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II Série — 4.º Suplemento ao n.º 47

Quarta-feira, 2 de Abril de 1986

DIÁRIO

da Assembleia da República

IV LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

SUMÁRIO

Comissão de Economia, Finanças e Plano:

Acta da reunião de 23 de Março.

Acta da reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano de 25 de Março de 1986

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas.

O Sr. Presidente: — Vamos iniciar a discussão, na especialidade, do orçamento do Ministério da Saúde.

Não sei como é que os Srs. Deputados pretendem que se inicie este debate, mas creio que podemos seguir uma das duas metodologias que têm sido aplicadas, ou o responsável do Governo, neste caso a Sr.8 Ministra da Saúde, principia fazendo um rapidíssimo enquadramento das implicações orçamentais do seu ministério, não repetindo necessariamente aquilo que já disse nas comissões especializadas, ou a Mesa concede, desde já, a palavra a um Sr. Deputado de cada grupo parlamentar para colocar as questões que entender.

Pergunto à Sr.a Ministra se pretende fazer alguma intervenção de abertura do debate.

A Sr.8 Ministra da Saúde (Leonor Beleza): — Se o Sr. Presidente me der licença, gostaria, efectivamente, de começar por fazer uma breve intervenção.

O Sr. Presidente: — Nesse caso, tem V. Ex.a a palavra, Sr." Ministra.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de aproveitar esta oportunidade para fazer algumas referências, de carácter geral e particular, sobre o orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Enfim, vou falar do orçamento do Ministério da Saúde em geral, mas presumo que aquele com que nos vamos preocupar mais detidamente é o orçamento do Serviço Nacional de Saúde.

É evidente para todos nós que a saúde é de um bem precioso e, de alguma maneira, é sempre possível dizer — e, em certa medida, é verdade — que o dinheiro

gasto com a saúde não é suficiente. Com efeito, é sempre possível fixarmos metas mais ambiciosas em relação ao que gostaríamos de fazer no âmbito da saúde e, embora exagerando um pouco, pode dizer-se que todos gostaríamos de ter o mais perto possível da nossa porta cuidados de saúde a todos os níveis, desde os mais simples aos mais sofisticados.

Todavia, dado que as coisas não são assim tão simples e, para além disso, a saúde não está isolada de todo o resto, isto é, de todas as outras despesas que o Estado tem que realizar, temos que, por um lado, nos limitar a prestar os cuidados de saúde que podemos pagar e que, num sistema como o nosso, podemos, em termos de esforço, pedir com razoabilidade aos cidadãos contribuintes e, por outro lado, justificar que cada escudo que é gasto na saúde é bem gasto.

Por tudo isto, o Governo entende que não basta limitarmo-nos, eventualmente, a constatar que o orçamento da Saúde não chega para tudo aquilo que gostaríamos de fazer. Os recursos são escassos e, portanto, é necessário optar por gastar num ou noutro sector.

Do ponto de vista do Governo, só faz sentido discutir as verbas da saúde em termos globais no enquadramento, também global, das despesas do Estado. Entende também o Governo que só é justo pedir um esforço maior neste sector — e, aliás, o problema não se põe exclusivamente em relação à saúde — se ele próprio tiver meios de, em termos de gestão, assegurar uma produtividade social superior àquilo que gastamos. Não basta gastar mais por gastar; como é óbvio, é preciso ter a certeza de que aquilo que gastamos a mais pode resultar em maiores benefícios para os cidadãos.

Vou passar a referir alguns aspectos que têm a ver com a gestão e também com esta capacidade de assegurar uma produtividade superior.

Assim e em termos de financiamento, sabe-se que, nos termos da Constituição — e vou abordar desde já um problema que tem a ver com um diploma que saiu recentemente —, o Serviço Nacional de Saúde é gratuito, isto é, no momento em que os cidadãos recebem cuidados de saúde não se lhes pode exigir que paguem alguma coisa parecida com o custo desses cuidados de saúde. No entanto, é inteiramente legítimo ao Serviço Nacional de Saúde exigir dos subsistemas cujos beneficiários utilizam serviços do Serviço Nacional de

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Saúde que paguem o preço dos cuidados prestados aos seus beneficiários. Naturalmente que o Serviço Nacional de Saúde não o pode exigir dos beneficiários, porque isso seria inconstitucional, mas pode fazê-lo em relação aos próprios subsistemas. Por outro lado, também é legítimo ao Serviço Nacional de Saúde — como, aliás, o reconhece a Lei do Serviço Nacional de Saúde — exigir o pagamento de taxas moderadoras, que não podem traduzir-se em pagamento dos custos dos serviços prestados, mas podem ser meios dissuasores de utilização excessiva dos serviços ou, por outras palavras, meios que assegurem alguma racionalização na utilização dos cuidados de saúde.

Como os Srs. Deputados sabem, as taxas moderadoras, bem como algumas questões relacionadas com o pagamento pelos subsistemas, foram, no passado, declaradas como inconstitucionais por razões não de fundo mas de carácter formal. Todavia, o Governo entende que está fora de qualquer dúvida a constitucionalidade do decreto-lei que foi recentemente emitido e que tem a ver com o pagamento pelos subsistemas das despesas com os respectivos beneficiários e com as taxas moderadoras a pagar por todos os beneficiários, quer os do Serviço Nacional de Saúde, quer os dos subsistemas. Obviamente que as taxas moderadoras que virão a ser fixadas não se situarão, nem de perto nem de longe, ao nível dos custos, pois isso significaria pôr em causa o princípio constitucional da gratuitidade. De resto, quem olhar para a estrutura das despesas do Serviço Nacional de Saúde e para aquilo que está previsto na proposta de Orçamento em termos de receitas do sistema verificará que não há nenhuma comparação possível entre o valor total das receitas próprias do Serviço Nacional de Saúde previsto e o valor das despesas deste Serviço. Portanto, aquilo que vier a ser cobrado em termos de taxas moderadoras não é, de modo nenhum, aproximado do custo daquilo que é efectivamente recebido. Isto significa que no momento em que um cidadão faz uso de um serviço de saúde paga uma pequeníssima parte daquilo que corresponde ao custo do que recebe; o resto, como todos sabemos — embora a Constituição diga que é gratuito —, é pago pelos contribuintes, isto é, por todos nós, cidadãos, que pagamos impostos.

Por outro lado, é também evidente que, se as taxas moderadoras não têm como objectivo imediato fazer pagar o que quer que seja comparável com os custos, o respectivo montante, acrescido daquilo que o Serviço Nacional de Saúde receberá dos subsistemas, aliviará, numa parte pequeníssima, as despesas do Serviço Nacional de Saúde.

No que diz respeito à organização do sistema, no entender do Governo, há melhorias muito substanciais a introduzir, relativamente às quais referirei dois aspectos em particular, e desde logo a responsabilização das administrações regionais de saúde pela elaboração de orçamentos e pelo cumprimento dos mesmos.

Entende o Governo que as administrações regionais de saúde devem ser instrumentos extremamente importantes de organização do sistema do Serviço Nacional de Saúde, pelo que precisam de uma maior autonomia e de uma maior responsabilização por aquilo que fazem. Até agora temos vivido num sistema em que as ARSs apresentam facturas ao Departamento de Gestão Financeira do Ministério, que são pagas; mas, naturalmente, teremos de passar para um sistema — e neste momento isso já está a ser iniciado — em que as ARSs

funcionam com base em orçamentos que elas próprias discutam com o Departamento de Gestão Financeira e por cujo cumprimento sejam responsáveis.

O País não é tão igual em toda a sua extensão que não se deva introduzir diferenças importantes em relação a uma série de aspectos, consoante as zonas do País que estão em causa. O sistema que até agora tem sido posto em prática tem-se revelado, em muitos casos, gerador de grandes diferenças de tratamento dos cidadãos que se encontram numa ou noutra parte do País, traduzindo-se no facto de cidadãos de zonas mais favorecidas do País receberem, em termos de saúde, uma contribuição mais forte do Orçamento do Estado que financia o Serviço Nacional de Saúde do que outros cidadãos que se encontram em zonas mais desfavorecidas. Portanto, um planeamento adequado das despesas das ARSs deve conduzir também a alguma melhoria nesta assimetria com que aquilo que prestamos se tem vindo a distribuir.

Há ainda um outro aspecto que também tem a ver com a organização do Serviço Nacional de Saúde e que diz respeito às relações entre os cuidados diferenciados e os cuidados primários, ou, se quiserem, entre, por um lado, as ARSs e os centros de saúde coordenados por estas e, por outro lado, os hospitais. Pelo menos em relação aos hospitais distritais é possível caminhar rapidamente para uma melhor articulação. Isto tem a ver, por exemplo, com uma coisa extremamente importante que é a utilização total dos recursos de que o Estado dispõe nos cuidados de saúde que são prestados aos cidadãos. Hoje, existem, por exemplo, equipamentos nos hospitais que não são totalmente utilizados e, em virtude da organização do Serviço Nacional de Saúde, há, por vezes, alguma dificuldade, por parte dos cuidados primários, em recorrer a esse tipo de equipamento. O País é um, o Serviço Nacional de Saúde é outro, o Estado que paga as despesas com a saúde é o mesmo e, portanto, não se justifica que, pelo facto de haver hoje uma diferença tão grande entre aquilo que está nas ARSs e aquilo que está nos hospitais, não haja um recurso integral por parte dos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde, situem-se eles num ou noutro nível, àquilo que o Estado dispõe em termos de equipamento.

Ainda em relação à gestão e à optimização da forma como as coisas se processam, gostaria de referir um outro aspecto importante, que se prende com a estrutura das despesas. É evidente que uma gestão óptima deveria poder escolher, em cada momento, entre gastar em pessoal ou gastar em consumo, isto é, gastar em pessoal ou gastar em equipamentos. No entanto, há alguma rigidez relativamente a certas despesas, as quais referirei dentro de momentos, que impedem que isso seja sempre assim.

No que diz respeito às verbas de que o Governo dispõe para o sector, em 1986 o financiamento atribuído pelo Orçamento do Estado ao Serviço Nacional de Saúde crescerá, nos termos da proposta do Governo, 16,7% em relação a 1985, o que é manifestamente superior à taxa de inflação prevista. Em relação às despesas de consumo corrente, no projecto que entreguei na Comissão de Saúde, Segurança Social e Família nenhuma rubrica, excepto a de medicamentos, cresce menos de 14%, o que é um ponto importante. Repito: comparando consumos em 1985 e consumos previstos em 1986, nenhuma rubrica, excepto a de medicamentos, cresce menos de 14%. Por outro lado, e no que

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respeita ao PIDDAC, como sabem, em termos globais, ele cresce 26,5% em relação a 1985, destinando-se na sua quase totalidade a investimentos no Serviço Nacional de Saúde. E isto sem contar com as despesas no âmbito dos PIDRs, onde há um investimento substancialmente superior em relação a 1985 em equipamentos de saúde.

O peso do orçamento do Serviço Nacional de Saúde no Orçamento do Estado, se não forem tidas em conta as despesas com os juros da dívida pública, mantém--se sensivelmente ao mesmo nível de 1985. No Orçamento do Estado há, de facto, um bloco de despesas que têm a ver com os juros da dívida pública, que, como os Sr. Deputado sabem, não pode deixar de cumprir-se exactamente nos termos em que essa responsabilidade foi assumida pelo Estado Português.

É verdade que o Governo não definiu a saúde como o sector prioritário em 1986. As opções orçamentais que foram tomadas aqui, como nos outros sectores, devem naturalmente ser encaradas em conformidade com essa opção.

Por outro lado, é certo que a verba que é atribuída pelo Orçamento do Estado ao Serviço Nacional de Saúde ou às suas despesas correntes acusa uma ligeira descida em percentagem sobre o PIB. Contudo, obviamente que não seria possível simultaneamente diminuir o peso do Estado na economia, acomodar os juros correntes, que são consequência das decisões que foram tomadas no passado, aumentar a componente do investimento e fazer subir em percentagem sobre o PIB as despesas correntes de cada ministério.

No entender do Governo, os cidadãos não vão ver descer, em 1986, o nível de cuidados de saúde. Pelo contrário, é nossa opinião firme que melhorias significativas na gestão dos serviços de saúde e dos recursos que temos à nossa disposição poderão causar melhorias na forma como os cidadãos são atendidos por esses serviços, e é essa a aposta do Governo. De resto, como disse, só vale a pena gastar mais se for possível garantir uma maior produtividade social daquilo que é gasto.

Deparamos com algumas limitações em relação à possibilidade de optimizar os recursos de que dispomos. Por exemplo, se compararmos os anos de 1985 e 1986, a relação entre despesas com pessoal e despesas com consumo no Serviço Nacional de Saúde é, em 1985, de 94,4% e será, em 1986, de 65,3%. Isto significa que aquilo que se gasta com pessoal sobre o que se gasta com consumos era anteriormente inferior mas agora passa a ser superior. A razão disto tem a ver com a relativa rigidez das verbas gastas com pessoal. Aliás, sobre esta questão gostaria de fazer algumas reflexões, que têm a ver com o saber se há suficiência ou insuficiência de pessoal técnico de saúde e muito particularmente de médicos.

É evidente que, como disse há pouco, dado que os recursos de que dispomos não são ilimitados, seria bom que em cada momento estivéssemos em condições de optar entre gastar em pessoal ou gastar em consumos ou investimentos. Do ponto de vista do Governo, não basta limitarmo-nos a discutir se há ou não pessoal de saúde a mais e, nomeadamente, se há ou não médicos a mais. O que é importante saber em cada momento é se temos ou não dinheiro para gastar com mais profissionais, se, eventualmente, chegarmos à conclusão de que eles faltam. Por outro lado, é também necessário que possamos, em cada momento, assegurar aos profissionais de saúde a possibilidade de trabalharem.

Sabemos que hoje muitos profissionais de saúde, e nomeadamente médicos, se queixam — e com razão — de que não têm meios suficientes para desempenharem as missões que lhes cabem. Diria que, de certa maneira, pode parecer masoquismo dos responsáveis limitarem--se, quando eventualmente a despesa seria mais bem feita num outro sector, a fazer crescer o pessoal de saúde e com isso aqueles que se virão queixar de não terem condições razoáveis para trabalhar.

Muitos médicos sabem que isso é verdade e, aliás, estão aqui, nesta Comissão, vários médicos que conhecem bem as condições difíceis em que os profissionais de saúde muitas vezes trabalham.

Em todo o caso, é preciso ter em conta que ainda recentemente a Assembleia da República obstou a que o Governo usasse de mais alguma flexibilidade nesta gestão dos recursos, nomeadamente em pessoal. É, de certo modo, estranho que em comparações que foram feitas entre o Orçamento de 1985 e o Orçamento de 1986 se tenham excluído os gastos com pessoal e, nomeadamente, com mais pessoal, como se desses gastos não resultasse nenhum benefício para os cidadãos utentes dos serviços de saúde. Com efeito, no âmbito da Comissão de Saúde, Segurança Social e Família foi feita uma comparação entre os gastos do Serviço Nacional de Saúde em 1986 e 1985, excluindo os gastos com pessoal e, nomeadamente, com mais pessoal, como se daí não resultasse nenhuma melhoria, o que, do ponto de vista do Governo, não é muito coerente com a ideia na base da qual há algumas semanas foi retirada ao Governo alguma margem de flexibilidade para pagar mais ou menos a determinados profissionais de saúde.

As despesas com pessoal deverão, aliás, crescer, em 1986, um pouco de 25%. É claro que 16,5% desse crescimento é imputável a melhorias salariais e o restante à existência de mais pessoal ou de pessoal mais qualificado no âmbito do Serviço Nacional de Saúde. Entende o Governo que vale a pena fazer esta despesa — e por isso a propõe —, porque acha que daquilo que é gasto a mais com pessoal pode resultar benefícios importantes para a população. Também por isso, o Governo tem uma certa dificuldade em entender que se proceda como se essas despesas fossem um peso morto no orçamento do Serviço Nacional de Saúde, pois isso não é verdade.

Quanto a despesas do Serviço Nacional de Saúde, digamos que há duas grandes rubricas que poderíamos comparar: por um lado, aquilo que é gasto com as administrações regionais de saúde e, por outro, aquilo que é gasto com os hospitais, ou seja, como tendencialmente poderia dizer-se, aquilo que é gasto com cuidados primários e o que é gasto com cuidados diferenciados.

Como se sabe, isto não é rigorosamente assim porque, em virtude de prática administrativa e arranjo orçamental subsequente, as despesas imputadas às ARSs englobam, em alguma medida, despesas relacionadas com cuidados diferenciados. Por exemplo, é por via das ARSs que são pagas as facturas tanto de medicamentos como de convenções. As facturas de medicamentos pagas pelas ARSs englobam aquilo que é receitado nas consultas externas dos hospitais e as despesas com convenções englobam, em muitos casos, cuidados sofisticados e até despesas de internamento. Há ainda alguns casos que, como disse, têm de ser incentivados de utilização nos hospitais de meios auxiliares

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de diagnóstico para consultas realizadas no âmbito dos cuidados primários. Portanto, uma coisa e outra tornam difícil estabelecer, com os dados resultantes do Orçamento, uma comparação entre aquilo que é gasto com cuidados primários e aquilo que é gasto com cuidados diferenciados. Aliás, não há uma grande alteração de 1985 para 1986 na relação entre estas verbas.

Relativamente às ARSs, os gastos com o pessoal crescem — de resto na média do Orçamento — cerca de 25%, o que, para além de ter a ver com o aumento dos vencimentos, se prende sobretudo com admissões de clínicos gerais em 1985 e 1986. Entre Março de 1985 e Janeiro de 1986 foram colocados — e este é um número importante — 2244 clínicos gerais em todo o País, garantindo hoje uma cobertura quase total do território, de acordo com aquela ratio que foi estabelecida de 1500 cidadãos para um médico de clínica geral. No entanto, entendemos que ainda têm de ser feitos retoques, nomeadamente em termos de dados actuais, sobre o número de cidadãos existentes em cada uma das zonas em causa. Por outro lado, tendo em atenção que não é a mesma coisa 1500 cidadãos em Trás--os-Montes ou 1500 cidadãos em Lisboa, tem de haver alguma adaptação da escolha que fazemos em termos do número de médicos à dispersão habitacional da zona em causa e à estrutura da população.

Quanto às despesas com convenções, nos termos previstos, elas deverão crescer, de 1985 para 1986, 14%, isto é, prevê-se uma manutenção da despesa em termos reais. Esta rubrica tem uma grande importância em termos da concepção do próprio sistema que está em causa, e, por isso, vou pedir-vos dois ou três minutos de atenção.

É óbvio que este Governo não é suspeito de qualquer espécie de animosidade em relação ao sector privado. Antes pelo contrário, incluído no domínio da saúde há, na Constituição e na lei, um papel do sector privado que pode ser importante e é desejo do Governo que ele tenha uma intervenção mais activa. Contudo, é necessário que existam regras em relação ao que deve ser a sua utilização, nomeadamente no sector convencionado. Não se pode manter um sistema em que se é médico do Serviço Nacional de Saúde e também se é médico convencionado, pago num e noutro lados pelo mesmo Estado para atender os mesmos cidadãos, lançando toda a espécie de suspeitas sobre a seriedade do sistema. E, do ponto de vista do Governo, a seriedade do sistema é ainda mais importante do que a questão de saber se ele deve ser mais público ou mais privado.

A verba atribuída às convenções tem, assim, como objectivos, por um lado, permitir uma actualização justa dos preços e, por outro, impedir que cresçam à custa da indefinição e do aproveitar da benevolência por parte da Administração, que julgo injustificada para além de certos limites. As regras que aqui estamos a adoptar são quatro: liberdade de escolha onde ela se justifica; aproveitamento integral dos investimentos do Estado nos seus próprios serviços, estejam eles nos cuidados primários ou nos cuidados diferenciados; adopção da via mais eficaz em termos de custos, e eliminação de tudo o que viabilize suspeições e fraudes.

Em relação ao que se prevê com gastos em medicamentos, e que alguns têm dito já ser insuficiente, importa acentuar que, na opinião do Governo, não é tolerável que o Serviço Nacional de Saúde suporte despesas como aquela que suportou em relação ao mês de Janeiro de 1986, isto é, perto de 3 milhões de contos

de comparticipações em medicamentos. Esta factura tão elevada resultou simultaneamente de uma nova metodologia de preços que, como se sabe, entrou em vigor em 1985 e de aumentos nas percentagens de comparticipações que começaram a vigorar a partir de Outubro do ano passado. Os aumentos de preços situaram-se, nalguns casos, em níveis manifestamente incomportáveis.

Quanto ao aumento das comparticipações, a Direcção-Geral de Assuntos Farmacêuticos avalia que ela se traduz numa diferença, em 1986, de cerca de 5 milhões de contos. Como se sabe, o Governo emitiu a Portaria n.° 964/85, criando «plafondamentos» em relação à subida dos preços durante o ano de 1986. Por outro lado, foram já tomadas medidas no sentido de obstar à existência de postos médicos numa série de empresas onde havia uma manifesta sobreutilização das requisições do Serviço Nacional de Saúde, quer das receitas de medicamentos, quer das requisições de meios auxiliares de diagnóstico. Estamos neste momento a trabalhar no sentido de pôr em vigor o mais depressa possível regras sobre o redimensionamento das embalagens e é possível que outras medidas tenham de ser adoptadas no sentido de diminuir, no âmbito das despesas totais do Serviço Nacional de Saúde, o peso das despesas com medicamentos, que, é óbvio, se são feitas em medicamentos não são feitas, por exemplo, em melhoria dos cuidados hospitalares ou quaiquer outras despesas.

Quanto às despesas hospitalares, queria apenas referir que, em termos daquilo que é proposto, está garantida a entrada em pleno funcionamento dos novos hospitais durante o ano de 1986 — e quando digo «funcionamento pleno» vale para Barreiro, Abrantes e Santarém e «funcionamento» para Coimbra, pois, como sabem, o hospital de Coimbra ainda não entrou em funcionamento.

Quanto aos restantes hospitais, na rubrica «Despesas com pessoal» prevê-se uma diminuição líquida de pessoal nos hospitais centrais, que resulta da passagem de pessoal destes hospitais sobretudo para os hospitais distritais como especialistas e também, em alguma medida, como clínicas gerais para as ARSs.

Os consumos com a generalidade dos hospitais crescerão 14%, mas com os distritais crescerão 20%. Em relação ao pessoal, como em relação aos consumos, isto traduz a opção do Governo de assentar o desenvolvimento da rede hospitalar na rede dos hospitais distritais. Hoje dispomos já de uma rede muito razoável em termos de hospitais distritais e é necessário que ela seja totalmente utilizada, não só porque isso poupa despesas e sofrimento às pessoas que não têm que ir mais longe, aos hospitais centrais, mas também porque possibilita que estes fiquem aliviados de um esforço que não têm, de facto, de realizar porque os hospitais distritais estão em condições de o fazer.

Gostaria ainda de dizer uma palavra relativamente às misericórdias. Elas tiveram, no passado, um papel importante nos cuidados de saúde e o Governo desejaria que elas retomassem algum desse papel, como hoje o fazem no âmbito da Segurança Social, para onde, aliás, se viraram quando foram impedidas de funcionar no âmbito da saúde.

Como estão recordados, o orçamento suplementar de 1985 permitiu pagar as rendas em dívida até 31 de Dezembro de 1985, pela utilização pelo Estado sobretudo dos hospitais concelhios, porque era sobretudo em relação a estes hospitais que existiam dívidas grandes.

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A verba que aparece destinada, no projecto que entreguei à Comissão de Saúde, Segurança Social e Família, às rendas de hospitais das misericórdias diz respeito apenas aos hospitais concelhios. Destaquei essa verba porque é justamente aí que há uma novidade grande em relação ao que estava para trás e, portanto, entendi que devia ser destacada.

As rendas com outros hospitais que também são das misericórdias estão incluídas nas verbas sobre os respectivos hospitais.

O Governo é de opinião que a situação dos hospitais concelhios tem de ser revista, havendo inclusivamente que pensar nalguns casos se eles actuam de facto no âmbito da saúde ou sobretudo no âmbito da segurança social. Aliás, isso já está a ser feito e, nomeadamente, no distrito de Santarém já foram tomadas algumas medidas nesse sentido. Em qualquer caso, repito, o Governo desejaria ver as misericórdias retomar um papel importante e activo em relação aos cuidados de saúde.

Estas são, Sr. Presidente e Srs. Deputados, algumas das considerações que julguei dever fazer como introdução àquilo que vai seguir-se.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Presidente Rui Machete.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de fazer a habitual ronda pelos grupos parlamentares, gostaria de dizer à Comissão o quanto nos entristece o facto de o Dr. Teófilo Carvalho dos Santos ter falecido de uma maneira relativamente inesperada, apesar de ele se encontrar doente há bastante tempo. Encontramo--nos impedidos de participar no funeral e na manifestação de pesar que é este saimento para a última morada do Dr. Teófilo Carvalho dos Santos, visto que estamos aqui a trabalhar. Contudo, penso que posso interpretar a vontade de todos os membros da Comissão em expressar a nossa profunda tristeza por mais esta perda de um homem que desempenhou um papel extremamente importante a favor da democracia e assumiu, na Assembleia da República, a presidência do Parlamento, tendo sido durante os anos que aqui esteve um deputado verdadeiramente exemplar e, portanto, uma pessoa cujo exemplo todos nós devemos tomar e seguir.

Vamos, então, prosseguir os nossos trabalhos. Começo por perguntar aos Srs. Deputados do PSD se têm alguma questão a formular à Sr." Ministra da Saúde.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Porto.

O Sr. Francisco Porto (PSD): — Sr." Ministra da Saúde, o PSD, tendo em conta as notas justificativas adicionais que lhe foram apresentadas por V. Ex.a, as explicações verbais que aqui nos deu, as medidas que já tomou e anunciou ir tomar no sentido de morigerar o sistema, e que essas medidas vão conferir à capacidade dos gestores toda uma criatividade e toda uma acção no sentido de as levar por diante, julgo que o orçamento apresentado é um orçamento de rigor e que satisfaz as necessidades dos utentes sem lhes retirar a qualidade e a quantidade que até agora lhes tem sido dada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Valdemar Alves.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): — Sr." Ministra da Saúde, na nossa perspectiva, se atendêssemos ao crescimento que se vinha verificando nos gastos — e digo «gastos com a saúde», mais do que «serviços de saúde» — e se se mantivesse este nível de crescimento, poderíamos chegar ao último trimestre e começar a ter dificuldades de financiamento com os serviços de saúde.

Todavia, da experiência e dos elementos possuídos, pensamos que, se forem tomadas medidas rigorosas de contenção das despesas — e sublinho bem: «contenção de despesas» e não serviços prestados —, poderemos conseguir que o orçamento chegue para as despesas do ano. Porém, de facto, tal só se conseguirá com a adopção de medidas rigorosas na contenção desses gastos — diria até dos desperdícios.

Na minha perspectiva, da relação entre os custos e os benefícios, poderei dizer que os benefícios estão demasiado caros, a manter-se o nível que se verificou até aqui.

Penso que, com as despesas que temos feito na saúde, com os gastos da saúde, se poderão prestar melhores serviços. Se, efectivamente, conseguirmos moralizar essencialmente os gastos com a saúde, poderemos aceitar este medicamento.

Confiamos perfeitamente no Governo e na Sr.a Ministra para que essas medidas sejam tomadas rapidamente, porque, na saúde, cada dia que passa implica muitos milhares de contos. Com efeito, cada caneta que escreve custa muito dinheiro ao Serviço Nacional de Saúde. E sempre que se colocam, por exemplo, mais clínicos gerais, de acordo com o quadro, são mais canetas a escrever, durante, pelo menos, quatro ou cinco horas por dia, e isso custa-nos muito dinheiro. E com as próprias direcções do Centro de Saúde, que estão mais perto da realidade, é que, com acções de formação e de sensibilização dos utentes e do pessoal que trabalha na saúde, podemos obter economia nesses gastos.

Contudo, penso que se, de facto, não caminharmos por aí, isto é, se não formos para a moralização e para a contenção (no bom sentido) das despesas, poderemos vir a ter algumas dificuldades, embora se note, por exemplo, em despesas de farmácia, de Janeiro para Fevereiro, uma diminuição de certa maneira acentuada. Porém, também sabemos que depois haverá «picos», isto é, que haverá meses de Inverno em que o crescimento aumenta. E neste aspecto, uma das medidas anunciadas pela Sr.3 Ministra, que seria precisamente a da internacionalização das embalagens, poderá ter uma influência importante.

Sr. Presidente, para já, penso que eram estas as ideias que gostaria de expor.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, gostaria de lembrar à Comissão que, como temos um horário bastante estrito, convirá não esquecer que estamos a discutir o orçamento das despesas na especialidade.

Dou agora a palavra ao PS, na pessoa do Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Sr.8 Ministra, V. Ex.a não nos trouxe, de facto, nada de novo, a não ser o anúncio de que vai tentar arranjar algumas verbas através das taxas moderadoras. Porém, de resto,

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não trouxe nada de novo à sua argumentação e penso que não valerá a pena estarmos a repetir de novo o diálogo que já tivemos na Comissão, limitando-me, portanto, a concluir e a dizer que o orçamento é, de facto, magro para as necessidades do Serviço Nacional de Saúde. Constatamos mesmo que, ao contrário do que V. Ex.a afirmou, ele é inferior, em valores reais, ao do ano passado, até porque há verbas que aparecem neste e que no do ano passado não apareciam, como é o caso das misericórdias.

Na realidade, pensamos que no nosso país ainda hoje gastamos modestamente na saúde, em relação ao PIB ou mesmo ao Orçamento do Estado global. Penso até que estamos numa curva decrescente nessa matéria, relativamente a qualquer país da Europa. Portanto, cremos que as verbas são insuficientes e que isso vai repercutir-se, fatalmente, na qualidade da assistência prestada aos utentes deste país.

Estamos totalmente de acordo com o facto de que é necessário continuar a obra que vinha sendo realizada, obra essa de racionalização da gestão dos recursos que temos.

Não acreditamos muito — até porque temos um pensamento contrário ao de V. Ex.a — na matéria das convenções. Assim, ficaríamos muito contentes se aparecesse diminuída a verba para as convenções, pois isso seria sinal de que haveria um melhor aproveitamento dos recursos dos serviços oficiais, verificando-se assim a redução da necessidade de recorrer às convenções.

Para isso é indispensável que melhoremos o equipamento das nossas unidades assistenciais, e não é com o PIDDAC deste ano que vamos conseguir isso. Admito mesmo que o PIDDAC deste ano não possa sequer reparar avarias ou manter a conservação do equipamento que temos. No entanto, V. Ex.°, Sr.a Ministra, está crente que este orçamento vai conseguir resolver os problemas do Serviço Nacional de Saúde, mantendo, ao menos, a qualidade existente.

