26 | I Série - Número: 014 | 15 de Outubro de 2010
Na realidade, o Governo tenta criar a ilusão de que, pese embora o estado calamitoso em que se encontra o País (a educação, o ensino superior, a economia, a produção nacional, os direitos dos trabalhadores e da juventude), tudo vai bem no mundo da ciência, como se de uma ilha à parte se tratasse.
Ora, nada podia ser mais falso. Na realidade, o Sistema Científico e Tecnológico Nacional está sujeito às mesmas consequências de uma política de direita que privilegia a concentração dos lucros e a privatização das funções centrais do Estado, sacrificando assim o desenvolvimento nacional justo e equilibrado.
Enquanto o Governo e o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior enviam milhões para instituições privadas estrangeiras e se pavoneiam junto dos laboratórios privados e de limitados nichos, ditos de excelência, que o próprio Governo entende privilegiar, os principais centros e alavancas do Sistema Científico e Tecnológico Nacional —  o ensino superior e os laboratórios de Estado —  vão contando as migalhas de um financiamento cada vez mais distante do necessário.
Enquanto o Governo se vai vangloriando com o crescimento do número de investigadores em Portugal, milhares de bolseiros de investigação científica, investigadores precários contratados a prazo no âmbito dos programas Ciência, ou mesmo a recibos verdes, ou os próprios investigadores de carreira, são em muitos casos forçados a desempenhar todo o tipo de tarefas nas instituições onde trabalham, com cada vez menos tempo efectivamente dedicado à investigação e desenvolvimento, e sempre, mas sempre, com a instabilidade e precariedade a pender-lhes sobre a vida como uma espada. E para o Governo todos esses homens e mulheres altamente qualificados mas sem direitos, sem perspectivas de futuro, sem estabilidade laboral e profissional, contam para engrossar os números da falsificação estatística.
Basta, porém, olhar à nossa volta para que o contraste entre as mentiras do Governo e a realidade se afirme inexoravelmente. Está, hoje, o País mais dinâmico em algum dos sectores produtivos? Existe, hoje, uma política de investigação e desenvolvimento estruturada, orientada para o desenvolvimento? O programa mobilizador e o livro branco anunciado, e até hoje nunca apresentado, reforçaram em algum aspecto os laboratórios de Estado? E, enquanto a propaganda do Governo se difunde, os investigadores continuam sem acesso a equipas técnicas de apoio, os laboratórios do Estado continuam sem os meios de trabalho minimamente adequados.
A título de exemplo, a administração do Laboratório Nacional de Engenharia e Geologia, nomeada pelo Governo, decidiu renovar os seus carros de luxo e gastar mais 100 000 € na aplicação de soalho flutuante no piso administrativo, enquanto a frota de trabalho jaz abandonada nas traseiras do Laboratório, em Alfragide, as instalações se degradam»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): —  » e há uma falta de verbas para as mais elementares tarefas de investigação.
Outro exemplo: os investigadores do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária são forçados a fazer eles próprios as necrópsias aos porcos e aos outros animais, porque há falta de técnicos para as fazer.
O Instituto Tecnológico e Nuclear, depois de ter estado privado de água canalizada devido à antiguidade das tubagens e dos equipamentos, tem agora cortadas as linhas telefónicas, por falta de pagamento, desde 6 de Setembro. Um Instituto onde funciona um reactor nuclear esteve sem água e está sem telefone! É algo de facto inquietante, Srs. Deputados.
Na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa apenas um técnico executa o corte e a preparação de lâminas geológicas para todos os investigadores e professores do Departamento de Geologia e, pasme-se, para quase todas as instituições do País que carecem dessas lâminas.
Muitos investigadores são obrigados a trabalhar sem contrato de trabalho, sem direitos laborais, mesmo quando têm de ser simultaneamente técnicos e investigadores, mesmo quando são obrigados a dar aulas em universidades sem remuneração, como vamos assistindo através da aprovação de regulamentos nas universidades claramente à margem da lei, mesmo quando têm que adiantar dinheiro do seu bolso e ficar meses á espera do reembolso,»
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade!