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II SÉRIE-A — NÚMERO 184 58

2. A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade

judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei.

3. Ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento,

salvo em situação de flagrante delito ou mediante autorização judicial em casos de criminalidade

especialmente violenta ou altamente organizada, incluindo o terrorismo e o tráfico de pessoas, de armas

e de estupefacientes, nos termos previstos na lei.

4. É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas

telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em

matéria de processo criminal.

(ênfase acrescentado).

O texto deste segmento anterior à 4.ª Revisão Constitucional (à Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de

setembro) vinha da versão inicial da Constituição, estabelecendo o seguinte:

4 – É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas

telecomunicações, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.

Consistiu esta alteração de 1997, pois, e sem qualquer indício – sublinhamo-lo desde já – de se ter visado

algo mais do que o acesso pelas autoridades ao próprio conteúdo da comunicação, na integração no texto

constitucional, em paralelo à correspondência em sentido clássico (o correio em suporte físico: as cartas, as

encomendas postais e o telégrafo) e às telecomunicações existentes (basicamente o telefone, eventualmente

já o fax e a telecópia), que correspondiam aos meios de comunicação clássicos pensados como a realidade

existente em 1976, de outros meios equivalentes, os “demais meios de comunicação”, abrindo a previsão do

artigo a uma evolução, já fortemente pressentida em 1997, para novas realidades técnicas comunicacionais

entre as pessoas. Estas, todavia, mantiveram no texto constitucional (no artigo 34.º, n.º 4) o sentido essencial

que, então (em 1997), lhes era atribuído: fundamentalmente o correspondente ao conteúdo da própria

comunicação (os dados de conteúdo, numa terminologia que posteriormente se tornou usual), não tanto, então

em 1997, com um sentido, que possamos considerar claro, de abarcar outros dados respeitantes à

comunicação, concretamente o que no futuro viria a ser qualificado como dados de tráfego, enquanto elementos

que nada aportassem quanto ao conteúdo, em si mesmo, do ato comunicacional. A doutrina propendia, então

(continuamos a referir o momento histórico da revisão de 1997), a associar a ideia de ingerência nas

telecomunicações, essencialmente, à interceção das palavras trocadas entre os intervenientes. Com efeito, era

então comum a referenciação “da danosidade social das escutas telefónicas” ao “direito à palavra” (Manuel da

Costa Andrade, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, Coimbra, 1992, p. 275; deve o trecho aqui

citado ser situado no exato contexto em que foi escrito, em 1992, bem antes da evolução que viria a culminar

com a introdução pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, do atual n.º 2 do artigo 189.º do CPP).

O que aqui se pretende sublinhar, sem menosprezar o significado do elemento evolutivo que a questão dos

dados de tráfego assumiu posteriormente, é, tão-somente, a circunstância do n.º 4 do artigo 34.º da CRP não

se ter formado num quadro em que a questão do acesso aos dados circunstanciais da comunicação se

colocasse exatamente com o mesmo sentido do próprio acesso ao conteúdo da comunicação, e já então a

questão do acesso das autoridades aos dados de tráfego havia sido equacionada, por exemplo, na

jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, no Acórdão Malone v. Reino Unido, de 1984, a

respeito do trecho do artigo 8.º, n.º 2 da Convenção que exige que a ingerência das autoridades esteja “prevista

na lei” (foi esse o exato sentido da decisão Malone, cfr. os respetivos pontos 66 a 68, e, posteriormente, em

1990, da decisão Huvig e Kruslin c. França, cfr. Louis-Edmond Pettiti, Emmanuel Decaux, Pierre-Henri Imbert,

La Convention Européenne des Droits de L’Homme. Commentaire article par article, 2.ª ed., Paris, 1999, pp.

314/315). Ou seja, o que aqui se pretende afirmar é, tão-só, que o texto constitucional, não se tendo cristalizado

numa fase (inicial) de “indiferença valorativa” pelo que hoje chamamos dados de tráfego, não assimilou logo

para estes um grau de proteção absolutamente idêntico ao dos dados de conteúdo.

Adiante voltaremos a esta questão, a respeito da apreciação de precedentes na jurisprudência deste Tribunal

que entendemos dever convocar à discussão da viabilidade constitucional do artigo 78.º, n.º 2 do Decreto n.º