Bem, fazemos votos para que venha a ter razão. Porém, estamos também muito receosos de que, a curto prazo, o Ministério comece a ter dificuldades, indo recorrer a um orçamento suplementar ou ao endividamento. E assim vamos talvez reconstruir uma situação, que foi encontrada em 1983, de cerca de 17 milhões de contos de dívidas de governos anteriores no Ministério da Saúde. Portanto, temos muito receio de que isso volte a acontecer e de que voltemos a assistir de novo ao espectáculo público da recusa das farmácias em entregar os medicamentos aos respectivos utentes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o PRD, na pessoa do Sr. Deputado Barros Madeira.

O Sr. Barros Madeira (PRD): — Sr.a Ministra da Saúde, em relação aos medicamentos, julgo que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu tem razão naquilo que diz e estou convencido de que o Ministério irá ter, no final do ano, dificuldades com os pagamentos às farmácias.

Queria colocar à Sr.a Ministra uma questão que também está relacionada com o orçamento e que se prende com o problema dos enfermeiros.

Julgo que existem 2700 enfermeiros na situação de tarefeiros, a qual é uma situação que me parece haver que corrigir, devido aos encargos que isso irá dar ao orçamento.

Sendo assim, gostaria de perguntar a V. Ex.a se seria possível atender a esta situação, visto que alguns hospitais que tenho visitado — até mesmo hospitais distritais — referem que têm uma situação altamente deficitária em profissionais de enfermagem. Portanto, penso que esta seria uma situação a que a Sr.3 Ministra deveria atender, pois parece muito injusta.

Também gostaria de ver esclarecido o problema das taxas moderadoras, no sentido de saber qual era a ideia da Sr. Ministra neste domínio.

Estou inteiramente de acordo com as suas medidas de racionalização, pois penso que são fundamentais.

Julgo que o Sr. Deputado Ferraz de Abreu terá tocado um ponto essencial, o qual se prende com z. melhor utilização dos serviços do Estado, isto é, que eles sejam rentabilizados e melhorados de forma a conduzir para si grande parte daquilo que é hoje feito no sector privado. Isto não quer dizer que tenha alguma coisa contra o sector privado. Porém, penso que, se o Estado dispõe de equipamentos, deve utilizá-los inteiramente.

Julgo também que percebi que as rendas dos hospitais concelhios estavam incluídas nas verbas atribuídas às administrações regionais de saúde (ARS).

A Sr.3 Ministra da Saúde: — Não, não estão!

O Orador: — Ah, estão de fora? Bom, é que não tinha percebido esse aspecto.

Há outro problema que gostaria de ver abordado pela Sr.3 Ministra, o qual já foi aflorado em Comissão. Trata-se da questão da racionalização da utilização dos hospitais distritais pelas companhias de seguros em casos de acidentes de trabalho e de viação. De facto, o que se está a fazer é um abuso, com as companhias de seguros a cobrarem os seus prémios, estando os hospitais, o Estado e as pessoas a pagar esses serviços indevidamente.

Portanto, de momento, são estas as questões que gostaria de ver esclarecidas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o PCP, na pessoa do Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr.a Ministra, eu iria falar mais de números, deixando um pouco a política de saúde.

O Sr. Presidente: — Fica mais dentro da agenda, Sr. Deputado.

O Orador: — Começava por dizer que o Orçamento deste ano é, em relação ao do ano anterior e em termos gerais, realmente inferior, pois a percentagem para a saúde é inferior à do ano passado, sendo inferior também em relação ao PIB. Com efeito, são dois dados que não se podem escamotear, por muito que o Governo possa dizer que não considera o sector da saúde como prioritário. Por conseguinte, há este ano nenos dinheiro para a saúde do que o que houve nos últimos anos — e note-se que não falo no ano znte-rior, mas nos últimos anos.

Sr.a Ministra, quando V. Ex.a me diz que tal não é verdade, quero dizer-lhe que, realmente, há mais dinheiro, mas a percentagem é que é menor. Isto porque, como toda a gente sabe, os preços aumentaram,

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há inflação e, portanto, há mais dinheiro, há mais milhões. Porém, em termos percentuais, há menos dinheiro e eu vou demonstrar isso, Sr.a Ministra.

A Sr.3 Ministra diz que não podemos ser ambiciosos e tal é verdade. Porém, temos é de ser realistas. Isto porque temos gastos com a saúde, os quais não podem deixar de ser feitos.

A Sr.3 Ministra vem aqui apresentar uma série de propostas, dizendo que vai rentabilizar os serviços, que vai melhorar os hospitais, que vai dotar as administrações regionais de saúde de orçamentos próprios, que vai responsabilizá-los e que vai fazer planeamento.

Sr.3 Ministra, estamos em Março e este Orçamento vai entrar em vigor em Abril. Sendo assim, pergunto-lhe quando é que isso se vai reflectir no orçamento da saúde.

A Sr.3 Ministra sabe perfeitamente que as coisas são lentas na saúde; não se pode adoptar um comportamento de fazer hoje, havendo amanhã poupança. Assim, pergunto-lhe de novo, Sr.3 Ministra: quando é que isso se vai reflectir no orçamento da saúde?

Toda a gente tem a consciência de que se essa rentabilização fosse possível, se todos os serviços começassem a funcionar muito bem, isso só se iria reflectir em Outubro, isto é, quando, com este Orçamento, já não houvesse dinheiro.

Com os medicamentos passa-se exactamente a mesma coisa.

A Sr.3 Ministra diz que vai fazer a unidose e as embalagens menores.

Sendo assim, também quero abrir aqui um parêntesis para dizer que não houve nenhum Ministro da Saúde ou nenhum Secretário de Estado que, no tempo do Ministro dos Assuntos Sociais, não dissesse isso aqui na Comissão ou em Plenário. Com efeito, todos dizem isso; há anos que andamos a ouvir isso, como há anos que andamos a ouvir falar no formulário nacional de medicamentos. Porém, isso são promessas, são sugestões do Governo. Agora, se isso conseguisse entrar em prática, para quando é que se verificaria, Sr.3 Ministra? Quanto é que a Sr.3 Ministra vai poupar este ano com essa tomada de medidas? Estas são, com efeito, situações muito concretas.

Por outro lado, a Sr.3 Ministra afirma que, no que respeita a consumos para o Serviço Nacional de Saúde, todos os consumos aumentaram 14%.

Só aí está logo um erro grande, Sr.3 Ministra, pois é o próprio Governo que propõe que a taxa de evolução dos preços seja de 16,5%. Portanto, a taxa proposta pelo Governo é de 16,5% e a Sr. Ministra vem dizer que o aumento dos consumos para os hospitais é de 14% — logo, falta dinheiro.

Gostaria ainda de analisar determinados factos.

Quanto aos hospitais, verifica-se que para todos eles o aumento é de 8,6%. E os hospitais não vão deixar de ter doentes; o consumo vai fazer-se exactamente da mesma maneira, pois tem de se alimentar os doentes que estejam lá, porque os hospitais não podem diminuir o número de doentes.

Portanto, o consumo de hotelaria vai ser exactamente o mesmo, ou mais caro, pois é agravado. Além disso, sabemos que esse preço é sempre aumentado, como são aumentados os consumos próprios da saúde, os quais não aumentam à taxa de inflação de 14%. A Sr. Ministra sabe que os pensos, o material de sutura e tudo isso aumentam em média muito superior à taxa dè inflação, tal como se tem verificado nos últimos anos, e esses são consumos obrigatórios dos hospitais.

Portanto, a verba de 8,6% para os hospitais é, no mínimo, irrealista, pois não vai chegar para pagar os serviços já existentes; não pode haver rentabilização nisto. Assim, como é que a Sr." Ministra justifica, para os hospitais centrais e distritais, uma verba de só 8,6%, sendo que para os novos se prevê uma verba de 12,7%?

No que diz respeito aos medicamentos, já fizemos muitas contas sobre essa matéria e a Sr.8 Ministra também já as fez. Não falo já dos 3 milhões de contos que foram gastos em Janeiro. Mas quanto é que foi gasto em Fevereiro ou em Abril, quando ainda nada entrou em vigor? Quanto é que vai ser gasto em Março e em Abril?

Sr.3 Ministra, faça contas ao que já foi gasto e veja se consegue gastar por mês uma verba muito pouco superior à do ano passado. Não tenho agora aqui o montante exacto, mas, estando orçados 26 milhões de contos e dividindo esse montante por doze meses, verifica-se que tal não chega; quer dizer, que é irrealista. E estes são números muito próprios que lhe queria focar.

Além disso, Sr.3 Ministra, nestas despesas estão ainda incluídas as rendas às Misericórdias que não foram pagas no ano passado. Por conseguinte, e concretizando melhor, nestas despesas dos hospitais estão também incluídas as verbas a pagar às Misericórdias, as quais não saíram daqui no ano passado. Com efeito, foram previstas no Orçamento Suplementar e as Misericórdias só receberam esse dinheiro nessa sede, o qual está agora incluído nos consumos dos hospitais centrais — não está nos distritais, mas nos centrais está incluído. Portanto, ainda tem mais esse suplemento.

Por último, queria falar no problema das taxas moderadoras.

Parece que a Sr.3 Ministra se propõe este ano — pelo menos, pelos números que temos aqui — a cobrar 5,6 milhões de contos em taxas. Assim, visto que, em números redondos, foram cobrados, no ano passado, 300 000 contos, penso que é uma grande passagem para taxas moderadoras, pois tudo quanto esteja relacionado com taxas moderadoras ou se modera economicamente, isto é, aquelas pessoas que não têm dinheiro para pagar a taxa não vão ao médico, ou então não há moderação possível a fazer.

Com efeito, sabemos como é que as taxas funcionam hoje — pagam as consultas. Porém, se, realmente, uma pessoa que necessite de ir ao médico não vai por causa da taxa, é porque não tem condições para ir, isto é, modera-se economicamente: só aqueles que não têm possibilidades, só os mais necessitados, é que não vão ao médico, por muitas isenções que a Sr.3 Ministra estabeleça.

Na realidade, a Sr.3 Ministra pode isentar os reformados, as crianças até aos 10 anos ou as grávidas. No entanto, se existe uma taxa moderadora e se as pessoas deixam de recorrer aos cuidados de saúde devido à existência dessa taxa, tal verifica-se sempre por uma razão económica. Portanto, são pessoas que necessitavam de cuidados de saúde e que, por não terem dinheiro para pagar uma taxa, não podem ter esses cuidados. Sendo assim, queria perguntar-lhe quanto é que a Sr.3 Ministra pensa receber com taxas moderadoras e onde é que as vai colocar.

Em relação ao diploma, também lhe queria dizer que não o percebo muito bem. Isto porque cobrar dos subsistemas, já o Governo o podia fazer.

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Quanto ao dizer-se que se criam taxas moderadoras, também o artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde estatui que pode haver taxas moderadoras.

Então para quê este diploma?

Este diploma diz, na sua primeira parte, que vai cobrar os subsistemas, e isso já o Governo podia fazer. Depois, na segunda parte, diz que cria taxas moderadoras para os utentes pagarem, e isso também está na Lei do Serviço Nacional de Saúde; no famigerado artigo 7.° dessa lei.

Então — volto a perguntar — para quê este diploma? Que água no bico traz este diploma? Que regulamentação prevê a Sr." Ministra para este diploma? São tudo situações que não compreendemos e não precebemos como é que a Sr." Ministra vai arranjar aí verbas para financiar o Serviço Nacional de Saúde.

A Sr.a Ministra pode dizer o que quiser, mas o que é facto é que essas taxas moderadoras vão constituir uma fonte de financiamento. Portanto, não vão moderar nada, mas sim constituir uma fonte de financiamento e isso é inconstitucional, Sr." Ministra.

O Sr. Presidente: — Bem, visto que tanto o CDS como o MDP/CDE não estão presentes, dava a palavra à Sr.a Ministra da Saúde para que respondesse às questões que lhe foram formuladas.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Presidente, aquando da minha intervenção só me referi ao orçamento da saúde, não tendo falado do PIDDAC. Assim, queria dizer que focaria esse problema num momento posterior.

O Sr. Presidente: — Certo, Sr. Deputado. Tem então a palavra a Sr.a Ministra da Saúde.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar gostaria de focar a questão das taxas moderadoras, a qual foi referida por alguns Srs. Deputados.

De facto, uma previsão em relação a elas está no projecto que entreguei na Comissão Parlamentar. Portanto, o Governo não tenciona cobrar mais com subsistemas e taxas moderadoras do que aquilo que está na estimativa que foi entregue aos Srs. Deputados, isto é, 6 774 000 contos — é isso que consta do projecto.

Por outro lado, os Srs. Deputados têm também elementos em relação ao que aconteceu em 1985, onde não temos ainda todas as contas fechadas. Porém, naquele documento que lhes entreguei a estimativa que constava era de 5 482 000 contos.

Como sabem, houve uma declaração de inconstitucionalidade de alguns actos que estabeleceram taxas moderadoras, que produziu efeitos no final do ano, que não foi imediatamente aplicado por todos os serviços, tal significando que não há uma previsão substancialmente diferente de verbas em relação ao que se possa passar em 1986. De qualquer maneira, aquele diploma que foi publicado não tem mais nada a ver do que com o cumprimento daquilo que estava previsto no documento que entreguei aos Srs. Deputados e, portanto.

não se trata de prever quaisquer outras receitas diferentes daquelas que constam do projecto de orçamento. Esta questão tem, aliás, a ver com algumas questões que foram colocadas no sentido de saber para que é que servia aquele diploma.

Como sabem, tinha havido declarações de inconstitucionalidade que, repito, tinham a ver exclusivamente com questões de ordem formal. Nomeadamente, tinha sido dito pelo Tribunal Constitucional que só em decreto-lei se podiam estabelecer regras sobre a criação de taxas moderadoras, sendo essa uma das razões pelas quais o Governo emitiu um decreto-lei.

Por outro lado, o Tribunal Constitucional disse também que só era constitucional a criação de taxas moderadoras no contexto da regulamentação do acesso aos serviços do Serviço Nacional de Saúde, focando também algumas outras questões que, repito, tinham a ver com problemas de ordem formal e não com questões de fundo sobre a constitucionalidade do próprio estabelecimento das taxas moderadoras.

Em relação à verba prevista no projecto de orçamento, ela engloba taxas moderadoras e reembolso dos subsistemas. E, nomeadamente em relação aos subsistemas, engloba — está nessa expressão de uma maneira um tanto imprópria, nos termos em que a tenho usado — o reembolso por entidades responsáveis pelos serviços prestados no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, designadamente pelas companhias de seguros. Portanto, as companhias de seguros são, em muitos casos, as entidades responsáveis pelos cuidados que são prestados.

Assim, esse diploma prevê também, para além do reembolso pelos subsistemas propriamente ditos, o reembolso por entidades responsáveis pelos cuidados que sejam prestados aos utentes, nomeadamente aqueles que são da responsabilidade de companhias de seguros.

Quanto às considerações sobre se o valor do orçamento é superior ou inferior ao do ano passado, quero dizer que fiz já algumas reflexões sobre essas questões. Assim, repito que o financiamento do orçamento do Serviço Nacional de Saúde pelo Orçamento do Estado aumenta em 16,7 97o, não sendo possível dizer-se que é, em termos reais, inferior àquilo que foi entregue pelo Orçamento do Estado ao orçamento do Serviço Nacional de Saúde em 1985.

Mesmo que retiremos as despesas com pessoal, o que do ponto de vista do Governo é legítimo, pois assentaria no princípio, repito, de que os aumentos de pessoal ou pessoal mais qualificado para o Serviço Nacional de Saúde não se traduzem em melhorias reais, o que na óptica do Governo é incompreensível — então para que é que aumentámos o pessoal no Serviço Nacional de Saúde (o Governo está de acordo em o fazer, e, por isso, nas propostas que apresentou há rubricas que traduzem um aumento líquido de pessoal) —, não é possível dizer que isso não serve de nada, em termos de melhoria daquilo que é prestado no âmbito do Serviço Nacional de Saúde.

Por outro lado, e em relação a verbas de consumos, repito que, excepto em relação aos medicamentos, as verbas de consumos aumentam, na generalidade dos casos, 14%, aumentando em relação aos hospitais distritais 20%.

Aquelas verbas que o Sr. Deputado Vidigal Amaro referiu, em relação a aumentos com consumos nos hospitais, comparam a execução orçamental de 1985 com as verbas previstas para consumos em 1986.

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Os Srs. Deputados têm uma discriminação que entreguei na comissão parlamentar especializada, a Comissão de Saúde, Segurança Social e Família, sobre os gastos de 1985 nas várias rubricas. Assim, se compararem aquilo que calculamos que terá sido pago com os consumos dos hospitais em 1985 com aquilo que prevemos que seja gasto com os consumos dos hospitais em 1986, verão que em relação a essas verbas, e nos hospitais centrais, há uma diferença de 14%.

É que acontece que em 1985 foram pagas despesas dos hospitais em relação a 1984 a um nível superior ao que aconteceu em 1986 em relação a despesas de 1985. E é isso que faz com que a verba que aparece em execução orçamental, em relação a 1985, dê uma diferença, que foi apontada pelo Sr. Deputado Vidigal Amaro em relação às verbas previstas para 1986. Portanto, isso tem a ver com o facto de em 1985 se ter pago mais de despesas de hospitais referentes a 1984 do que aquilo que se pagou em 1986 em relação a despesas de hospitais verificadas em 1985.

Como sabem, uma parte substancial do reforço orçamental no orçamento suplementar de 1985, que foi aprovado pela Assembleia da República, foi para despesas dos hospitais e isso fez com que tenha havido uma redução substancial do défice que passou de 1985 para 1986 em relação ao que tinha passado de 1984 para 1985.

Portanto, se compararem rubricas de consumos dos hospitais, nesse caso a mais baixa de todas é de 14% e está nos hospitais centrais e nos novos distritais.

Em relação aos outros distritais, com respeito aos quais, como disse, o Governo está, neste momento, a apoiar, fundamentalmente, o desenvolvimento da rede hospitalar, esse crescimento é de 20%.

O Sr. Deputado Barros Madeira fez-me algumas perguntas em relação aos enfermeiros.

Há, de facto, no âmbito do Ministério da Saúde, uma quantidade de tarefeiros, ou de pessoas que, em teoria, estão em regime de tarefa, dificilmente justificável.

Isso tem a ver com algumas dificuldades que houve no passado em relação a descongelamentos, pelo simples facto de que certo tipo de serviços do Estado que prestam directamente serviços à população não podem, obviamente, sobreviver em termos semelhantes aos que poderiam eventualmente acontecer com repartições normais de serviços públicos — sem desprimor para elas — sem pessoal que assegure minimamente a prestação de cuidados — os médicos, os enfermeiros e os técnicos auxiliares de diagnóstico e terapêutica (para falar de pessoal especializado).

Isso tem feito com que, de facto, haja hoje, e não só nos enfermeiros, um número importante de tarefeiros, sendo que essa é uma situação muito difícil de sustentar, nomeadamente quando se trata da prestação de cuidados em regime de permanência.

Aliás, tive já ocasião de dizer aos sindicatos de enfermeiros que a situação dos seus tarefeiros seria resolvida, a muito curto prazo, através do descongelamento das vagas e, por conseguinte, da possibilidade de entrada para o quadro dos enfermeiros que estão, neste momento, ao serviço dos serviços de saúde.

No entanto, o problema não se verifica só com os enfermeiros mas também com os técnicos auxiliares de diagnóstico e, em relação a eles, o tratamento tem de ser igual, pois eles são, por vezes, um pouco esqueci-

dos nas nossas preocupações, embora também desempenhem, como é óbvio, tarefas extremamente importantes.

Quanto às rendas dos hospitais e a algumas questões que foram postas sobre onde é que elas estão, gostaria de dizer o seguinte: As que estão destacadas, isto é, uma referência a 465 000 contos, dizem respeito, exclusivamente, às rendas dos hospitais concelhios. Aliás, isso é, de certa maneira, um plafond, pois, como lhes disse, há casos em que haverá uma revisão da situação, não havendo, portanto, mais razões para pagar as rendas, ou até casos em que a construção de novos edifícios para os hospitais gera, como é óbvio, a entrega às Misericórdias dos edifícios antigos, deixando também, nessa altura, de haver pagamento de rendas. Isso vale, nomeadamente, para três casos de hospitais novos — Barreiro, Abrantes e Santarém —, onde está em curso o processo de devolução às Misericórdias — aliás, aí são hospitais distritais e não concelhios.

Em relação às verbas para os outros hospitais, estão, de facto, incertas as verbas sobre rendas nas verbas para hospitais centrais e distritais. Porém, não há aí uma diferença em relação a 1985, porque só em casos muito limitados é que essas rendas não vinham já sendo pagas.

Portanto, aquela verba que foi votada pela Assembleia da República para pagar rendas a hospitais das Misericórdias era quase totalmente para hospitais concelhios. Com efeito, só em casos limitadíssimos é que, em relação a hospitais centrais ou distritais, havia dívidas. Portanto, a quase totalidade é para os hospitais concelhios, já eram verbas que estavam a ser pagas em 1985 e, assim, não há aqui despesas novas a fazer.

O Sr. Deputado Vidigal Amaro colocou uma questão extremamente importante, no sentido de saber quando é que as medidas de racionalização têm eficácia, em relação a um sistema burocraticamente pesado, como o é o sistema do Serviço Nacional de Saúde.

Sr. Deputado, estou inteiramente consciente do tempo que leva a que certas medidas sejam postas em prática e, por isso, tenho tentado trabalhar depressa.

É evidente que, em relação aos medicamentos, só haverá reflexo na situação orçamental vivida em 1986 se as medidas entrarem em vigor antes de Novembro. Isto porque, como sabe, Novembro e Dezembro serão pagos em 1987 — é isso que está previsto e é isso que tem vindo a ser praticado.

O Governo tem perfeita consciência de que assim é, mas essas medidas vão entrar em vigor antes, Sr. Deputado. Isto porque, como é evidente, de outra maneira não teríamos qualquer espécie de benefício sobre isso, nem eu viria para aqui abusar da paciência dos Srs. Deputados, dizendo-lhes que faria coisas que não teriam reflexos em relação aos textos neste momento em apreciação.

Passa-se exactamente a mesma coisa em relação às convenções.

Suponho que era um outro sector onde faz muito especialmente sentido falar em racionalização. As medidas estão a ser postas em prática, sendo este, de facto, um sector fundamental.

Assim, foram já tomadas algumas medidas em relação aos hospitais, no sentido de fazer utilizar tudo aquilo que existe, isto é, no sentido de utilizar os recursos, não só em termos de equipamento mas também em termos humanos, até ao limite. Há certas coisas que

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são dificilmente compreensíveis, como seja, por exemplo, o caso, revelado por um estudo recentemente publicado, de, entre 1975 e 1983, o número relativo aó pessoal dos hospitais centrais ter crescido 39%, o relativo ao pessoal médico ter crescido 76%, e o número de doentes saídos, por médico, ter decrescido 61,2%. Estes são números que impressionam muito quem para eles olha, pois há, por certo, qualquer coisa que não está certa.

O Governo não se permitiria revelar estes números — aliás, nem foi o Governo que os revelou — e dizer que, de facto, há situações sérias sem se propor modificá-las. É necessário que todos os recursos de que dispomos sejam postos a funcionar. E muitos dos Srs. Deputados são profissionais de saúde e sabem que, infelizmente, os recursos que temos não são integralmente aproveitados.

Quanto às comparações entre despesas de hospitais, suponho que já expliquei a razão por que é possível falar em 8%, 11% ou em outro valor qualquer. Se compararmos rubricas de consumo dos hospitais relativas a 1985 e a 1986, nenhuma cresce menos de 14% e, em relação aos hospitais distritais, menos de 20%, não sendo por acaso que é aí que é feito o esforço maior.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário do Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Quero apenas dar uma informação de carácter meramente formal e que é relativa ao facto de eu já ter entregue na Mesa uma substituição dos mapas relativos ao Serviço Nacional de Saúde, porque, como já se devem ter apercebido, os mapas que a Sr.a Ministra da Saúde apresentou não condiziam com os mapas informáticos da contabilidade pública. Esta discrepância deve-se, fundamentalmente, a um problema de ordem burocrática, que é o da contabilidade pública só incluir a informação nos mapas informáticos quando a mesma vem dos serviços, neste caso concreto, do Serviço Nacional de Saúde. Como, de facto, o Serviço Nacional de Saúde se atrasou bastante na entrega destes mapas à contabilidade pública — o que veio a verificar-se após a primeira ronda do debate na generalidade do Orçamento do Estado e antes da respectiva votação — e como esta correcção foi feita no dia 17 de Março, entendi que esta seria a altura oportuna para substituir os mapas informáticos e, assim, ficarem conformes às informações que os Srs. Deputados têm já.

Aproveitei, também, para nesses mapas informáticos substituir as folhas relativas a dois serviços: a primeira a das lotarias, cuja transferência para o OE é de 5 milhões de contos e que nos mapas informáticos assumia um valor relativo a uma situação pré-orçamemal. Uma vez que na altura não se detectou esta discrepância, teve de se fazer a sua posterior correcção. A segunda folha que substitui, relativa a uma receita da Fundação Ricardo Espírito Santo, refere-se a uma verba menor, mas que se corrigiu nos mapas anexos por uma questão de perfeccionismo.

Fundamentalmente, essas alterações de folhas referem-se ao ajustamento dos mapas de que os Srs. Deputados dispõem e que foram fornecidos pela Sr.4 Ministra da Saúde, com os mapas informáticos anexos.

Relativamente aos elementos que a Sr.a Ministra da Saúde forneceu, quero dizer que por via do Ministério das Finanças também se fizeram os cálculos de quanto é que cresceriam as verbas para o sector da saúde este ano e eles confirmam os valores encontrados pelo Ministério da Saúde. Assim, as verbas para pessoal do Serviço Nacional de Saúde crescem a um ritmo muito superior ao do aumento dos vencimentos, pelo que não só permite o pagamento ao pessoal como que se realizem novas admissões e promoções. Portanto, os aumentos dos consumos estão todos acima dos 14% e, no caso dos hospitais, esse aumento é de 18,6% relativamente ao autorizado.

Há ainda um outro aspecto a referir, que é o de o défice do Serviço Nacional de Saúde sair ligeiramente reduzido relativamente ao de 1985. Isto deve-se, en parte, ao facto de, em 1985, ter havido recuperação de atrasos naquele Serviço e, portanto, a base ser de mais do que a de um exercício relativamente a 1986.

Um outro aspecto que vem corroborar as afirmações feitas pela Sr.11 Ministra da Saúde é o de um estudo publicado numa revista francesa chamada Futurible, dizer que Portugal é um dos países que tem uma capitação de médicos mais elevada, a nível dos países mais industrializados, pois entre 1960 e 1982, em Portugal, o ratio de número de médicos por 100 000 habitantes cresceu de 77 para 220. É um valor muito superior ao verificado no Reino Unido, onde esse ratio atinge o valor de 129, na Holanda 201, em França 208, aproximando-se do valor que esse ratio atinge na RFA, 237 médicos por 100 000 habitantes, na Dinamarca 240 e na Suécia 234.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Já tínhamos conhecimento desses valores, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — De

qualquer forma, reparem que em termos de finanças temos tido o cuidado de analisar que esse é um dos serviços que está a carregar, de forma bastante elevada, o Orçamento do Estado, pelo que terá de haver uma racionalização. Não foi para chegar a esses valores que os Serviços Médico-Sociais em 1977-1978 saíram do serviço da Previdência e entraram no Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Já tive oportunidade de registar e mandar fotocopiar para posterior distribuição os documentos a que se referiu o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, pelo que em breve os mesmos estarão à disposição dos Srs. Deputados.

Pergunto aos Srs. Deputados se desejam colocar mais algumas questões.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): — Quero perguntar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que muito amavelmente veio aqui trazer-nos os valores assumidos pelo ratio do número de médicos por 100 000 habitantes nalguns países industrializados, se também possui elementos de qual a percentagem do PIB que ncs países europeus é gasta em saúde, e qual é essa percentagem em Portugal.

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Essa percentagem tem tido uma evolução ascendente mesmo para nós ou, pelo contrário, é descendente? E pergunto isto mesmo em relação ao Orçamento do Estado, pois isso é que nos interessa saber.

O Sr. Presidente: — Penso que a tentação de discutirmos matérias de política geral é dificilmente resistível, quer pelo lado do Governo quer pelo lado dos membros da Comissão. Em todo o caso, vamos ver se, também aí, conseguimos introduzir uma taxa moderadora.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Em relação aos medicamentos, a Sr." Ministra não explicou se a verba que está orçada chega para fazer face às despesas ou se temos de ter um orçamento suplementar. Pelos nossos números, seguramente, temos de ter um orçamento suplementar, tanto mais que a Sr.a Ministra vem dizer que os meses de Novembro e Dezembro não se pagam, que estamos já em fins de Março e que em Abril e Maio não vai entrar em vigor qualquer medida reguladora. É em Junho, Julho, Agosto, Setembro e Outubro, isto é, em cinco meses, que a Sr.a Ministra vai recuperar milhões de contos para pagar os medicamentos gastos pelo Serviço Nacional de Saúde? Esta é uma pergunta muito concreta que lhe coloco, Sr." Ministra.

Em relação ao consumo dos hospitais, a Sr.a Ministra deu-nos razão: realmente, os consumos aumentam 14%, como disse, e eu afirmei que — é uma taxa do Governo — a taxa de evolução de preços no consumidor é de 16,5%. E não estou a falar em taxa de inflação, mas, sim, em taxa de evolução de preços no consumo público.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Gostaria que me explicasse a que é que o Sr. Deputado se está a referir, pois não estou a perceber que taxa é essa.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Trata-se da taxa de evolução de preços do consumo público.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Se o Sr. Presidente me permite, quero referir ao Sr. Deputado Vidigal Amaro que o valor de 16,5% se refere ao aumento salarial médio na função pública.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Não é a isso que me estou a referir, mas, sim, ao consumo público.

A que taxa é que o Governo prevê que aumente o consumo público?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Sr. Deputado, este valor em termos de medicamentos...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Não me refiro a medicamentos, Sr. Secretário de Estado, mas, sim, a consumo dos hospitais, ao que os hospitais gastam em hotelaria, aquisição de pensos, material, álcool, soluções, enfim, tudo.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Sr. Deputado, em que fonte se baseia V. Ex.a para referir esse valor?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Baseio-me em elementos dados pelo Governo, não pelo Ministério da Saúde mas pelo Ministério das Finanças, e constam das GOPs.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Alípio Dias, poderá V. Ex.a dar uma ajuda no esclarecimento desta questão relativa ao consumo público?

O Sr. Alípio Dias (PSD): — Estão a discutir-se duas realidades distintas: uma é a taxa prevista para a inflação, digamos, o comportamento do índice de preços no consumidor, previsto pelo Governo nas GOPs como sendo de 14% e que, como foi já avançado pelo Sr. Primeiro-Ministro, face à evolução dos indicadores talvez possa ser menor; outra realidade é a da taxa da evolução de preços em termos da função pública. Aqui, em termos de deflacionador, joga-se com a taxa de acréscimo dos salários na função pública, que é a referida taxa de 16,5%.

