28 DE NOVEMBRO DE 1987
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Os Parlamentos da CEE tomaram a consciência de que, nessas condições, o seu poder legislativo estava a ser seriamente afectado pelas decisões tomadas sem a sua interferência ao nível do Conselho de Ministros das Comunidades. Para obviar a tal situação, os Parlamentos da maior parte dos países membros da CEE estabeleceram esquemas que lhes permitem pronunciar-se sobre os seus pareceres aos respectivos governos antes de estes discutirem essa legislação nos Conselhos de Ministros da CEE.
É necessário que a Assembleia da República decida se pretende, ou não, exercer, em matéria de legislação comunitária, uma actividade semelhante à de outros Parlamentos da CEE. A Comissão de Integração Europeia entende que isso deverá ser feito.
Das conclusões extraídas, quer nos debates realizados no seio da própria Comissão Parlamentar, quer desta Comissão com membros do Governo, e das reflexões motivadas pelas reuniões efectuadas com as personalidades atrás citadas, e ainda pela insuficiência de informação canalizada pela Assembleia da República, optou-se, posteriormente, pela apresentação de um projecto de lei devidamente estudado, que, após aprovação em Plenário, deu origem à Lei n.° 28/87 (participação da Assembleia da República na definição das políticas comunitárias).
É esta lei que agora vem ser posta em causa pelo Grupo Parlamentar do PSD, que a pretende revogar.
No preâmbulo do projecto n.9 24/V, do PSD, não se procede à apreciação do articulado da Lei n.9 28/87, tendo os seus autores argumentado com a necessidade de «consolidar a estrutura política constitucional através de uma efectiva separação e interdependência de poderes», sem que se declare explicitamente que a Lei n.° 28/87 é anticonstitucional.
Consideram os autores do projecto n.° 24/V que as matérias susceptíveis de decisão comunitária estão compreendidas, na sua quase totalidade, na competência legislativa e administrativa do Governo e, quando assim não acontece e forem da competência relativa da Assembleia da República, o Governo terá de solicitar a esta a respectiva autorização legislativa.
Chegados a este ponto, convém, então, salientar os diversos aspectos da Lei n.9 28/87, de forma a apreciarmos sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do diploma.
Assim, verifica-se que no seu artigo l.s, e de acordo com as normas constitucionais e de fiscalização dos actos do Govemo, a lei prevê que o Governo prestará informações, e tão-só, sobre o relacionamento com as Comunidades Europeias.
Aí se diz que o Govemo facultará à Assembleia da República informação detalhada sobre as matérias em apreciação nas várias instituições das Comunidades Europeias, por forma que seja perfeitamente perceptível a elaboração das políticas comunitárias nos diversos domínios, bem como a posição das entidades que têm a seu cargo a definição da posição portuguesa face a cada uma delas.
Depois prevê-se o tipo de informações sectoriais, e só informações, que o Governo deve enviar à Assembleia da República.
No seu artigo 2.9, na Lei n.9 28/87 consta que o Govemo deverá consultar a Assembleia da República sempre que esteja em causa matéria que, pelas suas implicações, envolva competência da Assembleia da República. Esta, no exercício das suas competências, pronunciar-se-á, por iniciativa própria, sobre os projectos de legislação e orientação das políticas comunitárias.
No seu artigo 3.°, sobre verbas dos fundos estruturais, salienta-se que a intervenção da Assembleia da República, no tocante ao planeamento e ao financiamento decorrente da adesão, se exerce nos termos da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado e dos planos ou programas nacionais em que se preveja a utilização daqueles fundos.
A lei em apreço considera, no seu artigo 4.9, uma Comissão Parlamentar para os Assuntos das Comunidades Europeias, que a Assembleia da República, por unanimidade, em sede de alteração do Regimento e sem, no nosso entendimento, violar o disposto naquele artigo, denominou não de Comissão para os Assuntos das Comunidades Europeias, mas de Comissão dos Assuntos Europeus.
Cria-se ainda, a exemplo do que sucede noutros Parlamentos europeus, uma Comissão Mista Assembleia da República-Parlamento Europeu, constituída, em partes iguais, por deputados da Assembleia da República e pelos deputados eleitos por Portugal para o Parlamento Europeu.
Finalmente, o Govemo, segundo a lei que se quer revogar, deverá apresentar anualmente um relatório sobre a evolução do relacionamento entre o nosso país e as Comunidades Europeias.
Verifica-se, assim, que, face ao disposto nos seis artigos da Lei n.B 28/87, o Governo não fica impedido de exercer as suas competências legislativas.
A lei prevê, isso sim, que, de acordo com a Constituição e com o próprio Regimento da Assembleia da República, que se revê no texto constitucional, o Governo preste à Assembleia da República informações e esclarecimentos, nomeadamente sobre a evolução das políticas comunitárias.
A Comissão de Assuntos Europeus não visa senão assegurar o objectivo constitucional consagrado no artigo 183.°, n.9 2, alínea 0. naturalmente segundo a forma neste caso exigida perante a importância nacional de que se revestem todas as decisões respeitantes à nossa integração na Comunidade.
Está, assim, assegurada a separação dos poderes do Governo e da Assembleia da República, na medida em que esta não se substitui à actuação do Executivo, respeitando a sua autonomia dentro dos limites constitucionais.
Ao pretender revogar a Lei n.8 28/87, o Grupo Parlamentar do PSD viria a impedir a Assembleia da República — a exemplo do que acontece noutros Parlamentos europeus —de ser informada, detalhada e atempadamente, sobre assuntos de relevância que dizem directamente respeito a Portugal, como a Assembleia da República carece para o exercício das suas competências.
Pode argumentar-se que existem mecanismos para informação e consulta mútua entre o Govemo e a Assembleia da República.
Acontece, porém, que a Assembleia da República sempre lutou com grandes dificuldades em ver suplantadas as insuficiências de informação sobre esta matéria, como, aliás, consta quer de relatórios da Comissão de Integração Europeia, quer de debates desenrolados no próprio Plenário. E foi perante essa lacuna informativa que se decidiu elaborar a Lei n.9 28/87.
Por outro lado, ao pretender revogar-se aquele diploma, também viria a impedir-se a Assembleia da República de ser consultada pelo Govemo, de forma obrigatória, sempre que esteja em causa matéria que envolva competência da Assembleia.
Outro dos perigos que importa considerar, e para o qual também se chama particularmente a atenção, diz respeito ao facto de, ao ser revogada a Lei n.B 28/87, isso implicar o esvaziamento das funções da Comissão dos Assuntos Europeus.