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2627 | I Série - Número 66 | 30 De Março De 2001

comissão especializada da Assembleia, e, nesse âmbito, serem ouvidas as ONG de direitos das mulheres, principais interessadas nesta matéria, completando assim o processo legislativo necessário, dignificante e que valoriza a cidadania em todas as suas vertentes.
Neste sentido, solicito à Câmara, em particular ao Partido Socialista, que não deixe ficar pelo caminho um processo legislativo necessário, tecnicamente útil e politicamente válido.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Céu Ramos.

A Sr.ª Maria do Céu Ramos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate que agora iniciamos não tem como finalidade consagrar a promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres nem proclamar o combate a todas as formas de discriminação por razões de sexo, nem tão-pouco visa reconhecer a importância do movimento associativo como instrumento de participação cívica e política para construção de uma cidadania plena.
Estes princípios, traduzidos em tarefas fundamentais do Estado, em direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, já estão integralmente acolhidos na Constituição da República Portuguesa, bem como no plano do direito ordinário.
Nem poderia ser de outra forma, hoje, num país democrático, que podem considerar-se até, em alguns aspectos, pelo menos no campo legislativo, vanguardista.
Este debate prende-se com estes valores primordiais, mas é bastante mais prosaico, o que, obviamente, não lhe confere menoridade ou irrelevância política, mas o situa no plano do concreto. É que os valores e princípios fundamentais carecem de instrumentos de concretização efectiva, sob pena de vivermos uma «democracia de papel», onde as tarefas do Estado nunca são alcançadas e os direitos individuais e sociais dos cidadãos são um mero simulacro do avanço civilizacional.
Situemo-nos, então, no plano do concreto, para simplificar o debate, e delimitemos com clareza o seu objecto.
Os projectos de lei em apreço, apresentados pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP, têm dois objectivos assumidos: primeiro, coligir a legislação em vigor sobre associações de mulheres, ou ONG, como se lhes queira chamar - aliás, o direito positivo já lhes chama ONG para os direitos das mulheres -, reformular a sua sistemática e, consequentemente, revogar a legislação avulsa e dispersa; segundo, inovar em alguns aspectos, com particular incidência nos direitos gerais e específicos das associações e nos direitos dos titulares dos seus órgãos sociais.
No que se refere ao primeiro objectivo, o direito vigente sobre as associações de mulheres tem um conjunto de leis directamente aplicáveis na génese das quais - justiça seja feita - se encontra, predominantemente, a iniciativa do Partido Comunista Português: é o caso das Lei n.º 95/88, de 17 de Agosto, e da Lei n.º 10/97, de 12 de Maio, que garantem e reforçam os direitos destas associações. A este diplomas juntam-se a Lei n.º 128/99, de 20 de Agosto, nascida de uma proposta de lei do governo, e o Decreto-lei n.º 246/98, de 11 de Agosto, que regulamenta o reconhecimento. Cabe ainda acrescentar a Lei n.º 61/91, de 13 de Agosto, também da iniciativa do PCP, sobre a protecção às mulheres vítimas de violência que, no capítulo dos direitos das associações de mulheres, introduziu a possibilidade de estas se constituírem assistentes em processo penal.
Deste complexo corpo normativo resulta um conjunto de elementos, relacionados com a natureza, âmbito e direitos das associações, que os autores das iniciativas pretendem manter. Nós também entendemos que se devem manter. São um sinal claro e incontornável dos avanços políticos já operados e, a todos os títulos, irrenunciáveis, porque não faria qualquer sentido um regresso ao passado, uma espécie de retorno à pré-história da cidadania política e do movimento associativo. Mas também porque, no concreto, está adquirido um acervo de direitos e um leque de instrumentos tão indispensáveis à actuação das associações, que, sem eles, o seu reconhecimento legal seria uma mera formalidade, para não dizer hipocrisia; sem eles as associações ficariam esvaziadas de conteúdo útil e dos princípios fundamentais que visam concretizar. De entre estes destacamos o direito geral de informação, o direito de participação, o direito de representação no Conselho Consultivo da CIDM - Comissão para a Igualdade e os Direitos das Mulheres - e em outros organismos consultivos junto dos quais haja conselhos consultivos, o direito de queixa ao Provedor de Justiça, o direito de acção popular, o direito de petição, o direito de constituição como assistente nos termos da lei já referida, o direito de antena, o direito ao apoio técnico e financeiro por parte do Estado para a prossecução dos seus fins e a aplicação da lei do mecenato aos donativos que forem afectos a estas associações. Tudo isto é já um património adquirido.
A este acervo acresce o estatuto de parceiro social, conquistado através da Lei n.º 10/97, de 12 de Maio, da qual decorre o direito de representação no Conselho Económico e Social para as associações com representatividade genérica e que, através da Lei n.º 128/99, de 20 de Agosto, proposta pelo Governo, foi estendido às associações que, não tendo representatividade genérica, tenham assento no Conselho Consultivo da CIDM.
Em termos abstractos, não repugna que assim seja. Porém, como já evidenciava o debate da proposta de lei em 1999, esta espécie de dupla representação das associações de mulheres introduziu um desequilíbrio objectivo na composição do Conselho Económico e Social, e na representatividade dos vários sectores de actividade, que aí têm assento, com manifesta ruptura dos princípios de equilíbrio de representatividade e de não preponderância, acautelados no seu figurino essencial. Além do mais este desequilíbrio pode, pelo menos abstractamente, fazer perigar a operacionalidade e o eficaz funcionamento deste órgão de concertação.
Em nosso entender, o debate na especialidade não pode passar ao lado desta importante questão, sendo óbvia a necessidade de rectificar a opção tomada, por iniciativa do Governo, em 1999.
Entre as propostas inovadoras dos partidos proponentes, e que constituem o segundo grupo de objectivos, há, por um lado, as matérias relativas aos direitos das associações e, por outro, as propostas que têm a ver com o estatuto dos dirigentes e dos titulares dos órgãos das associações.
As primeiras afiguram-se como concretizadoras dos direitos gerais de informação, participação e representação já adquiridos, e visam adaptá-los ao momento actual, à realidade local e regional, abrindo caminho para evoluções futuras. É o caso do direito das associações regionais e locais a estarem representadas nos conselhos económicos regionais e sociais ou nos conselhos municipais de segurança.