Portanto, e se o Sr. Deputado Vidigal Amaro me permite, V. Ex.a não deveria referir-se a essa taxa de 16,5%, que se prende a uma realidade completamente diferente da do consumo de medicamentos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, quero apenas fazer uma pequena observação relativamente às declarações do Sr. Deputado Alípio Dias.

É evidente que aquilo que está em discussão é o deflacionador do consumo público utilizado pelo Governo — e o Governo não o substituiu —, cujo valor é de 16,5%. E quer a taxa de 14% quer a de 16,5% estão em discussão, pois o Governo não substituiu as projecções das Grandes Opções do Plano. O deflacionador do consumo público é, efectivamente, de 16,5%, podendo-se discutir se os preços dos medicamentos seguirão ou não esse valor; mas o aumento do consumo público não abrange apenas os aumentos salariais, pois o consumo público não é apenas relativo a despesas com pessoal, mas, também, à aquisição de bens e serviços, etc.

Para o consumo público em termos globais, julgo ser este o deflacionador mais apropriado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Já percebi a que é que os Srs. Deputados se referem e há, de facto, uma certa confusão de indicadores. Aliás, o Sr. Deputado Alípio Dias tocou naquilo que eu estava à espera que tocasse, no que respeita ao deflacionador.

Com efeito, por deflacionador do consumo público, e por convenção — porque os serviços públicos não têm hipótese de quantificar, em termos de mercado, os serviços que prestam —, entende-se ser a variação salarial na função pública. Como este ano essa variação salarial média rondará o valor de 16%, esse será o deflacionador do consumo público.

Para efeitos do cálculo de aumento de encargos de aquisição de bens e serviços na função pública não podemos utilizar este deflacionador ex ante. Ou seja, para o cálculo dos encargos com medicamentos...

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O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado, os medicamentos não têm nada a ver com os hospitais, pois, embora os hospitais também tenham medicamentos que cobram directamente, aqueles são pagos peio Serviço Nacional de Saúde.

Mas do que estou a falar é dos consumos correntes dos hospitais e não de medicamentos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Bem, para concluir e independentemente disso, a base não pode ser esse defla-cionador, uma vez que ele se refere ao consumo público e porque se convenciona que uma esmagadora maioria das despesas do Estado são com pessoal.

O Serviço Nacional de Saúde, como se pode ver já pelos números apresentados, tem verbas suficientes para suportar os encargos com pessoal.

O único problema que pode ser mais discutível é o relativo às outras despesas que não as despesas com pessoal, e a Sr." Ministra já apresentou números que permitem dar um financiamento suficiente para as suportar. Efectivamente, nas outras despesas, os Srs. Deputados defendem que a verba é apertada e, embora o possa ser, de acordo com os cálculos feitos, designadamente por causa da componente importada desses consumos — e já não falo em medicamentos, mas, sim, em consumos —, relativamente ao ano de 1985, os encargos são muito menores.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Isso são equipamentos e são incluídos no PIDDAC, Sr. Secretário de Estado, e o que nos estamos a referir é aos consumos correntes, ou seja, à roupa, à alimentação, enfim, ao que é preciso.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Mas, afinal, o que é que estamos a discutir, que já'não estou a perceber?

Estamos a falar de medicamentos ou... ?

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Não estamos a falar de medicamentos nem nunca estivemos, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Mas, Sr. Deputado, há pouco V. Ex.a falou-me do PIDDAC e antes disso falou-me das despesas com pessoal. Creio que estou a falar em alhos e V. Ex.a em bugalhos.

O Sr. Presidente: — Houve aqui alguma confusão que se pretendeu esclarecer, quanto aos indicadores que estavam a ser utilizados.

Como suponho que isso já está esclarecido, o Sr. Deputado Vidigal Amaro já pode prosseguir na sua exposição para que, depois, oportunamente, o Governo possa dar as devidas respostas.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr.a Ministra: Muito concretamente, em relação aos hospitais centrais há um aumento de 7,9% nas despesas, relativamente ao ano passado, e em relação aos hospitais distritais esse aumento é de 10%.

Quando estamos aqui a discutir o aumento das despesas com pessoal, o que dizemos é que no orçamento do sector da saúde para este ano vêm já incluídos os aumentos da função pública, o que não acontecia no

ano passado, pois vinha da dotação provisional. Como este ano os aumentos já estão incluídos e o ano passado não estavam, é preciso que isso seja retirado à verba que não foi orçada o ano passado. Tirando essa verba, o aumento do orçamento da saúde é de 11,3%, Sr." Ministra.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Só quero esclarecer uma coisa ao Sr. Deputado Vidigal Amaro, que é o facto de o aumento das despesas com pessoal nos hospitais, relativamente a 1985, ser de 24,5%. Como os aumentos da função pública são de 16,5%, eles têm ainda um volante de 6,9% de aumento.

Quanto ao aumento da verba de consumo dos hospitais, ela aumenta de 18,6%.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr. Secretário de Estado: Pelos números que me foram fornecidos não dá isso, pois já fiz as contas. O ano passado e relativamente aos hospitais centrais foram gastos 34 milhões de contos enquanto para este ano estão previstos 3 156 000 contos. Está aqui orçado e são os únicos elementos que me foram fornecidos.

O Sr. Presidente: — Bem, vejamos se conseguimos chegar a alguma conclusão: Uma vez que pode hzver alguma discrepância quanto às fontes utilizadas, podemos voltar posteriormente a este problema, com vista a esclarecer o assunto, em lugar de estarmos a prolongar aqui a discussão sobre esta matéria. Assim sendo, pergunto ao Sr. Deputado Vidigal Amaro se tem outros aspectos a que se queira referir, nomeadamente em matéria de PIDDAC.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Em relação ao PIDDAC, quero dizer duas palavras: Este ano, o PIDDAC da saúde inclui, e achamos muito bem, o PIDDAC da antiga Direcção-Geral de Construções Hospitalares. Tirando esse PIDDAC, o que se passa é que no PIDDAC da saúde propriamente dito — e este é que interessa, uma vez que são dois mecanismos diferentes — é inferior ao do ano passado. E é com estas verbas que se compram lâmpadas de raios x, que se faz a pequena reparação, que se dá a rentabilidade aos serviços.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Não, Sr. Deputado!

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Pronto, se o Governo me diz que não, então tenho de ouvir as suas explicações.

O Sr. Presidente: — Terá de aguardar um momento até receber as explicações que pede, Sr. Deputado, pois, primeiro, terei de conceder a palavra à Sr.a Deputada Zita Seabra.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — Sr.* Presidente, Srs. Deputados, Sr." Ministra: Quero clarificar apenas alguns aspectos que estão aqui em discussão.

Em primeiro lugar, quanto à verba global do Ministério, por mais números que o Sr. Secretário de Estado ou a Sr.a Ministra dêem, é evidente que o Ministério da Saúde regista a mais pequena subida dos últimos anos, mesmo tendo em conta a taxa previsível para a inflação.

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Em nossa opinião, a subida da verba do Ministério da Saúde, em termos reais e, portanto, excluindo-lhe o aumento da função pública, não é suficiente para cobrir as despesas do Ministério. Das duas, uma: ou prevê-se aqui que dentro de três, quatro ou seis meses a Assembleia esteja a aprovar um orçamento suplementar ou, quanto a nós, esta verba não é claramente suficiente.

A Sr." Ministra e o Sr. Secretário de Estado dizem que o grande corte não se verifica na rubrica dos hospitais e na dos medicamentos, como estamos a afirmar, que é com base nos números que o Governo nos fornece, mas, sim, nas ARS. E dizemos que os maiores cortes orçamentais se verificam nas rubricas dos hospitais centrais e distritais e na dos medicamentos, o que justifica uma subida de apenas 11% no orçamento da saúde excluindo o aumento das despesas com pessoal. Mesmo que a taxa de inflação venha a ser aquela que foi agora anunciada pelo Sr. Primeiro-Ministro, aquelas rubricas registarão ainda um decréscimo em termos reais, pois com uma taxa de inflação de 12%, têm uma subida global de apenas 11 % em relação ao executado no ano passado.

Pergunto muito concretamente onde é que foram feitos os grandes cortes orçamentais, isto é, onde é que há poupança que permite este corte, em termos reais, do orçamento da saúde?

A segunda questão relaciona-se com as taxas moderadoras e é a seguinte: qual é o aumento, previsto pelo Governo, de receitas provenientes da aplicação da taxa moderadora aos utentes. Se está aqui uma verba global, se o Governo se propõe cobrar aos subsistemas — e estamos inteiramente de acordo que o faça — pergunto-lhe se a alteração é relativa aos utentes, porque a partir do momento em que o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional o anterior decreto, houve uma indicação dada aos hospitais para que deixassem de cobrar essas taxas aos utentes. Muitos hospitais deixaram de as cobrar, outros não, mas os utentes deixaram de as pagar.

QuaJ é a verba que está prevista como receita proveniente da aplicação das taxas moderadoras aos utentes? Isso relaciona-se, aliás, com uma proposta de alteração ao orçamento, que iremos apresentar.

Fala-se de medidas de racionalização, de rentabilização de serviços, estamos todos de acordo que essas medidas, pois, são necessárias. O meu camarada de bancada Vidigal Amaro já colocou o «dedo na ferida»; estamos em Março, como é que isso vai ter repercussão orçamental, nomeadamente ao nível dos grandes hospitais centrais?

Disse aqui a Sr." Ministra — e se não interpretei bem as suas palavras, corrija-me —, que o corte na verba relativa aos hospitais centrais resulta da transferência de pessoal para os hospitais distritais, mas, simultaneamente, a verba dos hospitais distritais não aumenta na conformidade ou, então, decresce nos consumos e, nesse caso, os hospitais distritais são inviáveis de gerir.

Quando se fala nos hospitais centrais, creio que o Governo se justifica com os hospitais distritais, mas quando analisamos estes últimos verificamos que não há um acréscimo ou uma melhoria significativa de verbas que nos possa levar a fazer um raciocínio de que há uma grande melhoria nos hospitais distritais em relação a uma transferência, particularmente de médicos, dos hospitais centrais. Com efeito, não é assim, uma vez que a verba global dos hospitais distritais, em rela-

ção ao executado do ano passado — e é com o executado que estamos a comparar, e não com o orçamento — tem apenas uma subida de 10,9%. É isto que penso ser preciso clarificar para não estarmos a discutir em ondas diferentes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Ministra da Saúde.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Em relação às questões que foram agora colocadas, quero fazer algumas observações.

Primeiro, relativamente à verba para os medicamentos, o ponto de vista do Governo é o de que a verba é suficiente, de que conseguiremos poupar esses milhões de contos que a Sr.a Deputada referiu, nos meses em que isso se reflecte na execução orçamental de 1986.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — A Sr.a Ministra dá--me licença que a interrompa?

A Oradora: — Faça favor, Sr." Deputada.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — A Sr.a Ministra vai alterar a comparticipação? Os utentes vão passar a comparticipar mais? Porque uma alternativa possível é a de, em vez de racionalização, o utente pagar mais.

Eu não acredito nesta verba.

A Oradora: — Neste momento, não tenho essa verba prevista, mas disse há pouco à Comissão que os aumentos de comparticipações com efeitos a partir de 1 de Outubro se traduzem em 5 milhões de contos de despesa no orçamento de 1986, pelo que gostaria que os Srs. Deputados tivessem consciência disso. De facto, há um grande aumento de despesa em 1986, que é directamente imputado aos aumentos de comparticipação.

Sobre estas rubricas e a respectiva comparação, quero dizer que quando se está a comparar rubricas de consumos dos hospitais não é possível utilizar o defiacio-nador do consumo público em geral, porque já excluímos, precisamente, as verbas relativas a despesas com pessoal. Portanto, quando estamos apenas a comparar as verbas de consumo dos hospitais — e vou mostrar, com números, porque é que essas verbas crescem de 14% — não é possível utilizar o deflacionador do consumo público em geral, porque, pura e simplesmente, são já verbas destacadas das verbas de aumento de pesr soai.

Em relação às verbas destinadas a hospitais, as relativas a pessoal têm um crescimento global de cerca de 25%, as relativas a consumos têm aquele crescimento que o Sr. Secretário de Estado referiu há pouco e que penso rondar os 18%. De qualquer maneira, os 16,5% como deflacionador do consumo público em geral, incluindo despesas com pessoal, é que não pode ser utilizado aqui porque já excluímos essas despesas. Portanto, isso não pode ser feito aqui nesses termos.

Em relação aos medicamentos e em que medida é que as respectivas despesas se reflectem nas despesas hospitalares e em relação à consulta externa é verdade que as respectivas despesas são imputadas às ARS, mas isso não é verdade no que diz respeito ao consumo interno dos hospitais.

Portanto, também há aí uma verba que entra nos consumos hospitalares.

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Quanto à questão da componente importada, o que entendi que o Sr. Secretário de Estado estava a referir é que nos consumos hospitalares há uma importante componente importada. Era aos consumos hospitalares que ele se estava a referir e não aos equipamentos.

Quanto às comparações de rubricas de consumo de 1985.e 1986, entreguei na comissão especializada este mapa, que é o que têm vindo a referir, no qual constam, em relação a 1985, as verbas da execução orçamental, mas não a repartição dessa verba pelas várias componentes. Simultaneamente, entreguei este papel onde essa repartição está feita.

Portanto, é em relação a este documento que é possível comparar os consumos de 1985 e 1986.

Em relação aos hospitais, por grupos — não é fácil anexar os novos hospitais a tudo o resto porque aí há despesas que não têm comparação fácil com aquilo que estava para trás —, e no que respeita aos consumos, posso dizer que em 1985 os hospitais centrais gastaram 11 955 000 contos e o que está previsto para 1986 são 3 629 000 contos, o que, nas minhas contas, dá 14% de alteração.

Em relação aos hospitais distritais, em 1985 foram gastos com consumos 5 683 000 contos e o que está previsto para 1986 são 6 820 000 contos, o que dá mais 20%.

Nos novos hospitais distritais, em 1985 gastaram-se 795 000 contos e em 1986 prevê-se uma verba de 906 000 contos, o que dá mais 14%. Não é relativamente a estes hospitais que se sente o desenvolvimento da rede hospitalar mas, sim, naqueles que eram já hospitais distritais.

Por outro lado, em relação aos novos hospitais nem vale a pena fazermos uma comparação uma vez que aí a situação é completamente diferente.

Portanto, quando se fala em aumento de 14%, trata--se de rubricas de consumo de 1986 relativamente a rubricas de consumo de 1985, pelo que no mapa geral da estimativa das despesas os Srs. Deputados não têm dados suficientes para ver isso. Embora os tenham num outro mapa que também entreguei.

Como referi, se a comparação entre a execução orçamental de 1985 e as estimativas para 1986 dá valores aproximados daqueles que os Srs. Deputados referiram, isso tem a ver com o facto de em relação aos hospitais ter havido mais despesas de 1984 para 1985 do que aquela que passou de 1985 para 1986. Os Srs. Deputados têm também esses dados detalhados no mapa que lhes entreguei.

Em relação aos hospitais, as despesas relativas a encargos contraídos em 1984 e que foram pagas em 1985 foram 3 518 000 contos — o que consta também daquele segundo mapa que lhes entreguei —, e para as relativas a encargos de 1985 e que são pagas em 1986 prevê-se 1 050 000 contos. Portanto, há aí uma diferença, para mais, naquilo que passou de 1984 para 1985, o que justifica que a comparação entre as rubricas de execução orçamental de 1985 e as de previsão orçamental para 1986 dê valores inferiores aos 14% que referi.

Eu penso ter citado suficientemente bem os números para que, pelo menos em relação às bases das quais estamos a partir, nos entendamos quanto a estas modificações.

Em relação ao pessoal e comparando os dois textos, têm dados sobre a evolução do pessoal nos hospitais centrais e distritais. Se quiserem números muito deta-

lhados, são os seguintes: os hospitais centrais gastaram com pessoal, em 1985, 23 594 000 contos. Acrescentando a isso a actualização salarial atinge-se um montante de 27 487 000 contos. A previsão para 1986 é de 26 915 000 contos, incluindo o pessoal que saiu e sairá dos hospitais centrais, durante este ano, para os hospitais distritais ou para as ARS.

Em compensação, nos hospitais distritais a simples actualização dos vencimentos ascenderia a 14 714 000 contos e a verba prevista é de 15 092 000 contos, onde estão abrangidos os especialistas que passarão de hospitais centrais para distritais, em princípio, mas muitos deles já terão feito o internato complementar nos hospitais distritais e, portanto, já lá estão. Digamos que, de certa maneira, houve alguma sobreavaliação. As verbas previstas em termos de pessoal chegam perfeitamente.

Em relação à comparação entre o orçamento de 1986 e o de 1985 — em que foi referido que o de 1986 é apresentado com as rubricas de pessoal actualizadas — ela é feita em termos diferentes daquilo que aconteceu anteriormente. Está tudo bem se nos limitarmos a ver as actualizações salariais em relação a 1985, mas, como os Srs. Deputados sabem, as actualizações salariais são de cerca de 16,5% e o pessoal cresce em mais de 25%. Há aí, portanto, uma diferença de crescimento líquido de pessoal que, naturalmente, também tem a ver com promoções e valorização profissional de trabalhadores que não podem deixar de reflectir-se na melhoria do serviço que é prestado.

Do ponto de vista do Governo, o que não é legítimo é fazer as comparações excluindo, totalmente, o peso que o novo pessoal e o pessoal mais qualificado tem no orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Isso seria reconhecer que eles são um peso morto e que a sua valorização não se traduz em melhoria de benefícios. Do ponto de vista do Governo isso não é verdade. Portanto, pelo menos aquilo que é aumento líquido de despesas com pessoal, isto é, aquilo que se traduz em aumento líquido de pessoal e de melhoria do estatuto profissional, nomeadamente as promoções, ou alteração de carreiras, não pode deixar de se traduzir em melhoria dos cuidados prestados, caso contrário não faria qualquer sentido.

Em relação ao PIDDAC, não é possível fazer uma comparação como foi feita entre o que estava orçamentado para a Saúde ou o que estava na Direcção-Geral das Construções Hospitalares. Por exemplo, Sr. Deputado Vidigal Amaro, em relação às tais pequenas reparações que estariam no PIDDAC, devo dizer-lhe que não estão, estão nas despesas normais de consumo. O PIDDAC, que era da saúde, engloba algumas das despesas que não são, nem de perto nem de longe, de pormenor; por exemplo, está lá uma angiografia digital para os Hospitais Civis de Lisboa o que não é, de todo o modo, uma pequena reparação de qualquer pequena coisa — custa cerca de 50 000 contos. No PIDDAC estão inscritas algumas despesas pesadas.

Mas, não é possível fazer a comparação separada do que era a Direcção-Geral das Construções Hospitalares e do que era Ministério da Saúde porque não há uma diferença tão estanque entre o que é equipamento mais leve ou menos leve, embora, tendencialmente, aquilo que está inscrito na Direcção-Geraí das Construções Hospitalares seja, em princípio, equipamento mais pesado.

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Só é legítimo, do nosso ponto de vista, comparar verbas globais, e aí há uma modificação substancial. Mas naquela modificação que eu lhe referi, de 26,5%, não estão incluídas as verbas dos P1DRE que posso dizer, neste momento, que aumentaram —e isto é um ponto importante porque também dei dados detalhados na comissão parlamentar respectiva sobre elementos dos PIDRE — relativamente a despesas com a saúde, cerca de 356% — há uma passagem de 128 000 contos em 1985 para 456 000 contos em 1986. E muitas dessas despesas incluídas nos PIDRE confundem-se com despesas que poderiam ser da ex-Direcção-Geral das Construções Hospitalares ou dos Serviços de Saúde e que assim são aliviadas através da assumpção pelos PIDRE dessas despesas.

Quanto às taxas moderadoras, perguntou-se o que é que se passa com elas e quais os aumentos respectivos. Devo dizer — aliás já o referi e repito-o — que a parte mais substancial que aí está prevista como «Receitas dos serviços de saúde» — não me estou a referir às receitas do Serviço Nacional de Saúde, pois essas têm sobretudo a ver com receitas provenientes de cumprimentos de convenções internacionais da Segurança Social — tem essa denominação na medida em que a generalidade dos países com os quais temos essas convenções têm prestações de saúde incluídas nas prestações da Segurança Social. Portanto, as convenções da Segurança Social existentes têm também prestações de saúde. 1 018 000 contos de 1985 têm a ver com a recuperação de atrasados numa grande medida, e, em 1986, a quantia prevista é de 350 000 contos, mas vamos excluir essa parte que tem a ver substancialmente com estes factos.

Em relação aos subsistemas e taxas moderadoras, devo dizer que a parte mais substancial, de longe, tem a ver com os subsistemas. Aquilo que resultará do pagamento de taxas moderadoras é uma quantia muito diminuta que neste momento prevemos que se situe à volta dos 250 000 contos. Comparar isso com a despesa global do Ministério da Saúde mostra que não há alguma espécie de possibilidade de dizer que alguém vai pagar aquilo que recebe — não faz sentido.

Por outro lado, como sabem, o decreto-lei configura uma série de situações em que não são pagas taxas moderadoras e prevê que em portaria do Ministério da Saúde sejam isentas do pagamento dessas taxas certas categorias de pessoas. Aliás, referi publicamente à RDP-Antena 1, alguns dos grupos que vão ser isentos — alguns dos quais já existiam, como os reformados, as grávidas, as crianças, na assistência materno--infantil — e que incluem deficientes e desempregados. Portanto, o peso em que, de facto, se traduzirá o pagamento das taxas moderadoras deve ser reconduzido ao respectivo âmbito e não ser muito valorizado no contexto daquilo que tem a ver, de facto, com reembolsos de subsistemas.

É sobretudo daí e, em grande parte, das companhias de seguros que esperamos que o SNS se faça pagar dentro daquilo que é razoável que os outros subsistemas suportem.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, eu aproveito a oportunidade para relembrar que, de acordo com aquilo que concordámos no início dos nossos trabalhos, as propostas de emenda, de alteração e de aditamento devem ser apresentadas, no que diz respeito às despesas, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, até

ao final do dia de hoje, isto é, até ao final dos nossos trabalhos de hoje. Digo isto para que algum eventual retardatário não sofra alguma surpresa desagradável. Tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): — Sr.a Ministra da Saúde, relativamente ao PIDDAC falou V. Ex.& na angiografia digital e há um erro grave em Santa Maria. Realmente está prevista a verba para a angiografia digital, que é um material necessário, mas a montagem vem prevista para cinco anos. Não pode ser, Sr.3 Ministra. Aquilo que se começa este ano tem que se terminar até ao final do ano, a verba tem que ser distribuída por dois anos. Que assim é, basta ver-se no mapa; trata-se de um projecto plurianual e tem uma verba «espalhada» por cinco anos. Aquilo que se começa a montar tem que estar pronto no início do ano que vem. Este é apenas um pormenor.

Outro pormenor que queria perguntar à Sr.a Ministra é o problema — que já lhe coloquei na Comissão de Saúde, mas como hoje estamos a gravar a sessão quero que fique em acta — do Hospital do Patrocínio, de Évora, esse triste folhetim que se vem arrastando há não sei quantos anos; todos os grupos parlamentares cada vez que lá passam vão prometendo que desta vez é que se faz a obra de conclusão do Hospital — por conseguinte aquilo não é a obra do Hospital do Patrocínio, é o aumento do Hospital Distrital —, sistematicamente se faz essa promessa e a única obra efectuada foi a do" ano passado durante a visita do Presidente da Repúbica, General Ramalho Eanes, e que se resumiu à colocação de um tapume novo, de madeira, porque o outro estava a cair. Foi a única obra que se fez no Hospital Distrital.

O que pergunto à Sr.a Ministra, como no PIDDAC não vejo verbas incluídas, é se concorda que a Comissão proponha uma verba para reinício dos trabalhos. É evidente que o ano também já vai largo, a verba não pode ser grande, mas é necessário reiniciarem-se os estudos e aproveitar-se aquele maravilhoso edifício que de ano para ano se vai degradando. É um assunto que — não é por ser regionalista — bate as raias de tudo quanto se possa imaginar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr.a Ministra, ainda voltando aos hospitais, far-lhe-ei um pedido de esclarecimento.

Neste mapa que distribuiu à Comissão de Saúde, quando nos aparece o capítulo da execução orçamental, será que nele se integram receitas próprias dos hospitais?

A segunda questão é a seguinte: qual o valor das receitas próprias dos hospitais em 1985?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.a Ministra da Saúde.

A Sr." Ministra da Saúde: — Sr. Deputado Vidigal Amaro, em relação à angiografia digital, confesso que, neste momento, não lhe sei explicar por que é que está referido aquilo que V. Ex.a disse, e se está, é evidente que é um erro, porque é óbvio que não faz sentido nenhum que se leve cinco anos a instalar uma angiografia digital.

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Em segundo lugar, em relação ao Hospital do Patrocínio e como, de facto, o Sr. Deputado me fez a mesma pergunta na Comissão de Saúde, respondo-lhe do mesmo modo que respondi naquela Comissão. Como sabe, há alguma margem de manobra na distribuição das verbas do PIDDAC e a intenção do Governo é — porque houve algum afastar no tempo entre a elaboração ...

Ó Sr. Deputado, infelizmente o Ministro da Saúde não tem sido capaz, todos os anos, de gastar toda a verba que lhe é atribuída em PIDDAC. Vamos tentar fazer com que as coisas melhorem, mas infelizmente é assim.

A história do Hospital do Patrocínio é uma história complicada de que eu só me apercebi depois de ter podido introduzir no PIDDAC alguma coisa para esse Hospital. De facto, há muitos anos que essa obra está parada e julgo que não demonstra muito respeito para com o contribuinte que uma coisa dessas aconteça. Não é o único caso no País, mas é uma situação séria e a intenção do Governo é a mesma que eu lhe comuniquei na Comissão de Saúde, é a de utilizar alguma margem de manobra para atribuir uma verba para que aquela obra arranque e para que as pessoas compreendam que as coisas não podem continuar naquela situação.

Esta referência à execução orçamental de 1985 tem a ver com a verba que cada um dos tipos dos serviços recebem do Orçamento do Estado e, portanto, subtraídos daquilo que é receita própria de cada um dos tipos de serviços. Aliás, se comparar essa verba de execução orçamental com a estimativa detalhada para 1985, que eu entreguei, verá que por exemplo em relação às ARSs estão lá 77 780 000 contos, constituídos pelas despesas de pessoal, mais os consumos, mais o défice de 1984, menos receita própria, menos o défice de 1985. Portanto, corresponde exactamente a esta conta a verba que aí está em execução orçamental.

Quanto ao que foram as receitas próprias dos hospitais em 1985 — penso que foi essa a pergunta que me colocou —, foram de 4 442 000 contos. Isto é uma estimativa, na medida em que, neste momento, ainda não temos as contas dos hospitais todas fechadas — isso, aliás, está no segundo papel que entreguei.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Srs. Deputados, gostava apenas de reforçar o que foi dito e de tranquilizar VV. Ex.*3, relativamente às verbas de pessoal.

Já agora volto a ler, para ficar registado: quanto ao Serviço Nacional de Saúde e serviços autónomos, a verba cresce de 1 157 000 contos para 1 443 000 contos, o que dá um aumento de 24,7%; quanto aos hospitais, a verba cresce de 37 000 contos e 1 652 000 contos para 46 000 contos e 874 000 contos, o que dá um acréscimo de 24,5%; quanto às ARSs, a verba aumenta de 22 000 contos e 621 000 contos para 28 000 contos e 769 000 contos, o que dá um acréscimo de 27,2%; quanto à psiquiatria, aumenta de 2000 contos e 839 000 contos para 3000 contos e 449 000 contos, o que dá um acréscimo de 21,5%.

Relativamente ao que foi questionado sobre a evolução económica deste sector, devo dizer que os governos europeus têm-se defrontado nessa matéria com cres-

centes problemas de verbas para a saúde. E no problema que se tem posto a propósito do PIDDAC na saúde e porque ele não era gerido pelo Ministério da Saúde ou pelo anterior Ministro dos Assuntos Sociais havia uma grande dificuldade e grandes discrepâncias. O próprio Ministro dos Assuntos Sociais não tinha conhecimento — ou só tinha a posteriori — das verbas que estariam incluídas no PIDDAC da saúde. Por isso é que a passagem da Direcção-Geral das Construções Hospitalares para o Ministério da Saúde deu uma maior margem de controle das verbas. Todos nós sabemos que as verbas do PIDDAC eram utilizadas para as coisas mais variadas, como forma de pagar pessoal, tarefeiros, etc. Portanto, aí pode haver, de facto, uma melhor utilização das verbas e ouvi vários Ministros da Saúde e dos Assuntos Sociais a referirem-se e queixarem-se de que não poderiam dispor das verbas do PIDDAC para fazer investimentos em infra-estruturas. Esta era, pois, a posição que queria esclarecer aos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: — Eu estava a dizer à Sr.a Ministra que houve Ministros dos Assuntos Sociais que nunca tiveram PIDDAC. Tenho essa experiência pessoal.

Tem a palavra a Sr.8 Deputada Zita Seabra.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, sobre a verba que enunciou, pergunto-lhe qual é a comparação da verba do Ministério da Saúde — embora tenha fornecido três verbas discriminadas — deste ano com a do ano passado. Quaí é a percentagem de aumento, excluindo, evidentemente, o aumento da função pública que o ano passado não estava metido, que, portanto, se lhe acrescentar os 16% de aumento da função pública não se podem comparar.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não, Sr.a Deputada, aqui considero o orçamento da saúde de 1985 rectificado.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — Portanto, já está a comparar com o orçamento executado no ano passado, isto é, já englobando o aumento da função pública do ano passado.

Se assim é, pergunto-lhe qual é a conta global.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Se me

dá licença que responda, Sr. Presidente, direi que a verba em termos de Serviço Nacional de Saúde para despesas com pessoal passa de 64 249 000 contos para 80 508 000 contos, o que equivale a um aumento de 25,3% ou, em termos económicos, o efeito de preço é de 16,5% e o efeito de quantidade é de 7,6%.

Portanto, é este o valor. O Serviço Nacional de Saúde, em termos globais, tem um aumento de 14,9%, mas porque há aqui outros valores — relativamente aos consumos, que aumentam 12,5%, sem pessoal.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada Zita Seabra, tem que falar ao microfone sob pena de não ficar registado.

A Sr.a Zita Seabra (PCP): — Isto é, quando se fala do pessoal...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sem

medicamentos; os consumos sem pessoal nem medicamentos aumentam 14% ou até mais do que isso.

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2 DE ABRIL DE 1986

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O Sr. Presidente: — Nós já discutimos este problema e cada um já expressou as suas perspectivas, de modo que tenho as minhas dúvidas de que adiantemos muito mais.

Tem a palavra o Sr. Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, se me dá licença, gostaria que tentássemos clarificar essa questão, embora já tivéssemos passado por ela.

