23 | I Série - Número: 093 | 9 de Junho de 2007
Sr. Ministro da Administração Interna, não creio que tenha sido convincente acerca de algumas matérias, e passarei a dizer-lhe quais. A primeira, acerca do carácter militar, mais do que militarizado tout court, da GNR.
Diz o Sr. Ministro da Administração Interna que é exactamente esse estatuto que, em tempo de paz, permite preparar esta força de segurança para a eventualidade de um período de guerra. De facto, diz muito bem o Sr. Ministro: é prepará-la aqui, no território, em período de paz, para um conjunto de missões que se prevêem de guerra, noutros teatros operacionais.
A questão é não tanto a de discutirmos, hoje, se temos um general de quatro estrelas à frente da GNR mas se sim ou não a GNR está prevista, de uma forma encoberta pelo Governo, como mais um instrumento de política externa. Ora, creio que é isso que se esconde sob o artigo 3.º da proposta de lei orgânica e creio que aí reside um pouco da insatisfação acerca do estatuto aqui previsto para a Guarda Nacional Republicana.
Bem podem os Srs. Membros do Governo entender que se trata de uma qualquer conjectura sem conteúdo, sem substância — «Nada disso se passa nem se passará!» —, mas não é esse o entendimento que podemos ter porque, então, o Governo já teria tomado uma atitude mais assertiva, mais clara, acerca do que projecta para a GNR. É que não faz sentido, não tem qualquer lógica a argumentação do Sr. Ministro.
Diz o Sr. Ministro que «preparam-se em tempo de paz, para uma situação de guerra». Claro, mas isso é em abstracto! E em concreto? Em concreto, é para as operações humanitárias e de paz — e quantas vezes isso é um eufemismo de «operações militares» — que se pretende ter a disponibilidade da Guarda Nacional Republicana para intervir noutros teatros operacionais, de guerra, e não é outra coisa.
É isso que, fundamentalmente, acaba por fazer a diferença, que tem lógica, entre uma PSP civil e uma GNR militar. É que, nestes diplomas, tudo foi alterado do ponto de vista da concepção das nossas forças de segurança.
Ao Bloco de Esquerda pouco importa que a GNR seja ou não o «quarto ramo» das Forças Armadas.
Na verdade, o que importa é o conteúdo das missões que é possível antecipar em relação à Guarda Nacional Republicana. Assim, pelo menos, fica aqui a previsão dessa possibilidade.
Há pouco, o Sr. Ministro não me respondeu a uma questão que não é menor, a de que, com a ida da GNR para o Iraque, foi inaugurado por anterior governo um mecanismo que apenas responsabiliza um órgão de soberania na projecção de uma força de segurança. Não creio que seja uma questão menor no contexto deste problema.
No que respeita às parcerias público-privadas, o Sr. Ministro da Administração Interna, que é um jurista reconhecido, disse-me «bem, veja o diploma!» Ora, vi o diploma, li a exposição de motivos e verifiquei que, realmente, é preambular e que, até de uma forma instrumental, em relação à Escola Prática da GNR, em Portalegre, está prevista uma parceira público-privada.
No entanto, o artigo 3.º da própria proposta de lei está em aberto — e não me desmentirá acerca disto, Sr. Ministro! Face à programação financeira, aliás, com esse argumento absolutamente cândido e original, percebe-se, em relação à referida Escola Prática da GNR, que se trata de uma parceria público-privada e que servirá para libertar efectivos da PSP e da GNR. Devo dizer que considero um argumento extraordinário invocar a vantagem de uma escola construída sob parceria público-privada — e está cá escrito, Sr.
Ministro! Quanto ao artigo 3.º, é em aberto, repito. Estará o Sr. Ministro disponível para limitar a incidência dessas parcerias público-privadas — vide artigo 3.º da proposta de lei? Gostaríamos que assim fosse, Sr.
Ministro.
Posto isto, há que referir, em relação à essência desta proposta de lei de programação, que, em abstracto e em teoria, estamos de acordo com uma lei de programação. A mesma é reclamada há muito e creio que é um instrumento absolutamente necessário para haver uma previsão plurianual dos investimentos nas forças de segurança. No entanto, a sua primeira execução é um exercício de alquimia, porque equivale ao que chamamos um programa «de troca de património e de pessoal por meios», mas sem aumento da despesa, particularmente das despesas de investimento. É uma opção e uma autoresponsabilização política do Governo, mas é um exercício de altíssima complexidade. Naturalmente, vamos acompanhar a execução, mas com um cepticismo muito marcado.
É que, tendo em atenção quer as dificuldades de transferência de um conjunto de meios que, hoje, nas forças de segurança, não estão em funções ditas de polícia, as respectivas reciclagem e afectação e a inserção no que é a actividade normal de polícia e não em meios de retaguarda onde estavam, quer a dificuldade, inclusivamente processual, de libertação e alienação de património num curtíssimo espaço de tempo, não vemos a eficácia deste conjunto de mecanismos nem sequer a celeridade deste tipo de operações.
Deixe-me que lhe diga, Sr. Ministro, estaremos muito atentos e, nesse aspecto, damos a benefício da dúvida à execução desta programação, mas, desde já, com manifesta dificuldade em entender que possamos ter mais do que um mero exercício de retórica para preencher algum calendário político. Em todo o caso, cá estaremos para «dar a mão à palmatória» se assim não for. Mas temos a maior dúvida de que