14 | I Série - Número: 111 | 10 de Setembro de 2008
decorrer de um divórcio decretado contra a vontade de um dos cônjuges.
Acontece, porém, que o Sr. Presidente da República, nos fundamentos do seu veto político, se refere a consequências negativas que a lei poderia ter, que, a nosso ver, a ocorrerem, não decorreriam do texto legal aprovado mas de uma interpretação errónea e forçada das suas disposições.
O Sr. Presidente da República reconhece que os deveres conjugais subsistem no Código Civil e que, cito, «a culpa não desaparece de todo da vida conjugal: deixa de existir para efeitos de subsistência do vínculo matrimonial, mas reemerge no momento do apuramento de responsabilidades». Ora, se assim é, as objecções segundo as quais o desaparecimento da culpa como causa de divórcio deixaria desprotegida a parte economicamente mais fraca deixam de fazer sentido.
Havendo situações de maus tratos, é evidente que, no momento da decisão judicial sobre as consequências patrimoniais do divórcio, essas situações não poderão deixar de ser ponderadas devidamente pelo juiz.
O facto de poder haver um divórcio baseado em causas diversas da culpa não significa que as consequências patrimoniais do divórcio sejam decididas de forma unilateral.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!
O Sr. António Filipe (PCP): — Para isso, há um juiz que decide, com base na lei e na justiça.
Não vemos nada na lei que aprovámos que imponha soluções injustas, e mal de nós se presumirmos que os juízes, podendo decidir bem ou mal, decidem forçosamente mal.
A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Mas insurge-se o Sr. Presidente da República contra a possibilidade de um cônjuge que viole os deveres conjugais, designadamente agredindo a mulher, poder obter o divórcio independentemente da vontade da vítima e afirma, ainda, que o novo regime poderia fazer com que um cônjuge em situação económica mais débil se sujeite a uma violação reiterada dos deveres conjugais, sob a ameaça de o outro poder requerer o divórcio.
Salvo o devido respeito, quer parecer-nos que a consequência lógica desta observação seria a constatação de que o interesse da vítima de maus tratos seria continuar casada com o agressor. E aí temos de dizer claramente que, em situações de maus tratos ou de violência doméstica, nos parece que um divórcio justo é mil vezes preferível a um casamento tormentoso.
Vozes do PCP e do PS: — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — E também não nos parece ter fundamento bastante a ideia de que o regime aqui aprovado conduzisse à redução do número de divórcios por mútuo consentimento e a um correlativo aumento dos divórcios não consensuais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!
O Sr. António Filipe (PCP): — O veto político do Sr. Presidente da República assenta numa concepção segundo a qual, salvo mútuo consentimento, a cessação do vínculo conjugal só pode ocorrer com base na culpa de um dos cônjuges. É uma concepção legítima, mas não é a nossa. Defendemos um regime jurídico do divórcio que contemple soluções justas e que proteja a parte economicamente mais fraca da relação que se desfaz, mas entendemos que não faz sentido obrigar duas pessoas a permanecer casadas por decisão unilateral de uma delas, mesmo que tenha havido uma ruptura de facto da relação conjugal.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.