I SÉRIE — NÚMERO 81
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Uma mulher com idade inferior a 65 anos recebeu a notificação para deixar a casa, cujo contrato de
arrendamento remonta a 1982, em abril deste ano. Vive com a filha, mas os rendimentos auferidos não suportam
os atuais valores de renda.
Uma mulher, com contrato de arrendamento há 15 anos, recebeu a notificação do senhorio de oposição à
renovação do contrato. Hoje paga 450 € de renda, que o senhorio quer aumentar para 850 €, por um
apartamento em Lisboa com 48 m2 num prédio antigo sem elevador.
São relatos de situações concretas mas que são reflexo da situação em que se encontram milhares e
milhares de famílias no nosso País: moradores e famílias que criaram os filhos e que hoje ajudam a criar os
netos na habitação de uma vida, habitação que se veem na iminência de perder, não porque não tenham
cumprido sempre com as suas responsabilidades — e muitas vezes valorizaram a habitação às suas expensas
— mas sim porque, sem qualquer justificação, o senhorio não quer manter o contrato de arrendamento;
moradores e famílias que quiseram iniciar uma vida independente mas que não encontram estabilidade com
contratos de duração reduzida, renovados anualmente, que os obrigam a andar constantemente com a casa às
costas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Tudo isto é consequência da lei dos despejos imposta por PSD e CDS. Uma
lei que desprotegeu os inquilinos e arrendatários, precarizando o direito à habitação através da total liberalização
dos valores de renda — levando a que estas atingissem valores especulativos e proibitivos para a maioria das
famílias, tendo em conta os baixos rendimentos — e da introdução de mecanismos que têm como objetivo
facilitar o despejo sumário, administrativo e cego das famílias.
Não são comportáveis para as famílias valores de rendas acima dos 850 € por um apartamento T1 em Lisboa
— se for no centro histórico já ascende aos 1800 € —, ou acima dos 1200 € por um T2. No Porto, o valor de
renda de um T1 é superior a 400 € e no caso de um T2 esse valor já sobe para 700 € ou mais. Em Évora,
arrendar um T1 custa 450 € e um T2 já chega aos 700 €.
Que famílias têm a possibilidade de suportar valores desta natureza, tendo em conta o salário mínimo
nacional do nosso País e o salário médio, que ronda os 900 €?
Os trabalhadores, as famílias de baixos e de médios rendimentos, estão a ser expulsos das cidades num
processo de elitização da própria cidade onde só as famílias de rendimentos muito elevados têm a possibilidade
de residir.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — A criação do Balcão Nacional do Arrendamento — que na prática é tão-
somente um balcão com vista ao aceleramento do despejo, retirando os processos da via judicial — revela bem
as intenções de PSD e CDS: pôr as pessoas na rua o quanto antes, sem se importarem se elas tinham para
onde ir ou não.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não houve qualquer dinamização no mercado do arrendamento,
contrariamente ao que PSD e CDS insistem em apregoar. O que houve foi: dezenas de famílias despejadas por
semana; encerramento de inúmeras micro e pequenas empresas, estabelecimentos de comércio, serviços,
restauração e até da indústria e a respetiva destruição de postos de trabalho; encerramento de coletividades de
cultura, desporto e recreio e de outras entidades, como, por exemplo, das repúblicas de estudantes.
É preciso, urgentemente, travar os despejos. É preciso evitar, o quanto antes, que os moradores sejam
obrigados a deixar a casa onde residem. É preciso travar a destruição da atividade económica, o encerramento
do comércio de base local e tradicional. É preciso travar a descaracterização social e cultural dos bairros.
Por isso agendámos este debate e trouxemos uma proposta de revogação da atual lei do arrendamento
urbano, a solução mais adequada para pôr fim aos despejos sumários.