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1886 | II Série A - Número 059 | 15 de Julho de 2000

 

cena política e, sistematicamente, as afasta dos lugares de decisão.
Acresce, por outro lado, que a sociedade contemporânea desenvolveu inter-dependências aos vários níveis (do económico ao cultural, do tecnológico ao geo-estratégico ...) que tornam cada indivíduo, particularmente, vulnerável ao colectivo e, por conseguinte, hoje, está muitíssimo reforçado o alcance das macro-decisões na vida quotidiana de cada pessoa. É ao nível da macro-decisão que, em boa parte, se determinam aspectos fundamentais da vida pessoal: maior ou menor oportunidade de emprego, acesso e qualidade da educação e da saúde; tempo livre e lazer, nível de segurança, situações de guerra e de paz, salvaguarda do equilíbrio ecológico no presente e para as gerações futuras.
Estas questões não podem deixar de interessar vivamente as mulheres, por causa delas próprias, mas também pelos seus filhos.
Tomar parte efectiva nestas decisões constitui, assim, uma legítima aspiração que é, simultaneamente, um direito e um dever. A democracia paritária reveste, por isso, o carácter de um direito humano fundamental.
Por outro prisma, importa reconhecer também que o afastamento das mulheres das estruturas democráticas constitui uma grave doença da própria democracia e talvez explique, em boa parte, o definhamento que ronda algumas estruturas políticas, em muitos estados de democracia representativa" (fim de citação).
Em síntese, a democracia paritária concorrerá para dar maior visibilidade aos representados(as); permitirá introduzir novas problemáticas no debate político; tornará as agendas políticas mais próximas dos interesses dos quotidianos dos cidadãos e das cidadãs; integrará novas lógicas na abordagem e resolução dos problemas, complementando e enriquecendo a lógica masculina prevalecente até agora.
Na presente proposta de lei, que se fundamenta nos pressupostos acima enunciados, foi instituído um sistema simples e decisivo. Apenas uma obrigação: todas as listas devem obedecer ao princípio da paridade, respeitando aquele limiar quantitativo, a partir do qual a paridade começa a ser possível. Uma sanção: caso não seja cumprida esta obrigação, as listas são rejeitadas.
Respeitados estes parâmetros, em breve teremos uma nova visão da representação política. Nos próximos actos eleitorais para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autarquias locais haverá uma entrada significativa de mulheres e uma melhoria quantitativa e qualitativa do panorama da representação política.
"Um novo olhar sobre a humanidade", como diz a Dr.ª Regina Tavares da Silva, in Democracia Paritária: Um conceito novo ou um novo olhar sobre a Democracia - Dito- & Escritos, n.º 6, hoje reconhecido como necessário, conduzirá a um novo olhar sobre a democracia, a qual, para ser verdadeira, deve ser, não apenas representativa e pluralista, mas também paritária. É naturalmente verdade que a democracia não deveria precisar de ser adjectivada. A democracia é ou não é, existe ou não existe. Mas enquanto não existe de maneira perfeita e tentamos construí-la, a adjectivação sublinha os aspectos que ela deve ainda revestir para ser genuína.
No que diz respeito à participação das mulheres, poderíamos afirmar que, sendo a igualdade real sempre o princípio de base e o objectivo final, há, porém, que definir e adoptar uma nova estratégia - a estratégia da democracia paritária - que reconhece valor e dignidade iguais aos dois sexos e exige uma reavaliação/redefinição dos papéis das mulheres e dos homens na sociedade" (fim de citação).
O objectivo último é a igualdade, em si mesma, durante muito tempo desvalorizada, mas hoje considerada como direito fundamental. A paridade é, realmente, um instrumento, entre outros, para alcançar esta igualdade.

II
Direito comparado

No prefácio do Relatório do Comité de Sábios, constituído em 1995 pela Comissão Europeia para analisar as consequências susceptíveis de serem tiradas da Carta Comunitária dos Direitos Sociais dos Trabalhadores, no âmbito da revisão dos Tratados da União Europeia, intitulado Para uma Europa dos Direitos Cívicos e Sociais, foi afirmado pela sua Presidente que direitos cívicos e direitos sociais são interdependentes e que ao colocarmos a questão dos direitos sociais abrangemos todo o conjunto de direitos que se exprimem na cidadania. Aprofundar essa cidadania no quadro da União não poderá constituir, para cada país, senão uma ocasião para ir mais longe na sua própria cidadania. Afirma ainda o Comité: "A Europa não se construirá com base em desemprego e exclusão, nem assente num défice de cidadania. A Europa será de todos os cidadãos, ou então não terá consistência", pelo que será necessário desenvolver uma concepção activa de cidadania, onde todos aceitem assumir obrigações relativamente aos outros e renovar profundamente as nossas políticas públicas, que devem prevenir em vez de curar ...".
A cidadania plena, em todas as suas implicações, está, aliás, no cerne das preocupações das grandes organizações internacionais e regionais, bem como nos programas de acção que resultam das grandes conferências e cimeiras da década de 90 promovidas pelas Nações Unidas. Também no que se refere à situação das mulheres e à igualdade de direitos e oportunidades, tal perspectiva está presente. Seja em relação ao ambiente ou ao desenvolvimento, ou às questões de população ou de direitos humanos, ou de habitat ou qualquer outra, não é mais possível pensar nas soluções para os problemas do nosso tempo, sem incluir nelas uma perspectiva de género e uma consideração atenta da situação das mulheres e da medida da sua contribuição para o desenvolvimento e para a gestão das sociedades, incluindo o seu efectivo acesso e partilha do poder e da decisão a todos os níveis.
A Plataforma de Acção, aprovada na 4ª Conferência Mundial das Nações Unidas sobre as Mulheres, realizada em Pequim, em 1995, considera, de entre os seus objectivos estratégicos, adoptar medidas que garantam às mulheres a igualdade de acesso e a plena participação nas estruturas de poder e de tomada de decisão, para o que prevê, como medidas a implementar pelos governos, nomeadamente, o acompanhamento e avaliação dos progressos alcançados na representação das mulheres através da recolha, análise e difusão regulares de dados quantitativos e qualitativos sobre mulheres e homens a todos os níveis das várias posições da tomada de decisão nos sectores público e privado, e difundir anualmente dados sobre o número de mulheres e de homens em funções a vários níveis dos governos ...
Por outro lado, a Plataforma de Pequim, que o Estado português também subscreveu, considera que "a realização do objectivo da igualdade de participação das mulheres e dos homens na tomada de decisão dará origem a um equilíbrio que reflecte mais correctamente a composição da sociedade e que é necessário para reforçar a democracia e promover o seu correcto funcionamento".
A Plataforma de Acção, adoptada no seu âmbito, aponta, assim, para a necessidade de os governos equacionarem os