I SÉRIE — NÚMERO 23
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O Sr. Presidente: — Bom dia, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da autoridade.
Está aberta a sessão.
Eram 10 horas e 5 minutos.
Peço que sejam abertas as portas das galerias.
Vamos dar início à nossa reunião plenária, cujo primeiro ponto da ordem do dia, que foi fixada pelo Grupo
Parlamentar do PAN, consta do debate conjunto, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 999/XIV/3.ª (PAN) —
Reconhece e regula a figura do animal comunitário, reduz o prazo de reclamação dos animais não identificados
recolhidos nos CRO, e atribui ao Estado o encargo com os programas de esterilização de animais errantes ou
comunitários, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 27/2016, de 23 de agosto, à décima alteração ao
Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, e
à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de dezembro, 1001/XIV/3.ª (PAN) — Alarga a tutela
criminal a todos os animais vertebrados, procedendo à quinquagésima quarta alteração do Código Penal,
514/XIV/2.ª (PCP) — Cria uma campanha nacional de esterilização de animais no ano 2021, e 1015/XIV/3.ª
(Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — Altera o Código Penal, alargando a proteção penal a todos os
animais vertebrados.
Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Declaração de Cambridge sobre a Consciência em Animais Humanos e Não Humanos, que data de 2012, representa um marco na
consensualidade científica em torno da senciência animal.
Esta evidência elevou a fasquia da nossa responsabilidade coletiva sobre a forma como tratamos os outros
animais, nomeadamente através dos instrumentos jurídicos. A ciência veio validar aquilo que empiricamente já
era do domínio público, ou seja, que os animais têm medo, fome, sentem frio, calor e dor, são capazes de
comportamentos consequentes, são seres com vidas emocionais ricas e que exigem de nós respeito, proteção
e um tratamento digno. Um debate que nasce na ética, passa pela ciência e pela sociedade civil tem,
evidentemente, de se espelhar na lei.
Por isso, o PAN traz hoje aqui dois diplomas. Comecemos por falar do projeto de lei que visa proteger os
animais que, noutros países, já há muito estão protegidos, mas que, infelizmente, por cá, continuam esquecidos.
São muitos os casos de cavalos esqueléticos, maltratados ou mortos, muitos dos quais abandonados e
largados, nas vias públicas, à sua sorte, que, no nosso País, apesar de já não serem considerados coisas no
Código Civil, continuam a ser tratados como tal no Código Penal.
Já em 2014, recorde-se, o Conselho Superior da Magistratura alertou esta Assembleia para a incoerência de
se proteger penalmente apenas os animais que fossem utilizados como companhia, deixando para trás outros
animais, vítimas de crueldade e que sentem e sofrem como esses. Citamos: «Não se compreende a razão de
se considerarem legítimos os casos de violência ou maus-tratos injustificados infligidos a um burro, a uma vaca,
a um cavalo ou a um veado».
Também a Ordem dos Advogados, em 2016, em parecer escrito dirigido a esta Assembleia, louvou «a
intenção de estender a tutela penal a outros animais, que não apenas os de companhia, orientação que vai ao
encontro do sentimento de justiça geral de proteger da violência desnecessária e evitável os outros seres
sencientes que connosco partilham o planeta», considerando, por isso, incompreensível que a tutela penal não
fosse alargada a todos os animais.
Sr.as e Srs. Deputados, podemos, portanto, concluir que todos os operadores judiciários estão mais do que
preparados para receber e aplicar uma lei como a que hoje aqui propomos.
Mas falemos também da realidade dos outros países que nos estão culturalmente próximos. Como se
protegem os animais, independentemente do seu fim, noutros países?
Ora bem, a Alemanha já prevê, desde o ano de 1972, na sua lei de proteção dos animais, a tutela penal de
todos os animais vertebrados, protegendo-os da morte e dos maus-tratos injustificados. Tal como se proclama,
logo no primeiro parágrafo dessa lei, «ninguém deve causar dor, sofrimento ou dano a um animal sem um motivo
justificado». Mas o exemplo penal alemão não se trata de uma qualquer sofisticação isolada.