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II SÉRIE — NÚMERO 32

Assim, onde o Governo referia ao Conselho Nacional do Plano ter pronto «um projecto de delimitação dos sectores público e privado que permitirá assegurar a contribuição da iniciativa privada e cooperativa com vista à concretização de projectos de investimento que não tenha lógica reservar ao sector público», foi aditada, para uso da Assembleia de República, a frase «para o qual solicita autorização legislativa» (p. 78, 1. 5.a). E, a p. 80 do mesmo texto, foram claramente aditados dois novos parágrafos às considerações sobre política de investimento do sector público, nos quais se anuncia à Assembleia da República aquilo que se ocultara ao Conselho Nacional do Plano «o Governo preparou também um projecto de modificação das bases gerais das empresas públicas, para emissão do qual solicita a necessária autorização legislativa»!

As discrepâncias entre os dois textos, o silêncio do Governo sobre as alterações e a forma como os deputados puderam verificá-las são de tal gravidade que não fica sequer excluída a hipótese de se estar perante uma contrafacção. Entretanto, não se tendo conhecimento de qualquer clarificação emanada do Governo ou da reconsideração dos termos em que se encontra até ao momento formulada a proposta de lei n.° 137/11, importa desde já extrair conclusões da conduta governamental.

3 — Ê, na verdade, significativo que, três dias após a pesada derrota eleitoral sofrida pela sua política e poucos dias antes da demissão do Primeiro-Ministro Pinto Balsemão, tenha sido remetida à Assembleia da República pelo Conselho de Ministros, nas circunstâncias que ficaram atrás apontadas, uma proposta tendente a aproveitar o debate e a votação das leis do OGE e do Plano para 1983 para fazer passar, sub-rep-ticiamente, duas peças fundamentais do seu plano de liquidação das nacionalizações e do sector público e de restauração do poder do grande capital.

Em quaisquer circunstâncias, já seria escandaloso que o Governo pretendesse aprovar nova legislação sobre a delimitação de sectores e o estatuto das empresas nacionalizadas mediante autorização legislativa, furtando-se a um debate amplo e público na Assembleia da República. Mas o expediente a que o Governo acaba de lançar mão representa um colossal escândalo.

Através dele, o Governo e a AD procuram, obviamente, reduzir o impacte público da nova operação subversiva contra as nacionalizações e munir-se rapidamente dos instrumentos jurídicos necessários para a levar a cabo, antes que sejam varridos do poder. Mas ta] procedimento, que ofende gravemente as regras e os princípios democráticos do funcionamento das instituições e rebaixa a Assembleia da República, visa também desencadear novas e perigosas confrontações entre órgãos de soberania.

4 — Que se trata de um subterfúgio ilegítimo ao serviço de um plano subversivo tendente à intensificação do assalto às nacionalizações não sobram dúvidas, examinado que seja o teor concreto das propostas que o Governo pretende emanar ao abrigo das autorizações legislativas contrabandeadas na proposta de lei n.° 137/11. Na verdade:

4.1 — As propostas anunciadas pelo Governo no tocante à revisão da lei de delimitação de sectores visam:

a) Abrir a banca e os seguros ao grande capital, facultando ao Governo a livre fixação das

condições de exercício das respectivas actividades (nova redacção prevista para o artigo 3.° da Lei n.° 46/77);

b) Garantir a plena libsrdade de acesso do capi-

tal privado às indústrias adubeira e cimen-teira (nova redacção prevista para o artigo 5.°, n.° 1);

c) Permitir o acesso do capital privado à indús-

tria de refinação de petróleo, em condições a definir livremente pelo Governo (nova redacção do artigo 5.°, n.° 4), que poderá também autorizar o exercício da actividade dos transportes por empresas privadas (nova redacção do artigo 4.°, n.° 2);

d) Manter reservada ao sector público apenas

a prestação de serviços essenciais não rentáveis, abrindo, mesmo assim, ao capital privado subsectores do saneamento básico, como a recolha de lixos em aglomerados populacionais e o saneamento básico fora dos aglomerados populacionais [nova redacção da alínea d) do artigo 4.°}.

4.2 — Quanto às propostas relativas ao estatuto das empresas, elas revelarem toda a sua dimensão, o plano governamental de desmantelamento do sector público e a liquidação do seu papel motor da actividade e do desenvolvimento da economia.

O Governo pretende consagrar legalmente a privatização do estatuto das actuais empresas públicas, abrir caminho à sua cisão, extinção e passagem, no todo ou em parte, para o sector privado, permitir a gestão de empresas públicas pelo capital privado, destruir todos os mecanismos de gestão unificada do sector público e viabilizar a formação de um conjunto de autênticos grupos económicos, com capitais públicos, mas submetidos às normas e critérios de gestão do sector privado e aos interesses da reconstituição do poder do grande capital. Para isso, a proposta agora revelada:

a) Determina a transformação em sociedades anónimas de responsabilidade limitada (e consequente sujeição às regras de direito privado) de todas as actuais empresas públicas, ainda que directa e integralmente nacionalizadas, que não tenham por objecto principal a exploração de serviços públicos ou quaisquer actividades em regime de exclusivo, bem como das que, tendo embora tal objecto, não sejam consideradas pelo Governo «instrumentos directos da sua política» (artigo 45.°). Deixaria de estar assegurada, em relação a tais empresas, a subordinação ao Plano (constitucionalmente obrigatória!), a respectiva gestão passaria a reger-se por padrões que postergam a prossecução do interesse público, poderiam ser livremente vendidas as participações financeiras que detenham, nenhum direito constitucionalmente reconhecido aos trabalhadores ficaria assegurado, poderiam ser cindidas, extintas ou ver modificado o seu estatuto por mera deliberação de assembleia geral (que, estando representado o Estado, poderia funcionar e deliberar validamente sem que se exija número mínimo de asso-