I SÉRIE — NÚMERO 5
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Depois, também é importante lembrar que os jogos sociais do Estado são uma grande fonte de financiamento
das políticas sociais do Estado, em diversas áreas como a saúde, a solidariedade social, a educação, o desporto,
a cultura e até na prevenção e combate à adição.
Ora, aquilo de que estes projetos hoje vêm falar é de fazer restrições à publicidade a esses jogos e apostas
legais através de alterações ao Código da Publicidade. A maioria dos projetos fundamenta essas alterações
recorrendo a um artigo de dois investigadores da Universidade do Minho que refere que os jogadores
portugueses são os que, na Europa, mais gastam em lotaria instantânea e distinguem as raspadinhas dos
restantes jogos, porque referem ter características que favorecem a ocorrência de comportamentos aditivos e
patológicos.
Contudo, uma das coisas que esses próprios investigadores também afirmam é que não existem ainda
estudos científicos robustos e suficientes para suportar qualquer tipo de conclusão no nosso País. Até a própria
DECO (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor), que apresentou um parecer sobre os projetos
que estão aqui em análise, refere a necessidade de termos estudos epidemiológicos que permitam perceber a
real dimensão do problema. Portanto, este é o contexto daquilo que estamos aqui a discutir.
Contudo, se formos ver em detalhe, a maioria dos projetos incide quase exclusivamente sobre a lotaria
instantânea, a chamada «raspadinha», esquecendo, por exemplo, as apostas desportivas online. Alguns
passam mesmo por cima desta realidade.
Porém, apesar de esse artigo científico referir que as raspadinhas têm características que favorecem os
comportamentos aditivos, aquilo que temos, hoje em dia, de dados científicos existentes, não permite concluir
isso. Por exemplo, é verdade que a receita da raspadinha tem subido muito nos últimos anos, mas, analisando
os dados da Santa Casa, aquilo que sabemos é que houve um aumento da população jogadora, de 17%, em
2012, para 53%, em 2019. Ou seja, é uma evidência que há um crescimento do jogo e da receita, mas que
acontece pelo aumento da base de jogadores e não pelo aumento do gasto per capita, este, sim, decisivo para
identificar padrões de adição.
Portanto, dado este contexto, porquê, então, proibir a publicidade exclusivamente na lotaria instantânea e
não fazer o mesmo nos restantes jogos? Ainda para mais, quando a Santa Casa afirma que já nem faz qualquer
publicidade à raspadinha nos meios de comunicação. Porquê? Porquê exclusivamente à raspadinha?
Além de que, sabemos nós, a ausência de publicidade, que, muitas vezes, não é só divulgação, é também
informação sobre aquilo que é o jogo, pode ter como consequência o aumento da procura pela oferta ilegal. Ou
porquê impor restrições à publicidade a empresas com sede em Portugal, como faz o projeto do PCP, quando
sabemos que a oferta de jogo ilegal, especialmente online, provém, sobretudo, de empresas com sede noutros
países que não Portugal?! Porquê especificarmos Portugal, quando o problema é bem mais abrangente?! Não
faria mais sentido clarificar que deve ser permitida publicidade apenas às entidades que estejam legalmente
habilitadas a explorar jogos e apostas em Portugal? Ou até prever contraordenações para os operadores ilegais
que atuam sem licença?
Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, há, desde logo, duas evidências. A primeira é a de que
precisamos de mais estudos sérios e aprofundados que permitam fazer um diagnóstico exaustivo dos padrões
de jogo e de apostas, da sua evolução ao longo do tempo e até da incidência de padrões de adição. E, por outro
lado, a de que poderiam fazer sentido outras alterações ao Código da Publicidade, de âmbito muito mais
alargado do que aquele que, hoje, é aqui discutido, mas necessitam, evidentemente, da devida ponderação e
discussão atempada.
Que não fiquem dúvidas de que, para o PS, este tema é muito importante, merece atenta análise e discussão,
mas, por isso mesmo, não podemos fazer meras alterações ad hoc, que até podem ter o efeito contrário ao
pretendido, sem a devida discussão séria de alterações profundas ao Código da Publicidade.
Entendemos que há aqui um início de caminho, como, por exemplo, aquele que é sugerido…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Filipe Pacheco (PS): — Concluo, Sr. Presidente.
Como dizia, entendemos que há aqui um início de caminho, como, por exemplo, aquele que é sugerido no
projeto do PAN, que é o da criação de um plano nacional de combate aos comportamentos aditivos associados