Assim sendo, quero apenas colocar algumas questões ao Sr. Secretário de Estado ou à Sr.a Ministra. Quanto aos hospitais, gostava de saber quais os encargos com pessoal suportados em 1985.

A Sr.a Ministra da Saúde: — 95 223 000 contos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — 95 223 000 contos?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Isso é a verba de 1986.

A Sr.a Ministra da Saúde: — 37 632 000 contos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, tenho aqui uns mapas que nos dizem que em 1986 as despesas com pessoal dos hospitais orçarão em 46 847 000 contos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — O melhor é ficarmos com os cerca de 45 milhões, que é a verba que vem nos mapas que todos temos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Se compararmos com 1985, temos para este ano 37 632 000 contos, o que dá um aumento de 24,5%.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Bem, o problema é o seguinte: podemos fazer agora as contas e só quero ficar esclarecido, pois ninguém perde com um esclarecimento. Em relação à verba para hospitais, o aumento global de despesas previstas para 1986 em relação ao executado em 1985 é de 13,27%.

Por conseguinte, se pegar no mapa que foi fornecido à Comissão de Saúde e, nomeadamente, na última coluna, que é a do financiamento necessário, e se a ela somar as receitas próprias, tem a despesa total prevista para 1986, isto é, 63 458 000 contos, relativos, pois, à despesa total dos hospitais. O financiamento necessário, que é aquilo com que o Orçamento tem de entrar, mais as receitas próprias constituem a despesa total dos hospitais, de acordo com o mapa que foi fornecido.

Em 1985, de acordo com os elementos que a Sr.a Ministra nos forneceu há pouco, essa despesa é de 58 670 000 contos, isto é, os 54 228 000 contos que aparecem na primeira coluna e os 4 442 000 que teria sido a receita própria de 1985.

A Sr.a Ministra da Saúde: — Importa-se de referir essa segunda referência, Sr. Deputado?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Em 1985 as despeas com os hospitais foram de 54 228 000 contos — primeira coluna do mapa fornecido —, a que há que acrescer os 4 442 000 contos de receitas próprias dos hospitais em 1985, segundo os elementos que a Sr." Ministra há pouco nos forneceu.

A Sr." Ministra da Saúde: — Já está tirada...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Falta o défice...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Aos 54 228 000

contos estão retiradas as receitas próprias e, por isso, temos de as somar.

Se assim for, temos que a verba comparável, isto é, a despesa total dos hospitais, foi paga com o que receberam do Estado e com as receitas próprias. A despesa total dos hospitais foi de 58 670 000 contos...

Voz inaudível na gravação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — ... — depois comparamos com o outro Orçamento — que compara com os 66 458 000 contos, que são os 60 826 000 contos da última coluna mais os 5 632 000 contos de receitas próprias. Ora, a diferença entre os 58 670 000 contos e os 66 458 000 contos é de 13,27% e, por isso, este é o aumento.

Como, pelos vistos, o aumento com encargos de pessoal é de vinte e tal por cento, para os outros consumos ou, melhor, para os consumos a diferença será muito menor em termos de evolução — qualquer coisa como 5%, 6% ou 7%.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Efectivamente, os valores que o Sr. Deputado Octávio Teixeira está a dizer não estão errados. Ele está é a vê-los de outra óptica. É que há que considerar as novas admissões, o défice transitado e o défice volante. Há sempre aqui o...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Há pouco, se o Sr. Secretário de Estado me dá licença, enganei-me quando disse que para os consumos, excluindo os encargos para pessoal, deve haver um aumento dos 5 % ou 6%, pois, de facto, há um aumento precisamente igual a 0,9%.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Se me

der licença, Sr. Deputado, vou dar os mesmos valores que V. Ex.a apresentou. Em 1985 as receitas dos hospitais foram as seguintes: receitas próprias, 4 442 000 contos do Orçamento de Estado, e outras, 54 228 000 contos, o que dá um total de receitas de 58 670 000 contos. As despesas com pessoal foram de 37 632 000 contos e os consumos de 18 570 000 contos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — E os outros 3 milhões, onde é que ficam?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O

défice do ano anterior são 3 518 000 contos — esse é

0 défice volante — e há um défice do exercício de

1 050 000 contos. São, pois, comparáveis um ao outro. No Orçamento de 1986 há uma redução do défice

de 3 518 000 contos para 1 050 000 contos; portanto, os 3 518 000 contos são encargos que foram pagos em 1985 e que em 1986 já só vão ser de 1 050 000 contos. Aí está a diferença e, digamos, é esse alívio em termos de despesa que vai permitir que as despesas com pessoal aumentem, nos hospitais, de 37 632 000 contos para 46 847 000 contos, que é o tal aumento de 24,5% para pessoal, e que os consumos passem de 18 570 000 contos para 22 020 000 contos, o que equivale, sem pessoal, a um aumento de 18,6%.

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II SÉRIE — NÚMERO 47

As despesas com o défice do ano anterior passam de 3 518 000 contos para 1 050 000 contos, o que equivale a uma quebra de perto de 70%. Isto significa que a variação global das despesas dos hospitais aumenta 17,1%, o que é superior à variação do índice de preços, que é da ordem dos 14%.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, eu acredito em tudo o que V. Ex.a disse. Só que, possivelmente, há dois Orçamentos: o do Ministério da Saúde e o do Ministério das Finanças.

O défice que tenho aqui neste mapa — estou a olhar para ele pela primeira vez — relativo a 1985 é de 1 050 000 contos e o défice previsto para 1986 é de 1 835 000 contos. Por conseguinte, não consigo descobrir aqui onde é que estão os cerca de 3 milhões de contos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — É porque aparecem, ainda nos encargos da gerência de 1985, encargos do exercício de 1984. Daí a tal discrepância entre os cálculos que o Sr. Deputado está a fazer e os cálculos de que nós falamos. O Sr. Deputado está a falar correctamente, mas nós também.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Então V. Ex.a falava em 18 milhões de comos de consumos...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Os

consumos sem pessoal passam de 18 570 000 contos para 22 020 000 contos, o que dá um aumento de 18,6%.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — 22 020 000 contos, aumenta o défice em 800 000 contos...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O

défice dos hospitais passa de 1 050 000 contos para 1 834 000 contos.

O Sr. Presidente: — Eu não sei se o Sr. Deputado Octávio Teixeira se recorda que quando foi do Orçamento previsto...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Estou a perceber perfeitamente aquilo que diz o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — ... houve uma redução das transferências. Em 1985 pagaram-se de 1984 cerca de 3 milhões de contos e este ano vai pagar-se cerca de 1 milhão de contos de 1985. Há esta diminuição.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, como não está neste mapa a questão dos 3 milhões de contos, não poderia descobri-la. Mas, já agora, se me permite fazer um pequeno comentário, devo dizer que está interessante. O Orçamento de 1985 é uma maravilha porque vai suportar — em termos comparativos — um défice acrescido de cerca de 3 800 000 contos, só deixando passar 1 050 000 contos, e o Orçamento de 1986 vai pagar 1 050 000 contos, mas deixa passar 1 834 000 contos. Por conseguinte, o ano de 1986 sobrecarrega o ano de 1985 em termos orçamentais e alivia o ano de 1986, porque aumenta a divida em trânsito quase para o dobro. Não é mau...

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado, vejo isto de um modo diferente. Recebeu-se um défice de exercícios anteriores de 3 518 000 contos e fica-se com um défice global — o que é pago e o que transita para 1986 — de 1 839 000 contos mais 3 518 000 contos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Transita para 1986 1 834 000 contos ou transita de 1986 para 1987

1 834 000 contos?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Desculpe, transita de 1986 para 1987.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Pois, e só transitou para 1986 1 050 000 contos. Por conseguinte, em termos orçamentais comparativos, o orçamento do Serviço Nacional de Saúde, hospitais, tem aqui um bene-ficiozinho de apenas 800 000 contos. Em termos comparativos com o Orçamento de 1985, este tem mais

2 750 000 contos, o que não é mau. O anterior Secretário de Estado do Orçamento é que não deve gostar nada disto quando fizerem comparações com o Orçamento dele.

O Sr. Presidente: — Srs. Membros do Governo, Srs. Membros da Comissão, penso que já está esclarecido este ponto e, portanto, quero perguntar se há mais alguma questão a colocar.

Não havendo mais questões, quero agradecer à Sr.a Ministra da Saúde ter estado aqui connosco e ter--nos dado os esclarecimentos sobre as despesas do seu Ministério. Vamos interromper a reunião até às 15 horas, altura em que continuaremos os nossos trabalhos, com a presença do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Está suspensa a reunião.

Eram 12 horas.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: — Pergunto aos Srs. Deputados se têm mais alguma questão a colocar à Sr.a Ministra da Saúde.

Pausa.

Não havendo mais questões a colocar, quero agradecer à Sr.a Ministra da Saúde o facto de ter estado aqui connosco a dar-nos os esclarecimentos sobre as despesas do seu departamento.

Srs. Deputados, vamos recomeçar os nossos trabalhos com o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Já se encontram presentes o Sr. Ministro e os respectivos secretários de Estado, pelo que já estamos em condições de prosseguir os trabalhos, aliás conforme o previsto.

De acordo com o procedimento habitual, dou a palavra ao Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações para ele fazer, querendo, uma curta exposição sobre o orçamento das despesas do seu Ministério.

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Talvez, por uma questão de facilidade, pudéssemos dividir a parte relativa ao Estado propriamente dito e a parte relativa às empresas públicas e discuti-las depois, evidentemente na parte que diz respeito ao Orçamento do Estado, separadamente, o que, porventura, facilitaria os nossos trabalhos. Sugeriria que, se pudesse, o Sr. Ministro ordenasse a sua exposição inicial por sectores. Depois, veríamos se há ou não muitas perguntas em relação a cada um dos sectores e se os temos de tratar ou não por secretarias de Estado.

Vozes inaudíveis na gravação.

O Sr. Presidente: — Sim, mas pode ser uma exposição única dividida em três secretarias de Estado, dado que o seu Ministério é único. Depois, se for muita matéria, faremos uma discussão mais dividida.

Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (João de Oliveira Martins): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como introdução a esta análise, resumiria aquilo que disse em Plenário sobre o que penso serem os tópicos essenciais deste orçamento.

Em primeiro lugar, devo dizer que o orçamento do meu Ministério, para ser devidamente analisado em termos comparativos, deve ter em conta as alterações orgânicas que se deram com a entrada em funcionamento deste governo e que, portanto, se devem comparar os conjuntos de serviços que são contemplados no Orçamento para 1986 e no Orçamento para 1985. Essa comparação entre conjuntos perfeitamente homólogos e comparáveis dá efectivamente um crescimento nas despesas de funcionamento do Ministério de 32% — 33%.

Este acréscimo nas despesas de funcionamento resulta de uma verba que cresce muito no âmbito de um departamento do Ministério — a Secretaria-Geral — e que, no fundo, é proveniente de transferências com três objectivos: o funcionamento da Junta Autónoma das Estradas, o pagamento do serviço de reformas dos ferroviários e, pela primeira vez, a atribuição de uma dotação para o subsídio de renda a que terão direito os inquilinos que, não tendo rendimentos suficientes, vão ser confrontados com actualizações de rendas habitacionais. Estas três rubricas justificam o acréscimo das despesas de funcionamento do meu Ministério, porque, quanto ao mais, nele se verifica e se concretiza a política que o Governo resolveu adoptar, ou seja, a máxima compressão das despesas correntes, com o objectivo de aumentar as despesas de investimento.

O segundo tópico reporta-se aos investimentos do Plano, ao PIDDAC, em que há um crescimento significativo das despesas, que fica a dever-se a dois factos: em primeiro lugar, ao facto de termos uma componente muito forte de compromissos que vêm do antecedente e, em segundo lugar, ao facto de o Governo ter atribuído uma prioridade ao sector da construção civil e obras públicas, como sector capaz de rapidamente gerar emprego e fazer face a um dos problemas graves que o País enfrenta.

O esforço financeiro do Estado para o PIDDAC no meu Ministério é considerável — da ordem dos 50% —, mas, como já tive oportunidade de esclarecer, tem de se ter em conta neste esforço que ele já contém as comparticipações do FEDER para certos

empreendimentos, no domínio dos portos, das vias férreas e das estradas, que foram financiados — estou a falar do PIDDAC.

O terceiro tópico diz respeito ao sector empresarial do Estado, o qual é contemplado no Orçamento com um verba global de 42 milhões de contos para dotações de capital e indemnizações compensatórias.

Temos aqui, efectivamente, um problema orçamental que não está tão definido como os outros, porque, dadas as alterações das variáveis macroeconómicas em curso, como as taxas de juro, a inflação e os salários reais, e outras alterações que passarão a «entrar» em todos nós, no domínio do plausível, nos próximos tempos, o conjunto da estrutura dos custos das empresas do sector público vai alterar-se significativamente. Se, por um lado, houver, como o Governo prevê, uma retoma da actividade económica com crescimento de tráfegos e, por outro lado, uma variação de custos fortemente acentuada, suponho que ninguém estará em condições de prever com exactidão qual deve ser o volume de indemnizações compensatórias de que as empresas de transporte necessitarão.

Em primeira análise, pareceu-nos que as verbas que constam do Plano seriam razoáveis, mas, como já tive oportunidade de dizer, manda a verdade que se diga que poderá haver aqui uma ou outra flutuação, de resto paralela à que outras verbas do Orçamento do Estado, seja de receitas, seja de despesas, poderão porventura apresentar.

Em síntese, era isto o que, segundo penso, seria útil dizer na abertura deste debate sobre as despesas do meu Ministério.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, por um questão de facilidade — e, de acordo com a metodologia, iria colocar a questão aos diversos grupos parlamentares —, proporia que começássemos pela parte relativa às obras públicas. Arrumada a parte relativa às obras públicas, passaríamos às Secretarias de Estado dos Transportes e Comunicações, das Vias de Comunicação e da Construção e Habitação. Depois, faríamos a analise do PIDDAC.

Penso que esta é uma maneira de arrumarmos algumas questões, sem misturar tudo, o que não significa que tenhamos de ser absolutamente rigorosos.

Na parte das obras públicas, temos basicamente os problemas da Secretaria-Geral, com um verba de 14 822 138 contos.

Isso facilitaria, porventura, o modo de discutirmos o Orçamento, em vez de estarmos a fazer perguntas sobre tudo, em conjunto. Isto não significa que, se algum dos Srs. Deputados não se enquadrar rigorosamente nesta disciplina, não possa fazer perguntas, mas é uma tentativa de ordenarmos a discussão do modo mais eficiente.

Começaria por perguntar aos Srs. Deputados do PSD se têm alguma questão a colocar ao Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações ou a algum dos Srs. Secretários de Estado, no âmbito da parte relativa às obras públicas, ou seja, da parte do texto da proposta de lei compreendida entre os capítulos 01 a 06 do Ministério em causa.

Pausa.

Não havendo questões a colocar da parte do PSD, pergunto aos Srs. Deputados do Partido Socialista se têm alguma questão a colocar.

Pausa.

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II SÉRIE — NÚMERO 47

Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro, gostaria que me desse alguns esclarecimentos.

Por ocasião da sua intervenção no debate na generalidade, verifiquei que eram atribuídos 27 milhões de contos para indemnizações compensatórias. Gostaria que me confirmasse este número, visto que, no mapa do adicional que nos foi distribuído, há uma chaveta que abrange várias empresas, nem todas de transportes. Queria apenas uma confirmação quanto a este ponto.

Depois, há outros problemas relativos ainda às indemnizações compensatórias. Na realidade, independentemente do que foi orçamentado para 1985, visto que essa é matéria que já está resolvida e o que nos interessa agora são as necessidades para 1986, verifica--se que, feito o somatório das várias empresas em causa, existe necessidade de indemnizações compensatórias da ordem dos 40 milhões de contos. Gostaria de saber se de facto o Ministério entende que 27 milhões são suficientes perante essas necessidades de 40 milhões de contos.

Por outro lado, quanto às dotações de capital, para as quais estão previstos 15 milhões de contos, a maneira como o mapa é apresentado abrange logicamente, embora lá não haja nenhuma referência, a Brisa, nomeadamente. Teríamos, depois, 15 milhões de contos para as empresas de transportes. Todavia, as nossas estimativas levam-nos a concluir que as necessidades de dotações de capital são da ordem dos 20 milhões de contos, com particular incidência nos casos da CP e do Metropolitano, pelo que há aí uma diferença de 5 milhões de contos.

São estes os pontos fundamentais que gostaríamos de apresentar.

Por outro lado, ainda com incidência orçamental de uma maneira indirecta, gostaríamos de saber se o Ministério tem planificado para o ano de 1986 o desenvolvimento do plano nacional de transportes, em algum sentido diferente do que o que se encontra até agora estipulado, e se pensa apresentar à Assembleia da República as incidências orçamentais daí decorrentes.

De uma outra questão — a questão do IVA — falará o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Sr. Ministro, na discussão na generalidade em Plenário tive ocasião de levantar a questão da não repercussão do IVA nos utilizadores, medida com a qual estamos de acordo, e de frisar a nossa preocupação quanto às repercussões que daí adviriam, nomeadamente para as empresas de transportes e de comunicações.

No caso das empresas de transportes, o meu colega João Cravinho já colocou a questão das indemnizações compensatórias, que poderão, de alguma forma, vir a resolver o problema.

No caso das empresas de comunicações, especificamente no dos CTT e dos TLP, pergunto como é que o Ministério pensa resolver o problema. Ou seja, a questão da não repercussão do IVA nos utilizadores levará de facto a uma degradação da situação económica e financeira destas empresas? Quais são os resultados previsionais que são esperados para este ano de 1986?

Poderia ainda o Sr. Ministro dar-nos uma ideia de, por exemplo, qual é o montante do investimento que estas empresas farão este ano? Será este investimento maior ou menor do que em anos transactos? Esta pergunta tem a sua lógica, dada a grande importância que o investimento nesta área tem para toda uma indústria que, no fundo, vive em grande parte do investimento que o sector empresarial do Estado faz.

Por outro lado, também gostaria de saber em que medida poderá haver ou não uma afectação, em consequência deste tipo de situação, das verbas destinadas à investigação e ao desenvolvimento, uma vez que é conhecido que os CTT e os TLP são as únicas empresas públicas no nosso país que têm um orçamento próprio para investigação e desenvolvimento. Gostaria, portanto, de saber se este orçamento será ou não posto em causa por isso.

Aproveitaria este balanço para colocar mais duas questões, às quais talvez o Sr. Ministro possa responder.

Uma delas relaciona-se com o que está previsto em termos de investimento para a Região Autónoma dos Açores, uma vez que, com os grandes temporais que ocorreram recentemente na Região, se verificaram danos avultados no sistema de telecomunicações. Gostaria de saber se foi prevista, em termos orçamentais, alguma verba para acorrer a esta dificuldade.

Em segundo lugar, e também em relação à Região Autónoma da Madeira, gostaria de saber em que medida é que os projectos que visam a introdução da rede de telepac na Região Autónoma, o que penso ser de importância vital para a Região e para os projectos que o Governo Regional considera prioritários, nomeadamente os que têm a ver com a zona franca e com o desenvolvimento do sector de serviços na Região Autónoma, podem ou não ser exequíveis durante o ano de 1986?

O Sr. Presidente: — Vejo que os Srs. Deputados João Cravinho e Raul Junqueiro não aceitaram plenamente a metodologia que propus, tendo feito, por isso, perguntas quer em relação à matéria das empresas públicas quer quanto às matérias relativas às outras secretarias de Estado, o que, afinal de contas, talvez seja um caminho mais expedido — veremos!

Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Marques.

O Sr. Vasco Marques (PRD): — Sendo assim, Sr. Presidente, perguntaria se seguimos o caminho de fazermos perguntas apenas relativamente às obras públicas ou se colocamos perguntas na generalidade, como faz o Partido Socialista.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, penso que o melhor é seguirmos o exemplo do Partido Socialista, porque, afinal de contas, não se tendo estendido em muitas perguntas, talvez venhamos a ganhar tempo.

O Sr. Vasco Marques (PRD): — Também não vamos fazer muitas perguntas e aceitamos esta metodologia.

O Sr. Presidente: — Não digo que não tenham sido substanciais, mas não foram muitas em quantidade. Tem a palavra, Sr. Deputado Vasco Marques.

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O Sr. Vasco Marques (PRD): — Sr. Ministro, no seguimento do que os Srs. Deputados do PS afirmaram, também ouvi a verba de 15 milhões de contos para as empresas públicas dos transportes, bem como a verba de 27 milhões de contos para as indemnizações compensatórias.

Sobre estes contratos-programa, cuja diferença entre a programação e o que está previsto para 1986 é de 8 milhões de contos, penso que, tanto na discussão que aqui tivemos, como na do Plenário, ou o Sr. Ministro não foi suficientemente explícito ou eu não o entendi suficientemente bem acerca deste assunto dos contratos--programa. Na verdade, parece haver mais empresas a receber essas indemnizações compensatórias, mas, ao mesmo tempo, há uma grande diminuição, que apenas foi justificada pela diminuição do preço do petróleo e das taxas de juro. Gostaria que o Sr. Ministro especificasse melhor esta situação.

Por outro lado, embora também pense que não será esta a sede própria, há um assunto, relacionado com a moralização, que gostaria de colocar aqui e que tem a ver com o imposto do selo. Trata-se do facto de os bilhetes para viagens de avião sofrerem um adicional de 11%, constituindo Portugal o único país da Europa que aplica essa taxa, ao contrário, por exemplo,, da Espanha, que antes de entrar para o Mercado Comum praticava uma taxa de 5°7o, a qual foi reduzida a zero quando entrou para o Mercado Comum. Isto significa, neste momento, que quem quiser ir a Espanha compra um bilhete de avião, partindo de Lisboa, mais barato 11 % e que quem quiser ir ao Brasil mete-se no carro, vai a Badajoz apanhar o avião e enche o depósito de gasolina, poupando dinheiro na gasolina e nos bilhetes das viagens.

No aspecto moralizante, e não só, o Governo é susceptível de receber todo este tipo de críticas e de sugestões. Estou convencido de que, neste aspecto, o Governo as aceita, muito embora veja a sua receita reduzida em qualquer coisa como 800 000 ou 900 000 contos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Ganopa.

O Sr. Carlos Ganopa (PRD): — Sr. Ministro, respondendo em Plenário a um pedido de esclarecimento que fiz sobre os transportes marítimos, o Sr. Ministro referiu a intenção de utilizar as verbas das instituições marítimas gerais no sentido de reestruturar a marinha mercante em articulação com os nossos estaleiros navais.

Dentro desta perspectiva e em função dos dados orçamentais que possuímos, nomeadamente das verbas que estão atribuídas para o reapetrechamento da frota da marinha de comércio nacional no PIDDAC, gostaria de saber quais são os objectivos a que essas verbas se destinam e como é que será a política governamental neste sector.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Ministro, tendo verificado que a metodologia do Sr. Presidente não foi seguida, vou apenas reforçar um pouco mais um problema já colocado pelo meu colega Vasco Marques, que tem a ver com uma questão fundamental para o PRD,

que é a dos contratos-programa, e com o nível dos montantes das indemnizações compensatórias e dos subsídios às empresas dos transportes e comunicações, designadamente às empresas transportadoras.

A primeira questão que gostaria de colocar ao Sr. Ministro é a seguinte: nas próprias Grandes Opções do Plano o Governo diz que vai fazer a revisão desses contratos-programa no momento que considerar oportuno.

A questão que se coloca é a de saber quando é que é oportuno fazer essa revisão. Além disso, sobretudo relativamente a alguns compromissos que o Governo tinha assumido em relação a algumas dessas empresas, designadamente aquelas que têm maiores custos de insularidade, como, por exemplo, a ANA, coloca-se também a questão de saber se o Governo está realmente a realizar os compromissos que efectivamente assumiu. Refiro, por exemplo, os casos da CP e da Carris, relativamente aos transportes gratuitos de algumas categorias sócio-profissionais. Cumpre saber, por um lado, se o Governo está a cumprir aquilo que havia assumido e, por outro, quando é que ele tenciona proceder à revisão desses contratos-programa.

Ainda nesta matéria, gostaria que o Sr. Ministro e a equipa do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações ajudassem claramente e com toda a transparência, se possível, esta Comissão no sentido de saber qual é o montante de indemnizações compensatórias que se afigura para este ano.

Faço notar que o Governo destinou a esse projecto 27 milhões de contos, mas sabemos que, segundo o que estava previsto nos contratos-programa para 1986, isso ascenderia a cerca de 36 milhões de contos, resultantes da soma dos 31,5 milhões de contos deste ano com os 5 milhões de contos que transitam de 1985 por não terem sido satisfeitos nessa altura.

É evidente que, como toda a gente sabe, esses contratos-programa tinham um cenário de evolução diferente em termos de evolução cambial, de custos das matérias-primas e da própria taxa de inflação, que era diferente — suponho que para 1986 estava prevista uma taxa de inflação de 19%, mas parece que vamos ter uma de 14% ou de 12 %, não se sabendo ainda bem.

Em todo o caso, há que fazer determinados ajustamentos, mas parece-nos — e julgo que não estamos sozinhos nesta matéria — que esse montante de 27 milhões de contos é claramente insuficiente.

Como esta questão é fundamental, gostaria que o Sr. Ministro comentasse estas nossas inquietações em relação a essa matéria.

Finalmente, e reportando-me ao discurso do Sr. Primeiro-Ministro na parte que se refere à eliminação do imposto de camionagem, pergunto ao Sr. Ministro se nos pode dar uma indicação da grandeza da receita fiscal que assim é perdida por essa via.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Seabra.

O Sr. José Seabra (PRD): — Sr. Ministro, quero colocar-lhe duas questões, para as quais agradeceria um esclarecimento.

A primeira questão é a seguinte: as verbas afectas ao FETT, que foi extinto recentemente, da ordem dos 11 milhões de contos, não aparecem aplicadas no sector dos transportes. Qual o destino desta verba?

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A segunda questão tem a ver com os transportes municipalizados. Só a título de exemplo, temos que, em cinco distritos, os transportes municipalizados apresentaram um défice de exploração da ordem dos 550 000 contos em 1985. Pensa o Sr. Ministro alterar as taxas regulamentadoras dos transportes urbanos no sentido de altenuar o défice, que é extraordinariamente elevado e que irá, com toda a certeza, dificultar os investimentos dos municípios em curso?

A última questão, que é de natureza técnica, é a seguinte: o montante das despesas com grandes reparações das vias de comunicação, que, como o Sr. Ministro sabe, se encontram num estado perfeitamente lastimável, é bastante substancial. Considera que, tecnicamente, as despesas de reparação deveriam ser consideradas como despesas de capital, ao contrário daquilo que vem no Orçamento para 1986?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, começaria pela questão das empresas públicas e por aquele problema que já aqui foi levantado e também debatido no Plenário e que novamente volto a levantar, exactamente porque continuamos a não ter os elementos necessários para o cálculo das necessidades efectivas das empresas públicas quanto às indemnizações compensatórias e, nomeadamente, partindo dos pressupostos do Sr. Ministro, ao cumprimento dos contratos-programa.

Naturalmente que esses elementos são fundamentais para que neste momento, num debate na especialidade, a Comissão possa estar habilitada a fazer uma apreciação da proposta que o Governo apresenta. Não consigo perceber como é que hoje podemos sair daqui e dar este debate por terminado se não forem fornecidos à Comissão os elementos necessários para apreciarmos o cálculo que o Governo fez quanto aos 27 milhões de contos de indemnizações compensatórias. Saber que taxa de inflação foi usada, que preços de combustíveis, que cálculo em relação aos encargos com o pessoal, tudo isso é fundamental para podermos ter uma ideia sobre os valores que o Governo apresenta.

De facto, no mapa que nos é fornecido pelo Ministério das Finanças relativo aos subsídios e às indemnizações compensatórias consta apenas uma grandeza global, que inclui não só as empresas públicas dos transportes mas também outras empresas. E isto ainda complica mais a análise que estamos aqui a fazer.

Sem serem fornecidos mais elementos sobre os contratos-programa e os cálculos que o Governo utilizou para chegar a este número, não podemos hoje ficar com a ideia clara das razões que determinaram esta verba de 27 milhões de contos, ou então teremos de concluir que o Governo apontou esta como poderia ter apontado outra qualquer.

Já aqui foi dito que só para os contratos-programa que estão em vigor, sem qualquer revisão, isso implicaria uma verba da ordem dos 36 milhões de contos. Só que isso não inclui sequer todas as empresas dos transportes e comunicações, pelo que, a cumprirem-se ps contratos-programa que estão em vigor, o valor global das indemnizações compensatórias deveria ser superior a 36 milhões de contos.

Então, qual a razão pela qual se apresentam apenas 27 milhões?

Ainda relativamente às empresas públicas de transportes e comunicações, há que ver o problema do investimento previsto. Também de acordo com os elementos que nos foram fornecidos e com aquilo que aqui foi ontem dito pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro, a proposta de investimento que é apresentada é apenas uma estimativa provisória. Segundo as palavras de ontem do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro, esta estimativa provisória estará sobreavaliada em 20%, ou seja, aquilo que o Governo virá a autorizar será um valor inferior em cerca de 20% àquele que está aqui estimado.

Assim sendo, gostaria que fosse dada uma informação, por parte do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, quanto ao investimento previsto, de facto, para as empresas públicas de transportes e comunicações, já que o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, repito, disse que esta estimativa provisória era a que as empresas pretendiam e não a que o Governo iria autorizar. Gostaria de saber se o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações tem já alguma ideia sobre isso e qual é, de facto, a verba que vai ser aprovada.

Naturalmente que isso se prende com o problema das dotações de capital, que são diminutas, muitíssimo baixas relativamente à proposta de investimento que foi apresentada pelas empresas, o que, aliado ao problema das indemnizações compensatórias por serviço público que essas empresas prestam e agravado com o facto de estas empresas estarem a suportar o IVA — numa situação que já ontem aqui foi destacada relativamente a uma empresa como a EDP —, leva a que a situação financeira e até económica destas empresas, digamos a sua exploração durante este ano, possa ser seriamente agravada e posta em causa.

Eu gostaria de saber o que é que o Sr. Ministro me poderá dizer quanto a esta questão.

Há um outro problema, também já aqui abordado mas que gostaria de aprofundar, que teria a ver com o Fundo Especial de Transportes Terrestres. Tinham sido pedidos, na reunião preparatória da Comissão de Equipamento Social e Ambiente, elementos sobre o que irá acontecer no que toca às responsabilidades que o FETT tem tido relativamente a investimentos de apoio a algumas autarquias e sobretudo relativamente ao problema dos transportes municipais em cinco autarquias. Esses elementos nunca chegaram a ser fornecidos e, como no Fundo Especial de Transportes Terrestres estão apenas incluídas as despesas e o investimento que está a ser feito durante estes quatro meses antes da transferência do FETT para o Orçamento de Estado, como é que irá ser resolvido este problema.

