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3237 | I Série - Número 058 | 04 de Março de 2004

 

gostariam de ver condenadas as mulheres que abortaram, sabendo que essa condenação só acontece porque fizemos uma lei que o permite - e que os senhores não querem mudar - e que, ao aplicá-la, os juízes estão apenas a cumprir a sua obrigação, é um paradoxo que só pode envergonhar os que não o resolvem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sabemos bem como é complexo e difícil definir posições sobre a descriminalização da IVG, porque assenta na existência de duas convicções mutuamente exclusivas: a de que há vida desde a concepção, e, portanto, ela é, desde esse momento, inviolável; e a de que a pessoa humana, cuja vida e dignidade são invioláveis, existe desde o momento em que nasce.
Nem a consciência nem a lei resolvem esta questão, porque ela é de outra natureza e decorre da consciência individual.
Por isso, a questão atravessa toda a sociedade, independentemente das convicções religiosas, das classes sociais e dos conhecimentos de cada um. Há católicos praticantes que apoiam o direito ao aborto, há agnósticos que são contra. Há cientistas e médicos em ambos os lados. Há, sobretudo, muitas pessoas divididas entre as duas opções.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Sendo a interrupção voluntária da gravidez um problema de consciência, a mulher que a faz está sujeita ao julgamento moral da comunidade que tem os mesmos preceitos, mas não pode acontecer, num Estado laico como o nosso, que uma das opções possíveis seja também sujeita a uma penalização prevista na lei.

Aplausos do PS.

No caso do aborto provocado, a questão é clara: os que defendem a criminalização do aborto, obviamente têm de condenar a mulher que o faça; a decisão de consciência da mulher que rejeita a hipótese de abortar, apenas encontra, entre os que defendem a despenalização, o respeito e a protecção que merece toda a mulher grávida.
Sabemos que o aborto é uma violência profundamente injusta que a mulher suporta e se projecta na sociedade e um gravíssimo problema de saúde pública.
Sabemos, como foi em tempo oportuno afirmado pelo Tribunal Constitucional, que não há uma imposição constitucional de criminalização do aborto; está, portanto, nas mãos do legislador optar pela despenalização.
Sabemos que já passou o "período de nojo" depois do referendo de 1998, que, aliás, não foi vinculativo; ou seja, não é legítimo manter o seu resultado como um dogma, passados seis anos, quando as legislaturas e os governos mudam de quatro em quatro anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Conhecemos qual é a cultura jurídica actual e a sua dinâmica no espaço europeu a que pertencemos e com o qual, apesar de todos os sacrifícios por que passamos, queremos convergir.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

A Oradora: - Perante isto, a Assembleia da República deve, no exercício das suas funções, definir um quadro legal que permita, a todas as cidadãs, o exercício consciente e responsável das opções tomadas e assegurar o acompanhamento necessário às repercussões da decisão, quer ela seja interromper a gravidez, quer ela seja assumir a maternidade.
A oportunidade das iniciativas que hoje discutimos não pode ser analisada à luz de estratégias partidárias no legítimo exercício do poder e da oposição.
Em seis anos que passaram, tornou-se evidente que em muitas famílias se cometem as maiores violências sobre as crianças, as mulheres e os idosos; divulgaram-se os números díspares mas assustadores sobre o aborto clandestino e as suas consequências; verificámos que a lei, que os senhores afirmavam existir mas não ser aplicável, afinal levou a inquéritos e julgamentos que trouxeram à praça pública a intimidade das mulheres. Tudo isto levou a um desconforto generalizado na sociedade. E há sinais de mudança, cujo sentido precisamos de aprofundar.