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1872 | II Série A - Número 035 | 12 de Fevereiro de 2004

 

que este fenómeno representa para o Estado, para os seus fundamentos e para a sociedade, cabe ao poder político definir o seu empenhamento no combate ao mesmo e os recursos a atribuir a tal combate. Os dados actualmente existentes permitem concluir que a criminalidade organizada transnacional evolui, adapta-se e enraíza-se na sociedade, procurando responder à procura, sempre crescente, dos seus bens e serviços.
Como disse o Secretário-Geral das Nações Unidas no discurso proferido na sessão de abertura da Conferência de alto nível para assinatura da Convenção, em Palermo,
"Se a delinquência atravessa as fronteiras, o mesmo terá de suceder em relação à acção da lei (…). Se os inimigos dos direitos humanos procuram servir-se da abertura e das possibilidades da globalização para alcançar os seus fins, devemos servir-nos desses mesmos factores para defender os direitos humanos e vencer a delinquência, a corrupção e o tráfico de pessoas" e mais adiante "Considero que o tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças (…) é uma das violações mais atrozes a que fazem frente as Nações Unidas na actualidade".
A prevenção e o combate à criminalidade organizada constituem um bom exemplo da interdependência das sociedades modernas, que se desenrola hoje em diversos planos, também no plano jurídico, em particular com base num bom e efectivo sistema de cooperação jurídica e judiciária internacional. É necessário, porém, reforçar aquela cooperação sendo que a realidade política e económica internacional, por um lado e as ligações dessa criminalidade grave ao terrorismo, por outro, amplificam significativamente os problemas com que todos os Estados, sem excepção, são hoje confrontados.
Trata-se de crimes qualificados pela criminologia como "crimes of the powerfull" com configuração jurídica significativamente diversa da dos tipos de direito penal clássico, embora, envolvendo muitas vezes também a sua prática (Vide Anabela Rodrigues e J. L. Mota Para uma política criminal europeia, 2002, pág. 14 e seguintes).
Ao salvaguardar os direitos e garantias reconhecidos à luz das normas e regras internacionais, a presente Convenção e Protocolos representam, além do compromisso da comunidade internacional, instrumentos jurídicos de referência para o fortalecimento de uma desejada cooperação internacional no combate à criminalidade organizada transnacional.

III - Antecedentes

A Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional e os respectivos Protocolos contra o tráfico de pessoas e a introdução clandestina de migrantes tem a sua origem na Resolução n.º 53/111, de 9 de Dezembro de 1998, da Assembleia Geral das Nações Unidas. Esta resolução previa a criação de um comité intergovernamental encarregado de elaborar uma convenção internacional contra o crime organizado, completada por protocolos. As negociações foram concluídas em Julho de 2000 para a Convenção, e em Outubro de 2000 para os dois Protocolos. Em Dezembro de 2000, teve lugar em Palermo uma conferência de alto nível destinada à assinatura da Convenção e dos Protocolos supracitados. A Convenção foi assinada por 147 países, o Protocolo contra o tráfico de pessoas foi assinado por 117 países e o Protocolo contra a introdução clandestina de migrantes foi assinado por 112 países. A Convenção entrou em vigor em 29 de Setembro de 2003, na sequência do depósito do quadragésimo instrumento de ratificação, tal como previsto no seu artigo 38.º.
Em Portugal, por indicação do Procurador-Geral da República, o auditor jurídico foi designado pelo Ministro da Justiça para coordenar o "Grupo de Trabalho Justiça/Viena", constituído para participar nos trabalhos do "Comité Ad Hoc", mandatado pela Assembleia Geral das Nações Unidas para elaborar o projecto de "Convenção Contra a Criminalidade Organizada Transnacional" e três Protocolos Adicionais - "Contra o Fabrico e Tráfico Ilícito de Armas de Fogo"; "Contra a Introdução Clandestina de Migrantes por Terra, Ar e Mar"; e "Contra o Tráfico de Seres Humanos, em especial Mulheres e Crianças". Neste contexto, foi elaborado pela Procuradoria-Geral da República um parecer sobre os referidos instrumentos. Note-se que a Procuradoria-Geral da República é igualmente a autoridade central competente nos termos do n.º 13 do artigo 18.º da Convenção e do n.º 6 do artigo 8.º do Protocolo contra a introdução clandestina de migrantes.

IV - Objecto da Convenção e dos Protocolos

A Convenção visa permitir a eficaz cooperação dos países signatários em matéria de luta contra o crime organizado, mediante a harmonização da definição das infracções nos diferentes sistemas jurídicos nacionais, de modo que um acto que constitua uma infracção num Estado signatário seja considerado igualmente como tal nos outros países signatários.
Neste contexto, a Convenção é o primeiro tratado das Nações Unidas juridicamente vinculativo que visa combater o crime à escala mundial, exigindo que os Estados signatários cooperem no combate a crimes como a participação num grupo criminoso organizado, o branqueamento de capitais, a corrupção e a obstrução à justiça. Trata-se, pois, de um instrumento global de luta contra as redes criminosas que fornece definições universais de certas noções fundamentais de direito penal em matéria de luta contra o crime organizado.
A Convenção instaura a obrigação de os Estados inscreverem no domínio penal quatro tipos de infracções graves: a participação numa rede de criminalidade organizada; o branqueamento de capitais; os entraves ao bom funcionamento da justiça e a corrupção. Prevê igualmente meios para melhorar a cooperação entre os Estados, nomeadamente em domínios como a entreajuda judicial, os inquéritos comuns e a extradição. Estão, além disso, previstas disposições específicas para assegurar o seguimento do dinheiro sujo, bem como a apreensão e o confisco dos activos provenientes do crime, e para proteger as vítimas e as testemunhas.
Quanto aos dois Protocolos, estes prevêem medidas rigorosas destinadas a combater o tráfico ilícito de migrantes e o tráfico de seres humanos, em especial das mulheres e crianças, protegendo-os contra a escravidão, a exploração sexual e o trabalho clandestino. De assinalar, neste contexto, que o Protocolo sobre o tráfico prevê medidas de assistência tanto jurídica como material às vítimas do tráfico. Assim, o artigo 6.º impõe aos Estados signatários que velem não só pelo fornecimento de