De acordo com elementos de que disponho, só para encaminhar as finanças dos transportes municipalizados urbanos dos cinco municípios — Aveiro, Barreiro, Braga, Coimbra e Portalegre — são necessários cerca de 1 740 0C0 contos. Entretanto, na Direcção-Geral de Transportes e na Direcção-Geral de Viação nada está inscrito que faça pressupor que estas verbas irão ser tidas em conta. Portanto, insisto, quero saber como vai ser resolvido este problema.

Outra questão que se me depara tem a ver com o problema do reapetrechamento da frota da marinha comercial nacional, para o qual há apenas prevista no

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Orçamento uma verba de 100 000 contos. O Sr. Ministro, no Plenário, teve ocasião de dar uma grande importância à acção que o Ministério se diz propor realizar e, como não há verba no Orçamento para tal, gostaria de saber como é que vai actuar.

O Sr. Ministro falou no problema das imposições marítimas gerais. Eu sei que no Orçamento está proposta uma autorização legislativa para o Governo vir a legislar nesta questão e, sinceramente, não percebo o alcance daquilo que se pretende. O Sr. Ministro deu a entender que isto iria dar uma grande receita no Estado, mas ela não está prevista no Orçamento de Estado, estando apenas previsto o pedido de autorização legislativa. E gostaria de saber em que sentido está esse pedido de autorização legislativa — embora, naturalmente, voltemos a esta questão no Plenário, pois é o seu lugar próprio de discussão — relacionado com o problema do reapetrechamento da frota de marinha comercial, ao qual, portanto, em termos de despesa, o Sr. Ministro disse que iriam ser afectadas as receitas das imposições marítimas gerais.

É neste sentido que eu levanto aqui o problema: para saber, em primeiro lugar, qual o sentido da autorização legislativa, em segundo lugar, que receitas é que irão, no entender do Sr. Ministro, ser arrecadadas durante 1986 e, por último, como vamos resolver esta questão no Orçamento, quer em termos de receitas quer em termos de despesas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Farei, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma breve intervenção, supondo que as três Secretarias de Estado deste Ministério vão ser analisadas, uma por uma, posteriormente, embora já tenha havido aqui uma série de questões comuns que, naturalmente, já foram abordadas na primeira resposta do Sr. Ministro.

No entanto, em relação aos primeiros pontos que o Sr. Ministro abordou e a esta referência que o Sr. Presidente fez, de análise dos seus primeiros pontos do Orçamento do seu Ministério, quero fazer uma observação e colocar duas questões.

A observação é a seguinte: o Sr. Ministro começou por salientar aquilo que eu chamaria, de uma forma eufemística, alterações orgânicas. Julgo que o Ministério de que V. Ex.a é, actualmente, titular foi um ministério altamente partilhado, que não resistiu, na sua permanência estrutural, ao longo consulado do ex--Secretário de Estado das Obras Públicas, pois essa ex--Secretaria de Estado das Obras Públicas, como se sabe, partilhou as várias Direcções-Gerais — estou a lembrar-me da DGERU, da DGRA e da Direcção-Geral de Saneamento Básico — por variados Ministérios e suas Secretarias de Estado, designadamente no Ministério do Plano e Administração do Território.

Se o Sr. Ministro considera isto apenas uma alteração orgânica, diria que é de menos em relação ao «talhar», designadamente, daquilo que era um dos ministérios de longa tradição administrativista portuguesa, de alguma forma filho longínquo do fontismo.

A primeira questão que quero colocar-lhe é exactamente a propósito dessa tradição administrativa de obras públicas. De entre os poucos organismos gerais que V. Ex.a herdou — entre aspas — fixa-se o Conse-

lho Superior de Obras Públicas e Transportes, alínea 06 da parte comum do seu Ministério, sem as secretarias de Estado. O Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes dava parecer sobre variadas obras, de grande monta, nos domínios hospitalar, escolar, do saneamento básico e dos recursos hídricos e aproveitamentos hidráulicos.

Sr. Ministro: com a partilha do espaço funcional da ex-Secretaria de Estado das Obras Públicas preserva--se essa tradição? De que forma, já que o Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes é tutelado pelo seu Ministério?

A segunda questão é a seguinte: o Sr. Ministro disse, e parece-me que bem, que uma das suas preocupações é a contenção das despesas correntes. Julgo que não há dúvida de que, qualquer que seja a nossa posição, a contenção das despesas correntes é uma disposição fundamental e perguntar-lhe-ia, quanto ao seu Gabinete — que, de alguma forma, verificadas as verbas, é um gabinete do Sr. Ministro e da ponte sobre o rio Douro, naturalmente por sequelas da passagem do Sr. Arquitecto Rosado Correia pelo Ministério — por que é que há uma componente, numa verba de 106 000 contos, de 47 000 contos de não especificados. O Sr. Ministro atribui 20 000 contos a não especificados em comissão de serviço — naturalmente se justificará, pois é uma pessoa que consegue dotações provisionais —, mas, por outro lado, há uma disposição de 27 000 contos para outra indicação, da qual gostava que me dissesse o porquê, neste momento.

Ater-me-ia, neste momento, a estas questões, seguindo a disciplina indicada pelo Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, dentro, também, da disciplina pretendo colocar uma questão muito concreta ao Sr. Ministro.

É a seguinte e incide sobre o Laboratório Nacional de Engenharia Civil: A Lei Orgânica do LNEC, no artigo 97.°, impõe que o Orçamento do Estado financie, pelo menos, 80% dos encargos com o pessoal dos quadros. A verba prevista no Orçamento não atinge esses 80%.

A questão concreta é, pois, a de saber o porquê do não cumprimento da lei. É uma lei que existe, não está revogada, o artigo e o decreto-lei em questão não foram revogados e, por conseguinte, há aqui uma questão de cumprimento da legalidade, para além do problema das necessidades concretas do LNEC.

E, já agora, relacionado com este problema do LNEC, chamo a atenção de V. Ex.a para o problema que se passa com o chamado — não sei qual será a designação técnica — ensaio das obras de arte, que não se está a verificar e designadamente a Junta Autónoma de Estradas e outros organismos dizem que não o fazem por falta de verba e, apenas para dar uma ideia daquilo que me parece ser a gravidade desta situação, quero chamar a atenção para aquela célebre ponte — salvo erro, da Figueira da Foz — que teve uns desequilíbrios pouco tempo depois de acabar de ser construída porque não foi cumprida a lei do ensaio da obra de arte.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

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O Sr. Próspero Luís (PSD): — Pedi a palavra por que a ordem de trabalhos foi um pouco torpedeada e gostaria de fazer duas ou três perguntas ao Sr. Ministro relacionadas com algumas das perguntas já feitas.

Falou-se no problema que a introdução do IVA nos transportes poderia ocasionar e eu perguntaria ao Sr. Ministro se a anulação do imposto do selo, que fazia parte do bilhete e que se deu com o IVA, terá maior ou menor peso do que o próprio IVA. Efectivamente, penso que a realidade tem de ser vista como um todo e não apenas num dos aspectos parcelares da degradação da exploração das empresas.

Outro aspecto em que se falou foi nas indemnizações compensatórias e gostaria de saber, já agora, se as recentes baixas das taxas de juro não influíram, de algum modo, na redução das indemnizações compensatórias. Isto, na medida em que as indemnizações compensatórias se destinam, como o próprio nome indica, a compensar a prestação de um serviço a preço mais baixo que o de custo e a redução dos factores de custo, obviamente, deve reduzir a compensação que é dada.

No que respeita aos investimentos — e este tem sido um aspecto muito versado nas várias reuniões — gostaria de saber se, efectivamente, o plano de investimentos do sector empresarial do Estado, no que respeita especificamente às empresas incluídas neste Ministério, corresponde a projectos de investimento devidamente apresentados, com estudos de rendibilidade, com análises de custos e benefícios, ou se, efectivamente, continuam a ser, como eram até há alguns anos, um arrolamento de projectos, onde desde obras de refeitórios para conselhos de administração se fazem.

E uma vez que se falou nos contratos-programa, gostaria também de saber qual é a opinião do Ministério quanto à constituição de empresas — não sei que designação lhes devo dar — 100% possuídas por empresas públicas, que servem para que certos investimentos, que deveriam passar e ser controlados pelo Ministério através do PISEE, possam ser feitos perfeitamente à revelia do próprio Ministério — caso específico é o de uma empresa constituída o ano passado, chamada Air Atlantis, e a compra de um prédio na Avenida dos Estados Unidos da América.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Há pouco levantou--se a questão do imposto de camionagem e eu gostaria, se o Sr. Presidente me permite, de fazer um pequeno aditamento a essa questão.

É o seguinte: vários transportadores têm colocado, nomeadamente ao Grupo Parlamentar do PS, mas penso que também a outros, a questão da abolição do imposto" de camionagem e da sua relação com o IVA. Consideram os transportadores que, com a entrada em vigor do IVA, o imposto de camionagem deveria ter cessado no dia 1 de Janeiro.

É uma posição que eu peço que o Sr. Ministro comente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Presidente, desejo apenas perguntar por que razão é que está prevista uma operação activa de tesouraria em 1986 com o ex-Funde de Fomento de Habitação e por que razão é que tem de ser uma operação activa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.3 Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, já agora que o Sr. Deputado João Cravinho levantou esta questão e que o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro está cá — há pouco, quando comecei a minha intervenção, não estava —, solicito que também seja dado um esclarecimento sobre por que é que é prevista uma operação de tesouraria com o Fundo Especial dos Transportes Terrestres, que vai ser extinto e, portanto, integrado no Orçamento de Estado. Aliás, nós temos o montante da dívida do FETT e talvez o Sr. Secretário de Estado nos pudesse dar alguma explicação sobre a forma como vai ser tratada esta questão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro, para responder.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Eu tenho, de facto, anotações de um enorme roí de questões, mas algumas delas são comuns a vários Srs. Deputados e, portanto, começaria, agrupando-as e pedia para me interromperem se verificarem que não estou a respondei directamente às questões.

Quanto aos contratos-programa, às indemnizações compensatórias e às dotações de capital para o sector empresarial do Estado, problema de fundo, levantado pelos Srs. Deputados João Cravinho, Raul Junqueiro, Vasco Marques, Ivo Pinho e Ilda Figueiredo, direi o seguinte: relativamente aos contratos-programa e sem me querer repetir, esclareço a Comissão de que, em primeiro lugar, encontrei no Ministério oito contratos--programa. A primeira pergunta que me ocorreu foi a de saber porquê oito e não quinze. Por que é que se celebraram oito contratos-programa e, com eles associados, oito contratos de gestão e não se celebraram contratos-programa para todas as empresas públicas do sector.

Bom, concluí que o Governo anterior iniciou uma prática que me pareceu correcta, que foi a prática dos contratos-programa — há muito tempo que, em Portugal, muita gente, dos vários quadrantes políticos e ideológicos, desejava que o sector público fosse governado com base em contratos-programa —, e para a qual se deram passos fundamentais. Por isso, deduzi que o anterior Governo deu esses passos relativamente a um certo número de empresas e que, se tivesse tido tempo, com certeza que abrangeria as outras empresas que ficaram para trás.

Seja como for é um estrato limitado do sector empresarial dos transportes e comunicações que, neste momento, tem contratos-programa e que a meu ver não deve ser tratado de forma dissemelhante do restante. Por que é que há contratos-programa na Carris e não há nos CTT, por exemplo? E poderia repetir o raciocínio em outros casos.

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Portanto, contratos-programa sim, iremos fazê-los, mas, atenção, só um estrato limitado de empresas é que é abrangido. E não deve, de forma nenhuma, o facto de um certo número de empresas ter contratos--programa deformar a política que o Estado deve seguir relativamente ao sector empresarial dos transportes e comunicações.

Em segundo lugar, esses contratos-programa traduzem uma política que o governo anterior desejava seguir nessas áreas e, se me perguntarem nesta Comissão e, claro, relativamente a estes meses que estou no Governo, se a política deste governo é substancialmente diferente, direi apenas que haverá uma tónica maior em tudo o que se refira à produtividade das empresas públicas, porque consideramos que. nesses contratos--programa os objectivos de produtividade não têm a relevância e a profundidade que nós entendemos que deviam ter.

Em Portugal defrontamo-nos com problemas de produção, isso é um facto, mas mais do que problemas de produção defrontamo-nos com problemas de produtividade. E, no sector público, pese embora as análises de gente muito respeitável — e que prezo — a demonstrar que no sector público ainda se conseguem índices de produtividade bastante favoráveis, ainda é preciso fazer um esforço maior, dentro do sector público, nessa área.

Em terceiro lugar, estes oito contratos-programa abrangem o universo limitado do Ministério a que presido e têm por trás de si um conjunto de variáveis macroeconómicas, que já referi que estão, a meu ver, ultrapassadas. Desde a previsão de crescimento do produto, passando pela taxa de inflação, pela taxa de juro, pelo crescimento dos salários reais, pelo preço do combustível, etc., etc., estão, essas bases, ultrapassadas. É evidente que quando o novo governo começou a definir os seus objectivos em termos de política económica global, nós começámos a ter elementos para, a partir daí, propor uma alternativa às projecções que tínhamos nesses oito contratos-programa.

Mas, como esta Comissão sabe, este governo tem actuado de uma forma contínua, com objectivos bem definidos, fazendo modificações profundas em certos factores que determinam a situação económica do País e ainda não se deteve nesse aspecto. A prova disso é que, ainda no último Plenário, nós verificámos que a intenção do Governo, se o Orçamento for aprovado, é no sentido de continuar a modificar certos parâmetros fundamentais.

É evidente que isto é uma realidade, todos o sabemos; podemo-la criticar, mas não deixa de ser uma realidade, e quem analisar as projecções feitas — e não estão em causa as pessoas que fizeram essas projecções — em Setembro do ano passado tem de se interrogar se tudo aquilo que está feito deve ser refeito.

Pedimos, efectivamente, às administrações de todas as empresas públicas — e não só às das oito empresas abrangidas — tuteladas pelo Ministério que, em Dezembro — estão aqui os Srs. Secretários de Estado, que confirmarão a data, mas creio que foi em Dezembro —, nos começassem a refazer esse quadro de projecções, justamente porque tínhamos o problema do Orçamento do Estado para apresentar e toda a gente compreende que assim deva ser.

Simplesmente, não ficámos satisfeitos com a forma como essas projecções foram refeitas. Sabíamos que alguma coisa ainda teria que ser «mexida», sabíamos,

desde logo, por exemplo, que nos parecia que as projecções derivadas do crescimento do produto, seja para os serviços telefónicos, seja para os serviços de transportes de passageiros, de mercadorias, etc., que estão de certa maneira correlacionadas com o produto — existem correlações bem estabelecidas de há longa data nessa matéria —, não estavam a ser tratadas convenientemente.

Por isso, no momento em que estou sentado nesta mesa a discutir este problema, o que tenho são novas projecções, mas com a correcção qúe entendo que me devem merecer as pessoas que constituem um Parlamento que deve controlar e apreciar os nossos actos; tenho o dever de dizer que essas projecções que reconduziram aos «27+ 15» me pareceram razoáveis mas que não excluo, de forma nenhuma, que possam ser corrigidas. Tenho que dizer isto desta maneira: pareceram--me razoáveis. Se alguém me perguntar se as inscrevo no Orçamento ou não, eu digo que sim, mas com a convicção de que se trata de uma área onde não estão apuradas em definitivo certas consequências das varian-ções macroeconómicas.

Julgo que não posso ser mais claro neste assunto; julgo que tenho à volta desta mesa pessoas que compreendem perfeitamente, independentemente da posição política que entendem adoptar, que muitas vezes defrontamos problemas deste tipo e peço que compreendam que dentro do sector público empresarial, como aliás no privado, devem rever-se cálculos porque as taxas de juro baixaram, porque o Governo diz que vai baixar a inflação, porque, se calhar, as taxas de juro voltam a baixar e, portanto, todas as projecções que se têm feito dentro de expectativas razoáveis estão a ser revistas a todo o momento. Para além disto, se perguntarem o que é que «ponho» no Orçamento, respondo que estão lá «27 + 15». É o provisório, é aquilo que é razoável admitir neste momento relativamente a contratos-programa, indemnizações compensatórias e dotações de capital.

Não sei se algum dos Srs. Deputados que abordou este problema quer mais algum esclarecimento. Se sim, estou à disposição.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, permite-me que o interrompa?

O Orador: — Faça favor.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, queria solicitar-lhe que fossem fornecidas a esta Comissão tanto as projecções feitas em Setembro como as feitas em Dezembro, relativamente a todas estas empresas, na medida em que, certamente, isso habilitaria a Comissão a uma análise mais aprofundada deste problema. Aliás, temos vindo a pedir esses elementos insistentemente ao Sr. Ministro.

O Orador: — Só queria dizer à Sr." Deputada lida Figueiredo que, relativamente às projecções feitas em Outubro, a Comissão já as tem, visto que joga com esses números. Com efeito, várias vezes a Comissão tem dito, por exemplo, que agora estes 42 não se comparam com os 45 que constavam dos contratos--programa. Logo, a Comissão conhece, com certeza, os contratos-programa.

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A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, eventualmente, alguns elementos desta Comissão poderão ter esses dados, que obtiveram da forma que entenderam. Mas vindos do seu Ministério não os temos, porque o Sr. Ministro não os mandou.

O Orador: — Certo.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Presidente, dá-me licença que use da palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro?

0;Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra.

O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Ministro, relativamente a esta questão que V. Ex.a suscitou, devo dizer--lhe que, em termos de raciocínio, a maneira como expôs o problema é perfeitamente razoável. Porém, em termos de conclusão — e perdoe-me a expressão —, o mesmo não se pode dizer sobre a maneira como abordou esse mesmo problema.

Sei que os factores têm variado, uns para mais e outros para menos, e deste próprio Orçamento resultarão factores que aliviarão algumas das empresas de transportes, nomeadamente a decisão que resultará real-tivamente ao gasóleo. Estou convencido de que esta Assembleia vai votar medidas por sua iniciativa que vão baixar o preço do gasóleo e daí resultará um alívio para as empreas do sector, o que determinará um raciocínio positivo no sentido da defesa destes valores.

Simplesmente, há outros factores negativos e entre eles alguns variaram muito recentemente. Em função disso, pergunto ao Sr. Ministro se o ententendimento que posso tirar das suas palavras é o de que, sendo os 27 milhões e os 15 milhões valores plausíveis na óptica da revisão de Dezembro, também admite, exactamente no mesmo contexto de raciocínio, que eles possam ser um bocado mais elevados — e não vou agora estar a avançar qualquer número. Quer dizer, em minha opinião, o raciocínio vale exactamente para ambas as coisas, porque, tal como o Sr. Ministro o pôs, o problema é um mero problema de lógica previsional no incerto e, portanto, exactamente as mesmas palavras que proferiu poderiam ser aplicadas em defesa de uma majoração. Em entendimento contrário, isto é, se o Sr. Ministro me dissesse que não, então eu tirava desde já a conclusão de que aquilo que o Sr. Ministro disse não era um quadro provável dentro do razoável mas sim uma defesa fechada e cerrada dos 27 milhões, o que não me pareceu ser o caso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado João Cravinho, as minhas palavras não podem ser aplicadas na defesa de uma majoração porque o Sr. Deputado, como observador muito atento e escrupuloso que é em relação ao que se passa em matéria de política económica governamental, sabe perfeitamente — e diria mesmo tão bem como eu — que estão a ser postas em vigor uma série de medidas conducentes à diminuição dos custos de produção das empresas públicas e privadas. O Ministro das Finanças já tocou várias vezes nesse ponto e,

de facto, verifica-se, através de todas as decisões tomadas por este Governo, que, para além de quaisquer políticas de regulação económica pelo lado da procura, este Governo ataca certos problemas pelo lado da produção e dos custos de produção, estando a ser tomadas medidas muito concretas nesta área que vão permitir uma diminuição dos custos de produção das empresas públicas e privadas.

Portanto, quando sustento aqui uma razoabilidade destes números para o sector público, é para efeitos orçamentais. Agora, se o Sr. Deputado me perguntar se estou perfeitamente seguro disso, respondo-lhe que não. Se me fizer a pergunta concreta se não admito que isso possa ser um bocadinho superior, se calhar, por defesa própria, dir-lhe-ia que sim. Mas a verdade é que esses números me parecem razoáveis para efeitos orçamentais, isto é, se tivesse que fazer o orçamento global do Estado, poria esses números.

O Sr. João Cravinho (PS): — Importa-se que faça uma precisão?

O Orador: — Faça favor.

O Sr. João Cravinho (PS): — O Sr. Ministro pode garantir à Comissão de Economia, Finanças e Plano que os montantes previstos, nomeadamente para a CP, dão integral cumprimento os Decretos-Leis n.os 361/85 e 387/85?

O Orador: — Sr. Deputado João Cravinho, per alguma razão a Comissão tem neste momento os mapas onde está a verba global, mas não está distribuída por empresas. Uma das razões por que não está distribuída por empresas é porque estamos a fazer essas contas que o Sr. Deputado. ..

O Sr. João Cravinho (PS): — Nós já as fizemos, Sr. Ministro.

O Orador: — Com certeza.

Vou agora passar a abordar outro tipo de problemas que dizem respeito ainda a esta área. De resto, o Sr. Deputado Raul Junqueiro levantou igualmente um problema muito concreto que, no fundo, também está metido no meio disto. Estou a falar do problema das repercussões do IVA.

Sei que o Sr. Deputado Raul Junqueiro está preocupado com as repercussões do IVA num sector que ele conhece muitíssimo bem, que é o sector das comunicações. Já falou disto no Parlamento e no outro dia também me dirigiu uma questão em Plenário, a qual, naquele abreviar da minha intervenção, por puro esquecimento acabei por não esclarecer — isto na medida em que o posso esclarecer.

Efectivamente, o IVA entrou em vigor no passado dia 1 de Janeiro e o Governo resolveu considerar que, na quase totalidade do sector dos transportes e no sector das comunicações, o IVA, como se diz em ligua-gem corrente, devia «estar por dentro». Fizemos aquele retoque de preços de 14% em Novembro/Dezembro e dissemos às empresas: «aguentem-se com o IVA». Obviamente que, ao dizer isto tínhamos estudos que (faço questão em dizê-lo) vinham do governo anterior — e quando digo que vinham do governo anterior significa que o governo anterior tinha provocado a ela-

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boração desses estudos —, através dos quais verificámos que, no sector dos transportes e até no das comunicações, as influências do IVA iriam ser muito limitadas. Isso levou-nos, com a base que tínhamos, a proceder desta maneira.

Estou convencido de que fizemos bem. E digo isto porque julgo ser conveniente que nas empresas — e agora falo nas de comunicações, que dispõem de um certo grau de monopólio, para não dizer mesmo que dispõem do monopólio — haja de vez em quando um aperto sobre os custos.

O Sr. Deputado Raul Junqueiro pertence a uma dessas empresas, por onde também passei durante algum tempo. Portanto, estamos a falar de coisas que até conhecemos (não são meras especulações) e sabemos que, por vezes, as realidades do mundo exterior devem forçar estas empresas, que têm o seu grau de monopólio, a aperfeiçoar e racionalizar os seus custos de produção.

Estou convencido, pelos dados que tenho, de que, descontado o imposto que havia sobre as chamadas telefónicas, que desapareceu, e o imposto de transacções, e mesmo não entrando em linha de conta com os outros factores de variação económica que referi há pouco — taxas de juro, taxas de inflação, etc. —, a haver agravamento com a cobrança do IVA de 8 % no sector das comunicações, esse agravamento acaba por ser muito pequeno e as empresas vão encaixá-lo. Isto para o sector telefónico, porque, se a memória não me falha, o IVA não se aplica ao sector postal e, portanto, parte da produção dos CTT não está sujeita ao IVA.

Mas nesta matéria vou socorrer-me de alguns dos Srs. Secretários de Estado que tenho aqui ao meu lado, uma vez que eles têm estado — e é, bom que a Comissão o saiba — em reuniões sucessivas com as empresas públicas do Ministério para reordenar todo este esquema de previsões para o ano de 1986, introduzindo, analisando em pormenor e discutindo, face às políticas que queremos praticar, como é que os seus instrumentos previsionais de gestão se devem compor. Têm--no feito com grande pormenor e empresa por empresa. Sei que ainda não chegaram ao fim, mas já passaram pelos CTT e TLP e, portanto, poderão acrescentar alguma coisa ao que estou a dizer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações (Gonçalo Sequeira Braga): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, como o Sr. Ministro disse, o IVA tem algum impacte nos custos de exploração quer dos CTT quer dos TLP. No entanto, em termos globais, ele é perfeitamente absorvido quer pela melhoria da eficiência das empresas quer por um facto muito importante que é o de esperarmos que, em 1986, devido à política económica do Governo, haja no domínio das comunicações — e, aliás, isso já se verificou em 1985 — uma significativa retoma da actividade, ou seja, a confirmação de um fenómeno que já se tinha desencadeado em meados de 1985, ainda numa conjuntura depressiva, e que em 1986 irá acentuar-se tanto ao nível da procura de equipamento como ao nível da procura de comunicações. Como disse, isto permite absorver o agravamento que o IVA pode implicar sem prejudicar a capacidade de autofinanciamento das empresas para os volumosos programas de investimento que elas têm de continuar a desenvolver.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Em primeiro lugar, quero agradecer ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado os esclarecimentos que prestaram.

Gostaria apenas de colocar uma questão, que é esta: admite-se que haja um impacte negativo mas, por dois argumentos fundamentais — melhoria da eficiência, portanto ganhos de produtividade, e retoma de actividade —, pensa-se que as empresas conseguirão anular esse impacte negativo. De qualquer forma, haverá ou não algum impacte no investimento previsto e no orçamento de investigação e desenvolvimento (ID) das empresas?

Penso que esta pergunta é importante, dado o profundo impacte, sobretudo a montante, na indústria e também nas actividades de investigação e desenvolvimento que são postas em prática por inúmeros centros de investigação que têm ligações com os CTT e com os TLP.

A precisão que gostaria de pedir era no sentido de saber se o investimento aumenta ou não relativamente ao ano passado e se, de facto, há qualquer impacte negativo nessas verbas destinadas a investigação e desenvolvimento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Raul Junqueiro, de facto, não podemos dizer que o IVA tem um impacte directo, ou indirecto, ou negativo, quer no plano de investimentos das duas empresas, quer no orçamento de ID. Porquê? Porque nós esperamos que, em 1986, o plano de investimentos dos CTT continue a crescer em termos reais. Haverá uma estabilização do plano de investimentos dos TLP mas por outras razões, ligadas à procura e não a problemas de investimento.

Existem limites naturais às capacidades de investimento das empresas, que são mais visíveis nos CTT, pelo que também não podemos forçar demasiado a nossa capacidade de investimento.

Portanto, sob esse ponto de vista, pensamos que o IVA não vai afectar os planos de investimentos.

Já agora, também posso dar um esclarecimento ao Sr. Deputado sobre um ponto que já foi focado e que tem a ver com os investimentos de substituição que há necessidade de fazer nos Açores devido aos temporais e que estão contemplados no plano de investimentos dos CTT.

O problema do programa de investimentos em investigação e desenvolvimento é uma preocupação deste Governo, constando do seu programa de acção. Neste momento a nossa preocupação é a de manter e se possível reforçar o nível percentual dos recursos que são afectados à investigação e desenvolvimento (o que estava era 0,85). Mas tal não significa que, em termos reais, não vá haver acréscimo de recursos. E isto por uma simples razão: é que as receitas vão ter um acréscimo significativo e, portanto, mantendo percentualmente o mesmo volume de recursos que afectamos à investigação e desenvolvimento, vamos ter um acréscimo de 50% dos recursos que afectamos a esta área.

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Estamos neste momento a examinar um problema que tem a ver com a possibilidade de, para além dos projectos que estão em curso — importa, portanto, ver qual é a dimensão dos encargos já assumidos —, podermos também financiar novos projectos. Mas isto com uma certa preocupação selectiva de fazer investimentos de acordo com as perspectivas de desenvolvimento tecnológico que as empresas operadoras estão a comandar nesta fase.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Ainda relativamente à intervenção do Sr. Deputado Raul Junqueiro, gostaria de abordar um problema que levantou e que também se insere na pergunta do Sr. Deputado Ivo Pinho. Trata-se da questão de saber o que é isso do imposto de camionagem, que receitas é que se perdem e se não deveria ter já cessado desde 1 de Janeiro.

O imposto de camionagem representa hoje uma receita da ordem dos 2 milhões de contos. É um imposto que tem crescido muito pouco e que, como sabem, incide sobre empresas de transporte público rodoviário, de passageiros e de mercadorias, isto é, empresas que fazem transportes por conta de outrem.

Sobre isto há duas teses, uma das quais diz que a natureza deste imposto, a sua origem, a forma como nasceu e as finalidades que prossegue são exactamente as mesmas do imposto ferroviário, pelo que, se o imposto ferroviário foi abolido, por analogia deveria ser abolido também o imposto de camionagem. Porém, há outra tese que sustenta o contrário, isto é, que, desde a forma como o imposto de camionagem é calculado, às variações que tem, se houve uma analogia inicial com o outro imposto, essa analogia desvirtuou--se ao longo do tempo.

Esta era uma questão que se discutia, mas que foi rematada — e a meu ver muito bem — pelo Sr. Primeiro-Ministro quando disse ao Parlamento que se este Orçamento fosse aprovado o imposto de camionagem seria abolido.

Portanto, quanto à questão do quantitativo, ele é de 2 milhões de contos e, quanto ao problema, presumo que ele será resolvido, porque estou convencido de que o Parlamento vai aprovar este Orçamento naquilo que ele tem de essencial.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça favor.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, queria só fazer-lhe um pequeno reparo: é que quem pode criar ou abolir impostos é exclusivamente a Assembleia da República.

O Orador: — Com certeza.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — E certamente que é a Assembleia que tem de analisar essa questão e não o Sr. Primeiro-Ministro.

O Orador: — Com certeza.

Agora passaria a outro problema muito importante que foi levantado pelo Sr. Deputado Vasco Marques, que é o do imposto do selo nas viagens de avião. De resto, este problema já tinha sido levantado no Plenário pelo Sr. Deputado Carlos Ganopa, a quem na altura não dei resposta. Mas a resposta que lhe dou agora é que ele está a ser examinado. Gostaria de ter podido trazer-lhe hoje uma resposta definitiva, mas espero poder dar-lha rapidamente.

O Sr. Vasco Marques (PRD): — A resposta é amanhã?

O Orador: — Bom, não sei a que horas é que saio daqui hoje...

Risos.

Passemos agora ao problema da marinha mercante, de novo focado pelo Sr. Deputado Carlos Ganopa e também pela Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

Na proposta de lei do Orçamento do Estado está prevista a revisão das imposições marítimas gerais e diz--se lá, se a memória não me falha, que o Governo pretende rever as taxas por forma a obter uma receita igual a «qualquer coisa», em termos reais, do ano de 1982. Feitas as contas, isso dá cerca de 1 800 000 contos a 2 milhões de contos. Portanto, em matéria de receitas, o peso que isso tem sobre as mercadorias movimentadas nos portos é desprezível — em termos percentuais, é «zero vírgula, zero, zero, qualquer coisa».

