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1890 | II Série A - Número 059 | 15 de Julho de 2000

 

As democracias europeias que já fizeram face a este problema fixando como meta uma representação significativa das mulheres nos postos de decisão política, constataram mudanças visíveis no que se refere à actividade dos governos e administrações, à relação entre governantes e governados, à capacidade de fazer responder a política à vida real e ao quotidiano das/dos cidadãos. Os recursos e as competências das mulheres revelaram-se preciosos para superar a crise política e para o aprofundamento da democracia. Trata-se, assim, de permitir que tais recursos e competências possam emergir e de os tornar operacionais. É nessa medida que se torna relevante a existência de novas regras e mecanismos que enquadrem a selecção da classe dirigente.
Consciente desta situação o Programa do XIV Governo Constitucional estabelece que a presente "Legislatura marcará um impulso decisivo na promoção da igualdade de oportunidades entre os homens e as mulheres, o que implica a reformulação de concepções arreigadas quanto à organização da vida familiar e da própria vida político-partidária, à repartição de tarefas entre os homens e as mulheres, à organização do mundo laboral e das instituições de ensino em função deste novo paradigma de paridade".
Em resumo, a plena e igual participação, quer dos homens quer das mulheres na vida política é hoje, em Portugal, um requisito fundamental da democracia.
E porque a organização social não soube ainda encontrar, sem norma expressa, outras formas de encorajar uma maior partilha entre as mulheres e os homens no processo de decisão política, a presente proposta de lei é necessária.
Ela é um instrumento de correcção da clara desigualdade de oportunidades de participação na vida política que, na prática e com prejuízo para a sociedade e para o aproveitamento integral das pessoas, se tem verificado entre homens e mulheres.
A proposta de lei é, sobretudo, um passo importante para o equilíbrio da participação das mulheres e dos homens no processo de decisão na vida política, sendo também determinante para a incorporação da igualdade de oportunidades no quotidiano.
O caminho para a igualdade entre homens e mulheres exige grandes e concertados esforços, de muita gente, por muito tempo, ao mesmo tempo, em vários níveis e espaços de influência, importando ter presente a relevância legitimadora de um acto forte de vontade política como será o de promover a paridade no acesso à Assembleia da República, ao Parlamento Europeu e às autarquias locais.
A partilha visível do poder entre as mulheres e os homens com uma dimensão expressiva tanto de umas como de outros, torna evidente que não há mais um só modelo para o poder. Nem para o modo de organizar o trabalho. Na vida pública e na vida privada.
Quanto mais depressa esta proposta passar a lei, mais e mais rápidos progressos se verificarão nas garantias da autonomia individual e na partilha de direitos e de responsabilidades entre mulheres e homens, com iguais direitos na esfera pública, com iguais direitos na esfera privada.
Quanto mais depressa esta proposta passar a lei, melhor será a qualidade da vida das portuguesas e dos portugueses.

IV
Direito

Com a lei eleitoral para a Assembleia Constituinte e com a Constituição de 1976 as mulheres alcançaram total igualdade de capacidade activa e passiva em todas as eleições. Com a Lei Constitucional n.º. 1/97 foi-se mais longe e é o próprio exercício de funções políticas representativas que se tem em vista.
Até 1997, seria, porventura, inconstitucional uma lei que prescrevesse acções positivas para efeito de acesso de mulheres aos órgãos do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais. Após 1997 verificar-se-á inconstitucionalidade por omissão se tais medidas legislativas não forem aprovadas, com as devidas consequências jurídicas e políticas.
Naturalmente, em sede de direitos fundamentais, a Constituição continua a não fazer acepção de sexos. São todos os cidadãos, homens e mulheres, que têm o direito e o dever de tomar parte na vida política, de receber informação acerca da gestão dos assuntos públicos, de votar, de aceder a cargos políticos, de petição e acção popular (artigo 48.º. e seguintes). E são também eles que gozam do direito de pré-iniciativa de referendo nacional e regional (artigo 115.º, n.º. 2), de propor candidaturas a Presidente da República e aos órgãos do poder local (artigos 124.º e 239.º, n.º. 4), de iniciativa legislativa (artigo 167.º, n.º. 1) e de iniciativa de referendo local (artigo 240.º, n.º. 2).
Mas a universal e igual atribuição de direitos de manifestação da soberania popular (artigo 10.º) não tolhe a promoção da igualdade no exercício dos mesmos direitos - assim como a igualdade perante a lei (artigo 13.º) não se queda diminuída pela promoção da igualdade real (artigos 9.º, alínea d), 81.º, alínea b) ou 104.º, n.º 1), ou pelo mandado de desenvolvimento harmonioso de todas as regiões e de correcção das desigualdades derivadas da insularidade (artigos 81.º, alínea d), e 229.º, n.º. 1).
Mais ainda a ideia de igualdade efectiva em qualquer dos campos acabados de mencionar pode ou deve considerar-se requerida pela própria ideia de igualdade jurídica, pela necessidade de lhe buscar um conteúdo efectivo; e, mesmo quando envolve a concessão de certos direitos ou de certas vantagens a determinadas pessoas - as que se acham em situações de inferioridade, de carência ou de menor protecção - a diferenciação está ao serviço da igualdade, oferece-se instrumental para este fim.
A representação política moderna estreia-se na universalidade e unidade da cidadania, na unidade do povo ou comunidade política, acima de quaisquer categorias ou qualidades particulares de representados e de representantes.
No entanto, isso não impede que se considerem medidas, directas ou indirectas, tendentes a dar aos órgãos representativos uma representação equilibrada de homens e mulheres - sendo esta divisão inerente às pessoas humanas - de tal sorte que a soberania do povo se traduza em cidadania assumida em plenitude por todos os seus membros, homens e mulheres.
Não está em causa o direito de eleger ou o direito de ser eleito. Só estão em causa os requisitos de legitimidade procedimental para a sua propositura, o que é muito diferente. Nem se trata de fraccionar, e tão somente de reforçar a unidade política. Tudo está em que os preceitos legais sejam tomados estritamente em vista desse objectivo e só pelo tempo estritamente necessário, confiando-se depois na dinâmica social e cultural que se venha a desenvolver. Não se trata de segregar, mas, pelo contrário, de integrar.
A Constituição continua, seguramente, a não permitir que se estabeleçam restrições tanto ao princípio da unidade e universalidade indivisível do sufrágio activo como ao princípio do mandato representativo, que constituem a base da democracia representativa e que nada no artigo 109.º autoriza a excepcionar. Pode haver limites máximos ou mí