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1599 | II Série A - Número 046 | 31 de Março de 2001

 

Com efeito, nesta, as dúvidas apenas podiam levantar-se quanto ao respeito dos limites contidos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa. Isto é: importava saber se o sistema contido na proposta de lei respeitava os limites da adequação, da proporcionalidade e da necessidade.
Nas iniciativas legislativas em análise, parece que as questões de constitucionalidade são outras.
A leitura dos pareceres de constitucionalistas relativamente à solução encontrada na proposta de lei n.º 194/VII será bastante elucidativa (Vide Democracia com mais cidadania, edição da Imprensa Nacional Casa da Moeda, contendo pareceres de Jorge Miranda, Leonor Beleza, Lúcia Amaral, Luísa Duarte e Vital Moreira).

Na verdade, segundo o Professor Jorge Miranda:
"A representação política moderna - contraposta à representação estamental e irredutível à representação de interesses - esteia-se na universalidade e unidade dos cidadãos, na unidade do povo ou comunidade política, acima de quaisquer categorias ou qualidades particulares de representados e representantes. No entanto, isso não impede que se considerem medidas, directas ou indirectas, tendentes a aproximar a composição dos órgãos representativos da composição real da comunidade, de tal sorte que a soberania do povo - una e indivisível (artigo 3.º da Constituição) se traduza em cidadania assumida em plenitude por todos os seus membros.
A esta luz, poderá entender-se que orientações, incentivos e prescrições nesse sentido, longe de conduzirem a um fraccionamento, poderão reforçar a unidade política. Tudo está em que sejam tomados estritamente em vista desse objectivo e só pelo tempo estritamente necessário, confiando-se depois na dinâmica social e cultural que se venha a desenvolver".
E salientava em nota de rodapé o Professor Jorge Miranda:
"V. O artigo 4.º, n.º 1, da Convenção sobre a discriminação contra as mulheres:
A adopção pelos Estados partes de medidas temporárias visando acelerar a instauração de uma igualdade de facto entre homens e mulheres não é considerado um acto de discriminação; mas não deve, por nenhuma forma, ter como consequência a manutenção de normas desiguais ou distintas; e estas medidas devem ser postas de parte quando os objectivos em matéria de igualdade e de oportunidades e de tratamento tiverem sido atingidos.

A Convenção, anota o Professor Jorge Miranda, foi aprovada para ratificação em Portugal pela Lei n.º 23/80, de 26 de Julho.

Nas conclusões do seu parecer foi, assim, exarado:

...importa notar

h) Sem embargo do carácter permanente da norma constitucional, o carácter temporário variável, em razão da necessidade, das normas legais de concretização nos moldes atrás referidos.
Também o Professor Vital Moreira considera no seu parecer que o artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa impõe a adopção de medidas de discriminação positiva, entre as quais coloca a adopção de um sistema de quotas.
Afirmando a tal respeito:
"Com efeito, é o próprio artigo 109.º da CRP, na sua nova redacção, que discrimina explicitamente a "participação (...) de homens e mulheres na vida política, lá onde anteriormente se falava em participação dos cidadãos na vida política, expressão esta que ainda se encontra na rubrica do mesmo preceito, que permaneceu inalterada, como que para significar que para este efeito os cidadãos são homens e mulheres, em suma, que a cidadania passou a ter sexo. Torna-se evidente que, para este efeito - ou seja, que para efeito de acesso aos cargos políticos incluindo os cargos electivos - a própria Constituição procede a uma diferenciação do demos em homens e mulheres, melhor dizendo em cidadãos e cidadãs".

Mas a dúvida continua a colocar-se:
Será que a diferenciação do demos não fica apenas autorizada enquanto forem necessárias as medidas de discriminação positiva?
Se é certo como todos referem, inclusivamente o Professor Vital Moreira, que o artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa impõe medidas de discriminação positiva para a promoção da igualdade entre homens e mulheres no acesso aos cargos políticos; se é certo que as medidas de discriminação positiva infringem o princípio da igualdade constante do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa; se por isso mesmo não devem exceder o princípio da necessidade, não será verdade que a paridade - que consiste na divisão para sempre do demos em homens e mulheres - excede os limites a que devem obedecer as medidas de discriminação positiva?
Não será verdade que a paridade ad aeternum acaba por violar o princípio da igualdade constante do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa?
Não será verdade que a Constituição só autorizará - sem prescindir dos limites do seu artigo 18.º, n.º 2 - a divisão do demos entre cidadãos e cidadãs apenas para o efeito da aplicação de medidas de discriminação positiva?
Não será só assim que tem conciliação com o artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa, o artigo 3.º da Constituição da República Portuguesa que proclama que a soberania é una e indivisível e que reside no povo, sem o dividir por sexos?
E não será só assim que se conciliam com o artigo 109.º, os artigos 48.º, 49.º e 50.º da CRP que não distinguem cidadãos e cidadãs?
Nalguns países, como na Itália, o sistema de quotas foi julgado inconstitucional por violar o princípio da não discriminação em razão do sexo.
Até medidas de acção positiva têm sido declaradas como contrárias ao princípio da igualdade, quando na opção entre dois candidatos a emprego, ou a promoções na carreira, não tomam em conta, na atribuição da preferência, qualquer situação especial do candidato preferido.
A Jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu tem vindo a pronunciar-se nesse sentido.
Tal aconteceu com o Acórdão Kalanke, mas também embora de forma mais mitigada com o acórdão Marschall e com Acórdãos mais recentes.
De facto com o Acórdão Marschall, cujo sumário se transcreve, veio reconhecer-se a possibilidade de medidas de discriminação positiva a favor das mulheres, desde que as candidaturas (no emprego) sejam objecto de uma apreciação objectiva que tenha em conta todos os critérios relati