De facto, no PIDDAC e na parte relativa à Direcção--Geral da Marinha e do Comércio, está orçada uma verba de 100 000 contos, que, se quiser, pode tomar como um envelope financeiro. Digamos que é uma verba de referência. Se me perguntar por que é que está lá 100 000 e não está 50 000 ou 150 000, não lhe sei responder. Estão 100 000 porque essa dotação significa apenas o começo de uma afectação de verbas, que em devido tempo há-de ser feita no sentido de financiar o desenvolvimento da nossa marinha mercante através de encomendas feitas a estaleiros nacionais.

Este ponto é muito importante porque todos os incentivos aos nossos armadores devem ser-lhes dados no sentido de eles conjugarem o reapetrechamento das suas frotas com o funcionamento dos nossos estaleiros navais. Se quiserem comprar barcos em segunda mão no mercado de ocasião, como já tive oportunidade de dizer, é tentador — aparecem por essa Europa fora barcos a ser vendidos por dez réis de mel coado — e a marinha mercante também não pode pôr aí um biombo e ignorar isso como se não existisse. Para isso, os empresários, públicos ou privados, da marinha mercante têm que raciocinar em termos meramente comerciais. Agora o que temos de fazer é estimular as encomendas da marinha mercante aos nossos estaleiros.

Sabemos que há aqui um problema porque todos os empresários tentam demonstrar que os nossos estaleiros trabalham mais caro que os estaleiros estrangeiros. Sou das pessoas que não entende isso. Sendo uma indústria que em Portugal tem uma tradição muito grande e que até tem exemplos de competitividade, como o caso do Estaleiro Naval de Viana do Castelo, que é hoje competitivo em termos internacionais, não entendo bem por que é que nós não havemos de conseguir que estaleiros como o da SETENAVE ou o da LISNAVE não sejam competitivos no plano internacional. Se toda a gente fizer um esforço no sentido de

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obter esse resultado, estou convencido de que ele estará ao nosso alcance. Temos características para isso. Há--de haver aqui qualquer artificialismo a evitar que isto se alcance.

Seja como for, a realidade é esta: quando se pede a cotação do fabrico, seja de partes inteiras, cascos, seja de partes de navios, aos estaleiros nacionais, sobretudo à LISNAVE e à SETENAVE, ficamos surpreendidos com os números que nos dão, com agravamentos de preços relativamente a mercados estrangeiros. Fato sobretudo da SETENAVE. Acho que temos que resolver este problema, e quando digo «temos» penso que não é só o Governo mas também a administração das empresas e o pessoal que nelas trabalha que têm que encontrar uma fórmula que nos permita ser a esse nível competitivos em termos internacionais. Sei que não é tarefa fácil, pois por toda a Europa os estaleiros navais estão a passar um mau momento. Isso é um facto e estas coisas não acontecem por acaso. De qualquer modo, acho que devemos fazer um esforço no sentido de recuperar uma certa competitividade.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Posso interrompê--lo, Sr. Ministro?

O Orador: — Com certeza.

A Sr.3 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, naturalmente que defendo — e ainda há poucos dias tive ocasião de dizê-lo no Plenário — que se faça um reapetrechamento da frota, não só da marinha mercante nacional como também da pesqueira, nos nossos estaleiros nacionais. Aliás, repare-se que pagamos de fretes ao estrangeiro mais de 60 milhões de contos por ano, divisas essas que poderíamos poupar tendo nós uma boa marinha de comércio nacional e dando trabalho aos nossos estaleiros. Naturalmente que não sou eu quem põe isso em causa, antes pelo contrário. Assim houvesse respostas no Orçamento a esta questão. Mas como o Sr. Ministro bem sabe, não há.

O Orador: — Há.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Não há. Há a tal

verba simbólica dos 100 000 contos e mais nada.

Mas a questão que lhe queria pôr era a seguinte: o Sr. Ministro falou nas imposições marítimas que iriam render cerca de 2 milhões de contos. Por outro lado, há no Orçamento o pedido de autorização legislativa. Pergunto: é para entrar em vigor ainda este ano? A receita de 2 milhões de contos é o que prevê arrecadar ainda este ano?

O Orador: — Em doze meses. Portanto, se o Orçamento vigorar oito meses, é de oito a doze meses.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Então prevê arrecadar cerca de 1 milhão de contos, não é verdade?

O Orador: — Sim, à volta de 1 200 000 contos.

A Sr.a Dda Figueiredo (PCP): — Portanto, há necessidade de ver este problema desta inscrição orçamental.

Mas, para além deste, há ainda outro problema, que ê o seguinte: se, como diz o Sr. Ministro, há a ideia de afectar essa receita de 1 milhão de contos — embora, naturalmente, não haja aqui uma consignação das

receitas — à marinha mercante nacional, então por que não se faz a inscrição dessa verba e não se inicia esse programa, com uma verba modesta, de 1 milhão de contos, mas que sempre é melhor do que os 100 000 contos que lá estão?

O Orador: — Sr.a Deputada, lembre-se que ainda há pouco me chamou a atenção de que fixar ou isentar impostos é uma decisão do Parlamento... Repare que sustentei que no Orçamento devia haver uma verba de referência para se dar o sinal de que se ia começar a actuar. Assim, sem desequilibrar muito o Orçamento, inscrevi a verba de 100 000 contos e sugeri ao Ministério das Finanças a inclusão na proposta orçamental de uma disposição no sentido de se rever as imposições marítimas gerais. Mas não faço ideia de qual vai ser o resultado da apreciação do Parlamento. Imagine que o Parlamento nos diz: «não há revisão das imposições marítimas gerais». Naturalmente que não podia ter o Orçamento tão dependente como isso.

Se aprovarem aquilo que lá está, obviamente que o Estado vai ter recursos que o Ministério das Finanças não deixará de, em devido tempo e na medida do necessário, afectar a esse plano, que, aliás, também passa por outras coisas. Não basta haver os recursos, é preciso que haja os planos de aquisição da frota, é preciso que os planos se justifiquem. Enfim, há uma série de peças a considerar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Ganopa.

O Sr. Carlos Ganopa (PRD): — Sr. Ministro, tive já ocasião de o felicitar no Plenário pelo facto de V. Ex.a ter referido que a política do Governo seria a de utilizar as imposições marítimas gerais para a reestruturação da nossa frota marítima. Queria lembrar-lhe que esse caminho já tinha sido, pelo menos, citado nalguns estudos, especialmente naqueles que se destinavam à viabilização e inovação da marinha mercante. Com efeito, foram já feitos vários estudos, que tive o cuidado de os ler e apreciar no seu conteúdo, ou seja, tive o cuidado de analisar toda a política que está na base das imposições marítimas gerais e as verbas que aí estão incluídas.

Verifiquei que nos últimos estudos se imputava uma verba de 5,5 milhões de contos para as imposições marítimas gerais, havendo um acréscimo nas taxas, através de um factor, de 5,77, o que implicava uma repercussão dos preços de alguns produtos no consumidor — o que mais se verificava no caso do açúcar e da energia eléctrica.

Verifiquei depois que havia um estudo posterior, em que se atribuía às imposições marítimas gerais uma verba de 7 milhões de contos. Portanto, começou-se por atribuir apenas 5,5 milhões de contos e o Governo apresentou num último estudo um pacote legislativo para a marinha mercante em que se pensou adoptar uma receita de 7 milhões de contos, tendo o custo sobre o consumo, especialmente do açúcar e da energia eléctrica.

Um peso aproximado de \%. Portanto, as taxas sobre os produtos não se iriam repercutir muito no consumidor. Esta era, pois, a conclusão desses estudos.

O Sr. Ministro diz que se pensa obter uma verba de 2 milhões de contos actualizando as imposições marítimas gerais ao nível real de 1982. Ora, quando oiço

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isto, penso logo o seguinte: por que não relativamente a 1986? Porquê 1982? O ano de 1982, segundo parece, foi aquele em que se actualizou, pela última vez, as imposições marítimas gerais.

Quando continuei a minha leitura também achei estranho ver o chamado «imposto de ancoragem». Comecei por me interrogar sobre o seguinte: nas imposições marítimas gerais conheço o imposto de moagem e o imposto de comércio marítimo. Será que o imposto de ancoragem é um imposto de estacionamento no porto?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Ganopa (PRD): — Se faz favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado, o imposto de ancoragem é uma destas coisas anquilosadas que existe nos portos — como, por exemplo, no porto de Leixões — e que data de 1911, 1912 ou 1913. É um imposto que reveste carácter de direito aduaneiro e que, face à adesão ao Mercado Comum, não pode subsistir.

O Sr. Carlos Ganopa (PRD): — Sr. Ministro, se não estou em erro, foi o Decreto-Lei n.° 1028, de 1920, que criou esse tipo de imposto.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sim, por aí.

O Sr. Carlos Ganopa (PRD): — É um decreto-lei muito antigo.

Como estava a dizer, felicitei o Sr. Ministro pela adopção de uma tal política precisamente porque também penso que é através das receitas do sector que poderemos reestruturar a marinha mercante.

Estranhei também aquela verba de 100 000 contos para o reapetrechamento da frota da marinha do comércio. É que pensei que o Governo fosse iniciar a reestruturação e o reapetrechamento da marinha do comércio com uma pequena verba. Por que é que vamos esperar mais? Penso que já se esperou muito tempo e que se fizeram e estudaram planos a mais. Creio que chegou a altura de começarmos a arrancar, porque em 1990 vamos abrir o sector a uma competitividade livre dentro da Comunidade e, por enquanto, a nossa marinha mercante dispõe apenas de 72 navios e tem uma série de navios fretados, muitos deles com uma idade já bastante avançada, da ordem dos 20 anos. Por outro lado, penso que os armadores e os estaleiros têm um futuro incerto, pois não sabem quando é que vai arrancar esta tal reestruturação plena da marinha mercante. Não podemos também esquecer que todas as entidades ligadas ao sector estão à espera que se faça qualquer coisa, já que não é possível aguardar mais tempo.

Creio que essa intenção dos 100 000 contos é positiva, mas não passa de uma «boa intenção». Penso que chegou a altura de passar às boas acções, sendo necessário que, para este sector e para este programa, seja avançada uma verba suficiente e que poderia ser idêntica àquela que o Sr. Ministro referiu para as imposições marítimas gerais. Porém, se tivéssemos uma verba

de 5 milhões ou 7 milhões de contos seria muito melhor, já que, ao analisarmos os estudos e os planos feitos pelos governos anteriores, verificamos que começávamos com 56 navios mas que depois passávamos a ter apenas 51 navios.

Tive o cuidado de verificar que no último plano de investimento e financiamento para a renovação da frota estava prevista, para o ano de 1986, uma verba de 2 milhões e tal contos. Todos sabemos — como, aliás, o Sr. Ministro disse e com inteira razão — que, neste momento, o mercado de ocasião é muito tentador, que há um excesso de navios, um excesso de oferta e que, portanto, os preços são muito baixos. É, pois, natural que os nossos armadores, face a uma proposta aliciante e em comparação com um navio novo, sejam tentados, logo à partida, a adquirir um navio de ocasião. Contudo, também não sabemos quais são os custes económicos e as repercussões desse acto. O armador, de início, sabe que a oferta é tentadora, mas terá de fazer uma análise dos custos e uma análise comparativa entre a aquisição de um navio já com uma certa idade e a feitura de um novo navio.

Por outro lado, todos sabemos que os estaleiros estão em crise, a qual já se arrasta há algum tempo — aliás, já aqui tive ocasião de falar sobre o problema da indústria naval e não vou alongar-me mais sobre essa matéria.

Registo também com muito apreço a intenção do Sr. Ministro de dinamizar e fomentar o investimento, especialmente em estaleiros nacionais. Concordo consigo, Sr. Ministro, mas volto novamente ao problema: temos que, de uma vez para sempre, avançar com uma verba para o investimento no sector, para que se possa renovar e reapetrechar a nossa marinha mercante. Mas essa verba não pode ser de 100 000 contos, Sr. Ministro! Não seria mau se fosse de 2 milhões de contos!...

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado, registo a sua intervenção, a sua sugestão e dar-lhe-ei a sequência que puder dar.

O Sr. Deputado José Seabra referiu-se à verba de 11 milhões de contos para o Fundo Especial de Transportes Terrestres (FETT) e perguntou como é que se vai pagar o défice dos transportes municipalizados.

O Sr. Deputado não acha que as despesas para a reparação das vias de comunicação não deveriam ser «Despesas correntes», mas sim «Despesas de capital»?

A Sr.3 Deputada Ilda Figueiredo perguntou o que é que vai acontecer à responsabilidade do Fundo Especial de Transportes Terrestres relativamente às autarquias e à responsabilidade dos serviços municipalizados. Só os serviços municipalizados necessitam de uma verba de 1 700 000 contos.

Perguntou ainda a Sr." Deputada Ilda Figueiredo o que é isso de «operação de tesouraria com o Fundo Especial de Transportes Terrestres» e em que termos vai ser feita.

Vou pedir ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento que me ajude a responder a algumas questões. Pelo meu lado, só gostaria de acrescentar o seguinte: nos últimos quatro ou cinco anos os vários governos atribuíram aos serviços municipalizados — sobretudo, a Coimbra, Porto, Barreiro, Aveiro e Portalegre — verbas a título de indemnizações compensatórias e de sub-

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sídios reembolsáveis. Não se descobre aqui quais os criterios de variação na atribuição desses subsídios: nuns anos atribuíram-se mais, noutros concederam-se menos. A ideia que se recolhe é a de que o Estado fez aquilo que podia fazer face à disponibilidade de recursos que tinha, sem estar sujeito a uma regra definida.

Como disse no Plenário, o Orçamento que tinha sido aprovado antes da extinção do Fundo Especial de Transportes Terrestres pelo meu antecessor continha uma verba bastante inferior àquela que tinha sido dada no ano anterior. Não sei qual a razão que levou a prever uma verba inferior, mas o que é facto é que ela estava assim prevista. Procedeu-se à extinção do Fundo. Especial de Transportes Terrestres, o que não implica que o Estado não tenha de cumprir com as suas obrigações. O que é necessário é que todos nós saibamos quais são essas obrigações do Estado. Aqui poderá dizer-se que o Estado criou um hábito, por analogia com o que se passa nos grandes aglomerados de Lisboa e Porto, onde o Estado concede grandes indemnizações compensatórias e subsídios; gerou, assim, o hábito junto de cinco serviços municipalizados de receberem determinadas importâncias. Criou-se a expectativa, com alguma credibilidade e com alguma plausibilidade, de que, se no ano de 1985 aconteceu isso, no ano de 1986, provavelmente, aconteceria a mesma coisa. No entanto, compromisso não há! De resto, em matéria de Fundo Especial de Transportes Terrestres, tenho estado a examinar, dossier por dossier, quais são os compromissos efectivamente tomados pelo Estado Português para com os vários empreendimentos. Como está escrito no nosso Programa do Governo, iremos proceder como um Estado/pessoa de bem, isto é, iremos pagar os atrasados e cumprir com as obrigações para o futuro, desde que estas estejam perfeitamente definidas e equacionadas. É este o trabalho que, neste momento, tenho em curso, do qual vai resultar, no futuro, o pagamento daquilo que for devido.

A Sr.â Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, dá--me licença que o interrompa?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Se faz favor, Sr.a Deputada.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, de facto, o Decreto-Lei n.° 21/86, de 14 de Fevereiro, que extingue o Fundo Especial de Transportes Terrestres, diz, no seu artigo 2.°, que as atribuições e competências do Fundo Especial de Transportes Terrestres serão transferidas para a Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e para a Direcção-Geral de Viação, do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, conforme o que foi determinado por despacho do respectivo Ministro.

Ora, é aqui que está a questão fundamental que lhe queria colocar e que é a seguinte: ainda não conheço o despacho do Sr. Ministro, nem sei sequer se já o fez. As verbas que estão nas duas direcções-gerais — na Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e na Direcção-Geral de Viação — não contemplam as obrigações que o Fundo tinha assumido no ano passado. Já discutimos este problema na Comissão e continuamos agora a fazê-lo.

A propósito da outra parte da explicação que o Sr. Ministro deu, vou ler também aquilo que diz o artigo 3.°:

A titularidade de todos os bens móveis e imóveis e de todos os direitos e obrigações contratuais é transferida automaticamente para a Direcção--Geral dos Transportes Terrestres, com a excepção dos direitos e obrigações de natureza creditícia, que são transferidos para a Direcção-Geral do Tesouro, do Ministério das Finanças.

Portanto, é neste artigo 3.° que o Sr. Ministro insere tudo o que tem a ver com os direitos e obrigações que serão transferidos para a Direcção-Geral dos Transportes Terrestres, deixando para o Sr. Secretário de Estado do Tesouro as perguntas que lhe coloquei relativas à parte dos direitos e obrigações de natureza creditícia.

No que diz respeito ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, continuamos a não perceber por que é que essas verbas não existem nem na Direcção-Geral dos Transportes Terrestres nem na Direcção-Geral de Viação. E que eu continuo a não conhecer o despacho do Sr. Ministro e nem sei sequer se já o fez! ...

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.a Deputada, o meu despacho atribuiu funções e não verbas. Isto é, há um organismo que foi extinto e que tinha determinadas funções. Algumas dessas funções hão-de passar para a Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e outras para a Direcção--Geral de Viação. Compete-me a mim, por despacho, determinar qual a função «tal e tal» que vai ser exercida pela direcção-geral «tal». Já é diferente o problema das verbas para o cumprimento de obrigações para executar planos.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Esse é o artigo 3.°

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Exacto, Sr.a Deputada.

O que é que nós, solenemente, garantimos? Que as verbas assumidas pelo Estado Português em compromissos com quem quer que seja — nomeadamente com as autarquias e com a banca — serão cumpridas e respeitadas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —Sr. Presidente, queria apenas complementar as informações relativas ao Fundo Especial de Transportes Terrestres dadas pelo Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Efectivamente, não há qualquer razão para alarme, já que há dois tipos de despesas. O Fundo Especial de Transportes Terrestres tinha várias receitas e, inclusivamente, este ano elaborou um orçamento. Pensámos que, uma vez extinto o Fundo Especial de Transportes Terrestres, o orçamento deste Fundo poderia ser transferido para o Orçamento do Estado. Como este não é um ano de transição, a parte que não é de intervenções de natureza creditícia — que são os empréstimos, quer directos, quer indirectos, através dos avales do FETT — e de juros vai para a DGTT e para a DGV. Fundamentalmente, essas intervenções vão para a cons-

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trução de passagens de nível, para a circulação rodoviária e viária e para a instalação de semáforos. Essa verba, que está no Orçamento do FETT, ficará acoplada aos orçamentos da Direcção-Geral dos Transportes Terrestres e da Direcção-Geral de Viação (fundamentalmente à primeira).

Vozes inaudíveis na gravação.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não, porque entra a despesa e a receita, isto é, será uma despesa com duplo cabimento, será uma despesa consignada às receitas que estão no Orçamento do FETT.

A Sr.3 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Se faz

favor, Sr." Deputada.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, então se essa verba ainda não está prevista, como é que já o está no campo das receitas do Ministério das Finanças?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Fundamentalmente, são os rendimentos da propriedade, os juros e o saldo do ano anterior, o qual ainda não sabemos exactamente de quanto é que é. Essas receitas serão para cobrir...

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Nós temos essa informação, Sr. Secretário de Estado. Mas, e os encargos? Essa é que é a questão. Relativamente à parte dos encargos...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Esses encargos transitam para o Tesouro.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — ... e a todas estas obrigações, por exemplo, os municípios têm este tipo de transportes e tinham já obras a decorrer que eram...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Serão suportadas pela Direcção-Geral de Transportes Terrestres, a qual tem dois orçamentos: o seu orçamento próprio e aquele que lhe é conferido pelo Orçamento do Estado.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — É um orçamento que ainda não existe!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Só

existirá quando o Orçamento do Estado for aprovado. Esse orçamento da Direcção-Geral de Transportes Terrestres para 1986 existira. Por exemplo, a Direcção--Geral de Geologia e Minas tem um orçamento simples e um orçamento privado, onde estão despesas com receita consignada. É uma situação, digamos assim, de transição.. .

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — É uma situação em que o Fundo, este ano e na prática, ainda continua a existir, embora tenha sido extinto.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Já é

gerido pela Direcção-Geral de Transportes Terrestres.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Na prática e em termos orçamentais, o que temos aqui é uma situação ainda de existência do Fundo, já que no Orçamento não está ainda bem delimitada a orçamentação de toda esta parte que tem a ver com a Direcção-Geral de Transportes Terrestres e com a Direcção-Geral de Viação. Levantámos este problema porque, com a extinção do Fundo, as entidades que estavam a contar com essas verbas sentiram-se prejudicadas e no Orçamento não havia resposta para este problema.

O Sr. Secretário de Estado agora diz:

Este ano é uma situação de transição. Não está lá inscrita, mas nós vamos garanti-la.

Isto é, vamos ter aqui uma situação de transição, em que esta parte não está ainda no Orçamento mas continua a existir. Este problema do Orçamento é fundamental para que possamos entender o que é que se passa.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Compreendo perfeitamente as suas dúvidas, Sr.a Deputada. Aliás, estas situações são novas e, em termos de contabilidade e de técnica orçamental, temos de arranjar sempre estes sistemas, porque o Orçamento não entrou em vigor no dia 1 de Janeiro. O FETT não podia parar até à aprovação do Orçamento e, portanto, esta solução pode, inclusivamente, honrar os compromissos que o FETT assumiu. Qual era a alternativa? Puxar toda a receita e despesa do FETT para o Orçamento? Simplesmente, isso implicava imediatamente puxar...

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Em técnica orçamental, essa solução era a mais correcta.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Concordo, Sr.8 Deputada. Simplesmente, a administração real considerou mais coerente, dadas as informações dos gestores destas verbas, não extinguir imediatamente o Fundo, porque a Direcção-Geral de Transportes Terrestres em Janeiro, Fevereiro e Março ainda não tinha orçamento e ainda se estava (e está) a reger pelos duodécimos transitórios. Para os serviços era muito confusa a solução —que, tecnicamente, é muito mais ortodoxa— de, pura e simplesmente, puxar toda a receita do FETT para a receita geral do Estado e incluir as verbas necessárias para a DGTT e a DGV. A Direcção-Geral de Transportes Terrestres irá já gerir essa verba — o mesmo se diga em relação à Direcção--Geral de Viação.

Por outro lado, já se sabe que a parte que vem do FETT é para as aplicações que estavam já comprometidas.

É uma solução...

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Em técnica orçamental não é mau, mas...

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — É a

solução possível, já que a alternativa que eles davam de distinguir o FETT só para o ano era bem pior. Ora, sabemos perfeitamente que as coisas que ficam para o ano nunca se fazem. É preferível fazer logo, é preferível não ser a solução óptima mas ser a solução exequível. Assim, acaba-se com o Fundo Especial de Transportes Terrestres, que estava a assumir uma imagem muito negativa de utilização dos dinheiros públicos.

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A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Mas, Sr. Secretário de Estado, acontece que isto levanta alguns problemas técnicos, já que ficamos sem saber como é que vão ser autorizadas as despesas de verbas não orçamentadas na Direcção-Geral de Transportes Terrestres e na Direcção-Geral de Viação.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O cabimento é dado por estas verbas que vêm do orçamento do ex-FETT.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sim, mas que não ficam agora extintas.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Isso é inscrito como orçamento privativo do FETT, Sr.a Deputada. Quer dizer, o FETT ...

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Mas o problema, Sr. Secretário de Estado, é o de que no orçamento privativo só está a parte dos 3 milhões de contos correspondentes aos quatro primeiros meses do ano, segundo disse o Sr. Ministro na altura. Portanto, não está para o resto do ano. Aqui é que parece estar a confusão do Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr.a Deputada, essa sua segunda dúvida é esclarecida pelo seguinte: para o resto do ano também o está, na medida em que tem compensação em receita, designadamente no imposto de compensação. Para além disso, há um determinado número de despesas que eram do FETT, e que não o serão da Direcção-Geral de Transportes Terrestres. Concretamente, estou a referir-me às operações creditícias, que passam para a alçada da Direcção-Geral do Tesouro.

A Sr.a Deputada Ilda Figueiredo pode perguntar quem é que determina esses empréstimos. Fundamentalmente, quem determina essas operações activas é o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, conjuntamente com o Sr. Ministro das Finanças.

As operações creditícias ficarão no Tesouro e as operações reais da área real ficarão na Direcção-Geral de Transportes Terrestres e na Direcção-Geral de Viação. Para o ano esta situação tenderá a normalizar-se, na medida em que o orçamento da Direcção-Geral de Transportes Terrestres será um orçamento único, já com uma verba suficiente, evitando toda esta situação de transição.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, não queria continuar a insistir mas vou ter de o fazer por uma última vez, porque julgo que vamos ter de encontrar uma saída para este problema.

Naturalmente, isso é o que se encontra consagrado no artigo 3.° do decreto-lei que referi há pouco e foi aquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui disse. Mas o problema é que as verbas não estão nem na Direcção--Geral de Viação nem na Direcção-Geral de Transportes Terrestres. É esta a situação que aqui se encontra, e que sob o ponto de vista orçamental e sob o ponto de vista da Lei do Enquadramento, é irregular.

Há o tal problema da transição, mas o Sr. Ministro disse que essas verbas existiam no Ministério das Finanças. Talvez seja essa a forma de resolver este problema,

ou seja, fazer-se, posteriormente, uma transferência do Ministério das Finanças para o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.a Deputada, dá-me licença que a interrompa?

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Se faz favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — O que disse foi que o Sr. Ministro das Finanças e eu próprio tomámos como quadro orientador para o ano de 1986 o orçamento do Fundo Especial de Transportes Terrestres tal como ele resultou da sua aprovação pelo governo anterior. Isto é, havia um conjunto de receitas e despesas no antigo organismo e que totalizavam os tais 11 milhões de contos. Independentemente da operação administrativa para liquidar o organismo, tomámos esse quadro referencial de despesas e receitas para a gestão do ano de 1986. Portanto, insisto — já que isso tem dado azo a algumas especulações públicas — que as autarquias têm previstas comparticipações do Fundo, e desde que essas previsões estejam solenemente assumidas pelo Estado Português, isto é, que exista um despacho atribuindo essas verbas, elas serão rigorosamente cumpridas.

A Sr.3 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, que é isso de «solenemente assumidas»?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.8 Deputada, é que há pessoas que dizem o seguinte:

Passou por aqui um Sr. Ministro que me disse que eu havia de ter a verba tal.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, mas o Fundo tinha ou não, antes da sua extinção em 14 de Fevereiro, o orçamento para 1986, onde estavam previstas todas estas verbas?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Obviamente, Sr." Deputada. Esse orçamento vai ser respeitado.

A Sr.4 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, era esse orçamento que deveria ser enviado a esta Assembleia para que pudéssemos saber quais são os compromissos que o Sr. Ministro considera «solenemente assumidos» pelo Estado Português e que, portanto, irão ser cumpridos. Se assim fosse, talvez a Comissão pudesse julgar se estão ou não contempladas todas as questões que foram aqui levantadas.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, penso que, do ponto de vista jurídico e orçamental, a formulação rigorosa é a seguinte: se há várias entidades que vão suben-trar nas posições do Fundo, trata-se, em última análise, de saber o que é que estava inscrito no orçamento do Fundo para se saber em que situações é que se subentra.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Sr. Presidente quero dar esclarecimento quanto a duas previstas operações activas do Tesouro.

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II SÉRIE — NÚMERO 47

Quanto ao Fundo de Fomento da Habitação, pergunta que foi posta pelo Sr. Deputado João Cravinho, o problema põe-se nos seguintes termos: espera-se que seja agora a vez do Fundo de Fomento da Habitação, extinto há mais de dois anos, ser efectivamente extinto e, portanto, entrar em fase de liquidação. Estão a ser delimitadas as suas funções, concluindo-se as obras em curso, não se entrando em novas responsabilidades, portanto, entrando-se, efectivamente, em fase de liquidação.

Neste momento, a situação patrimonial do Fundo de Fomento da Habitação não está perfeitamente definida no sentido em que não se sabe em que medida é que através da realizçaão dos seus activos se poderá obter a satisfação do seu passivo, quer do passivo efectivo quer do passivo potencial.

A curto prazo poderá haver uma situação financeira desequilibrada, portanto, um ajustamento imperfeito entre as suas obrigações financeiras e as suas receitas.

Evidentemente que, por cautela, não podemos deixar de considerar no Tesouro as obrigações externas do Fundo de Fomento da Habitação, que são, ao mesmo tempo, e já ontem tive oportunidade de referir aqui este conceito, obrigações financeiras da República. Portanto, o Estado é tão responsável quanto o próprio Fundo de Fomento da Habitação no cumprimento destas obrigações. Dai que, por segurança e por cautela, se tenha incluído esta verba em operações activas ao Fundo de Fomento da Habitação.

Quanto ao Fundo Especial de Transportes Terrestres, de facto, a verba deve ser retirada. A hipótese desta operação activa de 10 milhões de contos levantou-se na altura em que se elaborou a informação a ser enviada para a Comissão de Economia, Finanças e Plano, mas, de facto, a elaboração deste processo não justifica que esta verba seja mantida.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Faça favor, Sr.a Deputada.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, aquilo que acaba de dizer é importante e tem que se ter em conta, depois, no articulado do Orçamento do Estado ...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do MimisCro das Finanças e do Tesouro: — No articulado, não. Repare que a verba das operações activas ...

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Essa verba global era de 80 milhões de contos e diminui, neste momento, para 70 milhões de contos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Essa verba está diminuída, mas se olhar para a informação que aí vem relativa às operações activas, verificará que há outras responsabilidades que têm de ser consideradas. E repare que a verba das operações activas nunca é rigorosa ao centavo ou, mesmo, ao conto de réis.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Continuarei a responder ainda às perguntas formuladas.

O Sr. Deputado José Seabra levantou o problema de a despesa de reparação das vias de comunicação dever ser considerada uma despesa de capital ou uma despesa corrente. É evidente que julgo que as pessoas que estão mais ligadas à contabilidade pública lhe poderão dizer isso. Eu, pessoalmente, acho que isso depende dc tipo de obras que se fazem: há obras que talvez devessem ser consideradas como despesas de capital, outras que o devem ser como despesas correntes, mas, enfim, as pessoas que zelam pelo rigor da classificação pública ...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro das Finanças e do Tesouro: — Quero acrescentar apenas que as despesas com construção e reparação a céu aberto são sempre consideradas despesas de investimentos.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — O Sr. Deputado Próspero Luís fez algumas observações, uma das quais relativa à anulação do imposto do selo e sobre a qual defiro a minha resposta.

Relativamente aos PISEEs, estou de acordo com a observação do Sr. Deputado quando diz que devíamos fazer um esforço no sentido de justificar bem os projectos de investimento que se fazem.

