I SÉRIE — NÚMERO 3
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Basta perceber, também, as consequências desta iniciativa: um arrendatário arrenda uma casa já degradada,
que valia menos quando a arrendou. Com esta regra, vai ter de comprar a casa pelo valor mais caro. Que
absurdo!
Outro caso: imaginemos um prédio em que uma casa vale mais, outra vale menos — o rés-do-chão vale
menos do que outros andares, uma casa virada para trás vale menos do que uma casa com vistas melhores,
são assim as regras de mercado. Nesta perspetiva, as casas valem todas a mesma coisa.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Qual mercado!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Que absurda esta legislação!
Por isso, paremos com aquilo que estamos a discutir, nesta irresponsabilidade total! Pelo menos, o Partido
Socialista assuma e siga o bom senso.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Maria
Manuel Rola, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Decreto que discutimos
responde a uma alteração radical no modelo imobiliário e parte de uma constatação, a de que o direito de
preferência já não existia. E não existia ora porque o apartamento em venda não estava registado
autonomamente, ora porque, quando os vendedores não conseguiam fugir à sua atribuição, propunham que o
locado só pudesse ser adquirido se fossem comprados todos os apartamentos ou todos os edifícios em venda.
Foi o que se passou com a Fidelidade, por exemplo. Ninguém aqui acredita que qualquer pessoa que viva
num apartamento tem, sequer, possibilidade de comprar 277 imóveis, mais de 2000 frações — 425 milhões de
euros. Muito sinceramente, Srs. Deputados, é gozar com as pessoas! E é mesmo isto que o negócio imobiliário
tem feito: gozar com as pessoas e fazer desaparecer direitos!
Esta situação configura uma adulteração grosseira do intuito de existência deste direito e o Bloco de
Esquerda propôs a alteração que corrigia essa distorção. Conseguimos a maioria que correspondia a estas duas
questões e que as aprovou em julho. E, agora, analisamo-las novamente e o Bloco de Esquerda apresenta as
clarificações que garantem a resposta essencial às duas reservas do Sr. Presidente da República: a primeira é
um direito reforçado apenas para fins habitacionais; quanto à segunda, concretizamos a definição, a priori, do
locado a preferir através da permilagem. Não retiramos, clarificamos.
Clarificamos, ainda, que qualquer venda que ainda não tenha acontecido é abrangida pela existência destas
alterações assim que estas entrem em vigor; os finalizados, não.
Ora, da parte da direita, que chumbou o diploma inicial, o Bloco de Esquerda não esperava nenhuma defesa
de direitos dos inquilinos. Quando a habitação se confronta com a propriedade, já sabemos que o CDS e o PSD
respondem e quanto mais dependente da finança, da variabilidade e da instabilidade melhor.
Mas não contávamos com o recuo do PS. Não é que não o tenham feito antes e nos mesmos moldes,
privilegiando os grandes grupos. Neste caso, aprovaram duas alterações de fundo em julho e em setembro
aprovam uma e revertem a outra. Isto faz-me lembrar o «não pode, mas pode».
Para clarificar, também aqui — falo, neste sentido, da venda de portefólios de fundos —, Fidelidade, Novo
Banco poderão voltar a invocar o prejuízo da não contratualização do negócio e o direito de preferência volta a
deixar de existir. Esta proposta retalha o Decreto inicial, é um recuo na garantia dos direitos a que,
consensualmente, tínhamos chegado e permite que os fundos continuem a ridicularizar os direitos consagrados,
o Estado e os moradores. E tudo isto com o patrocínio do Partido Socialista.
No entanto, da parte do Bloco de Esquerda, estamos disponíveis para criar condições para atribuir este direito
de preferência a todos os moradores. Não estamos disponíveis para entrar em recuos dos direitos garantidos.
Aplausos do BE.