 de Outubro de 1994 e veio completar um conjunto de instrumentos de cooperação internacional preparados sobre a égide da referida organização em matéria de segurança nuclear dos quais foram já ratificados por Portugal a Convenção sobre Protecção Física de Materiais Nucleares, em 1979, aprovada pela Resolução n.º 7/90, 4 de Janeiro, e a Convenção sobre Notificação Imediata de Acidentes Nucleares, aprovada pela Resolução n.º 22/92, de 2 de Abril.
A presente Convenção entrará em vigor em 24 de Outubro de 1996 por se encontrar reunido já o número exigido de vinculações desde 26 de Junho de 1996. Tratando-se de um instrumento jurídico que, muito embora tenha como objecto específico a segurança das centrais nucleares, garantindo a uniformização mínima das condições de segurança, poderá contribuir para o estabelecimento de uma cultura de segurança nuclear a nível mundial e de um clima de utilização favorável a exploração segura desta forma de energia pelo que se afigura de todo o interesse a sua aprovação pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, a palavra ao Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.--- e Srs. Deputados: A presente proposta de resolução n.º 46/VII visa aprovar a Convenção sobre Segurança Nuclear aberta à assinatura em Viena, em 20 de Setembro de 1994, na 38.ª Sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, e assinada por Portugal a 3 de Outubro de 1994. A Convenção tem por objecto a uniformização mínima das garantias de segurança das centrais nucleares sob jurisdição ou controlo de qualquer Estado Parte.
É verdade que Portugal não possui qualquer central nuclear, nem parece que venha a possuí-las dentro do presente quadro científico, tecnológico e industrial.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas, por outro lado, o problema da segurança das centrais nucleares assume-se inevitavelmente como transnacional, e as consequências de eventuais acidentes nucleares não se compadecem com a existência de fronteiras, seja qual for a sua natureza. Acresce a circunstância, nada despicienda, de os nossos vizinhos espanhóis terem vindo a demonstrar uma particular tendência para edificarem ou tentarem edificar instalações nucleares seja no rio Tejo, seja na bacia hidrográfica do Douro, seja uma central para a produção de energia eléctrica, já construída, seja um depósito de detritos nucleares, ainda em projecto. Aprovarmos convenções como a que neste momento é colocada à nossa consideração é, desde logo, e para além de uma questão estritamente técnica, um imperativo de natureza ética e política que, também por esta via, reforça e legitima a capacidade negocial do nosso país neste domínio. Na verdade, a energia nuclear, quer na sua aplicação pacífica quer na militar, não é apenas mais uma forma de energia mas é uma forma de energia qualitativamente diferente. E de tal modo assim é que desde o seu aparecimento colocou ao Homem - e a cada homem - problemas ético-político quase insuportáveis. De início, é verdade, apenas no âmbito da sua aplicação militar. Albert Einstein - o mesmo que escreve uma carta ao presidente norte-americano Roosevelt convencendo-o da necessidade de se ganhar a corrida aos nazis no fabrico de uma bomba nuclear, e Niels Bohr (dinamarquês), e Enrico Fermi (italiano), e Robert Oppenheimer (por acaso, americano), ficam horrorizados com a barbárie americana sobre as populações civis de Hiroshima e Nagazaki; 6 e 9 de Agosto de 1945 ficarão para eles como datas de vergonha na história da humanidade, e o fardo absurdo dos 110 000 mortos e dos 100 000 feridos imediata e directamente causados pelas bombas conduzi-los-á a uma luta corajosa pela paz e contra os armamentos nucleares até ao fim das suas vidas. Por isso mesmo, Robert Oppenheimer foi perseguido pelo maccarthyismo, destituído de todas as suas funções, acusado de «comunista», ostracizado e apenas reabilitado já nos inícios dos anos 60! A energia nuclear transformou-se então, e naturalmente, num palco privilegiado para a afirmação, quer da consciência social e ético-política do cientista, quer do carácter não neutral da própria investigação científica e tecnológica.
O que talvez então se não pudesse adivinhar era que, duas ou três décadas depois, questões semelhantes se viessem a colocar em torno da aplicação pacífica da energia nuclear, nomeadamente no domínio da edificação de centrais para a produção de energia eléctrica. Há questões graves na área da segurança de funcionamento que se mantêm debilmente «resolvidas». Se os acidentes de Calder Haf, no Reino Unido, ou de Three Miles Island, nos Estados Unidos, já deveriam ter sido encarados como avisos muito sérios nessa área. o caso de Chernobyl demonstrou claramente que agimos demasiadas vezes como aprendizes de feiticeiro. Neste momento, a generalidade dos países detentores de uma parcela significativa de energia eléctrica com origem nuclear ou suspendeu a construção de novas centrais, como é o caso da França e dos Estados Unidos, ou, embora por razões diferentes, enveredou pela via do desmantelamento e desactivação de algumas unidades, como acontece na Suécia ou nos países da ex-URSS. Mas a verdade é que os problemas levantados pelas centrais nucleares não terminam com a sua desactivação. Os detritos nucleares resultantes, perigosamente radioactivos, vão assim manter-se por vários milhares de anos, hipotecando o futuro cote perguntas para as quais continuamos angustiadamente sem respostas. No plano ético e no plano político, «não podemos continuar a bombardear Hiroshima e Nagazaki» agora no silêncio de contentores vitrificados ou sob mausoléus de milhares de toneladas de betão e chumbo. A permanente construção da história, em que o homem já tanto conseguiu, não pode transforma-la, à história, e aos filhos dos nossos filhos, em reféns de quaisquer formas de cinismo circunstancial e definitivamente trágico.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para apresentar o respectivo relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.