Julgo que esse é um problema geral do sector público em Portugal. É evidente que os projectos de investimento têm de considerar a rentabilidade económica e social, por isso mesmo é o sector público que os faz, mas têm de estar bem correlacionados com o mercado que, efectivamente, temos ao nosso alcance para que não se façam projectos mirabolantes que depois não encontram escoamento nos mercados, ou se faça valorização de matérias-primas a todo o preço acabando--se por ter ferro, ou o que quer que seja, a preços três ou quatro vezes superiores aos do mercado internacional.

Acho que no sector público devemos aperfeiçoar os métodos de análise custo-benefício e temos bons pretextos para isso — não foi este Governo que os inventou, obviamente, mas já vêm de trás—, pretextos esses que se prendem com toda esta prática em que os nossos serviços e empresas públicas vão entrando quando se relacionam com instituições internacionais, designadamente o Banco Mundial e as instituições comunitárias. Aí, para se obter os financiamentos correspondentes, obriga-se a justificar muito bem as rentabilidades dos projectos. É um esforço que as pessoas que trabalham no Estado e nas empresas públicas fazem e que tem sido bem sucedido. Vê-se, por exemplo, um certo número de projectos importantes e até de avaliação difícil, como é o caso de projectos de estradas e vias férreas, que foram aceites pelo Banco Europeu de Investimento e pelo FEDER, o que significa que os métodos de análise utilizados não foram maus de todo, para não dizer bons. Esse esforço vai, evidentemente, continuar.

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Relativamente ao problema das empresas subsidiárias, é, de facto, importante. Todos sabem, embora alguns divirjam desta opinião, que pertenço a um governo que considera que há Estado a mais. E porque queremos um melhor Estado, mais restrito, uma das formas de o obter é examinando esse conjunto de empresas subsidiárias de empresas públicas, empresas essas que foram constituídas, algumas delas com razões objectivas, não discuto isso, outras com razões que são mais discutíveis e outras até que poderiam funcionar melhor no sector privado. Esse é, obviamente, um problema que o Governo não deixará de examinar dentro da política expressa no seu Programa.

Tentarei responder ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, que levantou algumas questões interessantes, uma das quais é relativa ao meu próprio Ministério.

Deu-me a ideia de que não concorda muito com esta nova configuração das obras públicas repartidas por outros ministérios e não sei se interpretei bem a sua observação. Nessa matéria, o Governo procedeu à sua alteração estrutural porque na Europa, juntamente com a Turquia — se a memória não me falha e se as coisas entretanto não mudaram—, éramos o único país que ainda tinha um Ministério das Obras Públicas no conceito tradicional, isto é, o de quase toda a obra financiada com recursos públicos ter uma tutela comum. Este governo fez aproximar as obras públicas dos seus utilizadores, com o sentido de poder coordenar melhor os empreendimentos públicos com as subsequentes exploração e entrada em funcionamento. É, de facto, uma experiência original, porque desde o tempo do fontismo nenhum governo havia feito isto e estou convencido que vai funcionar correctamente.

Paradoxalmente, o ministério voltou a ser aquele que Fontes Pereira de Melo criou, isto é, o ministério da grande obra pública, do porto, das vias férreas, das estradas, dos telégrafos — na altura —, e não será o dos faróis porque a Marinha tutela a ajuda radioma-rítima, mas será o ministério da Marinha e de tudo isso, e não o ministério do pequeno edifício, o não ministério do ordenamento do território e planeamento urbanístico, o não ministério do saneamento básico e de abastecimento de água bem ligado à autarquia e ao poder local. Voltou, portanto, a ser um ministério um pouco à moda de Fontes Pereira de Melo.

O Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes dava e continua a dar pareceres. Isso com certeza que se lhe escapou, Sr. Deputado, mas na Lei Orgânica do Ministério aquele Conselho, que era um órgão de consulta só dos Ministros das Obras Públicas e dos Transportes, passa a ser, também, um órgão de consulta directa do Ministro do Plano e da Administração do Território —tem planeamento urbanístico e saneamentos —, de consulta dos Ministros da Saúde e da Educação. Isto é, qualquer ministro, para questões de ordem técnica de construção civil e de obra pública, poderá consultar o Conselho a fim de obter parecer sobre os seus projectos.

O Sr. Deputado fez umas observações sobre as verbas do meu gabinete, isto é, bateu mesmo à minha porta.

Devo dizer que herdei dois gabinetes: os antigos Gabinetes do Equipamento Social e do Ministério do Mar. A primeira coisa que lhe posso dizer, se outra razão não tiver, é a de que consegui reduzir o orçamento em 32% em termos reais. Também não seria de esperar outra coisa porque, na prática, substituo dois

gabinetes, pelo que também terão de haver os reflexos financeiros dessa concentração. A prova está em que o ano passado os dois Gabinetes tiveram um orçamento de 120 000 contos e para o meu gabinete estão agora orçados 106 000 contos, pelo que, em termos reais, deve dar uma redução da ordem dos 30%.

Além disso, quero dizer-lhe que nesse orçamento está prevista uma verba importante, 27 500 contos, que se destina a dar execução à Lei da Defesa Nacional que impõe que em alguns ministérios se criem as chamadas «comissões de defesa», sendo esta uma mera previsão de uma verba destinada a esse fim. Não sei se isto vos esclarece, mas se precisarem de mais elementos, fornecê-los-ei.

O Sr. Deputado Octávio Teixeira focou o problema do Laboratório Nacional de Engenharia Civil e, depois, as verbas para ensaios das obras.

De facto, no estatuto do LNEC existe uma disposição que diz que o Estado lhe concederá um subsídio até ao limite de 80% das despesas com pessoal. Na prática, em vários orçamentos anteriores, verifica-se que o Estado tem sempre orçamentado por baixo este subsídio e procurei saber a razão de tal facto. A razão foi para mim plausível e é a seguinte: o LNEC é um organismo que obtém as suas receitas de duas origens, que são, a primeira, a da venda de trabalhos e serviços prestados ao exterior e a segunda, por compensação do Estado, como qualquer outro serviço público, através do Orçamento do Estado. Nos últimos anos tem havido uma espécie de pressão do Estado — isto não tem nada de político pois é meramentte administrativo e de gestão— no sentido de forçar o organismo a vender cada vez mais serviços ao exterior, isto é, realizar trabalhos para terceiros, cobrar pelos trabalhos que realiza e, agora, pelo meu impulso, e tomei isso bastante a sério, vender serviços a países estrangeiros, sobretudo europeus. Talvez como desejo de estimular as pessoas que lá trabalham, a verba de venda de serviços ao exterior está sempre orçada um pouco por cima e a verba do subsídio do Estado sempre um pouco por baixo e isto quando se confronta o orçamento com o efectivamente gasto.

O método não me pareceu errado e, portanto, aceitei-o e posso dizer-lhe que as pessoas que trabalham no próprio Laboratório também não o acham mau mas, antes, queixam-se de que, quando se chega ao fim do ano e quando já se sabe que, porventura, a venda de serviços não foi de 600 000 contos mas que vai ser, provavelmente, de 500 000, o Estado não corrija rapidamente a situação e o subsídio previsto de 400 000 contos não passe imediatamente para 500 000 contos. No entanto, acho que as pessoas que inventaram este método há uma série de anos fizeram um bom trabalho e sigo essa linha.

Quanto a verbas para ensaios de obras, de uma forma geral os serviços do Ministério — e têm-se recomendado isso — têm nos seus orçamentos de obras verbas para esse fim. Não digo que todos façam como se está a fazer na nova ponte sobre o Douro, em que até se criou um laboratório especial para aquela obra, mas de uma forma geral —e a não ser que sejam obras de rotina, com métodos de construção rotineiros e com dimensões normais — há sempre uma verba para observações do comportamento das obras.

Efectivamente, isso existe quando, como no falado caso da Figueira da Foz, alguma coisa não correu de acordo com as previsões.

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II SÉRIE — NÚMERO 47

Acho que respondi a todas as perguntas. No entanto, não sei se os Srs. Deputados se consideram esclarecidos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, julgo que ficou ainda por referir um aspecto que tem a ver com o investimento do sector empresarial do Estado nas empresas de transportes e comunicações.

Ontem o Sr. Secretário de Estado do Tesouro referiu aqui que os valores provisórios fornecidos à comissão quanto ao investimento previsto seriam diminuídos em cerca de 20%, no geral, pelo que gostaria de saber se, relativamente às empresas do sector dos transportes e comunicações, o Sr. Ministro tem já alguma ideia quanto ao investimento real que irá ser realizado por elas.

Quero ainda introduzir uma outra questão que há pouco foi abordada e que se prende com o IVA. Há pouco eu não tinha comigo a Portaria n.° 965/85, de 31 de Dezembro, e agora que a tenho comigo constato que nela se diz o seguinte: «os preços dos serviços prestados no âmbito das telecomunicações e transportes, cujo regime dependa de prévia fixação por parte do Governo, terão o IVA incluído». Depois, no ponto 2, diz-se que esta questão se aplica aos preços já fixados.

Assim sendo, através desta portaria as empresas de transportes e comunicação estão, de facto, a suportar o IVA. Naturalmente que não estou a defender que se aumentem os preços dos serviços prestados por estas empresas mas, então, se o Governo publicou esta portaria, naturalmente tem de admitir que as empresas têm de ser compensadas por isto.

Como há pouco o Sr. Secretário de Estado disse que estava a acompanhar de perto este problema e a fazer os respectivos estudos e cálculos, gostaria de saber, em primeiro lugar, se já há um cálculo aproximado do que implica para as empresas a aplicação da Portaria n.° 965/85 e, em segundo lugar, como é que vai ser encarado este problema em concreto.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.a Deputada, independentemente da resposta que o Sr. Secretário de Estado dará, quero repetir o que já disse há pouco e que não sei se escapou a V. Ex.a: quando se publicou essa portaria, tinham-se já feito alguns estudos, que vinham de trás, a provar que a introdução do IVA nas empresas de transportes agravava muito pouco os custos de produção. Várias contas estavam feitas e os valores que apareciam eram de 1% e 2%.

É evidente que quando se faz variar aquele conjunto de factores que determinam os custos de produção, como sejam as baixas da taxa de juro, a diminuição da inflação, a redução da desvalorização do dólar, esses aumentos dos custos em 1% ou 2% provocados pelo IVA, nessas empresas em que havia modelos estabelecidos, faz parte daquele conjunto e, neste momento, não temos razões para supor que as situações sejam de alguma gravidade.

Mas o Sr. Secretário de Estado responderá mais concretamente.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações (Gonçalo Braga): — Sr.a Deputada, quero confirmar o que o Sr. Ministro disse e salientar um

ponto: houve empresas que nos apresentaram cálculos cujas estimativas, neste momento e face à revisão dos elementos, descem para metade face ao impacte do IVA.

Depois, como o Sr. Ministro referenciou largamente, há uma mudança significativa de um conjunto de parâmetros para a exploração das empresas, estando algumas delas a ser discutidas no quadro da proposta orçamental. Sem termos a medida do impacte dessas medidas, confrontada com o impacte do IVA, que já se conhece em parte, será prematuro dizer que vamos ou não indemnizar.

Agora, o que sabemos face às informações de que dispomos é que, em princípio, será suportado pelas empresas.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado: Se me permitem, direi que 20% dos custos destas empresas é um valor importante.

De qualquer forma, não vou insistir neste assunto porque acima de tudo seria fundamental que dispuséssemos dos cálculos e não vou voltar a pedi-los.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.a Deputada, atenção com a maneira de interpretar aquilo que digo: se não examinar nada mais do que a variação produzida pelo IVA, encontra valores da ordem de 1 % ou 2%, mas estcu a dizer-lhe que existe um conjunto de parâmetros que são completamente alterados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Gostaríamos de continuar a verificar a componente dos investimentos, agora por secretarias de Estado. Se o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado nos permitem, colocaríamos quatro questões: a primeira tem a ver com a Secretaria de Estado dos Transportes e Comunicações, em relação à qual falámos, em Plenário, dos investimentos, de compromissos, do passado e dos novos investimentos. O Sr. Ministro já sublinhou o nível dos compromissos que herdou, o dos novos que lhe são permitidos e o dos que compromete para o futuro. Mas se balizarmos a acção do Ministério, poder-se-á dizer que nesta Secretaria de Estado há uma componente do investimento para a marinha do comércio — que tem apenas um valor emblemático, como o Sr. Ministro reconheceu, aliás, sem sequer ser a contrapartida das receitas previsíveis — e outra para aquilo que se pode chamar de «rede dos aeródromos», cuja componente de investimento novo nos parece ter algum significado em relação com o lançamento, em termos diversos, da rede doméstica de transportes aéreos.

Em relação à rede de aeródromos, queremos precisar quais são as principais prioridades dentro desta centena e meia de milhares de contos de investimento novo.

Em segundo lugar, em relação às administrações dos portos, organismos com autonomia administrativa e financeira e com personalidade jurídica, e em particular em relação às grandes administrações dos dois portos — muito embora neste momento Sines tenha um valor cie orçamento maior do que os dos portos de Lisboa, Porto e Leixões —, porque é que os valores de aquisição de serviços não especificados no orçamento da

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Administração-Geral do Porto de Lisboa têm uma elevação tal que, por exemplo, não corresponde a um orçamento dos portos do Douro e Leixões, que têm valores que consideramos relativamente normais em termos de aquisição de serviços?

Em relação ao Porto de Lisboa, parecem-nos valores muito elevados, cerca de um terço do orçado na Administração-Geral do Porto de Lisboa.

Se algum dos Srs. Secretários de Estado nos pudesse responder a esta questão, ficaríamos esclarecidos.

Uma outra pergunta prende-se com a Secretaria de Estado da Construção das Vias de Comunicação: a Junta Autónoma de Estradas tem um orçamento que retira da Secretaria-Geral do Ministério cerca de 7 milhões de contos. A que obedece esse princípio? É simplesmente uma herança? Pergunto isto porque uma secretaria-geral que movimenta verbas no valor de 14 milhões de contos, e apesar das explicações de ordem histórica que o Sr. Ministro poderia naturalmente dar, não será aquela a única justificação.

Das verbas da Secretaria-Geral do Ministério — de 14 milhões de contos—, 7 milhões são para a Junta Autónoma de Estradas e 5 milhões de contos para a Caixa de Reforma dos Ferroviários; assumem, portanto, valores que têm aqui um grau de coerência orçamental relativamente penoso de explicar.

Gostaria que se fizessem algumas considerações sobre esse aspecto.

Entretanto, a Junta Autónoma de Estradas tem a nível dos investimentos alguns valores que, no universo de penúria a que estamos habituados, têm um cheiro relativamente diverso. Estamos habituados a um universo de penúria tão pelas bases que qualquer cheiro a uma modalidade de investimento um pouco melhor deixa que algumas pessoas se considerem metidas numa aceleração da história, quando, de facto, não estão.

Mas o que queria dizer ao Sr. Secretário de Estado é que, relativamente aos investimentos da Junta Autónoma de Estradas, há entre a rede complementar e o programa geral da rede fundamental umas componentes de investimento que não sei se são de completa coerência com algumas afirmações que têm sido feitas, designadamente o Programa das IPs e o Programa de Desenvolvimento do Eixo de Auto-Estrada. Gostaria de saber se isso tem uma concretização financeira quanto à relação entre aquilo que é investido nessa rede fundamental e aquilo que é investido na complementar.

A menos que o Governo procure continuar a fazer aquilo que temos vindo a denunciar em várias vertentes, e que é passar para as autarquias, cada vez mais, um nível de custos de conservação de rodovias, com o desmuniciamento financeiro por parte das autarquias.

Por último, Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, devo referir a questão da indicação de se integrar a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais na Secretaria de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Ministro há pouco, ao interpretar a minha pergunta, fez considerações que não são certeiras em relação ao nosso entendimento sobre se devia prevalecer o modelo fontista do passado ou se a distribuição por áreas de concretização, onde as coisas de facto se realizam, isto é, quando fiz a referida pergunta não dei indicações judicativas que habilitem o Sr. Ministro a dizer qual é a nossa interpretação.

Seguimos com atenção a experiência de gestão que foi empreendida e não temos, in Umine, uma posição contra este tipo de adopção do investimento mais próximo dos utilizadores.

Mas em relação à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, o Sr. Ministro há pouco referiu: «ficámos com a obra grande».

Ora, o programa do PIDDAC relativo à Direcção--Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, como o Sr. Ministro sabe, é um programa de pequenas obras, aliás extremamente dispersas por todo o País. Aquela é uma direcção-geral que faz obras em toda a parte, não fazendo, naturalmente, muitas obras daquelas que se podem considerar essenciais.

É evidente que há uma grande dispersão dos edifícios e monumentos nacionais e que, mesmo sob o ponto de vista legal, à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais cabe uma parte importante na . conservação e mesmo na execução da obra nova, mas o PIDDAC desta direcção-geral, pelo menos, assenta também na possibilidade do arbítrio neste sentido: não por entendermos que há actos arbitrários — desde logo, só os consideramos assim quando justificadamente eles se nos apresentam como tal —, mas porque se podem investir 20 000, 30 000 e 50 000 contos num lado ou noutro, não havendo, pelo menos para quem está mais no exterior da máquina do Estado, justificação para isso.

O que queria perguntar ao Sr. Ministro e ao Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação era qual o critério globalmente seguido na afectação das verbas do PIDDAC, em termos da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, ou seja, se houve quanto a isto um entendimento da «grande obra» ou se se deixou correr o barco e manter compromissos anteriores, tout court, não tendo qualquer ambição de modificar, no que respeita à DGEMN, aquilo que estava a ser adoptado pelo governo anterior.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Oliveira Martins): — Antes de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado queria esclarecer o Sr. Deputado Anselmo Aníbal sobre três aspectos de índole geral.

Primeiro, devo dizer que quando tomei conta deste Ministério também estranhei haver uma Secretaria-Geral que implicasse tantos milhões de contos; no que se lhe refere, no Orçamento de 1985, havia lá 10 milhões de contos, e agora no Orçamento de 1986 o montante correspondente é de 14,8 milhões de contos.

Efectivamente, esta é uma técnica orçamental do Estado Português — não a discuto, aceito-a — que faz passar por via da Secretaria-Geral transferências correntes e transferências de capital. Portanto, o Sr. Deputado encontra no meu Ministério um pacote de verbas de transferências de capital e de transferências correntes para amortização da dívida e despesas de funcionamento da Junta Autónoma de Estradas que passam pela respectiva Secretaria-Geral, ou seja, essas verbas são afectas do Ministério das Finanças para esta Secretaria e dela para aquela junta.

Pergunto, como cidadão, digamos assim, a que título é que tendo o Estado Português, em determinada altura, assumido o compromisso de pagar os défices da Caixa de Reformas dos Ferroviários — assumiu-o solenemente —, dando-lhe isso encargos no montante

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actual de 5 milhões de contos, por que é que esta verba não é afecta directamente ao Ministério das Finanças, por exemplo, à Segurança Social?

Há uma técnica orçamental que respeito e que faz correr, através da Secretaria de Estado do meu Ministério, essa importância.

O mesmo se passa com o subsídio de rendas: vamos executar a lei das rendas este ano pela primeira vez e os encargos correspondentes a meio ano — 1 400 000 contos — vão ser pagos através do Centro de Segurança Social do Ministério do Trabalho. Mas é através da Secretaria-Geral do meu Ministério que o Ministério das Finanças faz correr a verba, isto é, afecta-a ali para dali ser transferida para outro lado. Esta é uma técnica orçamental que existe nas leis do Estado Português e que aceito.

O Sr. Deputado referiu também os investimentos da Junta Autónoma de Estradas, que têm um aspecto diferente e de excepção no clima de penúria característico destas matérias. Tenho de dizer-lhe que, de facto, esses investimentos são mesmo excepções, e são-no porque o Governo atribuiu uma prioridade ao sector da construção civil, e obras públicas e, particularmente, ao sector das vias de comunicação. As Grandes Opções do Plano referem-se a isto. Entendeu-se que este novo impulso ao crescimento económico e ao desenvolvimento em Portugal tinha de passar pelo sector das vias da comunicação e pelo relançamento da indústria da construção civil. Portanto, dentro das possibilidades orçamentais que existem, reforçou-se, o mais possível, as dotações da Junta Autónoma de Estradas dentro das capacidades de execução que pensamos que existem, problema que aliás esta Comissão levantou em determinada altura.

Quanto à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, o Sr. Deputado Anselmo Aníbal corrigiu-me, e bem, porque eu disse-lhe que o meu Ministério era a grande obra pública e, de facto, não é inteiramente assim. Ficou naquele Ministério, digamos, uma espécie de cocktail de empreendimentos, desde estabelecimentos prisionais a monumentos nacionais e quartéis para a Guarda Nacional Republicana, quer dizer, um conjunto de obras de edifícios que, não justificando, por si, uma separação e inserção nos ministérios, ficou integrado nesse cocktail que é a DGEMN. Portanto, aceito a correcção e peço-lhe desculpa por aquilo que lhe disse.

Agora pedia a cada um dos Srs. Secretários de Estado qe esclarecessem os demais pontos.

O Sr. Presidente: — Queria comunicar à Comissão o seguinte: não sabemos exactamente a hora a que vamos terminar a reunião de hoje. Provavelmente, não necessitaremos de trabalhar à noite, mas, em todo o caso, não é ainda uma certeza. Isso depende basicamente de VV. Exas, Srs. Deputados.

Todavia, recordar-se-ão que, em matéria de propostas, tenho vindo a insistir para que elas sejam entregues até ao fim da reunião de hoje, mas, dada a relativa indeterminação da hora do encerramento desta — não estará cá ninguém à noite para as receber —, e como no fundo o que interessa é marcar uma data limite clara para a entrega delas, proponho-vos que aceitem como data limite o dia de amanhã, até às 11 horas.

Esta é uma hora fixa, o que permitirá que não haja o probíema de alguns Srs. Deputados pretenderem entregar propostas hoje à noite e encontrarem a Comissão encerrada. Se os Srs. Deputados concordarem, fixamos então como data limite as 11 horas de amanhã, o que nos evitará quaisquer confusões nesta matéria.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, segundo entendi, as propostas que mencionou são as relativas às despesas.

O Sr. Presidente: — Sim, são somente as propostas relativas às despesas, visto que não temos nenhuma competência para estabelecer limitações, embora possamos, eventualmente, fazer depois um acordo quanto a esta matéria, como já tive oportunidade de referir.

Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações (Sequeira Braga): — Sr. Deputado Anselmo Aníbal, os aeródromos representam uma das principais preocupações — tão séria como as autarquias locais — para a movimentação das pessoas.

Além disso, estes investimentos têm também um impacte significativo em termos de desenvolver um sector do mercado, que é o do transporte aéreo regional regular e não regular.

Quais são os principais aeródromos em que estamos a pensar investir?

Temos os aeródromos de Bragança, da Covilhã, de Coimbra, de Viseu, de Braga, de Vila Real de Santo António e de Portimão. A distribuição das respectivas verbas pela generalidade dos aeródromos situa-se entre os 25 000 e os 30 000 contos, com uma única excepção, que é a do aeródromo de Viseu, em que é aplicado um montante de investimento significativamente inferior.

Estes investimentos são essenciais, porque se eles não se fizerem a exploração dos referidos aeródromos fica extremamente prejudicada e com custos agravados para os transportadores aéreos.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Secretário António Vasco de Melo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação.

O Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação (Falcão e Cunha): — Sr. Deputado Anselmo Aníbal, completava a informação do Sr. Ministro acerca do problema que V. Ex.a colocou sobre a Junta Autónoma de Estradas.

O plano de investimento desta Junta prevê um investimento de cerca de 7 milhões e meio de contos na rede fundamental e de 5 milhões e meio de contos na rede complementar.

O plano rodoviário, que foi aprovado por esta Câmara em Setembro do ano passado, define o que é a rede fundamental e o que é a rede complementar. Essencialmente, a rede fundamental é constituída pelos itinerários complementares e por outras estradas da rede nacional. O mesmo plano rodoviário previu a passagem para a responsabilidade das autarquias de uma rede de estradas nacionais que, de futuro, serão classificadas como municipais. E uma rede de estradas de cerca de 12 000 km.

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No plano de investimentos para 1986 estão ainda contempladas algumas das estradas da rede que vai ser desclassificada ou municipalizada, porquanto — e já tive oportunidade de, na Comissão Parlamentar de Administração Regional e Local, dar a conhecer quais são as intenções do Governo sobre esta desclassificação — nenhuma passagem de estradas nacionais a municipais será feita este ano. Para a determinação dos critérios a que vai obedecer essa passagem, nomeadamente critérios e recursos financeiros a garantir às autarquias e condições técnicas em que as estradas deverão ser transferidas, foi formado um grupo de trabalho com representantes do Ministério do Plano e da Administração do Território, do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e da Associação de Municípios, grupo de trabalho esse que ainda não apresentou o seu relatório final, o que espero que aconteça muito brevemente.

Julgo que era esta a questão que o Sr. Deputado tinha colocado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação (Elias da Costa)-. — Sr. Deputado Anselmo Aníbal, a Direcção-Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais, nos seus orçamentos, privilegia a defesa e a valorização do património cultural, as instalações especiais de saúde, a segurança e a ordem pública e as instalações de serviço da administração geral.

No entanto, a pergunta que o Sr. Deputado me colocou foi a de saber qual era o critério estabelecido na definição das actuações da referida Direcção-Geral. Naturalmente que ele é definido com base nas necessidades e prioridades de actuação face às nossas limitações financeiras a nível de verbas disponíveis para a DGEMN.

Esta Direcção-Geral tem um orçamento de 2 136 000 contos, sendo 1699 contos de compromissos — quando digo compromissos refiro obras que se vão fazer — e 439 000 contos relativos a novas actuações.

Como o Sr. Deputado disse, a actuação da DGEMN é muito disseminada por uma série de projectos com montantes da ordem dos 3000, 5000 , 20 000 e 30 000 contos, os quais sendo inúmeros, não posso de forma alguma estar a listar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação.

O Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação: — Sr. Deputado Anselmo Aníbal, sobre a questão da Administração-Geral do Porto de Lisboa, que aliás já me tinha sido posta na reunião que tivemos com a Comissão Parlamentar de Equipamento Social, na realidade há uma verba — não tenho aqui o orçamento dessa entidade mas ela anda na ordem de 700 000 contos de «serviços não especificados» — que diz respeito, nessa Administração, fundamentalmente à seguinte circunstância: há uma série de serviços prestados pela referida Administração para os quais ela recorre, nomeadamente para a mão-de-obra portuária, aos serviços de empresas de operadores portuários com as quais faz contratos anuais antecedidos de concurso.

Trata-se, sobretudo, da aquisição de serviços e, dentro deste ramo, da aquisição de mão-de-obra para a exploração de determinados serviços prestados pela DGPL.

Apresento-lhe um caso concreto do que disse, que é o do terminal de contentores de Santa Apolónia, cuja mão-de-obra é fornecida por um contrato de prestação de serviços e no qual se paga um x por contentor, havendo concurso aberto todos os anos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Luís Roque.

O Sr. Luís Roque (PCP): — Desejava fazer uma série de considerações em relação ao sector da habitação e que são as seguintes: nota-se em todo este sector que o Estado se demite das suas obrigações constitucionais e que passa a assumir o papel de mera Caixa Geral de Depósitos, ou seja, concede empréstimos para aquisição de habitações. Julgo que as habitações iniciadas, em termos do Estado e a título de realojamento, são cerca de 750.

Nesta matéria, os restantes empréstimos estatais são concedidos a cooperativas de habitação económica e a outras estruturas semelhantes, como as associações de moradores, e pensa o Estado, segundo me pareceu, passar essa obrigação, que lhe cumpre, para as autarquias locais.

É evidente que ele empresta segundo critérios de juro que considera baixos, mas nós consideramo-los demasiado elevados. Duvido que haja actualmente autarquias que possam comportar 11 % de juros em termos de habitação, habitação essa dita social, em que as rendas terão de ser obviamente muito baixas.

O que passará a verificar-se, de certeza absoluta — e isto é quase uma previsão — é que essas autarquias irão receber menos de rendas do que terão de pagar de juros e, além disso, terão de pagar a amortização do empréstimo, o que é ainda outro factor a considerar. Isto no fim conduz-nos a uma pergunta, que é a seguinte: quem é que vai resolver o problema da habitação social?

A segunda questão é relativa à lei das rendas. Foram iniciados critérios que julgo estarem a ser utilizados por defeito. Fala-se em 220 000 famílias — não sei como é que surgiu esse número e em que termos — e, portanto, o subsídio de renda será, em média, cerca de 800$ por fogo. Estou convencido de que este subsídio de renda é ridículo e não vai resolver absolutamente nada. Pergunto, pois, se não estaremos a criar uma política de habitação que, no fundo, será de novo o regresso às barracas?

Outra questão que lhe queria pôr, Sr. Ministro, em termos de estradas, era a seguinte: foram iniciadas este ano apenas 30% das obras projectadas, ou seja, perto de 100 estradas, e destas 55 estão dotadas com verbas iguais ou inferiores a 30 000 contos, o que talvez seja suficiente para o respectivo projecto (mas estou convencido que nem para isso dará).

Isto, no fundo, só denuncia a prática da primeira pedra que tem sido seguida por este governo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Sr. Deputado, vou procurar ser breve.

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Em relação à questão de fundo que levantou, basta comparar os resultados das acções desenvolvidas em termos de habitação social pelo Estado com o resultado obtido pelas autarquias locais para ser suficientemente esclarecedor que os melhores efeitos e benefícios que poderemos obter no âmbito da habitação social é quando ela é feita através das câmaras municipais.

O problema que o Sr. Deputado põe é puramente financeiro em relação às câmaras municipais e, como sabe, os mecanismos que estão estabelecidos não foram determinados por este governo. Estamos neste momento a analisar o seu aperfeiçoamento e o seu reenquadramento, tendo em conta exactamente a questão que colocou, ou seja, a do financiamento e do retorno do capitai face a uma habitação social que se destina a agregados familiares de recursos — não os chamemos insolventes, porque uma família não é insolvente — muito débeis. Como tal, continuamos e continuaremos a apostar na iniciativa das câmaras municipais e na criação de mecanismos que permitam de facto ultrapassar a situação.

De qualquer forma, em termos do PIDDAC actual e reafirmando a necessidade de o Fundo de Fomento da Habitação ser extinto, desde 1982 que os respectivos projectos se arrastam e, como deve calcular, o custo dessas habitações é extremamente elevado neste momento, como resultado da própria actuação da administração central nesta matéria. Não nos podemos esquecer de que temos cerca de 40 mil casas para gerir — património do Estado que é do Fundo de Fomento da Habitação — e que temos de prestar às câmaras municipais o apoio financeiro e em recursos humanos para que elas prossigam os programas de habitação social para arrendamento.

