I SÉRIE — NÚMERO 89
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O Sr. José Magalhães (PS): — É uma opinião!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Deputado, o problema é sempre o de quem é o dono da verdade. E, numa democracia, não há donos da verdade, ninguém pode ser dono da verdade! E eu obviamente digo que
não confio nem no Governo, nem no Partido Socialista, nem no Estado para nos dizer o que é que é verdade
ou o que é que é mentira. Deixemos o jugo normal democrático existir.
Diz o Sr. Deputado José Magalhães e dizia também a Sr.ª Deputada Constança Urbano de Sousa que já
existem limitações à liberdade de expressão. Com certeza que existem. Mas eu acho que se os senhores dizem
que já existem, então deixemos estar o que está, então, se calhar, não é preciso mexermos mais, não é preciso
criarmos novas limitações à liberdade de expressão para além daquelas que já existem.
E, neste tipo de matérias, eu não ignoro o problema que existe, designadamente quando este tipo de matérias
é política de Estado. Muitas vezes são políticas de Estado para causar prejuízo a democracias e a outros
Estados. Mas como é que temos de tratar isto, Sr. Deputado? É exatamente como tratamos, por exemplo, as
questões do terrorismo na matéria criminal. Esses comportamentos têm de ser criminalizados. Têm de ser
crimes! É por aí que temos de tratar isso.
Ou seja, a propagação de informação falsa, com vista a lançar uma pandemia ou aumentar uma pandemia,
a informação de apelo ao ódio, ao racismo, ao terrorismo, seja o que for, é em sede criminal que essa matéria
deve ser tratada e não na Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital.
Trata-se de uma Carta que, globalmente, é positiva. O foco e o debate que tivemos, na altura, centrou-se
muito nos direitos de autor, e era aí que estava concentrado o nosso foco. E devo dizer que não tenho problema
algum em aprovar a Carta na sua generalidade, mantenho a aprovação da mesma na generalidade.
Mas este artigo 6.º não só não é necessário como não traz nada de bom, como o melhor é, obviamente,
eliminá-lo para não permitir esta dúvida e esta falta de confiança no Estado e nas questões da verdade.
O debate sobre esta matéria e a reflexão que fizemos sobre os vários projetos de lei que estão em debate
teria dois caminhos possíveis. Um, o do Partido Socialista, embora com uma solução diferente, nalguma medida,
da proposta pelo PAN de procurar clarificar, de procurar introduzir e corresponder à intenção europeia,
clarificando as dúvidas — isto porque, obviamente, elas existem. Por isso, o PS nos traz uma proposta e por
isso o PAN também nos traz uma proposta.
Nós olhámos para esse caminho, mas, sinceramente, a conclusão a que chegámos é que a dúvida ficaria
sempre. Não há maneira de encontrar uma boa solução para uma ideia que, em si mesma, é negativa.
O que é que o Estado vai dizer? «Esta é a boa comunicação social, aquela é a má»? «Esta é a que diz a
verdade, esta tem selo de qualidade, a outra não tem selo de qualidade»? É errado!
E é sobretudo errado por algumas razões que o Sr. Deputado aqui disse, sobre as quais, provavelmente,
não teremos a mesma conclusão. Mas o facto em si — lá está! — é o seguinte: nós temos, hoje dia, já, uma
comunicação social extremamente fragilizada e dependente do poder, o que não é bom, é mau.
Ser o poder a financiar a comunicação social é mau, e os bons órgãos de comunicação social não o querem
sequer, querem ser independentes do poder político, do Estado e do dinheiro do Estado. Essa é que é a boa
comunicação social em liberdade e em democracia. E limitar o escrutínio parlamentar é uma fragilidade da nossa
democracia e também tem acontecido. Em cima disso tudo, dar ao Estado o direito de dizer «isto é verdade,
aquilo é mentira; estes estão a fazer bem, aqueles estão a fazer mal!» é um erro! Limitamos ao crime, limitamos
ao que efetivamente deve ser reprovado, seja a difamação, seja o que for, sejam os abusos — muitas vezes,
não são sequer sobre fake news, são sobre factos verdadeiros que violam a privacidade e que, com isso, atacam
e procuram destruir pessoas. Temos visto isso muitas vezes. Vimo-lo, até, muito recentemente — penso que
sabemos do que estou a falar — e é deplorável!
Portanto, esse é que é o caminho certo e não o caminho do artigo 6.º. Visto e ponderado, nós achamos que
ele deve ser revogado. E não somos os únicos. Se os Srs. Deputados virem, a própria ERC não parece
acompanhar de maneira nenhuma o projeto que o Partido Socialista nos traz hoje e a Ordem dos Advogados
fala em «duvidosa constitucionalidade», por limitar o direito à informação e à liberdade de expressão. É por isso
que nós achamos o seguinte: mantenhamos a Carta, eliminemos esse artigo 6.º e deixemos para outros
diplomas, designadamente em sede de matéria criminal, tratar daquilo que são crimes e daquilo que são ataques
à democracia, aos direitos humanos ou aos direitos individuais.