I SÉRIE — NÚMERO 58
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sem gatekeepers. Confunde-se o cidadão com o editor, confunde-se o comentador com o jornalista, confunde-
se a lei e, por fim, a democracia.
A exposição dos cidadãos a uma desinformação em larga escala é um desafio para todos nós. A internet
mudou profundamente a maneira como os cidadãos acedem e interagem com a informação. A democracia
participativa e inclusiva é disso uma boa consequência, a democracia desinformada e manipulada seria disso
um péssimo resultado.
Há muito para fazer neste contexto por entidades competentes, académicos, profissionais e sociedade civil
em geral. A reflexão e a ação devem considerar três fases no processo, a primeira das quais é a da motivação.
É importante perceber as motivações que subjazem à criação das notícias falsas e assegurar que estas
atividades, lesivas para a democracia, não ficam impunes quando detetadas ou deixadas à mercê de um sistema
de justiça que não está preparado para a sua velocidade, evolução e «difusividade».
Ao nível da disseminação, é fundamental conhecer quais os principais veículos de informação falsa nos
media sociais, bem como o tipo de mensagem veiculada. É fundamental melhorar a capacidade digital e humana
de detetar a sua circulação.
Neste âmbito, a política pública tem de ter três princípios: a responsabilização das plataformas; a valorização
da intervenção cívica, em que os próprios cidadãos denunciam estas situações; e a defesa do verdadeiro
jornalismo, que, com o seu código deontológico, pode constituir o melhor antídoto às notícias falsas.
Finalmente, o impacto e perceção. É fundamental ter uma análise de quem são as pessoas que alcança e
quais as mais permeáveis.
Acima de tudo, é necessário formar cidadãos que tenham a capacidade de análise crítica da informação
enquanto agentes participativos em democracia. Ninguém tem dúvidas de que, a longo prazo, a aposta na
educação é a vacina contra todas as notícias falsas.
No entanto, esta é uma guerra que tem de ser ganha em várias frentes, estando nós, aqui, no Parlamento,
na primeira linha. Há que liderar, dando o exemplo. Estar a deliberar sobre este projeto de resolução antes que
o Parlamento saiba o que o Governo já fez ou antes de fazer um debate aprofundado sobre a matéria, é começar
mal, é demitirmo-nos da nossa responsabilidade enquanto órgão máximo da pluralidade democrática.
O Parlamento tem de assumir esta liderança na plenitude da representação dos vários partidos em termos
normativos e de fiscalização apertada das políticas públicas. Endossar as responsabilidades exclusivamente
para um Governo, qualquer que seja, é abrir as portas para instrumentalizar esse combate e condicionar o
debate público.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Um ecossistema de informação livre, pluralista e bem regulado, baseado
em exigentes padrões profissionais, é indispensável a uma saudável democracia e debate democrático. São
estas algumas palavras das conclusões da Comissão Europeia.
Se queremos combater a desinformação, comecemos, então, por este Parlamento. Só com coragem e
honestidade, no contexto do mandato democrático que todos aqui temos, poderemos apresentar, em conjunto,
as soluções de que Portugal e a nossa democracia precisam.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Uma vez que a Mesa não regista mais inscrições, dou a palavra
à Sr.ª Deputada Carla Sousa, para a intervenção de encerramento do debate desta iniciativa do Partido
Socialista.
A Sr.ª Carla Sousa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projeto de resolução que aqui apresentamos
e que foi debatido hoje é, de facto, um primeiro contributo para uma discussão que, perante os avanços
tecnológicos com que nos deparamos, será, por boas e más razões, um debate recorrente. Aí, saudamos,
claramente, o interesse de todas as bancadas por manter esta questão em aberto.
Nós não estamos a abordar um fenómeno novo, mas ele tornou-se mais complexo, porque a rapidez com
que a desinformação se propaga e é partilhada é muito maior; porque os meios tecnológicos ao dispor permitem