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23 DE MAIO DE 1990

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4 — A listagem — que não será exaustiva, mas que conquista relevo em confronto com o texto inicial — dos direitos dos consumidores, feita no artigo 3.°, será, de igual modo, de apoiar, em termos gerais, como também o será a nova textualização dos artigos 5.° e 6.°

Configura-se, aliás, hoje, no plano comunitário, um «direito à saúde», na vertente de uma política comum de protecção dos consumidores (Jean-Claude Gautron, Droit européen, 4.a ed., 1989, pp. 153-154).

Serão, no fundo, os direitos dos consumidores a uma reforçada «segurança».

5 — Com a nova redacção do artigo 8.° fica, sem dúvida, valorizado o preceito. Amplifica-se o âmbito das acções de formação, até agora — assinale-se em breve parêntese — lamentavelmente secundarizadas pelo mais influente meio de comunicação social: a RTP. Outras preocupações a movimentarão.

6.1 — O tema a que se reporta o artigo 10.° (direito à reparação dos danos e a uma justiça acessível e pronta) interliga-se não apenas com o artigo 60.° da Constituição, como também com o n.° 3 do artigo 52.° (acção popular).

Não será agora caso de problematizar se a tipologia da acção popular deverá ficar conceitualmente dissociada da proposta pela tutela jurisdicional dos interesses e direitos difusos, fragmentados ou colectivos.

Em termos de realidade, é de supor que aquele n.° 3 do artigo 52.° estabeleceu uma orientação (perceptiva) geral, que poderá encontrar específica expressão no tocante a cada uma das áreas a que possa respeitar.

Aliás, face à letra desse n.° 3 do artigo 52.°, a tutela dos interesses difusos ficaria confinada, em matéria do direito do consumo, «à perseguição judicial das infracções contra a saúde pública», o que seria inadequadamente limitativo e contraditório com a intencionalidade do legislador constitucional. Efectivamente, da 2.a revisão dimanou um acréscimo da cidadania constitucional do consumidor, como se capta da já referida inserção do artigo 60.°

É, assim, de pensar que a regulamentação a editar quanto à acção popular não prejudicará a inserção, na Lei de Defesa do Consumidor, de um regime que a esta diga respeito.

6.2 — É de pôr a interrogativa sobre se a intervenção do Ministério Público deverá ser principal ou acessória. Embora esteja em causa, em sentido amplo, a «legalidade democrática» e o n.° 1 do artigo 221.° da Constituição preveja que ao Ministério Público compete ainda defender «os interesses que a lei determinar», tem-se que, prevalentemente, caberá aos consumidores, em primeira linha, a tutela dos seus próprios direitos e interesses. São as class actions do direito norte-americano, que aí se diferenciam das citizen suites; estas, sim, verdadeiras acções populares, como acontece, por exemplo, na Alemanha Federal (Popu-larklagen). Em qualquer delas não se prevê, aliás, a intervenção do órgão do Estado que em Portugal corresponderá ao Ministério Público.

A intervenção, a título principal, do Ministério Público sempre poderia implicar uma perda de espontaneidade que se deseja promane da sociedade, na defesa, embora tendencialmente «desinteressada», de interesses civis ou, numa acepção mais precisa, de interesses cívicos (civic justice).

Por natural destinação, o Ministério Público, que é um poder do Estado autónomo e objectivo (Boletim

do Ministério da Justiça, n.° 348, máxime p. 12), não deverá ser compelido a actuar como parte numa acção cuja iniciativa e movimentação deverá decorrer de cidadãos qua tale.

Isto, claro está, no plano civil, que será o campo de eleição deste tipo de acções, criando, precisamente por isso, toda uma nova formulação da problemática da legitimidade processual, centrada na titularidade dos sujeitos da pretensão (cf., por exemplo, C. Festa, «La legittimazione adagire per la tutela degli interessi di-fusi», na Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Ci-vile, 1984, p. 944).

Daí, muito exactamente, o que se prevê no n.° 2 do artigo 13.° e no n.° 3 do artigo 14.° do projecto de lei.

7 — Em relação à hipótese de criação de um Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, tem-se ela como pertinente como expressão da sociedade civil, embora cuidando de estabelecer linhas de fronteira bem apuradas entre a sua natureza e atribuições e as do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

8 — Dir-se-á, em síntese, que há que fomentar todo o arsenal de meios para a defesa do consumidor, nas suas essenciais frentes:

a) Os direitos à protecção contra riscos económicos dimanados de práticas comerciais desleais, desequilíbrios contratuais, distorções económicas, etc;

b) Os direitos à protecção contra os produtos defeituosos ou perigosos («direito à segurança»).

Muito naturalmente, o esbatimento das barreiras transnacionais resultantes da integração comunitária intensificam a necessidade de uma tutela eficaz.

Por isso mesmo existe uma política comunitária comum, reafirmada no n.° 3 do artigo 10O.°-A do Acto Único Europeu.

E embora se tenha como um dado certo que o artigo 173.° do Tratado de Roma deverá ser alterado no sentido de que os consumidores e as associações de consumidores possam propor acções perante o Tribunal de Justiça sem o ónus de alegar e provar um interesse directo e individual —o que traduzirá o acolhimento na ordem jurídica comunitária da tutela dos interesses difusos ou colectivos—, não resta dúvida de que as legislações nacionais dos Estados membros deverão, elas próprias, acolher essa prioritária necessidade.

9 — Tudo estará em que a lei se propague aos seus naturais destinatários, ganhando calor de vida e efectiva realidade.

Não é de esquecer que, em decorrência do artigo 7.° da Lei n.° 29/81, se publicou o Decreto-Lei n.° 446/85, de 25 de Outubro, respeitante às «cláusulas contratruais gerais», destinado, prevalentemente, a enfrentar o de-siquilíbrio dos protagonistas da contratação.

Mas o certo é que, embora prevendo-se a isenção de custas para as acções inibitórias das condições tipo abusivas, poucas, na realidade, terão sido até agora propostas. E isso dever-se-á ao desconhecimento pelos destinatários da lei das medidas nela previstas.

10 — Já o mesmo parece não estar a acontecer com a arbitragem institucionalizada («centros de arbitragem») figurada no Decreto-Lei n.° 425/86, de 27 de Dezembro, em decorrência da Lei n.° 31/86, de 29 de Agosto.

Um, pelo menos, foi criado no domínio das relações de consumo, por iniciativa de uma associação que ac-tuantemente tem funcionado na defesa dos direitos dos consumidores.