O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

II SÉRIE-A — NÚMERO 184 60

inequívoca, interessa agora caracterizar a atividade dos Serviços de Informações, enquanto elemento central

da discussão em torno da referenciação, no n.º 4 do artigo 34.º da CRP, do processo criminal, como espaço de

tolerabilidade da ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações e demais meios de comunicação.

Trata-se aqui de referenciar essa atividade (a dos Serviços de Informações) no plano constitucional e de

procurar a articulação desta atividade com o plano dos valores substanciais intuídos no trecho final desse n.º 4.

Com efeito, a existência dessa articulação propiciará um modelo interpretativo apto a sustentar –

interpretativamente – que a referência ao processo criminal não afasta, em termos absolutos, da lógica de

viabilização de uma ingerência reportada aos dados de tráfego, a atividade dos serviços de informações.

5. A Constituição da República Portuguesa não trata em qualquer norma – queremos dizer que não trata

direta e explicitamente – da atividade dos Serviços de Informações, atividade que referenciaremos aqui, olhando

à essência teleológica base de um Diploma contendo o Regime Jurídico do SIRP (a Lei n.º 30/84, de 5 de

setembro, e o Decreto n.º 426/XII), como função de produção de informações. Todavia, através de um

argumento de pendor orgânico, referido à alocação da competência legislativa exclusiva nesta matéria ao

Parlamento [referimo-nos ao artigo 164º, alínea q) da Constituição: [é] da exclusiva competência da Assembleia

da República legislar sobre […] q) [r]egime do sistema de informações da República e do segredo de Estado

[…]”], podemos intuir, através da integração dessa competência na reserva absoluta da Assembleia, a

consideração da organização funcional, atribuições legais e meios de atuação dos Serviços de Informações –

dos Serviços integrantes do SIRP – como matéria pretendida sujeitar aos requisitos específicos que justificam

uma tal opção atributiva de competência, a saber: “[…] o sentido e alcance da reserva absoluta de lei

parlamentar [significa], sobretudo: (a) que o processo de criação legislativa é público, desde a apresentação do

projeto ou da proposta de lei na AR; (b) que o procedimento legislativo está sujeito ao contraditório político, com

intervenção das minorias; (c) que todas e cada uma das normas são formalmente produto da vontade da

assembleia representativa” (J. J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, CRP. Constituição da República Portuguesa

Anotada, 4.ª ed., Coimbra, 2010, p. 309).

Esta reserva absoluta foi introduzida na revisão constitucional de 1997, traduzindo-se na migração da

anterior reserva relativa (antiga alínea r) do artigo 168º) para a atual reserva absoluta. A origem desta opção é

caracterizada por um participante nesse processo de revisão, como “[inculcando] nitidamente que a reserva não

se confina à aprovação de bases gerais ou de estatuto (geral) dos serviços. A solução aprovada acarreta, pois,

notória diminuição dos poderes que o Governo vinha exercendo [durante os anos 80] neste domínio sensível,

podendo contribuir para atenuar a opacidade e secretismo que têm caracterizado o processo de instalação dos

serviços de informações (e reforçar o controlo democrático das suas atividades)” (José Magalhães, Dicionário

da Revisão Constitucional, Mem Martins, 1989, p. 57). Note-se que, adicionalmente à intencionalidade que, em

si mesma, a alocação desta reserva já inculca, existe um elemento significativo, exterior ao texto constitucional,

de referenciação de todo o Sistema de Informações, na vertente do seu controlo externo, ao Parlamento. É esse

o sentido da existência, desde a conceção inicial do SIRP, do Conselho de Fiscalização do Sistema de

Informações da República Portuguesa (artigo 7.º, alínea a) da Lei 30/84, designado agora, no Decreto n.º 426/XII

– artigos 3.º, n.º 3, alínea a) e 20.º, alínea a) –, Conselho de Fiscalização do SIRP), eleito pela Assembleia da

República (artigos 8.º a 13.º da Lei 30/84, artigo 21.º do Decreto n.º 426/XII).

6. A discussão no plano constitucional – no quadro de uma democracia constitucional – da atividade dos

Serviços de Informações, convoca ao debate, necessariamente, os valores Segurança e Democracia, colocados

em paralelo, assumindo a existência de uma tensão existencial permanente entre a adoção de políticas públicas

promotoras de segurança e os valores democráticos – os valores próprios de um Estado de direito democrático

–, concretamente aqueles que se expressam no exercício de direitos fundamentais. Trata-se neste domínio,

essencialmente, de responder a um desafio: o desafio da perspetivação da Segurança, no sentido decorrente

do artigo 27.º, n.º 1, da CRP (“[t]odos têm direito à liberdade e à segurança”), enquanto obrigação prestacional

do Estado aos cidadãos, numa relação de tensão entre valores constitucionais. E, com efeito, todos

reconheceremos que a prestação de Segurança pelo Estado suscita frequentemente questões complexas de

compatibilização (mesmo de tensão existencial) entre direitos, apresentando-se como um domínio de eleição

na atuação do princípio da proporcionalidade, com o sentido que o nosso texto constitucional confere a este: