10 DE JULHO DE 2021
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, esta reforma é um desastre e um anacronismo. É um anacronismo tão grande que consegue transferir competências para uma entidade que ainda
não existe, o que, aliás, tem sido apontado por várias pessoas.
Esta reforma tem um motivo: a vingança. É a vingança de um Governo que, por razões ideológicas e de
castigo político, quer desmantelar uma instituição com décadas de provas dadas.
É uma enorme precipitação, porque o que vamos fazer com isto é dizer que não queremos militarizar o
controlo de estrangeiros, mas atribuímos a uma força militarizada o controlo de estrangeiros e de fronteiras. Se
há maior contradição, está aqui mesmo, debaixo de mim, enquanto falo.
Mas nem apenas o desmantelamento do SEF se revela como uma coisa necessária. É que era tão, tão
desnecessário fazê-lo nas costas dos trabalhadores, nas costas dos funcionários, nas costas dos cidadãos,
como trazer à Assembleia da República uma reforma apressada, para não ter de discutir lá fora o
desmantelamento do SEF. Era isto que o Ministro da Administração Interna deveria ter feito, e não, nas costas
dos portugueses, à revelia, tentar desmantelar uma instituição.
Este é um Governo e um País que desistiu de controlar as fronteiras, que desistiu de controlar a segurança
interna e que quer transformar o controlo de fronteiras e a segurança interna numa espécie de agência de
misericórdia da União Europeia e das suas portas.
Há algo que deve ser dito hoje. Se a direita tem uma missão para os próximos anos, quando nos livrarmos
deste Ministro e deste Governo, é a de reverter esta vergonhosa decisão e voltar a trazer o SEF para onde
merece.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para apresentar a iniciativa do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Beatriz Gomes Dias.
A Sr.ª Beatriz Gomes Dias (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Trazemos a este debate um projeto de lei que visa a criação de uma agência para as migrações e asilo, que
tem a missão de melhorar as condições de acolhimento das e dos migrantes e requerentes de asilo,
desburocratizar e simplificar o acesso à cidadania plena, assumindo o desempenho das funções administrativas
que atualmente estão atribuídas ao SEF.
As pessoas migrantes que escolheram Portugal para viver contribuem para a demografia, para o
desenvolvimento da economia, para a sustentabilidade do sistema de segurança social, bem como para a
riqueza e a diversidade social e cultural do País.
Apesar da relevância dos contributos das pessoas migrantes e refugiadas, bem como do reconhecimento,
por parte do Governo, de que Portugal precisa de mais imigração e de mais pessoas a trabalhar, os obstáculos
à regularização das pessoas migrantes persistem.
O Estado português tem falhado em garantir aos cidadãos estrangeiros e às cidadãs estrangeiras a igualdade
no acesso a direitos.
Os atrasos crónicos que se registam no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, nas marcações para a
renovação ou obtenção de autorizações de residência, têm sido denunciados pelas pessoas migrantes e pelas
organizações representativas das pessoas migrantes como um dos principais obstáculos colocados pelo Estado,
que, ao manter milhares de cidadãos e cidadãs estrangeiras em situação irregular, impossibilita o acesso a
serviços públicos, a prestações sociais, ao emprego com direitos, à habitação e ao reagrupamento familiar, entre
outros direitos fundamentais.
A política de migração em Portugal baseia-se no modelo securitário e restritivo, assente em burocracia que
faz coexistir na mesma instituição uma política de imigração, a vigilância e o controlo de fronteiras, o
processamento de documentação, a regulação dos fluxos migratórios e o combate ao tráfico de seres humanos.
Esta é uma opção errada — foi errada no passado e continua a ser errada hoje — e reforça a ideia disparatada
de que os migrantes são uma ameaça contra a qual o Estado precisa de se proteger e que a imigração é um
assunto de polícia.
As pessoas migrantes e requerentes de asilo que procuram Portugal para melhorar as suas condições —
como tantas portuguesas e portugueses fizeram no passado e continuam a fazer — não podem ser tratadas
como suspeitas ou criminosas até prova em contrário. A imigração não deve ser um assunto de polícia e os
direitos das pessoas migrantes têm de ser salvaguardados e protegidos.