0600 | I Série - Número 18 | 27 de Outubro de 2001
nessa matéria, já que, não implicando necessariamente penas de prisão, garantia que os consumidores e os jovens nessa situação pudessem ser reencaminhados para um processo de tratamento. Todavia e independentemente disso, pensamos que o actual sistema só será verdadeiramente eficaz se garantir que aqueles que estejam nesta situação possam efectivamente ser remetidos para uma situação de tratamento.
Neste sentido, preocupa-nos que no decreto-lei, designadamente nos artigos 25.º e 13.º, não exista nenhuma sanção para as situações em que não há comparência perante a comissão. Ou seja, a não comparência perante a comissão pode permitir o alargamento do prazo, pode permitir a tomada de diligências junto das entidades para que essa comparência se faça, mas é uma situação que, pelo que está disposto no decreto-lei, se pode prolongar por um longo período. Ora, isto parece-nos preocupante, não propriamente porque queiramos ter aqui uma visão estritamente sancionatória, mas, bem pelo contrário, porque se temos um sistema que encaminha para uma comissão, para que essa comissão possa encaminhar para um processo de tratamento, torna-se necessário que essa comparência e essa possibilidade de estar perante a comissão efectivamente se concretize.
Por outro lado, findo o processo - e este processo segue, essencialmente, o modelo do processo sumário ou sumaríssimo -, era, do nosso ponto de vista, fundamental que a comissão tomasse uma decisão num prazo relativamente curto. Não se pode, num processo de encaminhamento para tratamento que pretende ser rápido e eficaz, permitir que a comissão não tome uma decisão durante um período relativamente longo. De resto, a própria alteração da coima pela possibilidade de prestação de serviços à comunidade é facultativa, depende do consentimento e, portanto, é fundamental que essas situações sejam definidas num prazo relativamente curto e que este processo seja um processo efectivo.
Há alguns dias, no âmbito de uma comunicação que o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros nos quis dirigir, perguntei-lhe qual era a avaliação que fazia deste processo até agora, ou seja, da constituição das comissões e de todo o desenvolvimento que lhes diz respeito. Fi-lo porque se está a criar aqui a ideia de que substituímos um modelo que previa o crime e a possibilidade de detenção, ainda que não fosse aplicada, e que tinha um sistema alternativo de reencaminhamento para tratamento ou para sanções alternativas (que, pura e simplesmente, foi sempre esquecido) por um modelo que é mais flexível, que, na linguagem oficial e no discurso do Governo, se diz um sistema mais humano e mais correcto porque encaminha para tratamento, mas que, nos casos em que não há comparência perante a comissão, nos casos em que a comissão tem de proferir decisão e nos casos em que é necessário tornar este processo efectivo e expedito, permite que, pura e simplesmente, não haja comparência ou que a decisão tarde, pelo que não há encaminhamento para tratamento de espécie alguma.
Pode, portanto, criar-se aqui a ideia de que, se houver falhas neste processo e neste funcionamento, não há detenção, não há sanção e, em suma, passe a expressão em castelhano, «No pasa nada!». Noutros termos, o que se passa é que havendo um consumidor em relação ao qual a sociedade tem uma responsabilidade, pelo que tem de fazer alguma coisa, a forma como o mecanismo está composto na lei leva a que, como me sugeriu agora o meu colega Luís Nobre Guedes num aparte, pior do que não se passar nada, tudo se possa passar nesse mesmo período, não sendo o sistema eficaz.
Basicamente, são estas as razões do nosso pedido de apreciação parlamentar, já que esta é uma matéria que nos preocupa. Não quereria limitar esta discussão a uma repetição das críticas que fizemos a este mesmo sistema, críticas que poderíamos manter, mas, porque este é o sistema que temos e que está em vigor, o nosso propósito é o de garantir que ele tenha um mínimo de eficácia e de utilidade em relação ao nosso objectivo, que é o de assegurar a capacidade de tratamento daqueles que estão nesta situação, acompanhando-os e apoiando-os, fundamento que é essencialmente humanista.
O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Vitalino Canas): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Telmo Correia, confesso que estava curioso sobre a forma como o CDS-PP iria abordar hoje este debate. Estava curioso porque o CDS-PP nos tem habituado, sempre que há um debate sobre estes temas da droga e da toxicodependência, a uma posição de ilusão, procurando normalmente subterfúgios para não se pronunciar sobre as questões concretas que estão em discussão.
Recordo aqui que quando houve o debate sobre a descriminalização o CDS falou do referendo; quando houve um debate sobre políticas de redução de riscos o CDS falou do referendo; quando houve intervenções sobre o plano nacional de luta contra a droga o CDS voltou a falar do referendo e quando aqui fiz, recentemente, uma intervenção sobre prevenção primária, a que o Sr. Deputado Telmo Correia fez referência, o CDS, vá-se lá saber porquê, já não falou do referendo mas, sim, da sua preocupação pelo facto de nunca mais aparecerem as salas de injecção assistida. Portanto, normalmente, o CDS-PP, nesta área, fala daquilo que não está em discussão.
Felizmente, não foi essa a atitude que o CDS-PP assumiu a propósito desta apreciação parlamentar e eu desejava saudar esta postura finalmente construtiva e positiva. Uma atitude com a qual se procura melhorar, mesmo que eventualmente não haja nada a melhorar, é positiva e é por essa intenção de melhorar o que já está em vigor e está a ser feito que quero saudar o CDS-PP. Só por causa dessa mudança, já seria importante para o Governo manifestar abertura em relação à possibilidade de se fazer um trabalho sério em comissão, procurando encontrar alguns aspectos de pormenor em que possamos fazer ainda melhor do que até agora.
O Sr. Deputado Telmo Correia, em nome do seu partido, referiu dois aspectos. Em primeiro lugar, referiu que não há nenhuma sanção específica para o caso em que não haja comparência do indiciado perante a comissão de dissuasão, após ele ter sido convocado para comparecer. Em termos jurídicos, tal não é rigorosamente verdade, uma vez que ainda resta, nesse caso, a possibilidade de ser acusado de crime de desobediência. É certo que há quem o defenda, mas devo dizer-lhe que adoptar essa solução me faz alguma impressão. Como tal, aquilo que o Sr. Deputado suscita, a possibilidade de encontrarmos vias de obrigar, forçar ou pressionar o indiciado a comparecer perante a comissão de dissuasão de toxicodependência, é um domínio em que poderemos procurar outras soluções.