Nesta base e no âmbito do Decreto-Lei n.° 366/85, temos este ano 1 milhão de contos e está previsto, da nossa parte, o lançamento de novos 2000 fogos — e não 750 como o Sr. Deputado mencionou — em colaboração estreita com as câmaras municipais, que, como referiu (e muito bem), são financiadas pelo Instituto Nacional de Habitação.

Quanto à questão que me colocou sobre a lei das rendas, bem como a dos dados enunciados das 220 000 famílias, queria lembrar-lhe que a discussão na Assembleia da República sobre o dossier dessa lei se baseou nos censos e no inquérito sobre o parque habitacional feitos em 1981 e 1982, que retratou o parque arrendado e, portanto, as características das famílias, a sua dimensão, os seus rendimentos, etc. Esse inquérito abrangeu, em todos os concelhos, cerca de 3000 famílias, que nos permitem retratar o universo com que estamos deparados.

Quanto aos cerca de 800$ que o Sr. Deputado disse que seriam o subsídio médio de renda, preciso-lhe, com base naquele inquérito, que esse subsídio rondará os 872S e tem de ser correlacionado com o aumento das rendas. Este consistirá em uma renda média de 1000$ passar para 2000$.

Portanto, temos de correlacionar o subsídio com o respectivo aumento das rendas que se vai verificar.

Penso que não estamos numa situação de regresso às barracas; estamos sim numa situação de melhoria das condições de vida das famílias portuguesas, o que vai permitir uma recuperação efectiva do parque degradado que existe por este país fora.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Roque.

O Sr. Luís Roque (PCP): — Sr. Secretário de Estado, de qualquer maneira, isso só retrata uma situação que é a de o subsídio não chegar para cdbrir o aumento total.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — É lógico que o subsídio de renda se destina às famílias mais carenciadas, as quais, de facto, veriam a sua taxa de esforço muito elevada por efeito da entrada da lei das rendas.

Posso dizer-lhe que a taxa de esforço máximo nos agregados familiares sujeitos à correcção extraordinária das rendas não ultrapassará os 21 %, sendo significativamente mais baixa do que as taxas de esforço exigidas pelo Estado no sistema que está em vigor para a renda social, que, como sabe, se situa entre 10% e 25 %. Neste caso das correcções extraordinárias, essas taxas situar-se-ão entre 6% e 21 %.

Podia citar também ao Sr. Deputado o caso dos pensionistas, cujos agregados familiares são os mais carenciados e relativamente aos quais pensamos, dado o seu rendimento baixo, que o subsídio deverá ser igual à totalidade do aumento da renda.

Portanto, penso que não há nenhuma situação grave que decorra da entrada em vigor da lei das rendas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação.

O Sr. Secretário de Estado das Vias de Comunicação: — Sr. Deputado, julgo que entendi a sua pergunta. De facto, há um certo número de empreendimentos rodoviários que têm uma dotação relativamente pequena no ano de 1986, facto para o qual há várias razões: a primeira é que eles são empreendimentos que vão ser lançados possivelmente só no 3.° trimestre deste ano, inclusivamente por motivos de projecto; a segunda é a circunstância de a margem de manobra que tínhamos ser extremamente pequena, dados os compromissos assumidos no passado.

Julgo, Sr. Deputado, que dando-lhe alguns números dos anos anteriores amenizo as suas inquietações, porquanto, em 1985, para a realização de um plano da Junta Autónoma de Estradas a verba prevista em termos do PIDDAC foi de 12 milhões de contos, enquanto os compromissos para 1986 atingiram 16 milhões de contos, ou seja, 26% mais do que o valor do próprio plano de investimentos daquele ano. Em 1984 esta diferença foi de 18%; de 1986 para 1987 a mesma relação é apenas de 6 %, isto é, de 19 800 000 contos para 21 milhões de contos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação, tenho colocado aqui a questão da necessidade de medidas de reforma administrativa, questão à qual já me foi respondido pelo Sr. Ministro das Finanças, no Plenário, que considerava que a disciplina financeira era suficiente como causa motora da reforma administrativa que o Governo se propunha promover no âmbito da Administração Pública. Tenho algumas dúvidas sobre a bondade dessa

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solução, assente apenas na disciplina financeira, que tenho visto confirmadas, em relação a alguns departamentos do Estado, por opiniões que foram expressas por membros do Governo nestas reuniões da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Quero colocar uma questão ao Sr. Secretário de Estado, que corresponde a uma dúvida minha.

Verifico que, no PIDDAC do seu Ministério, a importância destinada à promoção directa conhece um aumento para 1986, cifrando-se a verba em 3 518 000 contos. Esta promoção directa corresponde, pois, ao sentido de que há uma procura ou uma oferta de habitação que terá de ser satisfeita por iniciativa pública, designadamente para as camadas insolventes da população. Esta promoção directa é feita com apoio em que serviços do seu Ministério? Ou é feita apenas com o apoio das câmaras municipais?

Se é feita com apoio em alguns serviços, não vejo, no quadro orgânico da sua Secretaria de Estado, qualquer serviço com este tipo de capacidade e de competências. O Sr. Secretário de Estado tem o seu Gabinete, a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais e, no campo da habitação, o Instituto Nacional da Habitação, vocacionado fundamentalmente para a concessão e para o apoio do tipo creditício. Além disso, tem, embora em extinção, o Fundo de Fomento, mas suponho que, não sendo com uma comissão liquidatária, não espera daí praticamente mais nada.

Pode esclarecer-me se vai fazer promoção directa através da administração central e com que meios?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, como o Sr. Deputado sabe, o Fundo de Fomento da Habitação foi extinto em 1982 e uma das suas responsabilidades era a de acabar os empreendimentos, as obras que estavam em curso.

Se reparar bem, dos 3 518 000 contos para a promoção directa, cerca de 2 milhões e meio destinam-se a acabar empreendimentos que estão em curso desde 1982. Trata-se de empreendimentos espalhados por todo o País, que estão toscamente feitos, apenas com as infra-estruturas feitas, representando, pois, dinheiro que está imobilizado há muito tempo sem sequer ser utilizado.

Por isso, procurou-se neste PIDDAC acabar com as obras que estavam em curso no âmbito do Fundo de Fomento da Habitação. Infelizmente, não consigo acabá-las na totalidade, mas penso que para 1987 vão passar muito poucas obras em curso do ex-Fundo de Fomento da Habitação.

Estes 1 080 000 contos que constam aqui para obras novas —e esta questão insere-se na resposta que dei ao Sr. Deputado Luís Roque— referem-se a uma participação e colaboração com as câmaras na promoção de habitação social no âmbito do Decreto-Lei n.° 366/85, que atribui, de certa forma, uma responsabilidade a metade quer à administração central, quer à administração local.

Dir-lhe-ia que aposto fortemente em que serão as câmaras municipais os órgãos mais competentes para o desenvolver. Neste momento, correria o risco de não lançar nenhuns empreendimentos no âmbito da habitação social para arrendamento se não fosse utilizar

uma estrutura que, neste caso, está posicionada no Fundo de Fomento da Habitação, mas que penso desenvolver através de um pequeno organismo que se destina a gerir o parque habitacional do Estado, ou seja, os 40 000 fogos.

Estamos aqui perante uma situação transitória e, portanto, temporária.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, as suas afirmações não me merecem crítica, mas gostaria de ver melhor esclarecida essa questão.

O Sr. Secretário de Estado não faz um planeamento nacional dessa oferta pública de habitação às classes insolventes?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Não, Sr. Deputado Nogueira de Brito, o que procuro fazer é um levantamento das necessidades ao nível do País. Terei de fazer uma análise da situação concelho a concelho, ou seja, um levantamento das necessidades, para saber com que realidade é que estou confrontado. Isto não foi feito, nem tão pouco para a caracterização da procura normal, nem especificamente para este tipo de habitação que é a habitação para agregados familiares de rendimentos muito baixos.

O que tenho de fazer neste momento é um levantamento da situação, que não está feito. Ou seja, tenho de saber, concelho a concelho, quais são efectivamente as necessidades que existem, para depois procurar enquadrá-las num determinado tipo de actuação desenvolvida pelas câmaras municipais.

Portanto, não tenho intenção de criar um plano nacional.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, apenas coloco a seguinte questão: em termos de reforma administrativa, o Sr. Secretário de Estado considera que a sua Secretaria de Estado não carece de outro tipo de estrutura orgânica que não esta para fazer face aos problemas da habitação? O Instituto...

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Sr. Deputado, o Instituto está vocacionado para determinado tipo de população e exerce as suas funções nessa matéria.

Ao nível de habitação social, defendemos que os órgãos vocacionados para a desenvolver são as autarquias locais. Há que ultrapassar certos contrangimen-tos que existem ao nível financeiro e são patentes, bastando olhar para eles, embora sejam os esquemas financeiros que já vêm do passado. Teremos de os ana-

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lisar porque, caso contrário, estaremos sempre perante a situação de buraco financeiro em todas as câmaras que recorram ao financiamento para arrendamento social.

Em termos de reforma administrativa e de organismos que funcionam dentro da minha Secretaria de Estado ou sob a sua tutela, a minha grande preocupação vai para a gestão e conservação dos 40 000 fogos que pertencem ao Estado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — E quem é que vai fazer esse tal levantamento de necessidades? Não é o seu Gabinete directamente, pois não?

O Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação: — Não, não é.

Se atentar ao decreto-lei que procede à instalação do Instituto Nacional de Habitação, verá que este Instituto tem funções de planeamento de habitação, podendo fazer inquérito ou levantamento, situação que, aliás, já está a ser desenvolvida e preparada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, gostaria de colocar uma questão sobre o processo de digitalização, nomeadamente na perspectiva de eventuais contrapartidas orçamentais.

É sabido que este processo ainda está em curso, tendo havido algumas medidas que o Governo tomou no que toca ao processo de uma forma global.

Creio que, neste processo de digitalização, se podem distinguir duas fases diferentes.

Uma primeira fase relaciona-se com o processo de transferência de tecnologia que foi decidido pelo governo anterior e que este governo ratificou, o qual, segundo penso, está neste momento em vias de execução, nomeadamente através do Instituto de Investimento Estrangeiro. Relativamente a esta fase do processo, coloca-se um pouco a questão de saber se foram já analisadas pelo Governo as eventuais contrapartidas para o Estado Português oriundas desse processo de transferência de tecnologia, nomeadamente os capítulos do impacte industrial, dos novos investimentos na área das telecomunicações e das tecnologias de informação e dos projectos nas áreas da investigação e desenvolvimento e da reconversão da força de trabalho, no aspecto social. Trata-se de saber, em relação a esta primeira fase do processo de transferência de tecnologia, se estão já definidas as contrapartidas para o Estado Português.

Relativamente a uma segunda fase, que penso estar em curso e que visa escolher um novo parceiro tecnológico nesta área, gostaria de saber que tipos de contrapartidas foram formulados pelo Governo no início desta segunda fase e se realmente este tipo de contrapartidas visa os mesmos objectivos que, de um ponto de vista genérico, estavam enunciados para a primeira fase.

Eram estas as duas questões que queria colocar, além da questão de saber se há realmente alguma implicação de natureza orçamental ou no capítulo dos investimentos resultantes de todo este processo.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Raul Junqueiro, quero dizer-lhe — depois, o Sr. Secretário de Estado completará mais em detalhe o meu esclarecimento — que, relativamente à escolha de um primeiro sistema, o que observámos, durante aquela fase de análise que fizemos dos relatórios que estavam elaborados e que vinham do tempo do governo anterior, foi que os acordos entre o licenciador estrangeiro e o licenciado nacional para a escolha do primeiro sistema e as contrapartidas que eram oferecidas pelo licenciador estrangeiro nos pareceram perfeitamente razoáveis. Teoricamente, enfim, podemos sempre admitir que ainda se pode obter mais qualquer coisa, mas a ideia que recolhemos foi a de que aquilo era razoável para a indústria nacional.

Daí termos prosseguido com a escolha do primeiro sistema, como acabou de dizer e como o País soube.

É evidente que essa decisão tem uma sequência administrativa — reporto-me sempre à escolha do primeiro sistema —, que tem lugar no Instituto de Investimento Estrangeiro, no qual estão a ser analisados em pormenor os acordos concretos que lá foram submetidos à apreciação, quer pelo licenciador, quer pelo licenciado. E aguardámos o resultado dessa análise do Instituto de Investimento Estrangeiro.

As indicações que tenho obtido vão no sentido de que se irá confirmar aquilo que na altura se admitiu como contrapartidas para o Estado Português.

Relativamente a eventuais reflexos disso no Orçamento, não estou a ver de momento que reflexos é que poderia ter no Orçamento do Estado, mas, mesmo que houvesse algum reflexo, não sei se neste momento, em que preparámos e submetemos ao Parlamento o Orçamento, estaríamos em condições de exprimir isso com alguma segurança.

Quanto à escolha do segundo sistema, é evidente que, escolhido o primeiro, temos um quadro de referência para contrapartidas. Se achámos boas as contrapartidas que nos foram oferecidas na escolha do primeiro sistema, isso serve-nos como referência de negociação para o segundo. Isto é, os CTT, aos quais, como sabe, o assunto compete agora, têm, no quadro global da primeira negociação, um esquema, para o qual podem olhar e dizer, relativamente ao segundo licenciador:

Vocês têm que nos dar, pelo menos, tanto quanto nos deu o primeiro.

Suponho que isso é mais do que suficiente para uma escolha acertada.

O Sr. Secretário de Estado poderá dizer mais alguma coisa, já que ele tem acompanhado o processo mais em pormenor do que eu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Raul Junqueiro, diria que, numa primeira fase, o processo foi mais centrado na transferência de tecnologia e nos eventuais compromissos que os licenciadores pudessem assumir perante o Estado Português — não se trata propriamente de con-

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trapartidas oferecidas ao Estado Português, que não as havia, mas sim de compromissos assumidos com o Estado Português, embora depois com reflexos, designadamente, na indústria e na área da investigação e desenvolvimento.

Nesta segunda fase de escolha do segundo parceiro e do segundo sistema, o processo está centrado na óptica do operador, mas tendo como referência um conjunto de vantagens, que já foram obtidas, pensando nós que vantagens similares serão também obtidas no decurso do processo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, agradeço-lhes os esclarecimentos prestados.

Em todo o caso, gostaria de perguntar em que medida é que a aplicação da digitalização à rede nacional de telecomunicações vai ou não ser atrasada em face da forma como o processo tem decorrido. Isto é, sendo urgente a introdução deste tipo de tecnologias, como é do consenso geral entre os técnicos e os responsáveis por esta área, para se atingir um conjunto de objectivos importantes, que também penso serem consensuais, pergunto qual é o estado exacto do processo de digitalização, quando é que se prevê que se pode dar início a este processo do ponto de vista da comutação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, o Sr. Secretário de Estado diz que tinha como referência um conjunto de vantagens, que o Governo ponderará.

Gostaria de saber se pode dizer qual é esse conjunto de vantagens que o Sr. Secretário de Estado referiu.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Raul Junqueiro, neste momento, a introdução da comutação digital é vital, quer para os operadores, quer para a indústria.

Como o Sr. Deputado sabe, os CTT e os TLP já tinham praticamente as coisas preparadas para avançar com o processo em 1983. Circunstâncias diversas não o permitiram, mas já existe neste momento toda uma estratégia definida e, desde o momento em que se concluam as negociações relativamente à escolha do primeiro e, depois, do segundo, pensamos que se vai avançar na introdução — não direi rápida, mas sistemática — do digital.

Essa introdução é importante para os operadores, porque lhes permite passar para uma tecnologia com efeitos extremamente importantes na sua exploração e nas facilidades que pode oferecer no mercado, sendo até, a nosso ver, mais importante pelos efeitos que tem na indústria. Como sabe, a transição do electromecánico para o digital tem um impacte muito grande, em especial a nível do emprego e da própria organização da produção.

Por outro lado, como também suponho que sabe, estão neste momento a abrir-se os mercados das telecomunicações na Europa, o que vai afectar muito a porção das reservas de mercado que existiam nos mercados nacionais para as diversas indústrias. A nossa indústria não poderá ser competitiva ou não poderá procurar segmentos de mercado em que possa vender sem dominar as tecnologias digitais. Daí a importância quer do arranque da introdução da comutação digital quer das suas ligações com licenciadores que lhe permitam ter acesso a essa tecnologia, não propriamente, segundo penso, por causa da comutação, mas mais por outros segmentos de mercado para equipamentos de terminais e outros equipamentos com que seja mais fácil a nossa indústria trabalhar, já que não pode trabalhar apenas com o mercado nacional.

Quanto à pergunta colocada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca sobre as vantagens que foram referenciadas, essas vantagens estão, neste momento, ainda em fase de concretização ao nível do Instituto de Investimento Estrangeiro. Houve um conjunto de vantagens nos domínios da aquisição de produtos fabricados pela indústria nacional, das acções de formação, da assistência técnica e da investigação e desenvolvimento, vantagens que, na fase das negociações, não estavam ainda suficientemente concretizadas.

Neste momento, estamos na fase em que se tem de celebrar o contrato, o qual obriga a especificar esse tipo de vantagens que se podem obter quer para os operadores, quer para a indústria nacional, quer ainda para a própria sociedade portuguesa, na medida em que, através delas, se fomentam actividades a desenvolver no País. É este tipo de vantagens que se está a concretizar no contrato que está a ser analisado e vai ser celebrado no quadro do Instituto.

Nesta fase, é pois prematuro dizer-lhe quais são concretamente essas vantagens, uma vez que elas ainda estão em concretização.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, já agora, atendendo a que estas coisas devem ser claras e para evitar certas especulações, solicitaria ao Governo e ao Sr. Ministro que, logo que fosse possível, logo que o tivessem devidamente explicitado, nos mandasse para a Comissão esse elenco de vantagens.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, quero da afirmação do Sr. Secretário de Estado de que em 1983 estava tudo preparado para arrancar, dado que a minha opinião não é essa, isso depende do que é que se entende por estar tudo preparado, já que, se dermos a este conceito o sentido de se estar pronto a avançar de qualquer maneira, poderíamos dizer que estava preparado desde 1980 ou 1981.

Em todo o caso, como isso não é relevante para a discussão que agora estamos a travar aqui, gostaria de saber, em termos concretos, se o Sr. Secretário de Estado prevê que a aplicação da tecnologia digital possa ter início neste ano de 1986 e, paralelamente, se confirma o início da aplicação do outro processo, que tem

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também a ver com a introdução da tecnologia digital e que passa pelo projecto nacional em desenvolvimento no Centro de Estudos de Telecomunicações de Aveiro, para 1986.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, quero fazer um ponto de ordem à Mesa, na medida em que, embora a matéria que se está a debater seja extraordinariamente interessante, as horas vão passando e aquilo que fundamentalmente nos traz aqui é a discussão do Orçamento na parte das despesas.

Efectivamente, estamos a discutir a política geral das telecomunicações em Portugal, mas, embora essa matéria seja extraordinariamente interessante, o que nos interessa são as ligações com o Orçamento propriamente dito, que são relativamente reduzidas. O tempo vai passando e ainda não temos nenhuma ideia sobre isto.

O Sr. Presidente: — Dou-lhe uma certa razão, Sr. Deputado.

Por isso, proporia o seguinte: gastaríamos mais dez minutos nesta matéria e, depois, passaríamos ao Orçamento propriamente dito.

Há alguma objecção?

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr.a Deputada.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, não se pode dizer que esta matéria não tem nada a ver com o debate que estamos a travar.

Desde o início que pedimos aqui, inclusivamente, que nos fosse referido quais os investimentos que efectivamente as empresas públicas de transportes e comunicações vão fazer, dado que apenas temos a tal estimativa provisória. Volto a este assunto porque, até agora, ainda não houve resposta a essa questão.

Neste caso, está a analisar-se aqui um problema concreto de um empresa relativamente ao investimento previsto para 1986. Naturalmente, temos todo o direito de tentar esclarecer esta questão, já que, a partir daí, poderemos calcular então se as dotações de capital previstas são ou não suficientes, o que só saberemos quando soubermos qual é o investimento que afinal o Governo vai autorizar que seja realizado. O problema que aqui se está a colocar tem a ver com isto.

Aproveitaria para perguntar, concretamente em relação às empresas de comunicações, que investimento se prevê realizar em 1986 — refiro-me aos CTT e aos TLP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, faria minhas as palavras da Sr." Deputada Ilda Figueiredo e penso que nos deveríamos ater a isso.

Estou a ouvir falar em contrapartidas, mas penso que as contrapartidas para a indústria nacional não terão propriamente efeito no Orçamento do Estado, até porque as empresas que vão ser afectadas por essas contrapartidas serão provavelmente do sector privado.

Efectivamente, ou há da parte do Governo possibilidade de dizer desde já quais são os investimentos ou, então, continuaremos a debater a política de telecomunicações.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejaria comentar estes pedidos de esclarecimento, da seguinte forma: de facto, como sabem, é hábito, no final do ano anterior, as empresas públicas enviarem ao Governo os instrumentos previsonais de gestão, que normalmente são a sua conta de exploração, o seu balanço projectado, o seu plano de investimento, o seu plano de financiamento, etc. Umas mandam mais cedo, outras mais tarde.

Este ano, como já tive oportunidade de esclarecer a propósito dos contratos-programa, houve que refundir largamente todo esse conjunto de instrumentos previsionais de gestão. E disse, no decurso desta reunião, que os próprios Srs. Secretários de Estado que têm directamente a tutela nessas empresas têm estado a proceder a reuniões, empresa por empresa, para refundir esses planos.

Efectivamente, estamos, numa primeira fase, a analisar as consequências que a modificação dos tais factores de custo introduz nos resultados, para, numa segunda fase, analisarmos propriamente os planos de investimento. Neste momento, estamos também já nessa segunda fase e há uma estimativa que foi fornecida pelo Ministério das Finanças, relativamente aos investimentos nas empresas públicas, desde a QUIMIGAL e passando por todas as empresas do sector público em Portugal, embora eu creia que ela deve ser tomada como estimativa provisória.

Eu próprio fui presidente de uma empresa pública e sei que o PISEE era publicado no Diário da República, em Setembro ou Outubro, que era a altura normal da sua publicação. Estou convencido de que este ano não vamos chegar a essa altura — logo que o Orçamento seja aprovado, as coisas avançarão mais rapidamente—, mas a situação do ponto de vista da apreciação e do estado da elaboração dos documentos é esta.

Neste momento há, efectivamente planos, que ainda se devem considerar provisórios, apresentados pelas empresas, dos quais constam, designadamente, as margens de autofinanciamento que esperam ter e os recursos a crédito, embora tudo isso tenha de ser agora acertado.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado deseja ainda acrescentar alguma pergunta?

O Sr. Raúl Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, quero apenas não protestar, mas, de alguma forma, dizer que as perguntas que fiz têm pleno cabimento com a discussão que estamos aqui a fazer, quer do ponto de vista das empresas, quer do ponto de vista dos investimentos, como foi aqui claramente referido. Estes projectos são projectos extremamente importantes e fundamentais para o País e compete-nos a todos discuti-los.

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2 DE ABRIL DE 1986

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Tenho notado que alguns Srs. Deputados têm uma certa aversão a discutir problemas que se ligam com telecomunicações e novas tecnologias de informação e pensam que este tipo de questões não é importante.

É bom que nos convençamos que estas questões são fundamentais. E creio ser devidamente acompanhado quer pelo Sr. Ministro, quer pelo Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações, quer ainda pelo Sr. Secretário de Estado da Construção e Habitação, que, apesar de ser da habitação, é um homem ligado também aos problemas das telecomunicações, na opinião de que estas questões são fundamentais, podendo vir a constituir instrumentos muito importantes para o desenvolvimento e a modernização do País e tendo, de facto, muito a ver com as Grandes Opções do Plano e com a discussão na especialidade do Orçamento do Estado que estamos aqui a fazer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Apenas quero chamar a atenção do Sr. Deputado Raul Junqueiro para o seguinte: nas Grandes Opções do Plano há, de facto, uma prioridade também para o sector das telecomunicações.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Raul Junqueiro, relativamente à introdução da comutação digital em 1986, ela vai certamente ocorrer, desde o momento em que se concluam, nesta fase, as negociações com o primeiro fornecedor.

Essa introdução é possível, mas na base de equipamento importado. Do equipamento de fabrico nacional nunca será possível dispor, pensamos, antes do segundo semestre de 1987, princípio de 1988, tudo dependendo da data em que terminar o contrato.

Quanto ao problema do projecto nacional, em meados deste ano vai iniciar-se a instalação de uma das centrais — aliás, já devia ter-se iniciado —, mas o outro fornecedor está mais atrasado e, portanto, ao nível do trânsito, teremos duas excepções com as primeiras experiências de comutação digital de protótipos que vão ser testados na nossa rede.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Arriscando-me à censura do Sr. Deputado Próspero Luís, vou colocar uma questão aos Srs. Membros do Governo. Eu quero uma confirmação referente ao problema da repercussão do IVA nos preços dos transportes. Suponho que o que se passa, isto é, a informação que nos foi transmitida hoje vai no sentido de que o imposto não foi tido em consideração no aumento de preços de Dezembro passado; as indemnizações compensatórias também não têm, necessariamente, em atenção o montante do imposto cobrado por dentro —como costuma dizer--se — e, portanto, a orientação do Governo é a de que, a haver repercussão situada entre 1 % a 2%, terá de ser conseguida compensação para ela através de ganhos de produtividade das própria empresas. É esta a confirmação que eu quero ter, Srs. Membros do Governo.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado, isso dá-se para esse agravamento de preços e para outros, porque —o Sr. Deputado Nogueira de Brito não estava cá —, como procurei explicar à Comissão, toda a estrutura de custos das empresas públicas e privadas é fortemente alterada a partir de Janeiro deste ano. Isso é um facto. As taxas de inflação, as taxas de juro, a taxa de câmbio no que se refere às empresas que trabalham com o exterior, as próprias contribuições para a Segurança Social, todos esses factores são alteráveis. E são-no de uma maneira tal que não podemos isolar nenhum factor. O IVA também entra nesse número de factores e nas repercussões globais de todos eles admite-se —e há para isso bons indícios — que a estrutura de custo, isto é, que os custos unitários de produção vão ser desagravados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes e Comunicações: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, gostava de fazer um aditamento a um aspecto que V. Ex.a focou.

É o seguinte: de facto, nós não temos indemnizações compensatórias. O que temos são subvenções de equilíbrio à exploração das empresas, porque não estão definidas —e isto tem de ser feito no quadro dos contratos-programa — quais são as obrigações de serviço público nem quantificados os respectivos encargos, por forma a dizer que temos indemnizações compensatórias. O que nós achamos é um subsídio por diferença.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Ministro, V. Ex.a falou em obter compensação para esse possível e eventual agravamento na estrutura de custos através de um global desagravamento de custos.

Eu pretendo saber se V. Ex.a também entrou em conta com a necessidade de obter ganhos de produtividade, mesmo nessas empresas.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Obviamente, Sr. Deputado. Peço-lhe desculpa por me ir repetir, mas V. Ex.a não estava presente na altura em que abordei esse tema. Quando abordei o tema dos contratos-programa e expliquei «em que pé» estão os contratos-programa que estavam celebrados com oito empresas tuteladas pelo Ministério a que presido — respondendo a questões que me foram colocadas —, citei que a revisão desses contratos--programa se justifica por uma mudança muito importante que se dá nos condicionamentos externos de ordem macroeconómica e também expliquei que me parecia que os objectivos de crescimento de produtividade no sector público, constantes desses contratos--programa, eram insuficientes. Isto é, apesar de o sector público não ter, em muitos casos, aquela falta de produtividade que à primeira vista as pessoas que não gostam do sector público lhe atiram à cara — isto porque há, efectivamente, empresas do sector público que têm níveis de produtividade razoáveis —, eu entendo

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que o sector público deve ter uma pressão sobre ele que conduza ao aumento de produtividade. Seja a do mercado, quando é um sector concorrencial, seja a de outros mecanismos de controle, quando se vive em situações de monopólio.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Eu suponho que essa repetição é benéfica, Sr. Ministro. Portanto, congratulo-me por tê-la povocado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, também vou correr o risco de me repetir, mas como o Sr. Deputado Nogueira de Brito não estava cá há pouco, gostaria de dizer o seguinte...

Voz inaudível na gravação.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Eu não quero responder a essa questão!

A repetição é, pois, a seguinte: é que é importante que o Sr. Ministro faça chegar a esta Comissão os cálculos realizados em Setembro/Outubro e a revisão desses cálculos, para que possamos fazer as comparações e concluir se, de facto, há desagravamento ou há agravamento de custos e se a introdução do IVA, que provoca o tal agravamento de 1% ou 2%, é ou não coberta pelas indemnizações compensatórias.

Nós ficamos a aguardar os cálculos, Sr. Ministro. Eu ouvi que o Sr. Ministro considera que o agravamento não deve ser coberto, mas, pela minha parte, considero que isto não deve significar um custo adicional para a empresa.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações: — Sr.a Deputada Ilda Figueiredo, eu trabalho no sentido de que esse pequeno agravamento seja coberto por outros desagravamentos e também pelo aumento de produtividade, mas não necessariamente pelas indemnizações compensatórias, pois essas têm outro objectivo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — São esses cálculos que nós queremos, Sr. Ministro, sem que isso signifique que pretendemos um aumento de preço dos transportes — evidentemente que não quero que haja.

Portanto, esses cálculos são os que nós necessitamos para podermos concluir o que é que efectivamente se passa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, quero colocar uma questão que já não tem a ver com o Governo.

Nós estamos aqui há oito dias e todo este trabalho tem sido gravado. Acontece que até agora não foi distribuído nenhum borrão das actas das reuniões. Eu creio que este é um trabalho idêntico ao que se processa em Plenário e seria de toda a utilidade nós termos algumas das actas das reuniões, pelo que solicito ao Sr. Presidente que, junto dos serviços, diligencie no sentido de ver qual é o panorama das actas das reuniões.

O Sr. Presidente: ^— Srs. Deputados, estão encerrados os nossos trabalhos.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:

A Comissão: Presidente, Rui Manuel Chancerelle de Macheie (PSD) — Vice-Presidente, Ivo Jorge de Almeida dos S. Pinho (PRD) — Secretário, Octávio Augusto Teixeira (PCP) — Secretário, António Vasco de Mello (CDS) — Belarmino Henriques Correia (PSD) — João Maria Ferreira Teixeira (PSD) — Alípio Pereira Dias (PSD) — Fernando Próspero Luís (PSD) — Carlos Alberto Pinto (PSD) — Cecília Pita Catarino (PSD) — Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD) — Carlos Manuel Luís (PS) — Helena de Melo Torres Marques (PS) — João Cardona Gomes Cravinho (PS) — José da Silva Lopes (PRD) — Victor Manuel Ávila da Silva (PRD) — Carlos Alberto do Vale Carvalhas (PCP) — Maria Ilda da Costa Figueiredo (?CP) — José Luís Nogueira de Brito (CDS) — João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP).

PREÇO DESTE NÚMERO 161$00

Depósito legal n.° 8819/85

Imprensa Nacional - Casa da Moeda, E. P.

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