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28 | II Série A - Número: 073 | 27 de Março de 2008

mulher; o adultério do homem; a condenação definitiva de um dos cônjuges a qualquer pena maior; as sevícias de origens graves; o abandono do domicílio conjugal por tempo não inferior a três anos; a ausência sem notícias, por tempo não inferior a quatro anos; a loucura incurável quando decorridos, pelo menos, três anos sob a sua verificação por sentença passada em julgado; a separação de facto livremente consentida, por 10 anos consecutivos, o vício inveterado do jogo de fortuna ou de azar; a doença contagiosa reconhecida como incurável, importante aberração sexual.
A mesma lei, numa lógica de separação da Igreja do Estado, consagra o casamento civil como o único válido, e obrigatório, estabelecendo-se que, a partir de Fevereiro de 1911, os casamentos religiosos só poderão celebrar-se com a apresentação do documento comprovativo da celebração do casamento civil.
A doutrina corporativa do Estado Novo fundamentando-se na trilogia de «Deus, Pátria e Família», repudia a visão de simples contrato de direito, impondo uma concepção social do casamento como uma das mais importantes instituições sociais legitimando a intervenção do Estado na sua regulamentação. O casamento é definido como integrante da família já que esta como base social do regime, território à escala micro-social do poder de chefe, consistia «no casamento e na filiação legítima» (Artigo 13.º da Constituição de 1933).
A Concordata celebrada com a Santa Sé, a 7 de Maio de 1940 (Decreto-Lei n.º 30615, de 25 de Julho) consagra, a par do casamento civil, o casamento celebrado pela Igreja, segundo as leis canónicas, exclusivamente por elas regido, sujeito ao princípio da indissociabilidade. Criam-se, assim, dois regimes matrimoniais distintos, sendo apenas um, o civil, passível de divórcio. No entanto, a partir de 1946, é nítido o declínio da taxa de divórcios, quer porque a maioria da população portuguesa mantém a celebração matrimonial tradicional católica quer porque a doutrina e o discurso corporativistas estigmatizam intensamente o divórcio. A vigência da Concordata originará situações de ruptura conjugal não reconhecidas, mas evidentes na subida das separações judiciais de pessoas e bens e na imposição da ilegitimidade dos filhos das novas uniões irregulamentáveis pela lei. O Código Civil de 1966 impõe novas restrições, impedindo o divórcio por mútuo consentimento, em vigor desde a I República, aos casados civis.
A dimensão social das consequências da legislação do Estado Novo toma visibilidade depois do 25 de Abril de 1974. Dois meses após a revolução, o Movimento Pró-Divórcio, existente desde 1965, entrega ao governo provisório 51 000 assinaturas às quais se acrescentam mais 50 000, reclamando a revogação da cláusula da Concordata e do articulado do Código Civil impeditivos da dissolução dos casamentos católicos. Na sequência de um vasto movimento social pelo divórcio, em Maio de 1974, com a ratificação do protocolo adicional à Concordata e o consequente Decreto-Lei n.º 261, retoma-se a unidade do regime matrimonial da legislação da I República, igualando o casamento católico e o casamento civil e admitindo o divórcio por mútuo consentimento e o divórcio litigioso. O protocolo adicional à Concordata, que veio permitir o divórcio civil para os católicos, foi assinado pelo Vaticano a 13 de Fevereiro de 1975.
O sistema português, à semelhança de outros sistemas europeus, nos quais se verificam reformas na mesma década, caracteriza-se como «sistema misto», de compromisso entre o «divórcio-sanção» e o divórcio constatação da ruptura do casamento ou «divórcio-remédio». As alterações de 1975 não contêm ainda a amplitude da legislação republicana. Porém, o direito começa lentamente a reflectir as novas vivências do casamento e da família, consagrando um e outra como realidades distintas, ainda que em íntima conexão.
Exemplo desta perspectiva moderna é o facto de, na Constituição de 1976, só a família ser objecto de garantia constitucional, não se enunciando o mesmo princípio de protecção para o casamento limitado pela Constituição a um direito individual fundamental.
Em 1994 e 1995, algumas alterações ao Código Civil introduzem pontualmente aligeiramentos no processo de divórcio. No entanto, apenas em 1997, com o projecto de lei n.º 399/VII, do PS, é proposta globalmente uma filosofia de liberalização do divórcio fundamentada nas profundas transformações da sociedade portuguesa e de uma maior valoração da conjugalidade e da família. A Lei n.º 47/98, baseada neste projecto, embora contendo alterações que facilitam o divórcio, fica aquém da proposta. Mais recentemente o DecretoLei n.º 272/2001 veio agilizar o processo de divórcio por mútuo consentimento, remetendo-o para a competência exclusiva dos conservadores do Registo Civil, libertando, assim, os tribunais, e acelerando o processo com a redução das tentativas de conciliação a uma apenas, o que elimina o compasso de espera de três meses, no mínimo, que decorria entre ambas as conferências.
Entretanto, o processo de mudança social que se reflecte em novas exigências de autonomia individual e de realização afectiva, traduzidas em novas expectativas face à conjugalidade, no aumento de rupturas