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32 | I Série - Número: 047 | 9 de Fevereiro de 2007

forma mais dramática, a natureza escassa, finita e limitada da água doce à nossa disposição.
Por tudo isto, como defendemos aqui, na Assembleia da República, aquando da discussão da Lei da Água, seria fundamental, numa matéria com esta importância estratégica absolutamente crucial, que estes diplomas fossem discutidos na Assembleia da República, com tempo, precedidos de uma ampla participação e discussão públicas, pois a água é um bem de todos, não é pertença de nenhum governo para dela dispor apenas sob a forma de autorização legislativa e não sob a forma de proposta de lei.
Recordo-vos, Srs. Deputados, que, em 2003, o então governo do PSD-PP tentou fazer uma lei da água sem a submeter à discussão plena neste Plenário, colocando-a em apreciação pública em vésperas de Natal, com prazo marcado até 10 de Janeiro, situação que só foi revertida graças à pronta denúncia da Associação Água Pública e à intervenção do Grupo Parlamentar de «Os Verdes», que alertou os restantes grupos parlamentares para o que se estava a passar.
Da mesma forma, o actual Governo do PS só colocou a matéria da Lei da Água em apreciação pública já depois da sua discussão, na generalidade, aqui, no Parlamento, a qual mereceu as maiores críticas da esmagadora maioria das várias entidades que se pronunciaram, muitas pedindo, inclusivamente, a suspensão da votação final global, exigindo um mais amplo espaço de discussão. Entre elas encontravam-se não só várias associações, como as ambientalistas LPN e Quercus, mas também a Confederação Nacional dos Agricultores, o Movimento dos Utentes de Serviços Públicos e várias estruturas sindicais.
Justificava-se plenamente um maior debate, tal como se justifica plenamente a exigência que, hoje, Os Verdes aqui fazem, de que o Governo retire esta proposta de lei de autorização e apresente uma proposta de lei substantiva à Assembleia da República, para que os diferentes grupos parlamentares possam discutir, na especialidade, e apresentar as suas propostas de alteração. Numa matéria como esta, todo o cuidado é pouco, já que o que está em causa é o acesso a uma das condicionantes fundamentais do próprio direito à vida, o direito à água, como ao ar, que fazem parte do nosso meio ambiente.
Até porque, analisando agora apenas a proposta de lei de autorização, esta, talvez por ser acompanhada, na sua discussão, do projecto de decreto-lei, cai no pecado inaceitável de se apresentar demasiado vaga e pouco concreta na determinação do alcance objectivo e dos limites que o dito decreto-lei deverá, depois, respeitar. Isto, do ponto de vista constitucional e legiferante, é um erro grave e justifica, só por si, a inviabilização da iniciativa do Governo.
Em Julho de 2005, criticámos a proposta do Governo por não ser uma verdadeira lei de bases, apresentando-se mais como um super-regulamento que, a pretexto da transposição de uma directiva comunitária, veio substituir e deitar fora um conjunto de instrumentos legais com longa implementação no nosso país, rodeando-se de um discurso fortemente técnico e hermético, num impulso de reforma em que o diploma que hoje analisamos é não apenas mais um mas aquele em que a privatização dos recursos hídricos se torna mais clara, cristalina e transparente e a desresponsabilização dos poderes públicos pela gestão do bem público água se vai concretizar, com consequências desastrosas para o ambiente e para os portugueses.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Se a Lei da Água do PS veio abrir a porta à privatização da gestão do domínio público hídrico, esta proposta vem materializar, em concreto, a filosofia economicista de transformação da água, mas também dos leitos e margens das massas de água, numa mera mercadoria, num bem venal, à disposição num grande mercado, para quem tenha dinheiro para investir e fazer exclusivamente seu aquilo que é de todos e que ao serviço e disposição de todos deveria estar.
É isso que está aqui em causa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando se assume que se pretende pôr fim a uma filosofia de desincentivo às actividades económicas relacionadas com a água, como se ela existisse, num Portugal em que planos de ordenamento, como o da Albufeira de Castelo do Bode, no rio Zêzere, prevêem aumentos de 400% da construção na área de incidência de um recurso que é o principal abastecedor de água para o consumo humano, por exemplo, da região de Lisboa, ou num país onde os campos de golfe e as marinas se multiplicam como cogumelos. Na verdade, o que se pretende é colocar todas, mas todas, as massas de água à venda, num brutal negócio de milhões para alguns.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É uma vergonha!

O Orador: — É isso que está aqui em causa quando o Estado assume o compromisso de indemnizar os privados, para que estes não corram qualquer risco.
É isso que está aqui em causa quando as concessões ou licenciamentos aos privados do domínio público hídrico são feitos em regime de exclusividade.
É isso que está aqui em causa quando são os privados que se vão autocontrolar, desresponsabilizando o Estado.
É isso que está aqui em causa quando se permite que o privado exerça competências próprias da Administração Pública, como as de licenciar ou fiscalizar.
É isso que está aqui em causa quando se volta a deixar matérias no escuro, criando cláusulas abertas