I SÉRIE — NÚMERO 54
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Embora aparentemente densas e algumas até volumosas, as propostas que hoje trazemos não pretendem
fazer uma revolução no sistema de justiça e muito menos trazer todo um «admirável mundo novo». Trata-se de
alterações mais ou menos pontuais em diversas áreas da justiça — algumas até cirúrgicas — e de propostas
que desenvolvem os sistemas, uniformizam e atualizam os processos. Várias pequenas coisas que, no fim do
dia, podem fazer a diferença na vida dos portugueses.
Todas estas iniciativas resultam, de resto, de uma reflexão profunda e aturada que fizemos dentro e fora do
Grupo Parlamentar, ouvindo vários especialistas em cada área, com ou sem filiação partidária, e não
necessariamente do CDS — pessoas que não têm a mínima preocupação com o símbolo ou com a cor partidária
e cujo único propósito é contribuírem para um Portugal melhor.
Note-se que muitas das iniciativas que aqui trazemos não são mais do que a natural evolução das reformas
que, no passado recente, foram feitas na justiça, algumas delas, aliás, com resultados muito positivos.
Basta olhar para os números dos últimos cinco anos, em que, pela primeira vez desde 2009, o rácio dos
processos cíveis entrados e findos é positivo. Ou seja, desde 2013, há mais processos acabados do que
entrados, o que revela a recuperação nos atrasos.
Mais: de 2014 para 2015, as pendências nos tribunais cíveis de 1.ª instância conheceram uma diminuição
na ordem dos 8%, que atingiu os 13% de 2015 para 2016.
Porém, e apesar destes avanços, a perceção de que a justiça continua má e lenta não é, infelizmente,
desmentida pelos mesmos números: a 31 de dezembro de 2016 continuavam pendentes nos tribunais cíveis de
1.ª instância mais de 1 milhão de processos, com a duração média de dois anos e nove meses. Isto é, desde a
entrada do processo até à sentença, em média, cada processo demora praticamente três anos, sem falarmos
em recursos.
Pior ainda é a situação que se vive nos tribunais administrativos e fiscais. O rácio de processos entrados e
findos é bastante negativo, com uma taxa de acumulações muito preocupante.
De facto, em 31 de dezembro de 2015, a entrada de processos superava em 20% o número de processos
findos, sendo certo que, com os meios que estão atualmente à nossa disposição, seria preciso que um ano
tivesse cerca de 1000 dias — o triplo dos dias de um ano, portanto — para que fosse possível recuperar todos
os atrasos.
Sabemos que não está tudo feito, sabemos que há ainda muito caminho a percorrer e sabemos, acima de
tudo, que a justiça é vista com desconfiança pela grande parte dos portugueses, que sentem que ela não dá
resposta ou a dá tarde demais.
Por isso mesmo, entendemos apresentar seis projetos de lei e seis projetos de resolução, que tocam, de
forma transversal, várias áreas da justiça.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, são cinco os eixos que definimos para um objetivo maior, a confiança
no sistema de justiça, desígnio que esperamos seja comum a todos nesta Câmara.
Simplificação, celeridade, eficácia, transparência e garantias dos cidadãos são os eixos que o CDS elegeu
como prioritários para este conjunto de iniciativas. Passo a exemplificá-los, para esclarecer ao que vimos.
Em matéria de simplificação, destaco duas alterações: a previsão de sentenças orais, proferidas
imediatamente no fim da audiência de julgamento, e a consagração da regra dos depoimentos escritos. Uma e
outra tornam o processo bastante mais ágil e fácil e evitam, no caso das sentenças, a expectativa — às vezes
agonizante — do veredito do juiz. No caso dos depoimentos escritos, não só livra as testemunhas do calvário
da espera pelos corredores dos tribunais, como permite ao juiz determinar, com maior facilidade e rapidez, a
prova a que se destinam.
Contudo, estas não são regras fechadas ou herméticas. Permite-se, naturalmente, que as partes ou o juiz
chamem as testemunhas a depor sobre factos de que tenham dúvidas ou que as sentenças sejam transcritas
sempre que a causa seja complexa ou que as partes dela queiram recorrer.
Quanto à celeridade, recuperámos a ideia da constituição das bolsas de magistrados para resolver os
processos parados há mais de cincos anos nos tribunais administrativos ou superiores a 1 milhão de euros no
caso dos processos tributários pendentes. Para além disso, propomos a remessa para arbitragem, a pedido dos
particulares, dos processos administrativos e fiscais parados há mais de dois anos, para o que é preciso, no
caso da arbitragem administrativa, que o Governo regulamente, coisa que também nós propomos.